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Acórdão
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 135.970-8 DE LONDRINA 4ª VARA CÍVEL
APELANTE : RUTH BONESI PORCÍNIO DE SOUZA.
APELADO : JOSÉ SÍLVIO MOREIRA MARQUES
RELATOR : JUIZ DESIGNADO MÁRIO HELTON JORGE.
DIREITO CIVIL NULIDADE DE ATO JURÍDICO ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM NEGÓCIO CELEBRADO COM PESSOAS JURÍDICAS INEXISTÊNCIA DE CONTRATOS SOCIAIS REGISTRADOS CARACTERIZAÇÃO DE SOCIEDADES IRREGULARES SEM PERSONALIDADES JURÍDICAS REPRESENTAÇÃO PELO SÓCIO INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 12, VIII, CPC - SENTENÇA MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO. Tanto as sociedades de fato como as irregulares não possuem personalidade jurídica, pois lhes falta a inscrição no registro peculiar, que é o Registro do Comércio. Mas convém esclarecer que essas entidades não perdem a sua condição de sociedades comerciais, valendo a advertência de Pedro Lessa de que a sociedade irregular é menos que a sociedade regular e mais que a comunhão de bens, tomada esta expressão em sentido restrito. A responsabilidade dos sócios, no caso, é ilimitada, porém subsidiária. Os credores particulares dos sócios só podem executar os fundos líquidos que o devedor possuir na sociedade se não tiver outros bens desembargados, ou se, depois de executados, os que tiver não forem suficientes para o pagamento (Cód.Com. art. 292). E, por igual, o credor da sociedade deve primeiro, pelas dívidas sociais, executar a sociedade, para, na falta de bens, realizar a responsabilidade ilimitada do sócio, que por isso é subsidiária (art. 350).
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 135.970-8, de Londrina, 4ª Vara Cível, em que é Apelante Ruth Bonesi Porcínio de Souza e Apelado José Sílvio Moreira Marques.
I EXPOSIÇÃO DOS FATOS
RUTH BONESI PORCÍNIO DE SOUZA interpôs a presente APELAÇÃO contra a sentença (fl.89/92) que, nos autos nº 845/01, de Ação de Nulidade, declarou-a carecedora do direito de ação, por ilegitimidade passiva ad causam, condenando-a ao pagamento das custas e despesas processuais.
Em suas razões (fl. 94/102), a Apelante alegou que não poderia ser extinto o processo, por ilegitimidade passiva do réu, eis que, por ausência de contestação, os fatos alegados devem ser reputados verdadeiros, de acordo com o artigo 319 do CPC. Na decisão, foi considerado que o sócio José Sílvio Moreira Marques é parte ilegítima, eis que o contrato foi pactuado com a pessoa jurídica inexistente de J. Marques Empreendimentos Construção Civil Ltda. No entanto, na inicial, foi alegado que a pessoa jurídica não existia registrada no órgão próprio, como exige o artigo 18 do CC e 119 da LRP, fato este não reconhecido na decisão impugnada. No final, postulou o provimento do recurso, determinando-se o prosseguimento do feito, até final decisão de mérito.
O Apelado apresentou as suas contra-razões recursais (fl. 112/116), alegando que a empresa está devidamente registrada, cuja razão social era J. Marques & Marques S/C Ltda. a qual foi alterada para L. Marques & Marques S/C Ltda, cujo CNPJ é 234.788.470001-80. Pugnou pelo improvimento recursal.
É o relatório.
II O VOTO E SEUS FUNDAMENTOS
Não existem óbices ao conhecimento do recurso, eis que estão presentes os pressupostos processuais de admissibilidade.
A autora, na demanda inicial, alegou que pactou com a empresa J. Marques Empreendimentos Construção Civil Ltda, através de seu diretor José Sílvio Moreira Marques, em 23.01.97, contrato de construção de unidade autônoma e incorporação de condomínio, relativamente ao apartamento 37, do Edifício Residencial Santa Helena, abrangendo fração ideal de terreno, lote 14, da quadra 132, da Gleba Patrimônio Londrina, com área total de 768,85 m2, pelo preço de R$ 15.420,00, integralmente pago em parcelas. Posteriormente, em 23.06.99, foi formalizado outro instrumento de compromisso de venda e compra de imóvel urbano, relativamente à uma unidade de garagem, da empresa Construtora J. Marques Incorporação e Construção Civil Ltda, pelo valor de R$ 2.800,00, integralmente pago em parcelas. Em 24.01.2000, foi obtido o visto de conclusão da obra, de propriedade de José Sílvio Marques. No entanto, a edificação foi realizada em terreno alheio, ou seja, de propriedade de José Freitas dos Santos, havendo, inclusive, débitos de IPTU, relativamente aos exercícios fiscais de 1994 a 2001. Portanto, é remota a possibilidade de obtenção da escritura do imóvel, adquirido de boa-fé, restando-lhe apenas postular pela restituição das parcelas pagas, corrigidas e atualizadas. Ademais, não existe registro do contrato social das empresas J. Marques Empreendimentos Construção Civil Ltda e Construtora J. Marques Incorporação e Construção Civil Ltda, sendo violados o artigo 18 do CC, 119 da LRP e art. 302 do Decreto 3708/1919. No final, pediu a restituição dos valores pagos, com os acréscimos legais e indenização por danos morais.
Não existem quaisquer dúvidas de que os contratos (fl. 12/17 e 31/32) foram firmados com a Construtora J. Marques e pela Construtora J. Marques Incorporação e Construção Civil Ltda, representadas por José Sílvio Moreira Marques.
Por outro lado, observa-se que as notas promissórias (fl. 18/30) foram emitidas e pagas em favor de José Sílvio Moreira Marques, enquanto que foram sacadas duplicatas (fl. 33/42 e 51/52) contra a autora pela empresa MARQUES & MARQUES S/C/LTDA.
A edificação objeto do contrato entre a autora e as pessoas jurídicas foi objeto de concessão de habite-se, através de termo de visto de conclusão (fl. 43) da obra de propriedade de José Sílvio Moreira Marques.
Evidente que o terreno onde consta a construção da edificação está em nome de José Freitas dos Santos (fl. 45), estranho á relação contratual.
Não existe nenhuma obra de titularidade das empresas obrigadas contratualmente.
A autora, embora não tenha comprovado, documentalmente, a inexistência dos registros dos contratos sociais das empresas nos órgãos competentes, por ausência de contestação, pode ser reputada como fato verdadeiro, de acordo com o artigo 319 do CPC. No entanto, a empresa J. Marques & Marques S/C Ltda. está registrada no 1º Ofício de Registros de Títulos e Documentos de Londrina (fl. 129), não integrando a sociedade o sócio José Sílvio Moreira Marques.
Mas, ainda que não exista o registro dos contratos sociais, o artigo 12, inciso VII, e § 2º, do CPC, estabelece que as sociedades sem personalidade jurídica sociedades irregulares - devem ser representadas a quem couber a administração de seus bens, o que ocorre quando as sociedades não levam os seus contratos sociais para o respectivo registro, não possuindo personalidade jurídica, a teor do artigo 18 do Código Civil. Assim, são válidos os compromissos pactuados entre as partes, não caracterizando nulidade a ausência de registro dos estatutos sociais. O que determina a existência da pessoa jurídica é o seu contrato social. O registro dos atos constitutivos outorga a personalidade da pessoa jurídica.
Rubens Requião sobre a matéria leciona que tanto as sociedades de fato como as irregulares não possuem personalidade jurídica, pois lhes falta a inscrição no registro peculiar, que é o Registro do Comércio. Mas convém esclarecer que essas entidades não perdem a sua condição de sociedades comerciais, valendo a advertência de Pedro Lessa de que a sociedade irregular é menos que a sociedade regular e mais que a comunhão de bens, tomada esta expressão em sentido restrito. A responsabilidade dos sócios, no caso, é ilimitada, porém subsidiária. Os credores particulares dos sócios só podem executar os fundos líquidos que o devedor possuir na sociedade se não tiver outros bens desembargados, ou se, depois de executados, os que tiver não forem suficientes para o pagamento (Cód.Com. art. 292). E, por igual, o credor da sociedade deve primeiro, pelas dívidas sociais, executar a sociedade, para, na falta de bens, realizar a responsabilidade ilimitada do sócio, que por isso é subsidiária (art. 350).
Acionando diretamente o sócio das empresas contratantes, fica evidente a ilegitimidade passiva ad causam.
O voto é no sentido de negar provimento ao recurso, mantendo-se a sentença.
III DISPOSITIVO
ACORDAM os integrantes da Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso e negar-lhe provimento.
O julgamento foi presidido pelo Desembargador Mendonça de Anunciação, com voto, e dele participou o Desembargador Accácio Cambi.
Curitiba (PR), 09 de agosto de 2004.
MÁRIO HELTON JORGE Relator
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