SELEÇÃO DE DECISÕES

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Processo:
395576-2
(Decisão monocrática)
Segredo de Justiça: Não
Relator(a): José Sebastião Fagundes Cunha
Desembargador
Órgão Julgador: 8ª Câmara Cível
Comarca: Toledo
Data do Julgamento: Tue Dec 11 09:09:00 BRST 2007
Fonte/Data da Publicação: DJ: 7512 Fri Dec 14 00:00:00 BRST 2007

Decisão Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Decisão monocrática. Eventuais imagens serão suprimidas.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 395.576-2, DA 2ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE TOLEDO
APELANTE : MARGARETE DAS GRAÇAS ARAÚJO
APELADO : MAYCON ALLESON MUNIZ
RELATOR : J. S. FAGUNDES CUNHA
APELAÇÃO CÍVEL. DANOS MORAIS. CALÚNIA. COMPROVAÇÃO. DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO. VALOR DA INDENIZAÇÃO. MENSURAÇÃO.
1. Devidamente comprovado que a requerida, de forma imponderada e infundada, apontou o requerente diante de toda a vizinhança como autor de furto, presentes mostram-se os requisitos necessários à sua responsabilização civil.
2. A indenização por danos morais tem finalidade compensatória e didático-pedagógica, devendo ser fixada levando-se em consideração o sofrimento ocasionado à vítima, sua função de inibição da conduta ilícita, o nível econômico das partes e o grau de culpa do agente infrator, sempre obedecendo ao princípio da proporcionalidade e às peculiaridades do caso concreto. Redução da indenização, no caso, para R$3.000,00, levando-se em consideração, principalmente, a desfavorável situação econômica da ofensora, a despeito da gravidade dos danos.
3. Recurso conhecido e parcialmente provido.
Vistos e relatados estes autos de Apelação Cível sob o nº 395.576-2, da 2ª Vara Cível da Comarca de Toledo, em que é apelante Margarete das Graças Araújo Bueno e apelado Maycon Alleson Muniz.
1. RELATÓRIO
Maycon Alleson Muniz ajuizou pedido de indenização por danos morais contra Margarete das Graças Araújo Bueno alegando, para tanto, que foi apontado injustamente por ela como autor de furto.
Contestado e instruído o feito, adveio a respeitável sentença de fls. 60/65, através da qual decidiu o juízo de primeira instância pela procedência do pedido para o fim de condenar a ré ao pagamento de R$10.000,00 (dez mil reais) ao autor a título de danos morais.
Inconformada com a decisão, a sucumbente interpõe a presente apelação (fls. 73/80), alegando, em síntese, que as provas carreadas aos autos demonstram que não foi ela quem apontou o apelado como autor do furto, e que o valor fixado a título de indenização é excessivo. Requer, assim, o provimento do recurso para julgar improcedente a ação.
Devidamente intimado, deixou o recorrido de apresentar suas contra-razões (fls. 83 e verso).
É o relatório.
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 Do Exame de Admissibilidade
Presentes os pressupostos de admissibilidade, tanto intrínsecos (legitimidade, interesse, cabimento e inexistência de fato impeditivo e extintivo) como extrínsecos (tempestividade, preparo e regularidade formal), deve o recurso ser conhecido. Assim, passo à análise do mérito.
2.2. Do Mérito Recursal
Trata-se de caso no qual se discute se a ré é ou não responsável pelo fato de ter acusado o autor, menor à época, de furtar um aparelho de DVD da residência de uma afilhada sua.
Como se extrai dos elementos acostados aos autos, o requerente encontrava-se conversando com um amigo diante da residência deste, ocasião em que a requerida chegou ao local.
Após esse momento, duas versões diferentes são dadas pelas partes.
De um lado, argumenta o autor que foi ostensivamente abordado por ela, sob a acusação alta e clara de que teria furtado o aparelho eletrônico de sua afilhada, sendo instado insistentemente a devolvê-lo, tendo até mesmo sua mochila revistada contra sua vontade pela ré; neste momento, a polícia, que já tinha sido chamada, chegou ao local e, finalmente, um dos policiais confirmou na escola do requerente que este estava na sala de aula no momento do furto (por volta das 15 horas e 30 minutos), quando as acusações cessaram.
De outro lado, a requerida defende que não agiu ofensivamente, apontando-o como autor do furto, mas apenas dirigiu-se a ele perguntando se havia algo errado, pois sua afilhada tinha chamado a polícia, pois suspeitava que o requerente tinha furtado o aparelho de DVD.
Durante a instrução do feito, foram ouvidos dois informantes, sendo um o amigo do autor presente no momento dos fatos, e outro a vítima do furto, afilhada da ré, sendo que o primeiro confirmou exatamente a versão apresentada pelo autor, com riqueza de detalhes, e a segunda relatou que sua madrinha não havia conversado com o requerente antes da polícia chegar ao local, o que diverge da versão dada pela requerida.
A par disso, uma das testemunhas do autor, que presenciou os fatos a partir do momento no qual a polícia chegou e foi ouvida mediante compromisso legal, relatou:
"a depoente afirma que vieram duas viaturas da polícia e que ouviu quando o policial disse que a requerida estava dizendo que o autor havia furtado o DVD e inclusive pegou a bolsa dele mas que ao revistar a mochila nada foi encontrado; que a depoente afirma que uma das viaturas foi até a escola do autor a fim de verificar se ele havia comparecido às aulas naquele dia e quando retornou disse que realmente o autor havia estado na escola;" (fls. 46)
Sendo assim, diante dos elementos probatórios acostados aos autos verifica-se com tranqüilidade que a ré realmente apontou o requerente de forma precipitada, ostensiva e injusta como autor do furto, fato deveras grave.
Afora a conduta ilícita e a culpa no evento, o nexo de causalidade encontra-se evidente, e o dano moral sobejamente comprovado, pois praticamente todos os depoentes confirmaram a aglomeração de pessoas no local quando da chegada das viaturas policiais, sendo que alguns deles relataram que o apelado, menor à época, chegou até mesmo a ser apelidado de "DVD" em razão do ocorrido, e passou a evitar freqüentar lugares como supermercados, com receio de ser novamente acusado de forma injusta.
Diante deste quadro, exsurge claramente o dever de indenizar da apelante, nos exatos termos dos arts. 186 e 927 do Código Civil.
A respeito, a jurisprudência inclusive pacificou-se a respeito da ocorrência de danos morais em casos como esse, nos quais a acusação se dá de forma precipitada e pública.
Confira-se:
"APELAÇÃO CÍVEL - INDENIZATÓRIA - DANOS MORAIS - ACUSAÇÃO DE FURTO EM LOJA - REVISTA PESSOAL POR FUNCIONÁRIO - CONSTRANGIMENTO - HUMILHAÇÃO - DANO MORAL - CARACTERIZAÇÃO - "QUANTUM" INDENIZATÓRIO - FIXADO COM MODERAÇÃO - VALOR MANTIDO - SENTENÇA - MANUTENÇÃO - RECURSOS - APELAÇÃO - NEGA PROVIMENTO - ADESIVO - NEGA PROVIMENTO. 1.- Age com culpa aquele que, precipitadamente e com excesso, imputa fato criminoso a alguém, pois tal ato, sem que haja provas da efetiva prática do furto, impõe à pessoa constrangimento, humilhação, vergonha, sofrimento, fazendo ela jus ao recebimento de indenização por danos morais; 2.- Os proprietários e prepostos de empresa de comércio não possuem o poder de polícia, o que lhes impede por mera suspeita de furto de mercadorias expostas, abordar e efetuar a revista pessoal, não havendo que se falar em exercício regular de direito." (TJ/PR, AC 0377263-2, 9ª Câmara Cível, Rel. Sérgio Luiz Patitucci, julgado em 23/08/2007)
"AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - ACUSAÇÃO INFUNDADA DE FURTO ATRIBUÍDA AO AUTOR, NO INTERIOR DE UM ESTABELECIMENTO COMERCIAL, POR PARTE DE PREPOSTOS DA RÉ - EXPOSIÇÃO DO OFENDIDO, EM PÚBLICO, A UMA SITUAÇÃO DE CONSTRANGIMENTO E DE DISSABOR, OFENDENDO A SUA HONRA E HONORABILIDADE, ANTE A ABORDAGEM NELE FEITA POR PREPOSTOS DA EMPRESA, QUE NÃO VEIO A ENCONTRAR QUALQUER MERCADORIA SURRUPIADA NA SUA POSSE - INSTRUÇÃO PROBATÓRIA ROBUSTA E INCISIVA, CONFIRMANDO A VERSÃO FÁTICA POR ELE DADA NESTE PROCESSO - CARACTERIZAÇÃO INDELÉVEL DO DANO MORAL, GERANDO O DEVER DO OFENSOR DE INDENIZÁ-LO, INDEPENDENTEMENTE ATÉ DA DEMONSTRAÇÃO DO PREJUÍZO, QUE É PRESUMIDO - VALOR FIXADO NA SENTENÇA, A ESSE TÍTULO, QUE SE REVELOU EXACERBADO, AUTORIZANDO A RESPECTIVA REDUÇÃO - APELAÇÃO DA VENCIDA EM PARTE PROVIDA. (TJ/PR, AC 1.0180969-0, 6ª Câmara Cível, Rel. Duarte Medeiros, julgado em 14/02/2006)
Quanto ao valor da indenização, os critérios de aferição encontram-se plenamente pacificados na jurisprudência no seguinte sentido:
"A valoração da compensação moral deve ser apurada mediante prudente arbítrio do Juiz, motivado pelo princípio da razoabilidade e observadas a gravidade e a repercussão do dano, bem como a intensidade, os efeitos do sofrimento e o grau de culpa ou dolo. A finalidade compensatória, por sua vez, deve ter caráter didático-pedagógico, evitado o valor excessivo ou ínfimo, objetivando, sempre, o desestímulo à conduta lesiva." (TJ/PR, AC 386.748-9, 8ª Câmara Cível, de minha relatoria, julgado em 31/05/2007)
Dentro desses parâmetros repousa a discricionariedade do órgão jurisdicional, o qual deve levar em conta, como verdadeiro norte para decidir, as peculiaridades do caso concreto, como há muito já preconiza o Egrégio Superior Tribunal de Justiça:
"PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INEXISTÊNCIA. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. INSCRIÇÃO INDEVIDA NO SPC. DANO PRESUMIDO. VALOR INDENIZATÓRIO. CRITÉRIOS PARA FIXAÇÃO. CONTROLE PELO STJ. (...) III - O arbitramento do valor indenizatório por dano moral se sujeita ao controle desta Corte. E, inexistindo critérios determinados e fixos para a quantificação do dano moral, recomendável que sejam atendidas as peculiaridades do caso concreto. Recurso especial provido." (REsp 303888/RS, 3ª Turma, Rel. Min. Castro Filho, julgado em 20/11/2003)
Desta forma, observando-se todos esses parâmetros, temos que a despeito da intensa gravidade do fato, a indenização deve levar em conta também o situação econômica da ofensora, buscando servir como desestímulo à prática de novas condutas ofensivas como essas, mas sem levar a ofensora à ruína; em outras palavras, a indenização deve ser alta, mas não inviável para os padrões econômicos dela.
Sobre o tema, restou incontroverso no processo que a ofensora é funcionária pública municipal da área de educação, reside em bairro humilde da cidade, e possui apenas a casa em que mora, obtida mediante financiamento pelo Sistema Financeiro da Habitação, não tendo carros, motos ou outros imóveis.
Sendo assim, a condenação no patamar de R$10.000,00 mostra-se excessiva, sendo mais condizente com a realidade posta nos autos uma quantia da monta de R$3.000,00 (três mil reais), donde a sentença deve ser reformada neste ponto.
03. DECISÃO
Do exposto, com base no artigo 557 e 557, §1º-A do CPC, conheço o recurso e, no mérito, dou-lhe parcial provimento a fim de reduzir o valor da indenização para R$3.000,00 (três mil reais), nos termos da fundamentação.
Curitiba, 28 de novembro de 2007.
J. S. Fagundes Cunha
Juiz de Direito de Segundo Grau