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Acórdão
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 337443-8, DA 4ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA
Apelante : FRUT´SUL COMERCIAL DE PRODUTOS ALIMENTARES LTDA.
Apelado : INSTITUTO DE DESENVOLVIMENTO DO PARANÁ - FUNDEPAR
Relator : Des. LEONEL CUNHA
EMENTA
1) ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO PARA COMPRA DE SUCO CONCENTRADO DE FRUTA OU PREPARADO LÍQUIDO PARA REFRESCO SABOR ABACAXI DE MERENDA ESCOLAR. LEGALIDADE DA EXIGÊNCIA DE PH ENTRE 3,5 E 4. NÃO IMPUGNAÇÃO DO EDITAL. ACEITAÇÃO DE SUAS EXIGÊNCIAS. RESCISÃO CONTRATUAL POR NÃO CUMPRI-LAS. PAGAMENTO DAS DESPESAS DECORRENTES.
a) A Administração Pública tem discricionariedade quanto ao objeto licitatório, podendo especificar características do produto desde que compatíveis com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. b) As exigências que o licitante considere ilegais devem ser impugnadas quando o Edital for publicado, sob pena de preclusão deste direito, com a conseqüente aceitação tácita das condições editalícias. c) O Princípio da Vinculação ao Edital exige que a Administração Pública rescinda o contrato administrativo, após o devido processo legal, se empresa licitante que venceu o certame faz a entrega de produto diverso daquele constante das exigências editalícias. d) Nessas condições, é legal a rescisão de contrato administrativo celebrado com a FRUT'SUL COMERCIAL DE PRODUTOS ALIMENTARES LTDA., porque não entregou o produto licitado de acordo com uma exigência do Edital (PH entre 3,5 e 4), a qual aceitou tacitamente. Por conseqüência, merece ressarcida a FUNDEPAR pelas despesas decorrentes do armazenamento do produto. 2) APELO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
RELATÓRIO 1) O INSTITUTO DE DESENVOLVIMENTO DO PARANÁ (FUNDEPAR) ajuizou Ação Ordinária de Rescisão Judicial de Contrato, com Pedido de Tutela Antecipada, contra a FRUT´SUL COMERCIAL DE PRODUTOS ALIMENTARES LTDA. Aduz que celebrou com a Ré o Contrato de Fornecimento nº 2276/96-AT, no dia 02 de janeiro de 1997, seguido pelo Termo Aditivo nº 013/97-AT, após licitação em que a Ré foi a única concorrente; que referido Contrato e Termo Aditivo visavam o fornecimento de suco de fruta concentrado sabor abacaxi ou uva, conforme as especificações do Anexo I do ato convocatório; neste ficou estabelecido que o controle de qualidade seria feito após a contratação; referidas disposições não foram objeto de impugnação. Entretanto, após a análise do padrão de qualidade, foi constatado, pelo Centro de Pesquisa e Processamento/UFPR - CEPPA, que o produto não atendia às exigências do Edital, e, por isso, foi rejeitado, tanto em seu aspecto visual como também na análise físico-química (pH abaixo do limite estabelecido); assim, foi oportunizado à Ré, consoante disposto no parágrafo primeiro da Cláusula Oitava do contrato, que poderia requerer a nova análise do produto ou substituí-lo; contudo, se restringiu a protocolar correspondências para argüir a desnecessidade do padrão de qualidade do Potencial de Hidrogênio (PH) e, ainda, "suscitou a tese de que o produto que ela havia efetivamente cotado era preparado líquido para refresco - sabor abacaxi e não suco concentrado, como era a exigência contida no ato convocatório em foco" (f. 06). Diante disto, o Autor alega que requereu ao laboratório LARVE/SUL, nova análise do produto, onde se concluiu que não era nem "preparado líquido para refresco sabor abacaxi" nem "suco concentrado adoçado de abacaxi". Assim, o Autor alega que rescindiu unilateralmente o contrato e pediu a antecipação da tutela a fim de que a Ré seja compelida a retirar os produtos do depósito e, ao final, a condenação ao pagamento das despesas de armazenamento. Afirma que a Ré: a) não cumpriu as suas obrigações contratuais e especificações editalícias (art. 41, § 2º, da Lei 8.666/93); b) a nomenclatura equivocada do produto no Anexo I do Edital não justifica o erro, uma vez que poderia identificar o produto correto através das exigências dos elementos constantes do Controle de Qualidade, constante no Anexo V; c) a própria requerida se confunde com o seu produto, pois em um primeiro momento diz que é preparado líquido para refresco sabor abacaxi e, após, que é suco concentrado e adoçado; d) se tivesse dúvida quanto à descrição do produto, deveria impugnar o Edital; e) esgotada a fase recursal, somente restou a alternativa de rescisão administrativa dos contratos (arts. 78, I e art, 79, I, da Lei 8.666/93); f) a falta do produto causou prejuízo aos alunos dos estabelecimentos de ensino público (cf. fls. 02/19). 2) A tutela antecipada foi concedida. Determinou que "a ré, no prazo improrrogável de sete dias deve promover a retirada dos 36.000 litros de suco, sob pena de arcar com a multa de R$ 1.000,00, por dia de atraso" (cf. f. 152). 3) Em sua contestação, a FRUT'SUL COMERCIAL DE PRODUTOS ALIMENTARES LTDA disse que: a) o Autor não tem interesse de agir para pleitear a rescisão de contrato administrativo, uma vez que se trata de prerrogativa inerente à Administração Pública, não sendo necessário, portanto, invocar a tutela jurisdicional; b) "além de nominar erroneamente o produto, o Edital exigiu que um preparado líquido para refresco apresentasse especificações não exigidas em Lei, incorrendo em vício de ilegalidade" (f. 174), uma vez que a questão do PH é irrelevante; c) a alegação de que os eventuais vícios do Edital deveriam ser impugnados antecipadamente não merece prosperar, uma vez que "a vontade do particular não é o meio hábil de convalidar vícios dos atos administrativos, com a maxima venia" (f. 173); "não se admite duas vontades: uma indicada no Edital e outra velada, mascarada em descrições equivocadas de produtos, em erros materiais supostamente 'sanáveis'" (f. 174); d) esta divergência de produtos entre o Edital (que previa o fornecimento de Suco Concentrado de Polpa de Fruta) e o Anexo (que descrevia Preparado Líquido para Refresco) provocou dissenso entre a solicitação feita pela FUNDEPAR e o produto descrito pelo Laudo da CEPPA; este concluiu que o produto não era o descrito no Anexo, ou seja, a FUNDEPAR requereu a CEPPA a análise do produto para verificar se tratava de Suco Concentrado de Polpa de Fruta, e essa concluiu que não era, pois efetivamente não foi o produto fornecido pela Ré, porque se baseou no Edital; e) é impertinente a exigência de pH para preparado líquido para refresco sabor abacaxi; f) os Senhores Luiz Fernando Ribeiro Peixoto e Mário de Oliveira Branco Filho não têm qualificação técnica; g) a Portaria 371/74 do Ministério da Agricultura não faz referência a pH para o produto em questão; h) a análise técnica do produto deveria ser realizada após a entrega da primeira leva; se fosse constatada a regularidade desta, seria feita nova aquisição, através de termo aditivo; i) não há que se falar em taxa de despesa ou armazenamento dos produtos entregues, uma vez que o Autor não respeitou o prazo de até quinze (15) dias úteis para emissão do laudo de análise dos produtos entregues; j) o procedimento administrativo que culminou com a rescisão do contrato é nulo porque não assegurou ao Réu o contraditório e a ampla defesa; k) as amostras encaminhadas pela Ré ao laboratório do Ministério da Agricultura são as que foram retiradas do depósito da CODAPAR, conforme consta nas fls. 160/162; l) não adulterou a embalagem encaminhada para amostra; fez apenas "acréscimo, no rótulo litografado na embalagem plástica do produto, de etiqueta emitida com autorização do próprio Ministério da Agricultura indicando a diluição de 1 (uma) parte de suco para 6 (seis) partes de água, utilizada pelo próprio Ministério para efeito de análise laboratorial" (f. 186); m) o Autor deve ser condenado por litigância de má-fé se continuar embasando suas teses em documentos de legalidade duvidosa; n) a Ré não pode ser responsabilizada pelos prejuízos decorrentes da inadequada armazenagem dos produtos; o) as notas fiscais dos produtos foram emitidas de acordo com a descrição do Edital (suco de fruta); p) o Ministério da Agricultura, ao aprovar o rótulo do produto, autorizou chamá-lo de natural e não impôs a nomenclatura oficial (cf. fls. 170/191). 4) A FRUT'SUL COMERCIAL DE PRODUTOS ALIMENTARES LTDA apresentou reconvenção. Diz, repetindo as mesmas razões da contestação, que o produto entregue atendia perfeitamente às exigências legais e se prestava ao consumo. Alega, ainda, que "teve de retirar o produto do depósito da CODAPAR e inutilizá-lo. Sofreu todo o prejuízo decorrente da fabricação e não comercialização do preparado líquido demandado pelo Autor-Reconvindo. Isso porque o Reconvindo não reconheceu, enquanto havia oportunidade para isso, que houve falha no processamento da licitação e que caberia a anulação dos atos que se seguiram" (f. 212). Assim, afirma que tem o direito à indenização por todos os prejuízos decorrentes da indevida rescisão contratual, além de indenização por danos morais, no valor do contrato originário, "a fim de coibir o Autor-Reconvindo a agir com mais responsabilidade nas suas contratações, não expondo os particulares a situações constrangedoras como a ora relatada" (cf. fls. 208/215). 5) Na contestação à reconvenção, a FUNDEPAR alegou que: a) não há que se falar em indenização à Reconvinte, uma vez que o produto fornecido não era suco concentrado, nem preparado líquido para refresco, além de estar em desconformidade com os Decretos 73.267/73 e 2.314/97, pois não esclarece que se trata de produto aromatizado artificialmente; assim, a Ré não cumpriu as especificações do Edital e as legais, enquanto que o Autor agiu estritamente nos limites de seu dever de fiscalizar a avença administrativa, e no seu direito de consumidor de não aceitar produto que estava em desacordo com o padrão de qualidade exigido; b) "não há como desprezar a importância de ser verificado o exame de pH, que serve para constatar o índice de acidez ou alcalinidade de uma solução ou a sua neutralidade, ainda mais no caso vertente, por se tratar de produto com sabor ABACAXI" (...) "dependendo da qualidade da fruta, estado de maturação, estado de conservação, presença de aditivos intencionais ou acidentais o pH é alterado" (fls. 271/272); c) a Reconvinte infringiu as normas consumeristas (arts. 6º, III; 31 e 39, VIII); d) não houve demora na tramitação do processo administrativo; este observou os ditames do art. 109, da Lei 8.666/93; e) a Reconvinte foi omissa quando solicitada a retirar os produtos dos depósitos da CODAPAR; f) não há provas dos gastos com a mobilização e desmobilização da mercadoria; g) também não há provas dos danos morais, uma vez que o documento emitido pelo SERASA e os demais bloquetos bancários não são hábeis a comprovar de qual dívida foram originários; h) se for eventualmente devida alguma indenização, deve ser fixada de acordo com o prudente arbítrio do julgador, e não no valor pleiteado pela Reconvinte (cf. fls. 269/281). 6) Na audiência de conciliação (art. 331, do Código de Processo Civil), foi rejeitada a preliminar da Ré-reconvinte, porque "a forma usada pela FUNDEPAR para buscar a rescisão de contrato não se afigura inadequada, visto que pela atual ordem constitucional nenhuma lesão de direito pode ser afastada da apreciação do poder jurisdicional" (cf. f. 342). 7) A sentença julgou procedente o pedido do Autor e, conseqüentemente, improcedente o pedido da Reconvinte. Fundamentou-se em que: a) o fato do Edital equivocar-se na nomenclatura dada ao produto ("suco de fruta concentrado sabor abacaxi" ou "preparado líquido para refresco de abacaxi") não o torna inválido, pois deve ser verificado se o produto preenchia os requisitos e, se estes podiam ser exigidos; b) apesar de o Ministério da Agricultura não especificar PH no Regulamento Técnico para fixação dos padrões de qualidade, referido quesito "visou dar maior segurança ao produto fornecido, principalmente por se tratar de alimento destinado a merenda escolar e, frise-se, constou no edital de abertura da licitação" (f. 511); c) o Réu não contestou a exigência concernente ao PH, presumindo-se, assim, que a aceitou; d) "caso a exigência de limites na variação do PH do produto fosse expressamente proibida ou configurasse abuso discricionário da administração, este Juízo entenderia, por bem, declará-la nula, assim como todo certame licitatório" (f. 511); e) conforme se verifica pela contido nas fls. 60 e seguintes, foi oportunizado o contraditório e a ampla defesa ao Réu; f) não pode ser imputada ao Autor a demora no deslinde do feito, uma vez que agiu dentro das exigências necessárias, sem que excedesse os prazos legais; g) ocorre a rescisão contratual na esfera administrativa quando há eventos que impeçam ou tornem inconveniente o prosseguimento do ajuste; h) o produto fornecido não era suco concentrado nem preparado líquido para refresco; i) o produto fornecido não obedece os ditames dos Decretos 73.267/73 e 2.314/97, porque não informa ao consumidor que se trata de produto "aromatizado artificialmente"; i) não há indícios de que os demandantes agiram de má-fé. Por fim, condenou a Ré-reconvinte ao pagamento dos honorários advocatícios, que fixou em dez mil reais (R$ 10.000,00), e das custas processuais (cf. fls. 505/515). 8) O Réu interpôs recurso de Apelação. Aduz que: a) é desnecessária a exigência do pH, tanto que em Edital posterior ao ora questionado, também para a aquisição de merenda escolar, requereu-se "Preparado Líquido para Refresco", sem restrições quanto ao pH; b) o Apelante comprovou que forneceu preparado líquido para refresco (resposta ao quesito "b" do Apelado); c) no mais, repetiu os argumentos explicitados em sede de contestação e reconvenção (cf. fls. 526/537). 9) Em suas contra-razões, a FUNDEPAR alega que: a) "as assertivas da Sra. Perita põem uma pá de cal sobre a questão da menção equivocada da nomenclatura da bebida de fruta, uma vez que ficou evidenciado que a FUNDEPAR, consoante as explicitações técnicas do produto, queria adquirir 'preparado líquido para refresco - sabor abacaxi' e não suco de fruta concentrado - sabor abacaxi" (f. 546); b) as Portarias 332, de 06 de junho de 1998, e 544, de 16 de novembro de 1998, são posteriores à licitação, não sendo, portanto, aplicáveis ao caso; c) o Edital posterior ao que está em questão, invocado pelo Apelante, não guarda correlação com este, sendo impertinente a comparação, uma vez que "a situação fática vivenciada quando da elaboração do Edital de Concorrência nº 17/98-DES (fls. 288 e seguintes) em nada se assemelha àquela existente por ocasião do Edital de Concorrência nº 21/96 (fls. 25 e seguintes)" (cf. fls. 542/554). 10) A Procuradoria Geral de Justiça pediu a manutenção da sentença, porque: a) o produto entregue não respeitava o nível de pH exigido; b) a Apelante tinha pleno conhecimento das condições do Edital; c) em homenagem ao princípio da vinculação ao edital (art. 41, de Lei 8666/93), a Administração não tinha outra alternativa, devendo pleitear a rescisão contratual (cf. fls. 569/577). É o relatório.
FUNDAMENTAÇÃO
Cinge-se a controvérsia à possibilidade de Edital de licitação exigir que suco concentrado de polpa de fruta sabor abacaxi, ou preparado líquido para refresco do mesmo sabor, tenha Potencial de Hidrogênio (PH) na faixa de 3,5 a 4. Referida exigência, assim como as condições e qualidades do objeto licitado, constituem exercício de discricionariedade administrativa, ou seja, o Administrador tem juízo de oportunidade e conveniência para escolher as condições e qualidades do objeto a ser licitado, desde que respeite a razoabilidade e a proporcionalidade, e haja razão para as suas escolhas. "Ao produzir e divulgar o ato convocatório, a Administração exercita juízos de conveniência e oportunidade sobre o objeto a ser contratado, os requisitos de participação, os critérios de seleção do vencedor" (JUSTEN FILHO, Marçal. 11ª ed. São Paulo: Dialética, 2005, p. 47, sem destaques no original). No caso, para a aquisição de Suco Concentrado ou Preparado Líquido para refresco, a Administração exigiu que respeitasse limites referentes ao PH, o que, segundo o Apelante, é ilegal. O PH, como disse a perita judicial, "indica se uma solução aquosa é neutra (pH = 7), ácida (pH menor que 7) ou alcalina (pH maior que 7)" (f. 396). E, como afirmou o Apelado, "constata-se, sim, a cautela da FUNDEPAR em querer um alimento de qualidade e que fosse preservado até o efetivo consumo pela clientela escolar, considerando-se que sua entrega seria feita em todo território paranaense, nas mais variadas escolas estaduais, de molde que não há como ser desprezada a importância do pH em se tratando de preparado líquido para refresco - sabor abacaxi no atinente à acides do respectivo sabor". Após, explica a necessidade da exigência de limites de pH para o caso. Diz que "em alimentos ácidos, como o é o preparado líquido para refresco - sabor abacaxi, é importante ser determinado intervalos de pH de forma a garantir a aceitabilidade sensorial do produto, até porque há de ser considerado que a bebida de fruta deveria ser embalada em simples galão plástico virgem (f. 148) e sua conservação deveria estar garantida fora de refrigeração (fl. 35)" (f. 551, sem destaques no original). Há, portanto, relevantes motivos para que o Apelado tenha exigido que o pH do produto fosse entre 3,5 e 4. É que a embalagem o exigia (simples galão plástico virgem), e certamente não havia condições para conservar o produto em local refrigerado. Não há, portanto, que se falar em ilegalidade nas exigências do produto, sendo irrelevante as demais alegações do Apelante, uma vez que o simples fato de não ter entregue produto de acordo com as exigências do Edital já é motivo para a rescisão contratual, com o conseqüente pagamento das despesas que foram despendidas para a sua armazenagem. Conforme explicitou o Laudo Pericial, "segundo laudos de análise nº 61/97, fls. 54, e nº 110/97, fls. 57 o pH é inferior ao especificado no Anexo V, fls. 59, portanto não atende aos termos exigidos no Anexo V do Edital de Concorrência nº 21/96 - DES" (f. 395). H Hhhhh Assim, tendo em vista o princípio da vinculação ao Edital, somente restaria ao Apelado pleitear a rescisão do contrato, uma vez que o produto fornecido pelo Apelante não atendeu às especificações editalícias. Cumpre citar o art. 41, § 2º, da Lei 8.666/93: "Art. 41. A Administração não pode descumprir as normas e condições do edital, ao qual se acha estritamente vinculada". Assim, "o licitante vencedor, tal qual o Poder Público, deve cumprir as normas e condições previstas no edital - no caso, ratificadas na escritura de compra e venda -, em razão do princípio da vinculação ao instrumento convocatório (Lei 8.666/93, arts. 3º e 41), sob pena de responderem pelas conseqüências de sua inexecução total ou parcial (Lei 8.666/93, arts. 66 e 77)" (STJ, REsp 540.811/DF, T1, Rel. Min. DENISE ARRUDA, DJ 13.3.2006, p. 190, sem destaques no original). Independentemente de o Edital ser dúbio quanto ao produto requerido (Suco Concentrado ou Preparado Líquido para refresco), faz-se imperiosa a rescisão contratual, pois não foi esta a questão que a ocasionou, mas sim o não cumprimento do requisito referente ao pH do produto. Não merece guarida a alegação de que a exigência é desnecessária porque o fator pH não é considerado pelo Ministério da Agricultura, através das Portarias nº 371, de 13 de julho de 1998, e 544, de 16 de novembro de 1998, para averiguar a qualidade dos produtos. Cumpre frisar que referidas Portarias têm o objetivo comum de "Fixar a identidade e as características mínimas de qualidade a que deverá obedecer o Preparado Líquido para Refresco ou Refrigerante" (fls. 401 e 406, sem destaques no original). E, como exposto pelo Apelado, o produto requerido necessitava de condições especiais, por estar sujeito a condições diferenciadas de estocagem e armazenamento, em função de ser consumido pelas Escolas Públicas. O Apelante diz, ainda, que o Edital 17/98 (fls. 228/335), posterior ao ora questionado e também destinado à aquisição de Merenda Escolar, incluindo Preparado Líquido para Refresco, não faz qualquer exigência de pH. Assim, conclui, que esta exigência é dispensável. Entretanto, o Apelante está querendo exercer discricionariedade administrativa, que é privativa da Administração. Se esta julgou que nesse novo Edital não é necessária qualquer exigência de pH, não cabe ao Judiciário substituir o Administrador para concluir que no Edital impugnado também não é necessário. Ademais, como explicitado no parecer Ministerial, "uma vez constatada na espécie a desconformidade do objeto contratado com as respectivas normas editalícias, que eram de prévio conhecimento da apelante e não foram de qualquer forma impugnadas, afirma-se a autoridade e a correção jurídica da increpada decisão" (f. 576, sem destaques no original). Assim, se entendesse impertinente a exigência de índices de PH, o Apelante deveria impugná-los antes da contratação. Diz o art. 41, § 2º, da Lei 8.666/93: "Decairá do direito de impugnar os termos do edital de licitação perante a Administração o licitante que não o fizer até o segundo dia útil que anteceder a abertura dos envelopes de habilitação em concorrência, a abertura dos envelopes com as propostas em convite, tomada de preços ou concurso, ou a realização de leilão, as falhas ou irregularidades que viciariam esse edital, hipótese em que tal comunicação não terá efeito de recurso". "Como regra, a renúncia a direito apenas pode ser produzida quando o silêncio for qualificado ou acompanhado de alguma outra forma de manifestação inequívoca de vontade. Isso permite afirmar que o sujeito que participa de uma licitação, submetendo-se a todas as exigências contempladas no ato convocatório, atua tal como se não tivesse ressalva ou divergência em vista das cláusulas editalícias. Ou seja, a questão não reside na pura e simples omissão de impugnar as condições do edital, mas na participação no certame, sem ressalvas. Somam-se duas condutas distintas: ausência de impugnação (ação omissiva) e participação no certame (atuação ativa), permitindo-se extrair-se a inferências de que o sujeito manifestara sua concordância com as condições estabelecidas e a renúncia a discordâncias" (JUSTEN FILHO, Marçal. 11ª ed. São Paulo: Dialética, 2005, p. 405, sem destaques no original). Faz-se mister citar precedente do Superior Tribunal de Justiça: "A impetrante, outrossim, não impugnou as exigências do edital e acatou, sem qualquer protesto, a habilitação de todas as concorrentes. Impossível, pelo efeito da preclusão, insurgir-se após o julgamento das propostas, contra as regras da licitação" (STJ, REsp 402.711/SP, Rel. Min. JOSÉ DELGADO, j. 11.6.2002, sem destaques no original). Por fim, não há falar que o Apelante não é obrigado a arcar com qualquer despesa pelo armazenamento dos produtos, porque esta decorreu da demora da Administração em julgar o pedido administrativo, uma vez que, quem deu causa à instauração do procedimento administrativo foi a própria Apelante que, se tivesse fornecido produto de acordo com as disposições do Edital, tornado desnecessário o referido procedimento. E, como disse a sentença, "não é possível, sob outro aspecto, imputar ao autor a demora no deslinde da questão. Após a aprovação do produto, travou-se longa discussão acerca da necessidade da exigência de limitação de PH no suco fornecido, o que não pode ser atribuído ao requerente, pois estava este agindo dentro das exigências e prerrogativas que lhe eram esperadas, visando a segurança dos consumidores do alimento (crianças em idade escolar), apoiado em laudos técnicos que corroboravam as decisões tomadas. Entre a entrega da mercadoria e a primeira análise não se verifica excesso ilegal de prazos, haja vista que as notas fiscais datam de 20/01/1997 (fl. 50) e 03/02/1997 (fl. 51) e os laudos n.ºs 61/97 e 110/97 datam de 22/01/1997 e 03/02/1997, respectivamente" (fls. 512/513, sem destaques no original). ANTE O EXPOSTO, voto por que seja negado provimento ao Apelo. DECISÃO ACORDAM os Desembargadores integrantes da Quinta Câmara Cível deste TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ, por unanimidade de votos, em negar provimento ao Apelo. Participaram do julgamento os Desembargadores ROSENE ARÃO DE CRISTO PEREIRA, Presidente sem voto, LUIZ MATEUS DE LIMA e JOSÉ MARCOS DE MOURA. CURITIBA, 20 de março de 2007. Desembargador LEONEL CUNHA Relator
17 Apelação Cível nº 337443-8
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