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Acórdão
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AGRAVO DE INSTRUMENTO N.º 164.695-5, DA 2.ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE LONDRINA. Agravante : Município de Londrina. Agravada : Francovig & Cia. Ltda. Interessada: Companhia Municipal de Trânsito e Urbanização CMTU-LD Relator : Des. Bonejos Demchuk.
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. CONTRATO DE PERMISSÃO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO. LEGITIMIDADE DA COMPANHIA GERENCIADORA DO SISTEMA DE TRANSPORTE COLETIVO E DO MUNICÍPIO DE LONDRINA PARA RESPONDER POR EVENTUAIS INDENIZAÇÕES PERANTE A PERMISSIONÁRIA. INEXISTÊNCIA DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO COM A OUTRA EMPRESA PERMISSIONÁRIA. SUSPENSÃO DO PROCESSO. DESNECESSIDADE. AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. A Companhia Municipal de Trânsito e Urbanização CMTU-LD, é parte legítima para figurar no pólo passivo do feito, a fim de que se apure, mediante instrução probatória, a sua responsabilização pela alteração unilateral das tarifas de transporte coletivo e que causou o alegado desequilíbrio econômico-financeiro. 2. O Município de Londrina, na qualidade de poder permitente, tornou-se responsável direto pela modificação e fixação das tarifas, assim como das demais cláusulas contratuais e, portanto, responsável pela manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato firmado com a agravada. 3. Não havendo qualquer ofensa a direito afeto à empresa Transportes Coletivos Grande Londrina Ltda - TCGLL, não se mostra coerente a pretensão de incluí-la no pólo passivo do feito. 4. Inexistindo discussão acerca da legalidade da taxa de gerenciamento nos presentes autos, não há que se falar em suspensão do feito até que se julgue a ação popular em que se está a questionar tal matéria. 5. Agravo parcialmente provido.
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 164.695-5, de LONDRINA 2ª VARA CÍVEL, em que é agravante o MUNICÍPIO DE LONDRINA, agravada FRANCOVIG & CIA LTDA e interessada a COMPANHIA MUNICIPAL DE TRÂNSITO E URBANIZAÇÃO CMTU-LD. Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto pelo Município de Londrina, visando a reforma da decisão judicial proferida nos autos de ação de indenização nº 275/2002, promovida pela agravada, através da qual se reconheceu a ilegitimidade passiva da Companhia Municipal de Trânsito e Urbanização CMTU, bem como a legitimidade do Município para figurar no pólo passivo da demanda, dentre outras decisões. Sustenta, para tanto, que a agravada, Francovig & Cia. Ltda., na qualidade de prestadora de serviços públicos de transporte coletivo municipal, insurge-se contra a sistemática tarifária em vigor, ao argumento de que os serviços de transporte urbano e rural são diferenciados em função de que a execução deste último demanda percursos mais extensos, com menor fator de ocupação - menos usuários - e, via de conseqüência, acarreta maiores custos, a exigir uma tarifa também diferenciada - a maior -, sob pena de desequilíbrio econômico-financeiro do contrato. Nesse aspecto, por meio do Decreto n.º 332/97, o Poder Público Municipal teria fixado tarifa diferenciada para efeito do transpor,te rural de que ora se cogita, mas não teria concedido reajustes periódicos, como o fez em relação ao transporte coletivo urbano, o que lhe teria acarretado prejuízo. Após apresentar os demais argumentos lançados pela agravada, reportou-se às preliminares articuladas nos autos de Ação de Indenização, quais sejam: a) - suspensão do processo (CPC, art. 265, inc. IV, alínea a); b) - intimação da outra empresa permissionária; c) - ilegitimidade para figurar no pólo passivo da demanda. Argumentou, insurgindo-se contra a decisão proferida em saneador, que a Companhia Municipal de Trânsito e Urbanização - CMTU - detém legitimidade para figurar no pólo passivo da demanda, uma vez que responsável pelo planejamento operacional do sistema de transporte coletivo de passageiros na Cidade de Londrina. Afirmou que a CMTU está incumbida da elaboração das planilhas para fixação da tarifa, nos termos do inc. X do art. 25, da Lei Municipal n.º 5.496/93, e que a mera ausência de assinatura de seu representante legal no contrato de permissão firmado, não implica sua ilegitimidade passiva, haja vista que é ela que presta assessoria ao Prefeito quando do reajuste de tarifas e é ela quem determina a criação de linhas, o aumento da frota e a majoração da freqüência dos ônibus, tudo a evidenciar a conexão subjetiva entre a CMTU e o Município. Verberou que não procede a decisão objurgada quando enuncia que não se cogita a suspensão do processo em função da ação popular em curso, em que se discute a possibilidade legal da cobrança pela CMTU da taxa de gerenciamento, pois o objeto da referida ação não está relacionado ou contido no pedido da presente ação. Tergiversou que a aludida taxa tem repercussão nesta ação e, assim sendo, revela-se processualmente necessária a suspensão do processo até a resolução da pendência deduzida naqueles autos de ação popular, tratando-se de matéria prejudicial (CPC, art. 265, inc. IV, alínea a). Argumentou que a outra permissionária - Transportes Coletivos Grande Londrina Ltda. - há de integrar a lide, no pólo passivo da ação, à medida em que a causa propende a afetar direito subjetivo que lhe é afeto. Disse, ao final, que não detém legitimidade para figurar no pólo passivo da ação, pois eventual condenação advinda de erro em planilhas de custos do sistema deve ser imputada à CMTU, a qual conta com administração descentralizada, personalidade jurídica de direito privado, autonomia financeira e administrativa, configurando-se entidade plenamente responsável pelos atos que pratica. Afirmou que sua ilegitimidade decorre, ainda, do contrato de permissão pois, considerando que a pretensão da agravada nasce do fato de que não estariam sendo estabelecidos ou obedecidos mecanismos para compensação dos recursos auferidos, na proporção dos passageiros transportados pelas permissionárias, em função da integração (Decreto n.º 307/97, Anexo I, art. 6.º, §2.º), e considerando que tal obrigação é encargo das permissionárias, não há razão para ser penalizado. Por derradeiro, pugnou pela concessão de efeito suspensivo e, ao final, pelo provimento do recurso, para o fim de reformar a decisão ora hostilizada, seja para declarar a legitimidade passiva da CMTU e sua ilegitimidade passiva, seja para determinar a intimação da outra empresa permissionária para manifestação quanto a eventual interesse na lide, suspendendo-se, após, o trâmite processual em função da ação popular em curso, por tratar-se de questão prejudicial externa. Juntou documentos (fls. 23/446-TJ). Através do despacho de fls. 452/457 foi deferido o pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso. A agravada, Francovig & Cia Ltda apresentou as contra-razões e documentos de fls. 464/485. O MM Juiz de Direito informou acerca da manutenção da decisão recorrida, bem como sobre o cumprimento pelo agravante do disposto no artigo 526 do CPC (fls. 488). A Companhia Municipal de Trânsito e Urbanização apresentou manifestação sobre os termos do presente agravo (fls. 502/515), conforme determinado no despacho de fls. 499. A douta Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se pelo conhecimento e provimento parcial do agravo, para o fim de se reconhecer a legitimidade da CMTU-LD para figurar no pólo passivo do feito, mantendo-se, no mais, a decisão objurgada. É o relatório.
I Inicialmente, no que tange à alegada legitimidade da Companhia Municipal de Trânsito e Urbanização S/A CMTU razão assiste à agravada. Da análise dos documentos colacionados aos autos, mormente da Lei Municipal nº 5.496/93, extrai-se que à CMTU (antiga COMURB) foi atribuída a função de gerenciar os serviços de transporte coletivo do Município de Londrina delegados às empresas permissionárias do serviço, competindo, dentre outros, elaborar a planilha de custos para possibilitar a fixação da tarifa pelo Prefeito, na forma dos artigos 25, inciso X e XI e artigo 27 de referida lei, in verbis: Art. 25. Compete à gerenciadora COMURB S.A.: (...) X fixar os parâmetros e índices da planilha de custo; XI elaborar cálculos tarifários e fiscalizar a sua aplicação; (...) Art. 27. O Prefeito fixará a tarifa com base na planilha de custos do sistema proposta pela COMURB S.A. Do anexo I do decreto de permissão que concedeu à agravada a exploração do serviço de transporte coletivo (fls. 69/71-TJ), artigos 7º e 8º, reiterados no anexo I do decreto nº 307/97, restou confirmada a atribuição conferida à CMTU e ao Prefeito Municipal, conforme se observa da transcrição abaixo: Art. 7º - A tarifa cobrada dos usuários dos serviços será fixada pela COMURB/SA, mediante Ato Executivo. Art. 8º - O Poder Executivo fixará a tarifa com base na planilha de custos do sistema, proposta pela COMURB S.A. Amparada em tais preceitos, a CMTU-LD passou a interferir no contrato de permissão firmado entre agravante e agravada, passando a determinar, inclusive, o valor das tarifas a serem cobradas (fls. 127/130, 135/136 e 481/483 TJ), e que, conforme alegações da agravada, estavam em desacordo com os valores estipulados no Decreto 332/97. Daí se extrai que, ainda que não tenha celebrado diretamente o contrato de permissão, certo é que referida empresa interferiu no equilíbrio econômico-financeiro da agravada, mostrando-se, prima facie, precipitada a sua exclusão da lide sem que seja apurada a sua real responsabilidade no feito, o que somente poderá ser analisado após a devida instrução probatória. Não se pode olvidar, ainda, que as razões argüidas pela CMTU-LD administração da receita do sistema de transporte coletivo local realizada pelas próprias permissionárias e que justificaria a sua exclusão da lide, demanda a análise do próprio mérito da questão, não podendo ser aventada em sede de preliminar. Note-se que nada obsta, ad argumentandum tantum, que após a instrução venha a se concluir pela ausência de culpabilidade da CMTU no alegado prejuízo suportado pela empresa agravada, excluindo-a do feito ou minorando a sua responsabilização por ocasião da sentença. Assim, à luz da farta documentação demonstrando a sua interferência na fixação das tarifas, inexistem razões para se pretender a sua exclusão do pólo passivo ao argumento de que não teria participado do contrato de permissão, motivo pelo qual não subsiste a decisão objurgada sob esse aspecto.
II Da mesma forma, patente a legitimidade do Município de Londrina para figurar no pólo passivo da ação de indenização promovida pela empresa agravada, que advém, ab initio, da própria competência que lhe foi atribuída pela Carta Magna, art. 30, inciso V, in verbis: Art. 30. Compete aos Municípios: (...) V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial; Pelo dispositivo constitucional acima citado o Município, como responsável pelo transporte coletivo, poderia explorá-lo de forma direta, tendo optado, contudo, pela delegação do serviço mediante permissão à agravada. Assim, na qualidade de poder permitente, tornou-se responsável direto pela modificação e fixação das tarifas, assim como das demais cláusulas contratuais e, portanto, responsável pela manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato firmado com a agravada, a quem incumbe, tão-somente, executá-lo nas condições que lhe são impostas. Não há como afastar, portanto, a eventual responsabilidade do Município pelo descumprimento contratual advindo de conduta sua ou do ente por ele criado, cuja competência, diga-se, se restringe ao gerenciamento do transporte coletivo. Assim sendo, inexiste qualquer amparo à pretensão do agravante em ver-se excluído do pólo passivo da demanda, conforme bem determinado pelo despacho agravado.
III Ainda, em relação à necessidade de inclusão da permissionária Transportes Coletivos Grande Londrina Ltda no pólo passivo do feito, ao argumento de que não estariam sendo obedecidos os mecanismos de compensação dos recursos auferidos entre as empresas, afetando direito subjetivo que lhe é afeto, nenhuma razão assiste ao agravante. É que o objeto da demanda visa, tão-somente, a constatação dos eventuais prejuízos decorrentes do descumprimento pelas rés das disposições contidas no Decreto 332/97, em relação ao trecho operado pela agravada, não englobando qualquer ato que possa ser atribuído à TCGLL, ou seja, da pretensão buscada em Juízo não decorre nenhuma responsabilidade para a outra permissionária, já que não se está a discutir qualquer ato por ela praticado. Muito embora a agravante insista no fato de que o mérito da demanda envolve a questão da criação da câmara de compensação, o que se busca no presente feito é apurar se houve ou não o alegado desequilíbrio contratual e se este foi causado pelas rés. Tal questão não envolve interesses da outra permissionária, que, a priori, não foi atingida pelo alegado desequilíbrio econômico-financeiro, não vindo a ser atingida, da mesma forma, pela sentença que vier a ser prolatada nos autos de indenização. Se houve qualquer inadimplência das permissionárias, concluir-se-á pela improcedência do feito, o que, por uma via ou outra, não acarreta qualquer responsabilidade, na ação em questão, para a outra empresa permissionária. E, caso reste configurado que o desequilíbrio foi gerado pela errônea compensação, cabe à agravada pleitear junto à outra permissionária e em procedimento próprio o ajuste dos valores devidos. Inexistindo qualquer ofensa a direito afeto à empresa Transportes Coletivos Grande Londrina Ltda, não se mostra coerente a pretensão de incluí-la no pólo passivo do feito.
IV Por fim, no que tange à necessidade de suspensão do feito até que se discuta a legalidade da cobrança da taxa de gerenciamento, não prosperam as alegações da agravante. É que, muito embora a agravada tenha discorrido acerca da ilegal cobrança da taxa, tais argumentos somente foram utilizados para reforçar a idéia de que os reajustes não teriam ocorrido na forma devida, comprovando o alegado desequilíbrio econômico-financeiro. Tanto é que o pedido formulado na petição inicial, e que está a delinear os limites do julgamento pelo magistrado, restringiu-se ao pagamento dos valores devidos entre março de 1999 e junho de 2001, decorrentes da ausência de reajuste, excluída a percentagem da taxa de gerenciamento, já que tais valores não lhe são devidos. Em momento algum está a se pleitear pelo reconhecimento da ilegalidade da cobrança de referido percentual pela CMTU, o que eventualmente justificaria o pleito do agravante, inexistindo, portanto, nenhuma questão prejudicial a justificar a suspensão do processo. A propósito: DIREITO PROCESSUAL CIVIL - SUSPENSÃO DO PROCESSO - QUESTÃO PREJUDICIAL EXTERNA (ARTIGO 265, IV, "A", CPC) - INEXISTÊNCIA - DISCUSSÃO, EM OUTRO PROCESSO, QUE NÃO INFLUI NO JULGAMENTO FINAL DA LIDE PRINCIPAL - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. A questão prejudicial externa capaz de suspender o andamento do processo, nos termos do que dispõe o artigo 265, inciso IV, alínea "a", do Código de Processo Civil, é aquela que, efetiva e decisivamente, influi no julgamento da demanda. Inexistindo tal relação de subordinação, como na hipótese vertente, impõe-se o regular prosseguimento do feito, até final decisão de mérito. (TJPR, AI nº 161085-7, 6ª Câmara Cível, Rel. Milani de Moura, DJ 01.11.2004). Como bem lançado pelo parecer do ilustre Procurador de Justiça (fls. 528), caso a decisão a ser proferida nos autos de ação popular venha a reconhecer a legalidade da cobrança da taxa de gerenciamento, a questão pode ser resolvida em sede de execução, não obstando, contudo, o prosseguimento da ação de indenização promovida pela agravada. Ex positis, voto pelo conhecimento e provimento parcial do recurso, reformando o despacho objurgado para, tão-somente, determinar a inclusão da Companhia Municipal de Transporte e Urbanização CMTU-LD no pólo passivo da demanda.
ACORDAM os Desembargadores integrantes da Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em dar provimento parcial ao recurso. Participaram do julgamento, votando com o Relator, os Desembargadores Antonio Lopes de Noronha, Presidente e Prestes Mattar. Curitiba, 23 de fevereiro de 2005.
DES. BONEJOS DEMCHUK - Relator.
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