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Acórdão
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 142.013-9, DE UMUARAMA 1ª VARA CÍVEL. Apelante : Alimentos Zaeli Ltda. Apelado : Microsoft Corporation. Relator : Des. Bonejos Demchuk.
Medida CAUTELAR DE VISTORIA e AÇÃO ORDINÁRIA COMINATÓRIA CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR ATO ILÍCITO PIRATARIA DE SOFTWARE LIMINAR CONCEDIDA LAUDO PERICIAL UTILIZAÇão de programa de computador sem autorização AçÕES PROCEDENTES PARA CONDENAR A RÉ EM INDENIZAÇÃO E MULTA PARA COMPELIR A ABSTENÇÃO APELO ALEGAÇÃO DE NULIDADE DA SENTENÇA INOCORRÊNCIA CONTRAFAÇÃO UTILIZAÇÃO ILÍCITA DE SOFTWARE APLICABILIDADE DO DISPOSTO NO ART. 28 e 29 dA LEI Nº 9.610/98 (LEI DO DIREITO AUTORAL) C/C ARTS. 6º, I, e 12 dA LEI Nº 9.609/98 (LEI DO SOFTWARE) DECISÃO MANTIDA APELO DESPROVIDO.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 142.013-9, de Umuarama 1ª Vara Cível, em que é apelante ALIMENTOS ZAELI LTDA. e apelado, MICROSOFT CORPORATION. I. Trata-se de Ação Ordinária Cominatória cumulada com Indenização por Ato Ilícito proposta por Microsoft Corporation em face de Alimentos Zaeli Ltda., objetivando que a ré se abstenha de reproduzir e utilizar cópias de programas de computador de propriedade da autora, bem como seja ela condenada ao pagamento de indenização pela violação de seus direitos autorais, e ainda, de multa diária a fim de que se abstenha de prosseguir na utilização indevida de software. Concomitantemente à ação principal a autora ajuizou Ação Cautelar de Vistoria e Busca e Apreensão (autos nº 322/2000, em apenso) pleiteando medida liminar ante a existência de fumus boni iuris e periculum in mora, a qual foi deferida, mediante caução, pela decisão prolatada às fls. 163 usque 164. O laudo pericial foi apresentado às fls. 174 usque 185, da cautelar. Na contestação, a ré argüiu, preliminarmente, a impropriedade de cumulação de pedido cominatório com indenizatório; e no mérito refutou todas as alegações da autora, acrescentando que vinte e sete (27) computadores não foram vistoriados posto que não se encontravam na sede da empresa, face a avarias decorrentes de descargas elétricas na rede de energia. Na audiência de conciliação (fls. 271) o Magistrado deferiu o pedido de liminar com fulcro no § 2º, do art. 4º da Lei nº 9.609/98, sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000,00 (mil reais). Desta decisão, a ré interpôs Agravo de Instrumento autuado sob o nº 109.824-8, o qual foi julgado pela 4ª Câmara Cível através do acórdão nº 19.653 (fls. 308/310) que, sem discrepância de votos, negou provimento ao recurso. Sentenciando, houve por bem o douto Magistrado em julgar procedente o pedido formulado nos autos principais para: a) condenar a ré a pagar a autora pela utilização indevida de software a indenização de R$ 151.000,00 (cento e cinqüenta e um mil reais), corrigida monetariamente, acrescida de juros moratórios de 0,5% (meio por cento) ao mês desde 13.09.2000; e b) condenar a ré a abster-se de utilizar os programas ilegitimamente adquiridos, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais) por cópia ilegalmente utilizada. Julgou também procedente o pedido formulado nos autos de cautelar (nº 322/2000) confirmando a liminar e homologando o laudo pericial ali produzido. Condenou, ainda, a ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) do valor da condenação. Irresignada, apela a sucumbente argüindo a preliminar de nulidade da sentença por ofensa ao art. 128 do Código de Processo Civil, e, no mérito, a improcedência da ação de vez que pela prova produzida restou claro que a recorrente não praticou e nem pratica contrafação, e nem violou direitos autorais da ora apelada.
Nas contra-razões de fls. 387 usque 395, a defesa do decisum. É o relatório.
II Decido: Não merece guarida a súplica recursal. Dimana dos autos que a autora Microsoft Corporation ajuizou contra Alimentos Zaeli Ltda. Ação Cautelar de Vistoria, Busca e Apreensão nº 322/2000, com fulcro nos termos do art. 14, § 3º, combinado com o art. 13 da Lei nº 9.609, de 19.02.98 Lei do Software, e art. 102, da Lei nº 9.610, de 19.02.98 Lei de Direito Autoral, requerendo concessão de liminar inaudita altera pars com fulcro nos arts. 797, 798 e 842, § 3º do Código de Processo Civil, de vistoria nas dependências da empresa ré, objetivando a elaboração de laudo pericial, eis que esta estaria praticando reprodução e utilização ilícitas de programas de computador, conhecida como pirataria de software. A liminar foi concedida pelo nobre Magistrado às fls. 163 usque 164 dos autos em apenso de medida cautelar para o fim de determinar a vistoria de todos os computadores e demais equipamentos de informática instalados nas dependências da empresa ré, para que fossem apuradas supostas violações dos direitos autorais da requerente. Nomeados, os peritos oficiais, apresentaram o Laudo Técnico de Perícia Judicial acostado às fls .174/185. Não se vislumbra qualquer ilegalidade no despacho liminar, pois o nosso ordenamento jurídico reconhece direitos do autor, tanto na criação, como na produção, circulação e utilização da obra intelectual, permitindo-lhe desfrutar dos proveitos econômicos decorrentes da utilização de sua obra. É o que dispõe o art. 28 da Lei nº 9610/98: Cabe ao autor o direito exclusivo de utilizar, fruir e dispor da obra literária, artística ou científica.
E como a ninguém é lícito fazer uso econômico da obra de outrem, direta ou indiretamente, a medida liminar foi corretamente adotada. Realizada a perícia, verificou-se que apenas dois certificados de autenticidade (documentos que acompanham disquetes ou CDS para instalação do software original, que atestam a origem lícita e respectiva licença para utilização) foram encontrados pelos peritos, correspondentes aos programas com números de série 33097-OEM-0027732-69098 e 25600-OEM-0086833-84825. Como bem salientou o Magistrado, verbis: Para os demais programas encontrados instalados nos computadores vistoriados pelos Peritos, não apresentou a ré os respectivos certificados de autenticidade, sendo que, relativamente aos apresentados, encontrados instalados em 13 máquinas distintas (cinco com windows 95, fls. 48; oito com windows 98, fls. 49/50), não demonstrou a ré que estivesse autorizada a instalar cada programa simultaneamente em mais de um computador. No último caso, porque a aquisição do original de uma obra, ou de exemplar, não confere ao adquirente qualquer dos direitos patrimoniais do autor, salvo convenção em contrário entre as partes e os casos previstos nesta Lei (art. 37 da Lei nº 9.610/98), sendo que a prova da convenção em contrário só a ré competia. Resta então concluir que a ré, ao instalar em seus computadores programas não originais, de procedência duvidosa ou sem comprovação da legitimidade da aquisição (reputados, pois, contrafações, porque desprovidos do respectivo certificado de autenticidade e licença para utilização) e ao instalar programas em mais de uma máquina (reprodução em desacordo com o art. 6º, inciso I, da Lei n] 9609/98), violou direitos autorais da autora, praticando a conduta proibida pelo art. 12 da Lei nº 9.609/98 e violando o disposto no art. 29 da Lei nº 9.610/98 (fls. 362/3) (grifos nossos).
À nenhuma outra conclusão poderia ter chegado o Magistrado, face o contido nos autos, que não levasse à procedência da demanda. No que diz respeito à preliminar de nulidade da sentença por violação ao disposto no art. 128 do Código de Processo Civil (o juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questões não suscitadas, a cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte) entendo que inocorreu in casu. A apelante alega que a lide foi proposta sob o fundamento de imputação de reprodução e contrafação de software de propriedade da ora apelada, utilizados de forma ilícita e que pela perícia realizada nas instalações da empresa restou comprovado que a recorrente não estava reproduzindo programas de computador da apelada (cópias em mídias magnéticas). Desta forma teria o juiz extrapolado os limites da lide, indo além da causa de pedir que foi delimitada na exordial.
Porém, e data vênia, não é o que se observa do pedido. Na verdade a autora não se refere apenas à reprodução, mas também à utilização não autorizada pela apelada, como usuária final, de programas de sua propriedade. Aliás, essa é a interpretação que se deve dar ao disposto no art. 28 da Lei nº 9.610/98, cabe ao autor o direito exclusivo de utilizar, fruir e dispor da obra literária, artística ou científica Nesse sentido: O software, enquanto programa de computador, é produção intelectual do espírito e foi objeto de proteção pelas Leis brasileiras nº 7.646/87 e 9.609/98, a primeira já revogada pela segunda, e pelas convenções de Berna e de Genebra. A denominada pirataria de software, nada mais é do que violação de direitos autorais, através de utilização ou reprodução de cópias de programas de computador sem autorização ou licença do titular de direitos autorais do mesmo programa, constituindo não só ilícito penal, como ilícito civil, podendo o autor intentar ação para proibir o infrator a prática do ato incriminado, com a cominação de pena pecuniária para o caso de transgressão do preceito, que poderá ser cumulada com a de perdas e danos pelos prejuízos decorrentes da infração, sendo-lhe lícito, também, segundo a Lei nº 5.988/73, requerer a apreensão dos exemplares reproduzidos ou a suspensão da divulgação e utilização da obra (TAMG, Ap. 0298057-2 (30659) 3ª C.Cív. Rel. Juiz Edílson Fernandes DJMG de 07.09.2000) (grifos nossos). Por óbvio, que não se poderia interpretar restritivamente a lei porque ela não se refere somente à reprodução de software, mas, também, a utilização, sem autorização, por parte da titular do direito autoral. Este é o caso dos autos. Se foi confirmado pelo laudo pericial que somente dois certificados de autenticidade (autorização para utilização) de dois programas foram encontrados, os demais estavam sendo utilizados ilicitamente. E, segundo a recorrida, verbis: a regularidade dos programas, por outro lado, não admite outra prova que não as licenças de uso e as notas fiscais dos programas. É o que diz o artigo 9º da Lei nº 9.609/98. Em recentíssima decisão prolatada pela Exma. Min. Nancy Andrighi, relatora do REsp. 443.119-RJ, julgado pela 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, em 08.05.2003, foi fixado o entendimento esposado na ementa ora transcrita: Direito Civil Recurso especial Ação de conhecimento sob o rito ordinário Programa de computador (software) Natureza jurídica Direito autoral (propriedade intelectual) Regime jurídico aplicável Contrafação e comercialização não autorizada Indenização Danos materiais Fixação do quantum Lei especial (9.610/98, art. 103) Danos morais Dissídio jurisprudencial Não demonstração. - O programa de computador (software) possui natureza jurídica de direito autoral (obra intelectual), e não de propriedade industrial, sendo-lhe aplicável o regime jurídico atinente às obras literárias. Constatada a contrafação e a comercialização não autorizada do software, é cabível a indenização por danos materiais conforme dispõe a lei especial, que a fixa em 3000 exemplares, somados aos que foram apreendidos, se não for possível conhecer a exata dimensão da edição fraudulenta. É inadmissível o recurso especial interposto com fulcro na alínea 'c' do permissivo constitucional se não restou demonstrado o dissídio jurisprudencial apontado. Recurso especial parcialmente provido (DJ de 30.06.03, pg. 0240). Finalmente quanto à possibilidade de pedidos cominatório e indenizatório, é indiscutível posto que expressamente previsto na Lei nº 9.609/98. Como a ora apelante se insurgiu somente quanto à estes fatos, que já foram analisados, despiciendas outras considerações sobre a bem lançada decisão, posto que não impugnadas no recurso. Ex positis: nego provimento ao apelo.
ACORDAM os integrantes da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em negar provimento ao apelo. Participaram do julgamento votando com o Relator os Desembargadores Domingos Ramina e Clayton Camargo. Curitiba, 2 de dezembro de 2003.
DES. BONEJOS DEMCHUK Presidente e Relator.
ANO DO SESQUICENTENÁRIO DA EMANCIPAÇÃO POLÍTICA DO PARANÁ
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