SELEÇÃO DE DECISÕES

 Selecionar Todos     Imprimir  Imprimir Selecionados

82ms
DOCUMENTO 1
 
Integra Integra do Acórdão Carregar documento  Imprimir/salvar (selecionar)
Processo:
429073-3
(Decisão monocrática)
Segredo de Justiça: Não
Relator(a): José Sebastião Fagundes Cunha
Desembargador
Órgão Julgador: 8ª Câmara Cível
Comarca: Londrina
Data do Julgamento: Thu Aug 23 16:58:00 BRT 2007
Fonte/Data da Publicação: DJ: 7439 Wed Aug 29 00:00:00 BRT 2007

Decisão Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Decisão monocrática. Eventuais imagens serão suprimidas.

APELAÇÃO CÍVEL Nº429.073-3 DA 6ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE LONDRINA
APELANTE: COMPANHIA MUNICIPAL DE TRÂNSITO E URBANIZAÇÃO - CMTU- LD
APELADO: MAZILDA APARECIDA BENEDITO
RELATOR: J. S. FAGUNDES CUNHA
APELAÇÃO CÍVEL. OMISSÃO DO PODER PÚBLICO NA CONSERVAÇÃO DE VIAS PÚBLICA. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. FALTA DO SERVIÇO. DANOS MATERIAIS. CULPA CONCORRENTE. INDENIZAÇÃO DEVIDA. REDUÇÃO.
1. Em se tratando de ato omissivo, embora esteja a doutrina dividida entre as correntes dos adeptos da responsabilidade objetiva e aqueles que adotam responsabilidade subjetiva, prevalece, na jurisprudência, a teoria subjetiva.
2. Constatado o fato danoso, o nexo de causalidade, a negligência dos agentes públicos e os danos materiais suportados pela apelada, incumbe ao Estado o dever de indenizar.
3. A culpa neste caso é concorrente, eis que ambas as partes (apelante e apelada) contribuíram para o fato danoso.
4. Aplicando-se a culpa concorrente o valor indenizatório deve ser minorado.
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
Vistos e relatados estes autos de apelação cível sob o nº 429.073-3, da 6ª Vara Cível da Comarca de Londrina, em que é apelante COMPANHIA MUNICIPAL DE TRÂNSITO - CMTU-LD e apelada MAZILDA APARECIDA BENEDITO.
01. RELATÓRIO
Trata-se de pedido de indenização ajuizado por Mazilda Aparecida Benedito em face da Companhia Municipal de Trânsito e Urbanização - CMTU-LD consubstanciado na precariedade da sinalização, eis que, segundo alega, devido à insuficiente sinalização, a apelada invadiu a preferencial colidindo com veiculo de terceiro, pois a sinalização horizontal encontrava-se parcialmente apagada e em decorrência da chuva ficou invisível. A placa "PARE", por sua vez, estava inteiramente encoberta por galhos de uma árvore vizinha.
Contestado e instruído o feito, adveio a decisão de fls. 87-89, por meio da qual o juízo singular julgou procedente o pedido formulado pela autora, condenando a Companhia Municipal de Trânsito e Urbanização ao pagamento da quantia de R$ 1.944.74 (mil novecentos e quarenta e quatro reais e setenta e quatro centavos), corrigidos pelos índices da contadoria desde a data do fato (29/04/2005) e juros de mora de 1% ao mês desde a citação, bem como ao reembolso de todas as despesas que a autora terá, junto à companhia seguradora pelo ressarcimento dos danos decorrentes do acidente referente ao veículo de Eduardo Fassina, condicionados à comprovação nos autos em sede de futura liquidação.
Inconformada com o teor do decisum, Companhia Municipal de Trânsito e Urbanização interpôs apelação cível de fls. 94-103, alegando, em síntese: a) a responsabilidade da Administração pública é subjetiva, dependendo assim, de comprovação da culpa; b) a culpa é exclusivamente da apelada; c) caso assim não se entenda, houve culpa concorrente, no caso. Requer assim, a redução do valor da indenização em 50% (cinqüenta por cento).
Contra-razões apresentadas às fls. 109.
É o relatório
02. FUNDAMENTAÇÃO
02.01 Do exame de Admissibilidade
Presentes os pressupostos de admissibilidade, tanto intrínsecos (legitimidade, interesse, cabimento e inexistência de fato impeditivo e extintivo) como extrínsecos (tempestividade, preparo e regularidade formal), deve o recurso ser conhecido. Assim, passo à análise do mérito.
02.02. Do mérito do recurso
Sustenta o recorrente que a responsabilidade, no caso, é subjetiva; que o acidente ocorreu por culpa exclusiva da vítima, que não tomou as devidas cautelas ao invadir a preferencial; e que é inexistente o nexo causal entre o fato ocorrido e o dano que a autora quer reparado, porquanto, precisaria ficar definido se a omissão no caso constituiu, ou não, o fato gerador da responsabilidade civil do Estado.
O Juízo singular concluiu pela responsabilização do Município pela indenização reclamada nestes autos, aplicando o § 6º, do art. 37, da CF ao caso, tendo em vista que ao Poder público compete à manutenção e conservação das sinalizações em vias públicas, e assim sendo, inegável que no local do sinistro, o serviço era precário, restando caracterizada a omissão da Administração Pública.
Insta ressaltar, nesse contexto, que o dano alegado não decorreu de atuação positiva do poder público na consecução das atividades que lhes são próprias. A imputação de responsabilidade, ao contrário, está baseada na ausência de atuação do ente estatal, ou seja, na falta de manutenção das sinalizações na via pública.
Sobre o tema, é de se ressaltar:
"Art. 3º: 8ª. Responsabilidade objetiva do Estado.
(...)
A responsabilidade civil que imputa ao Estado por ato danoso de seus prepostos é objetiva (art.37, § 6º, CF), impondo-lhe o dever de indenizar se verificar ao patrimônio de outrem e nexo causal entre o dano e o comportamento do preposto. Somente se afasta a responsabilidade objetiva se o evento danoso resultar de caso fortuito ou força maior ou decorrer de culpa da vítima. Em se tratando de ato omissivo, embora esteja a doutrina dividida entre as concorrentes dos adeptos da responsabilidade objetiva e aqueles que adotam responsabilidade subjetiva, prevalece na jurisprudência a teoria subjetiva do ato omissivo, de modo a só ser possível indenização quando houver culpa do preposto"(STJ-2ª T., REsp. 602.102, rel. Min. Elliana Calmon, J. 6.4.04, deram provimento, um voto vencido, DJU 21.2.05, p. 146)".1 (grifo nosso).
Veja-se ainda:
"Em face dos princípios publicísticos não é necessária a identificação de uma culpa individual para deflagrar-se a responsabilidade do Estado. Esta noção civilista é ultrapassada pela idéia denominada de faute du service entre os franceses. Ocorre a culpa do serviço ou "falta de serviço"quando este não funciona ou funciona atrasado. Esta é a tríplice modalidade pela qual se apresenta e nela se traduz um elo entre a responsabilidade tradicional do Direito Civil e a responsabilidade objetiva.
(...)
Em suma: a ausência do serviço devido ao seu defeituoso funcionamento, inclusive por demora, basta para configurar a responsabilidade do Estado pelos danos daí decorrentes em agravo dos administradores". 2
Assim, não obstante assente que a Constituição Federal, no § 6º, do art. 37, tenha adotado a teoria da responsabilidade objetiva do Estado, pela qual a Administração responde com base no conceito de nexo de causalidade, que consiste na relação de causa e efeito entre a conduta do Estado e as conseqüências prejudiciais dela resultantes, não podemos deixar de destacar que, alegando o apelado que o dano decorreu da omissão estatal, melhor a incidência da teoria da responsabilidade subjetiva, exigindo-se a prova da culpa da Administração, no sentido de que havia um dever de agir e não agiu ou agiu mal.
Como leciona CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO:
"Há responsabilidade objetiva quando basta para caracterizá-la a simples relação causal entre um acontecimento e o efeito que produz. Há responsabilidade subjetiva quando para caracterizá-la é necessário que a conduta geradora de dano revele deliberação na prática do comportamento proibido ou desatendimento indesejado dos padrões de empenho, atenção ou habilidade normais (culpa) legalmente exigíveis, de tal sorte que o direito em uma ou outra hipótese resulta transgredido. Por isso é sempre responsabilidade por comportamento ilícito quando o Estado, devendo atuar, e de acordo com certos padrões, não atua ou atua insuficientemente para deter o evento lesivo.
(...)
É que, como bem acentuou, nem todo funcionamento defeituoso do serviço acarreta responsabilidade. O Conselho de Estado francês aprecia in concreto a falta, levando em conta a "diligência média que se poderia legitimamente exigir do serviço". É sabido que a culpa relaciona-se com negligência (noção antitética à de diligência), imprudência ou imperícia. Donde, a responsabilidade por falta de serviço é, indubitavelmente, responsabilidade subjetiva".3 (grifo nosso).
Ainda neste sentido, conforme esclarece Lucia Valle Figueiredo:
"Deverás, ainda que consagre o texto constitucional a responsabilidade objetiva, não há como se verificar a adequabilidade da imputação ao Estado na hipótese de omissão, a não ser pela teoria subjetiva. Assim e porque, para se configurar a responsabilidade estatal pelos danos causados, há de se verificar (na hipótese de omissão) se era de se esperar a atuação do Estado. Em outro falar: se o Estado omitiu-se, há de se perquirir se havia o dever de agir. Ou, então, se a ação estatal teria sido defeituosa a ponto de se caracterizar a insuficiência da prestação de serviço" 4.
Neste sentido, colaciono ainda os seguintes julgados:
"EMENTA: PROCESSUAL CIVIL - REQUISITOS LEGAIS DA SENTENÇA - FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE - ARGUMENTOS DE MENOR RELEVÂNCIA - RESPONSABILIDADE CIVIL - OMISSÃO DA ADMINISTRAÇÃO NA CONSERVAÇÃO DE VIA PÚBLICA - RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA - INTELIGÊNCIA DO ART. 37, § 6º, DA CF - TRAVESSIA DE PEDESTRE FORA DA FAIXA - BURACO NA PISTA DE RODAGEM - FALTA DE PROVA DE ILEGALIDADE DA CONDUTA DO TRANSEUNTE - ART. 69, DO CNT - OBRIGAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO NA MANUTENÇÃO DAS VIAS PÚBLICAS - DEMONSTRADA OMISSÃO QUE GEROU DANOS AO PARTICULAR, DEVER DE INDENIZAR MANTIDO - APELO CONHECIDO E IMPROVIDO. A partir do momento em que o julgador encontra fundamentos fáticos e jurídicos com espeque nos quais lança seu posicionamento, dizendo o direito no caso concreto, não lhe é exigido se manifeste sobre todas as alegações deduzidas pelas partes, sendo desnecessária a incursão sobre questiúnculas de menor relevância que não interferem no encerro da causa. Muito embora a regra seja a travessia de pedestres por sobre a faixa destinada para tanto, local onde seria exigível exímia pavimentação, evitando riscos aos cidadãos, casos há em que o indivíduo se vê obrigado a transpor o leito carroçável fora destes locais, não tendo a Municipalidade-ré, comprovado que a autora dispunha de faixa de pedestres a uma distância inferior a 50 (cinqüenta) metros para realizar, com toda a segurança, a travessia da rua, fato que excluiria por completo a responsabilidade da Administração por caracterizar conduta negligente do particular, fez ampliar sua obrigação de manter a via pública em perfeitas condições àquele que anda a pé também sobre o leito carroçável da rua, respondendo pelos danos causados ao particular em razão de sua omissão".5 (grifo nosso)
"EMENTA: 1) DIREITO ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DECORRENTE DE ATO OMISSIVO. DUPLICIDADE DE REGISTROS. DEPARTAMENTO DE TRÂNSITO DO PARANÁ - DETRAN/PR. ILICITUDE NÃO DEMONSTRADA. ART. 123, §3º DO CÓDIGO DE TRÂNSITO NACIONAL. NÃO CABIMENTO DE INDENIZAÇÃO. a) Tratando-se de ato omissivo do poder público, a responsabilidade civil por tal ato é subjetiva, conforme jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. b) Conforme o § 3º, do art. 123 do Código de Trânsito Nacional, a expedição do novo certificado do veículo deverá ser comunicada ao órgão executivo de trânsito que expediu o anterior. Não tendo sido comprovado que o DETRAN/PR teve conhecimento do novo registro, não pode ele ser responsabilizado por eventuais danos suportados pelo Autor em decorrência do duplo registro de seu veículo, pois a autarquia paranaense não tinha o dever de proceder a retificação. 2) DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ACOLHIMENTO DA TESE DEFENDIDA PELO RÉU QUE PREJUDICA A ANÁLISE DO PEDIDO DO AUTOR. a) No caso dos autos, a sentença havia condenado o Réu a indenizar o Autor por danos materiais. Em grau de recurso, porém, foi afastada a culpa do Réu, e verificou-se que este não tinha o dever de retificar o cadastro do veículo do Autor. b) Portanto, restou prejudicado o Apelo deste, que pleiteava indenização por danos morais, pois se não competia ao DETRAN/PR retificar o cadastro do veículo, é certo que não responde nem por danos materiais, nem por danos morais. 3) APELO DO RÉU A QUE SE DÁ PROVIMENTO E APELO DO AUTOR QUE RESTOU PREJUDICADO PELA REFORMA DA SENTENÇA".6 (grifo nosso).
Tem-se, dos autos que as faixas pintadas no chão com a escrita "PARE", bem como as faixas amarelas com tartarugas e as setas indicativas de sentido conforme as fotos de fls. 22-25, estavam parcialmente apagadas, com visualização dificultada. Nota-se ainda que as fotos foram tiradas em dia de pista seca, e conforme declaração do policial de serviço de trânsito, " se estivesse chovendo com certeza a sinalização de chão seria em parte prejudicada". (fls. 91).
Nesse sentido a prova da culpa do poder público restou comprovada pelas fotos e declarações acostadas nos autos, não havendo, assim, que se falar em culpa exclusiva da vítima.
Quanto à alegada culpa concorrente merece prosperar, haja vista que ficou demonstrado nos autos, que a causa do dano é concorrente, eis que ambas as partes contribuíram para fato danoso.
A respeito bem definiu a r. sentença recorrida:
"A culpa de fato é concorrente, pois, sabedora a autora de que tinha em mãos a arma que mais mata no país, qual seja veículo automotor, deveria de fato por questão de sua própria segurança fiscalizar o cruzamento em preferencial"7.
Assim, ficou devidamente demonstrado nos autos que a sinalização no local do fato era precária, mas não inexistente, logo, era exigível da motorista fiscalizar o cruzamento em preferencial.
A respeito, o art. 44 do CTB:
"Art. 44 - Ao aproximar-se de qualquer tipo de cruzamento, o condutor do veículo deve demonstrar prudência especial, transitando em velocidade moderada, de forma que possa deter seu veículo com segurança para dar passagem a pedestre e a veículos que tenham direito de preferência".
Assim, sendo o dano certo conforme evidenciado, decorrente de omissão do estado e culpa concorrente da apelada, não há que se falar em insubsistência da responsabilidade do estado, e nem em culpa exclusiva da vitima, sendo de se reconhecer a concorrência de culpas, no presente caso.
Nessas condições, impõe-se o parcial provimento do recurso para reduzir pela metade a indenização devida pelo apelante.
03. DECISÃO
Dessa feita, com espeque no artigo 557 do CPC e na orientação deste Tribunal, conheço do recurso e, no mérito, dou-lhe parcial provimento, no sentido de reduzir o valor indenizatório em 50% (cinqüenta por cento).
Considerando-se a sucumbência recíproca, condeno ambas as partes ao pagamento de metade das custas processuais e dos honorários advocatícios fixados.
Publique-se e intimem-se.
Curitiba, 15 de agosto de 2007.
J. S. Fagundes Cunha
Juiz Substituto em Segundo grau.
1 NEGRÃO, Theotonio, Código de Processo Civil e legislação em vigor/ Theotonio Negrão e José Roberto F, Gouveia. - 38. ed., 2006 - São Paulo: Saraiva, pág. 113.
2 MELLO, Celso Antônio Bandeira de, Curso de direito Administrativo, 18 ª ed., Editora: Malheiros -São Paulo, 2005, pág. 956-957.
3__________________, Curso de direito Administrativo, 18 ª ed., Editora: Malheiros - São Paulo, 2005, pág. 929.
4 FIGUEIREDO, Lúcia Valle, Curso de Direito Administrativo, 6ª ed., São Paulo: Malheiros, 2003, pág. 264.
5 TJPR, Apelação Cível nº 0336920-6, 4ª Câmara Cível, Relator: Anny Mary Kuss, julgado em 11/07/2006.
6 TJPR, Apelação Cível nº 0335580-8, 5ª Câmara Cível, Relator: Leonel Cunha, julgado em 22/08/2006.
7 Sentença de fls. 88.