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Acórdão
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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 473.239-2 3ª VARA CRIMINAL DE PONTA GROSSA Apelante: MIGUEL NUNES PEREIRA Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO Relator: Des. Rogério Kanayama
EMENTA: PENAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES (ART. 33, CAPUT, DA LEI Nº 11.343/06). NULIDADE DA SENTENÇA. CONDENAÇÃO FUNDADA APENAS NAS PROVAS OBTIDAS NA FASE EXTRAJUDICIAL. ALEGAÇÃO DESCABIDA. SENTENÇA RESPALDADA EM PROVAS OBTIDAS EM JUÍZO. DEPOIMENTO DOS POLICIAIS MILITARES QUE EFETUARAM A PRISÃO EM FLAGRANTE. VALIDADE. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO DESACOLHIDO. PARECER DA PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA PELA APLICAÇÃO, DE OFÍCIO, DA CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO DO § 4°, DO ARTIGO 33, DA NOVA LEI DE DROGAS. INAPLICABILIDADE. "SITUAÇÕES RESIDUAIS". RÉU QUE SE DEDICA A ATIVIDADES CRIMINOSAS. RECURSO DESPROVIDO.
I - "Não há condenação baseada exclusivamente nas provas produzidas no inquérito policial. A sentença condenatória foi devidamente fundamentada nas provas pericial e testemunhal produzidas durante a instrução criminal, não obstante a existência de algumas divergências entre os depoimentos prestados, pelas mesmas testemunhas, na fase inquisitorial e processual, devidamente apreciadas pelo magistrado e tidas como insuficientes para ensejar a absolvição do Paciente" (STJ - HC nº 59.855 - 5ª T. - Rel. Min. Laurita Vaz - DJU de 07.02.08. p. 01).
II - "Alegação de o réu ter sido condenado com base exclusiva em depoimento policial. 4. Nada existe nos autos que possa desabonar os depoimentos dos policiais, invocados na sentença, confirmada no acórdão. Além da comprovação da materialidade do delito, a prova testemunhal decorrente de declarações dos policiais foi colhida, em juízo, assegurado o contraditório, inexistindo qualquer elemento a indicar pretendessem os policiais incriminar inocentes" (STF - HC n° 77.565 - 2ª T. - Rel. Min. Néri da Silveira - DJU de 02.02.01).
III - Não se aplica, no caso, o §4º, do art. 33, da Lei n° 11.343/06, se evidenciado que o réu se dedicava a atividades criminosas.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal nº 473.239-2, da 3ª Vara Criminal da Comarca de Ponta Grossa, em que é apelante Miguel Nunes Pereira e, apelado, o Ministério Público.
I - Trata-se de apelação interposta por Miguel Nunes Pereira contra a sentença que o condenou, como incurso nas sanções do artigo 33, da Lei nº 11.343/2003, absolvendo-o no entanto do crime do art. 333, caput, do CP, à pena de 5 anos de reclusão, sob regime inicialmente fechado, e 500 dias-multa, no valor unitário de R$0,86 (oitenta e seis centavos).
A denúncia tem o seguinte teor:
"No dia 28 de fevereiro de 2007, por volta das 05h30min, na residência localizada à rua Talco, nº 03, Vila Ouro Verde, nesta cidade, o denunciado, plenamente ciente da ilicitude e da reprovabilidade de sua conduta, mantinha em depósito, para comercialização, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, três gramas de 'crack', envolta em papel celofane (auto de exibição e apreensão de fl. 13), substâncias essas capazes de causar dependência física e/ou psíquica, conforme auto de constatação provisória de fl. 14, além de grande quantidade de dinheiro em notas diversas, proveniente da referida comercialização. Momentos antes da abordagem policiail, o denunciado havia vendido 'droga' para a pessoa de Steefhany Christina Graviana Batista.
Segundo Fato:
'No mesmo dia e local do primeiro fato, logo após ser dado voz de prisão ao denunciado, este, plenamente ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, ofereceu vantagem indevida ao policial militar Ronaldo Lopes, mediante um acordo, com a finalidade de que este se omitisse de realizar a prisão, o que não foi aceito pela autoridade policial" (fls. 2/3).
Alega o apelante, em síntese, que a sentença condenatória é nula porque está fundada nas provas obtidas no inquérito policial criminal, o que afronta suas garantias constitucionais de ampla defesa e do contraditório. Argumenta, nesse sentido, que as testemunhas Sttefhany Christina Gravina Batista e Richael Dias de Freitas, ambas arroladas pela acusação, não foram ouvidas pelo Juízo. Assim, as imputações delas advindas na fase extrajudicial não restaram confirmadas. Ademais, as provas colhidas durante a instrução criminal não evidenciaram a participação do recorrente no delito de tráfico ilícito de drogas. Ao contrário, demonstram sua inocência. Ressalta, de outro lado, que a sentença condenatória está fundamentada exclusivamente nos testemunhos dos policiais militares que efetuaram sua prisão, fato que "... gera dúvida quanto ao conteúdo emocional envolvido" (fl. 187). O Dr. Promotor de Justiça, em contra-razões, pugna pela manutenção da sentença por seus próprios fundamentos (fls. 190/198). A douta Procuradoria Geral de Justiça opina pelo desprovimento da apelação com a aplicação, de ofício, da minorante prevista no art. 33, §4º, da Lei nº 11.343/06, em fração de 1/6. II - Conheço do recurso porque revestido dos pressupostos de admissibilidade. A nulidade da sentença, suscitada pelo apelante, não prospera. Isso porque, ao contrário do que afirma o réu, o Juízo de primeiro grau valeu-se das provas obtidas na fase judicial para motivar sua convicção a respeito da prática do crime do art. 33, da Lei nº 11.343/06. Especificamente em relação ao delito de tráfico ilícito de drogas, vê-se da parte da fundamentação da sentença que o Dr. Juiz de Direito, após transcrever parte do interrogatório judicial do réu, reproduziu também excertos dos depoimentos judiciais dos policiais Ronaldo Lopes e Bruna Roberta Mayer e, mais, da declaração da adolescente Sttefhany Christina Gravina à autoridade policial (fls. 153/155). Confira-se o teor dos depoimentos judiciais transcritos pelo Magistrado na sentença: "Em declarações prestadas em juízo (fls. 90) o policial militar Ronaldo Lopes declarou: '[...] que no dia dos fatos, realizaram uma busca na Rua Sete de setembro, onde encontraram vestígios de uso de substância entorpecente; que encontraram dois adolescentes, uma mulher, a qual ligou para o acusado e disse que queria comprar substância entorpecente; que a adolescente foi até a casa do réu, acompanhada de uma polícia feminina e do declarante; que a adolescente foi atendida pelo réu nos fundos da residência; que a adolescente pagou R$60,00 por três gramas de crack; que em seguida, chamaram outros policiais e entraram na casa do réu, onde encontraram dinheiro; que o dinheiro era em notas miúdas; que eram em notas de R$10,00 e R$5,00 e R$2,00; que o dinheiro foi encontrado embaixo do colchão; que na casa estava o irmão do réu, a mulher, uma criança e a mãe do réu; que o réu por diversas vezes convidou declarante para ir até o quarto, para fazer um acordo; que a equipe de policiais sempre acompanharam o declarante; que o declarante quando prendeu o 'mancha', este informou que a droga que vendia era de propriedade do réu; que na última audiência do 'mancha', sua mulher estava assustada, em razão das ameaças do réu; que o réu também teve problemas no Ouro Verde, com disparos de arma de fogo; que o disparo de arma de fogo ocorreu entre o réu e o ' Paulista'; [...] que viu o réu entregando substância entorpecentes para Stefany; que estava a uma distância de trinta metros; que a entrega de substância entorpecente foi no portão dos fundos da casa; que as três gramas estavam embrulhadas; que o dinheiro foi encontrado embaixo do colchão, no quarto do réu; [...] que ficaram a distancia, observado Sttefany adquirir a substância entorpecente; que não acompanharam Sttefany até o local onde o réu entregou a droga; que não usaram viatura; que o declarante estava nos fundos da casa, observando a adolescente Sttefany pegar a substância entorpecente; que a soldada Bruna estava junto com o declarante; que não consegue descrever a roupa do réu; que não sabe dizer o nome do irmão do réu que estava junto na casa; que o réu por várias vezes indagou do depoente se tinha jeito de fazer um acordo; que o réu não mencionou valores [...]'.
'Bruna Roberta Mayer em juízo (fls. 92) declarou: '[...] que no dia dos fatos descritos na denúncia, fizeram abordagem em um apartamento, onde pessoas usavam substância entorpecente; que encontraram a adolescente Sttefany; que Sttefany ligou do telefone celular para Miguel e falou que queria adquirir substância entorpecente 'crack'; que Miguel falou que Sttefany poderia passar em sua residência; que a declarante e o soldado Ronaldo acompanharam a adolescente até a casa de Miguel; que a declarante e o soldado Ronaldo aguardaram a adolescente há uma distância aproximadamente de dez metros; que a declarante visualizou o réu Miguel entregando a substância entorpecente a adolescente Sttefany e Sttefany entregou dinheiro; que para Miguel; que Sttefany entregou ao réu a quantia de aproximadamente R$60,00; que posteriormente chamaram outras viaturas e entraram na residência do réu; que encontraram na residência a quantia superior a mil reais, em notas pequenas; que o dinheiro se encontrava espalhado nos cômodos da casa; que foi encontrado dinheiro embaixo da cama; que dentro da casa estava o réu, a esposa; que acha que tinha o irmão do réu na casa; que o declarante escutou o réu Miguel falando para o soldado Ronaldo 'vamos entrar aqui pra fazer um acordo'; que Ronaldo falou para os demais policiais 'olha, o réu quer fazer acordo'; que depois levaram o réu para a Delegacia; [...] que Sttefany falou no telefone que queria passar na casa para comprar drogas; que não chamou pelo nome de Miguel; que posteriormente chegaram dois policiais; [...] que quando fizeram abordagem no apartamento, fizeram abordagem em Sttefany; que Sttefany não portava nada, a não ser a quantia de R$60,00; que usou para comprar droga; que não dizer (sic) o nome do irmão de Miguel; que não ouviu Miguel oferecendo quantia em dinheiro para Ronaldo; que o réu Miguel chamava Ronaldo para entrar num quarto, para fazerem um acordo; que na casa do réu nada foi achado; [...]" (fls. 154/155). Certo, o Juízo de primeiro grau valeu-se das informações da adolescente Sttefhany Christina Gravina à autoridade policial para motivar sua convicção a respeito dos fatos, mas não se limitou a elas. Apenas reforçou, com isso, os supracitados depoimentos dos policiais demonstrando que há harmonia entre estes e aquelas: "Que a depoente, na madrugada de hoje, se encontrava pernoitando no apartamento nº 01 do prédio 1955, da Rua Sete de Setembro, nesta cidade, acompanhada do menor Richael, quando ali chegaram policiais; que após ter sido indagada, disse que havia consumido droga naquela noite fornecida por Miguel de tal, residente no bairro de Ouro Verde, nesta cidade; Que foi solicitada a depoente que mostrasse a casa do referido traficante, para onde se descolaram; Que a pedido dos policiais, a depoente solicitou a Miguel que lhe fornecesse mais R$60,00 (sessenta reais) em droga, quantia pela qual foi dado à depoente aproximadamente duas gramas e meia de CRACK, envolta em papel celofane branco; Que antes de se dirigir à residência de Miguel, a depoente fez uma ligação para o mesmo, pelo número (42) 9963-6089, e Miguel já a aguardava no portão da sua casa, com a droga na mão (...) que foram várias as vezes que a depoente fez aquisição de droga do referido traficante, cujo nome completo soube neste ato ser MIGUEL NUNES PEREIRA" (fl. 155). Ademais, conforme ressaltou o Dr. Procurador de Justiça em seu parecer, "... é de se levar em consideração, no caso, a impossibilidade da repetição da prova judicialmente, haja vista que, mesmo com a persistência do membro do Ministério Público em ouvi-la, a mesma não foi encontrada pelo oficial de justiça (fls. 86-verso, 104-143-verso)" (fl. 219). De toda forma, na medida em que a condenação não está motivada apenas nas provas obtidas na fase inquisitorial, mas é fundada substancialmente nas provas judiciais, não há de se falar em nulidade da sentença. Nesse sentido:
"HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSUAL PENAL. DELITO DE INCÊNDIO CIRCUNSTANCIADO (ART. 250, § 1º, II, A, DO CÓDIGO PENAL). CONDENAÇÃO COM BASE EM PROVA PRODUZIDA EXCLUSIVAMENTE NO INQUÉRITO POLICIAL. NÃO-OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE NA EXACERBAÇÃO DA PENA-BASE. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. 1. Não há condenação baseada exclusivamente nas provas produzidas no inquérito policial. A sentença condenatória foi devidamente fundamentada nas provas pericial e testemunhal produzidas durante a instrução criminal, não obstante a existência de algumas divergências entre os depoimentos prestados, pelas mesmas testemunhas, na fase inquisitorial e processual, devidamente apreciadas pelo magistrado e tidas como insuficientes para ensejar a absolvição do Paciente. 2. Cumpre ressaltar, ainda, que o habeas corpus não é o instrumento processual adequado para reexaminar a alegação de negativa de autoria, uma vez que dependente do revolvimento do conjunto fático-probatório, o que é vedado na via mandamental. 3. A pena-se foi devidamente agravada em 6 (seis) meses com base em circunstâncias judiciais desfavoráveis ao ora Paciente, tais como, as conseqüências do delito (destruição total da residência familiar) e a sua personalidade. 4. Habeas corpus denegado" (STJ - HC nº 59.855 - 5ª T. - Rel. Min. Laurita Vaz - DJU de 07.02.08. p. 01 - grifamos). O apelante também questiona a validade da sentença por estar apoiada exclusivamente nos testemunhos dos policiais militares. Aduz que a atuação dos policiais na prisão em flagrante põe dúvida quanto à imparcialidade dos seus depoimentos. Ocorre que não há nos autos quaisquer indícios de suspeição dessas testemunhas, ouvidas em Juízo sob o crivo do contraditório, cujos depoimentos, reitere-se, são harmônicos com as demais provas. Não há porque, então, deixar de considerar o que disseram:
"Habeas corpus. 2. Paciente condenado como incurso no art. 12, da Lei nº 6.368, de 1976, a 3 anos e 6 meses de reclusão, em regime fechado, além de 50 dias-multa. 3. Alegação de o réu ter sido condenado com base exclusiva em depoimento policial. 4. Nada existe nos autos que possa desabonar os depoimentos dos policiais, invocados na sentença, confirmada no acórdão. Além da comprovação da materialidade do delito, a prova testemunhal decorrente de declarações dos policiais foi colhida, em juízo, assegurado o contraditório, inexistindo qualquer elemento a indicar pretendessem os policiais incriminar inocentes. 5. Habeas Corpus indeferido." (STF - HC n° 77.565 - 2ª T. - Rel. Min. Néri da Silveira - DJU de 02.02.01).
"HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. CONDENAÇÃO DEVIDAMENTE AMPARADA NO CONJUNTO PROBATÓRIO DOS AUTOS. TESTEMUNHO POLICIAL. EFICÁCIA PROBATÓRIA. VALORAÇÃO DAS PROVAS. IMPOSSIBILIDADE NA VIA ELEITA. PRECEDENTES DO STJ. 1. Ainda que a condenação tivesse sido amparado apenas no depoimento de policiais - o que não ocorreu na espécie -, de qualquer forma não seria caso de anulação da sentença, porquanto esses não se encontram legalmente impedidos de depor sobre atos de ofício nos processos de cuja fase investigatória tenha participado, no exercício das funções. Em sendo assim, tais depoimentos revestem-se de inquestionável eficácia probatória, principalmente quando prestados em juízo, sob a garantia do contraditório. 2. É inviável no presente writ a análise do valor das provas contidas nos autos para a condenação, uma vez que, além de ferir o princípio do livre convencimento do juiz, tal matéria escapa ao âmbito de apreciação do habeas corpus, em face da necessidade do exame minucioso do material cognitivo colhido no processo. 3. Ordem denegada." (STJ - HC n° 30.776 - 5ª T. - Rel. Min. Laurita Vaz - DJU de 08.03.04).
"CRIMINAL. HC. CONDENAÇÃO EM PORTE ILEGAL DE ARMAS E USO DE ENTORPECENTES. APELAÇÃO. DESCLASSIFICAÇÃO PARA TRÁFICO DE DROGAS. NULIDADE. FUNDAMENTAÇÃO NO DEPOIMENTO DE POLICIAIS. POSSIBILIDADE. DECISÃO MOTIVADA TAMBÉM EM OUTROS ELEMENTOS DE PROVA. IMPROPRIEDADE DO HABEAS CORPUS. REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. ORDEM DENEGADA. I. Hipótese em que ao paciente foram impostas penas pelas práticas dos delitos de porte ilegal de arma e uso de substância entorpecente, sendo, em sede de apelação ministerial, condenado por tráfico de drogas. II. O depoimento de policiais pode ser meio de prova idôneo para embasar a condenação, principalmente quando tomados em juízo, sob o crivo do contraditório. Precedentes do STF e desta Corte. III. Maiores incursões a respeito das provas que embasaram a condenação do réu não podem ser feitas na via eleita. IV. Ordem denegada." (STJ - HC nº 40.162 - 5ª T. - Rel. Min. Gilson Dipp - DJU de 28.03.05. p. 301). Não há de se falar, portanto, em nulidade da sentença. Também não prospera a alegação do apelante de que as provas colhidas durante a instrução processual demonstram sua inocência. Embora Idalécio Valverde da Silva, Alzemiro dos Santos, Zenildo da Silva Mello e Paulo Roberto Pereira tenham "abonado" a conduta do réu ao deporem ao Juízo, nenhuma dessas testemunhas presenciou o ocorrido segundo consta de seus depoimentos às fls. 108/111. Ademais, a afirmação de Paulo Roberto Pereira de que emprestou R$1.200,00 (mil e duzentos reais) da agência do Banco Real e, três dias após, reemprestou esse valor ao réu sem qualquer garantia para a aquisição de estoque de bebidas, além de ser destituída de qualquer prova material carece de credibilidade. Isso porque essa testemunha também declarou ao Juízo que tem mulher e filho pequeno, que comprava "fiado" na lanchonete do réu e, ainda, que obteve o empréstimo junto ao Banco Real para comprar um "carrinho" (fl. 111). Além disso, o dinheiro apreendido quando da prisão em flagrante - um total de R$1.197,10 (um mil cento e noventa e sete reais e dez centavos) - espalhado debaixo de uma cama e por cima de utensílios na casa do réu, segundo declarou a policial Bruna Roberta Mayer ao Juízo, era composto por notas diversas de R$1,00, R$2,00, R$5,00, R$10,00, R$20,00 e R$50,00 (cf. auto de Exibição e Apreensão de fls. 17) o que afasta, ante a experiência comum, a alegação de que provinha de uma instituição financeira que, sabidamente, não forneceria cédulas de valor baixo e variado. De outro lado, o depoimento dos policiais militares anteriormente transcritos é corroborado, insista-se, pela declaração da adolescente Sttefhany Christina Gravina e das demais provas relativas à materialidade delitiva (auto de Exibição e Apreensão à fl. 17, auto de constatação provisória de substância entorpecente de fl. 18 e laudo de toxicologia de fl. 52). Portanto, a manutenção da condenação do réu, ora apelante, pelo crime do art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06, é medida que se impõe.
Em relação à aplicação, de ofício, da causa de diminuição prevista no §4º do art. 33 da Nova Lei de Drogas, hipótese aventada pela Procuradoria Geral de Justiça em seu douto parecer, tenho que é de ser afastada, data venia.
Isso porque a grande quantidade de dinheiro em poder do réu, o intenso movimento de usuários de drogas em sua residência no período noturno, conforme narrativa dos policiais militares em Juízo, somado ao fato de que responde a inquérito pelo crime de homicídio qualificado (art. 121, §2º, IV, do CP) e está denunciado pelo delito de estupro (art. 213, caput, do CP), conforme consta da certidão de fls. 147/148, evidenciam que se dedica a atividades criminosas, o que obsta a concessão do referido benefício.
Luiz Flávio Gomes pondera que "as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, desde que o agente seja primário (não reincidente), de bons antecedentes e não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa (traficante, agindo de modo individual e ocasional). Os requisitos são subjetivos e cumulativos, isto é, faltando um deles inviável a benesse legal." (Nova lei de drogas comentada. lei n° 11.343, de 23.08.2006. São Paulo: RT, 2006. p 165, grifei). A respeito do conceito de "atividades criminosas" do art. 33, § 4º, da Lei Antidrogas, confira-se a doutrina de Jayme Walmer de Freitas disponível na Internet (www.jusnavigandi.com.br):
"2.3) Atividades criminosas. Não existe conceituação legal ou doutrinária. Tentaremos cooperar neste sentido, levando em conta o caráter teleológico do instituto objetivado pelo legislador, qual seja, somente o marinheiro de primeira viagem no tráfico merece ser agraciado. Em outras palavras, a lei beneficia aquele jovem que, usuário ou dependente, não resiste a uma comando do traficante para vender, e com isso obter o necessário em droga para o sustento de seu vício. Ainda nesta condição, está a pessoa miserável ou em desespero de causa que, por uns tostões, cede ao convite do traficante profissional que tem domínio do fato para mercadejar drogas. (...)
2.3.3) Situações caracterizadoras de atividades criminosas: (...) f) Maus antecedentes (situações residuais). Vimos que o traficante eventual, de primeira viagem, para fazer jus ao benefício, deve ostentar um passado imaculado, ou quase. Tendo maus antecedentes representados por outras situações, afora sentença transitada em julgado (respeitado os setores mais radicais da doutrina e jurisprudência quanto ao alcance do conceito), como sentenças condenatórias não definitivas, processos e inquéritos em andamento em quantidade expressiva ou qualitativamente relevantes (por exemplo: outro processo por tráfico, por associação para o tráfico, por homicídio etc), induvidoso que lhe deve ser negado o benefício, uma vez que ostenta requisito subjetivo incompatível."
Deixo, assim, de aplicar a redução do §4°, do art. 33, da Nova Lei de Drogas.
III - Do exposto, nego provimento ao recurso. ACORDAM os integrantes da Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Paraná, por unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso. Participaram do julgamento os Desembargadores Rogério Coelho (Presidente com voto) e Edvino Bochnia.
Curitiba, 12 de junho de 2008.
Rogério Kanayama Relator
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