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Acórdão
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Apelação Cível e Reexame Necessário nº 552.548-8, da 1ª Vara Cível da Comarca de Cascavel.
Relator: Juiz Subst. de 2º Grau Fernando César Zeni
Apelante 1: Dieleffe Aparecida Silva e outros
Apelante 2: Departamento de Estradas de Rodagem do Estado do Paraná DER-PR
Apelados: Os mesmos
APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. ACIDENTE DE TRÂNSITO. PISTA COM A SUPERFÍCIE SUJA COM PEDRAS E RESTOS DE OBRAS. DERRAPAGEM DE VEÍCULO QUE TRAFEGAVA EM ALTA VELOCIDADE. MOTORISTA SEM HABILITAÇÃO. MORTE DO PASSAGEIRO E DO CONDUTOR. CULPA DO AGENTE PÚBLICO QUE NÃO PROVIDENCIOU A VARREDURA DA PISTA ANTES DE SUA LIBERAÇÃO. DANOS MORAIS E MATERIAIS BEM AVALIADOS. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO ART. 944 DO CÓDIGO CIVIL PARA AMORTIZAÇÃO DO DANO, VISTO QUE NÃO FOI RECONHECIDO NA SENTENÇA DA CONCORRÊNCIA DE CULPAS (ART. 945 DO CC). BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO NÃO COMPENSÁVEL COM INDENIZAÇÃO DEVIDA POR DANOS DECORRENTES DE ATO ILÍCITO. DANO MORAL. MORTE DA VÍTIMA NO DECORRER DO PROCEDIMENTO. TRANSMISSIBILIDADE DO DIREITO AOS HERDEIROS. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. APELO CONHECIDO E PROVIDO E APELO 2 (DER-PR) CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Por força da teoria objetiva (art. 37, § 6º, da CF), incide em responsabilidade civil o órgão público responsável pela conservação das estradas de rodagem, o qual não toma providência para limpar a pista depois que foram feitas obras de recuperação e manutenção, as quais deixaram resíduos sobre a pavimentação asfáltica e provocaram acidente fatal em que vieram a falecer duas pessoas após derrapagem e colisão de veículo. Além disso, prevê o art. 1º, § 3º, do Código de Trânsito Brasileiro, que: "Os órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito respondem, no âmbito das respectivas competências, objetivamente, por danos causados aos cidadãos em virtude de ação, omissão ou erro na execução e manutenção de programas, projetos e serviços que garantam o exercício do direito do trânsito seguro." Assim, comprovado o nexo causal entre a conduta (omissão) e o resultado (morte), nasce a obrigação do Departamento de Estradas e Rodagem (DER-PR), responsável pelas obras, relativamente à recomposição dos danos morais e materiais suportada pelos autores, que deverão conviver com a perda irreparável de seu pai e marido. 2. Se a responsabilidade civil objetiva independe de culpa do agente administrativo, é inaplicável a regra do art. 944, parágrafo único, do Código Civil, que trata da dosimetria da indenização e torna possível a redução do montante da indenização diante do grau de culpa do agente, visto que não houve o reconhecimento da culpa concorrente para que fosse possível a atenuação ou repartição dos danos na medida de suas proporções, conforme prevê o art. 945 do Código Civil. O argumento utilizado na sentença para atenuação dos danos (falta de habilitação e alta velocidade), não são suficientes para afetar o nexo causal, visto que ambos são infrações de ordem administrativa, que não foram a causa primária do acidente. As atenuantes da responsabilidade civil objetiva, segundo orienta a doutrina derivam "de culpa exclusiva ou concorrente da vítima; no primeiro caso desaparece a relação de causa e efeito entre o ato do agente causador do dano e o prejuízo experimentado pela vítima; no segundo, sua responsabilidade se atenua, pois o evento danoso deflui tanto de sua culpa, quanto da culpa da vítima. (Silvio Rodrigues, Direito Civil Vol. 04, Responsabilidade Civil, Saraiva, 1975, p. 168/169)" 3. O disposto no art. 944, caput, do CC, se adapta somente ao dano material e não está adequado ao dano moral, visto que na reparação do dano moral não há ressarcimento, porquanto não é possível restaurar o direito personalíssimo que foi lesado, o qual tem caráter imaterial. Os parâmetros dos valores de afeição são destituídos de economicidade e variam entre os indivíduos de acordo com a carga a carga emocional de cada um. Quando se trata de dano material, o cálculo refere-se exatamente ao desfalque sofrido no patrimônio da vítima, desde que comprovado e a indenização deve corresponder ao seu exato valor. Mas no caso de dano moral, a apuração do quantum indenizatório é mais delicada, porque o bem lesado (honra, sentimento, nome, etc.) não se mede monetariamente, ou seja, não tem dimensão econômica ou patrimonial. 4. "Consolidou-se a jurisprudência do STJ no sentido de que eventual benefício previdenciário não é compensável com indenização devida por danos decorrentes de ato ilícito. (STJ Resp. 251.433-RJ, 2ª Turma, rel. Min. Peçanha Martins)" 5. "O direito de ação por dano moral é de natureza patrimonial e, como tal, transmite-se aos sucessores da vítima (RSTJ - vol. 71/183)" 6. Incide correção monetária sobre dívida por ato ilícito a partir da data do efetivo prejuízo (Súmula 43 do STJ) e os juros moratórios fluem a partir do evento danoso (Súmula 54 do STJ), em caso de responsabilidade extracontratual, com a ressalva de que tão-somente quanto ao valor da condenação por dano moral o termo inicial para a incidência da correção monetária é a data em que foi arbitrado o valor definitivo, ou seja, na sentença. f. 2
Vistos, relatados e discutidos estes Autos de Apelação Cível nº 552.548-8, da 1ª Vara Cível da Comarca de Cascavel. Cuida-se de ação de indenização promovida por Edineu Ribeiro da Silva, Dieleffe Aparecida da Silva, Edson João da Silva e Dalvina Rodrigues de Jesus contra o DER-PR, em razão de acidente automobilístico ocorrido em 16 de julho de 2005, na rodovia PR 471, no sentido de Catanduvas ao entroncamento da BR 277, ocasião em que o Fiat Uno placa AFA 0456 derrapou e colidiu com árvores, deixando o primeiro autor em estado grave e, posteriormente, tetraplégico. Contra a sentença que julgou parcialmente procedente pedido formulado em ação Sumária de Reparação de Danos formulada por Edineu Ribeiro da Silva e outros contra DER (Departamento de Estradas e Rodagem do Paraná) e contra a Fazenda Pública Estadual, foram interpostos o recursos de apelação (f. 340/352), que a sentença "considerou erroneamente a existência de fato de terceiro, concorrência de causa e mitigou equivocadamente os danos em 40% de todos os pedidos deferidos, se ter observado que inexiste prova de causa concorrente do motorista e de que a causa primária e determinante do evento foi à existência de grande quantidade de pedriscos e pedregulhos no leito da pista, sem qualquer advertência da reforma, o que aumentava consideravelmente o risco de acidente na rodovia" (f. 343). Continuam seus argumentos no sentido de que a causa determinante do acidente foi a sujeira da pista, a qual estava sob a mão de direção do condutor do veiculo Uno. Alegam que não havia a necessária segurança para trafegar durante as obras, o que viola o CTB. Alegam que o nexo de causalidade é justamente a falta de aviso no local do acidente, em que estava sendo recuperada a rodovia. Cita trechos de depoimentos pessoais, os quais comprovam a ausência de segurança no local. Que não foi demonstrada culpar exclusiva na vítima. Menciona trechos doutrinários e jurisprudência que
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entende aplicável ao caso e pedem a reforma da sentença, para obter a exclusão da tese de fato de terceiro. Já o recurso formulado pelo DER-PR objetiva a reforma da sentença, ao argumento de que o condutor do veículo não tinha habilitação para dirigir e que está circunstância foi o motivo determinante para o acidente. Que o condutor do veículo não havia feito auto-escola e que não houve negligência por parte deste departamento no tocante a manutenção da pista e de que não havia advertência no local do acidente. Alega que o acidente ocorreu à luz do dia e que estava asfaltado o local do acidente, bem como a pista estava seca. Assevera que no boletim de ocorrência consta a declaração acerca de uma advertência de curva e que havia outras placas indicando que rodovia se encontrava em obras. Tece comentários sobre a ausência de nexo causal, citando doutrina. Quanto ao pensionamento mensal, alega não ser razoável a fixação judicial. Que não é necessária devolução das despesas médicas e que o dano moral arbitrado é muito elevado. Por fim, afirma que os juros devem ser aplicados a partir da data do trânsito em julgado e não da data do evento. Os recursos foram recebidos (f. 364), com apresentação das contrarrazões (f.367/381) e parecer do Ministério Público (f. 382/387). As contrarrazões do DER constam às (f. 389/392). Nesta instância, a Procuradoria Geral da Justiça requereu a degravação dos depoimentos, pedido que foi indeferido (f.422), com nova manifestação da PGJ às f. 431/433, com novo indeferimento às f.436/438. Em seguida a PGJ opinou pela confirmação da sentença e desprovimento de ambos os recursos. É o relatório. Conheço do reexame necessário, visto que a decisão foi proferida contra Autarquia (art. 475, I, do CPC) e também pela superação do valor disposto no parágrafo 2º do referido dispositivo. Para qualificar juridicamente o instituto jurídico que deve ser considerado no caso, dispõe o art. 37, § 6º, da CF, que:
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"Art. 37 - A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...)
§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa."
Além deste dispositivo, dispõe o art. 1º, § 3º, do Código Brasileiro de Trânsito:
"Art. 1º O trânsito de qualquer natureza nas vias terrestres do território nacional, abertas à circulação, rege-se por este Código. (...)
§ 3º Os órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito respondem, no âmbito das respectivas competências, objetivamente, por danos causados aos cidadãos em virtude de ação, omissão ou erro na execução e manutenção de programas, projetos e serviços que garantam o exercício do direito do trânsito seguro."
Portanto, como no caso trata-se de ação indenizatória movida em razão de obras que foram feitas em rodovia no interior do Estado (Rodovia Estadual PR-471), local em que teria ocorrido o acidente que ceifou a vida de duas pessoas, aplicável no caso o instituto da responsabilidade objetiva, sobretudo porque "Em todo caso, o hermeneuta usa, mas não abusa da sua liberdade ampla de interpretar os textos; adapta os mesmos fins não previstos outrora, porém compatíveis com os termos das regras positivas." (MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito. 19ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 127.)" A qualificação do instituto jurídico de acordo com o texto legal, no caso focado em qualificar se se trata de subjetiva ou objetiva a responsabilidade, tem relevância no caso em apreço, visto que terá consequências na incidência de outras disposições. Em outras palavras: não pode o juiz simplesmente escolher qual o instituto jurídico incidente na espécie, se a lei assim já a definiu.
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Se o Direito não se compõe apenas de um dogma, mas sim da integração de normas, a cautela em não abusar da interpretação é fundamental. A doutrina e a jurisprudência, não se desconhece, tem aceito a tese de que a responsabilidade civil por omissão é sempre subjetiva, e esta Câmara, com minha concordância, tem assim julgado. No entanto, neste caso, a lei predefine a responsabilidade do ente público como objetiva, mesmo nos casos de omissão. Não há espaço para interpretação, sob pena de decisão contra legem, sobretudo porque não se trata de texto defeituoso, mas sim de disposição clara, em que a interpretação não tem sentido, haja vista que a exegese tem espaço quando a expressão ou frase não é precisa, lúcida, escorreita, sendo necessária a intervenção do intérprete para buscar a exata definição do que dispõe a norma. Não se trata, igualmente, de um conceito legal indeterminado. Pelo contrário, a afirmação legal foi precisa, englobando as hipóteses de ação e omissão. No tocante a prova produzida, não poderia ser outra a decisão impugnada, visto que é contundente a prova no sentido de que o DER, efetivamente, omitiu-se de seu dever legal de manter a segurança da pista para o tráfego regular, porquanto segundo a prova oral colhida na instrução, não foram removidos os resíduos que estavam sobre a pista (poeira, pedra fina e pedregulhos), as quais, em razão de condições meteorológicas (chuvas durante a execução das obras em datas anterior ao acidente), geraram condições desfavoráveis para o tráfego seguro naquele local e, como conseqüência gerou o triste episódio em que vieram a falecer duas pessoas em acidente rodoviário. A sentença, no que pertine a prova, decidiu o seguinte:
"Trata-se de ação reparatória de danos calcada na responsabilidade civil oriunda do risco administrativo, positivado no artigo 37, § 6º, da Constituição Federal. A demanda também possui lastro no artigo 1º, § 3º, do Código de Trânsito Brasileiro, o qual dispõe que todos os órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito respondem objetivamente, no âmbito de suas competências, por danos causados aos cidadãos em virtude de ações, omissões ou erros na execução de
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seus programas e serviços. Tendo em vista a disposição especial contida no Código de Trânsito, se tornam inócuas discussões acerca da necessidade de eventual apuração de responsabilidade subjetiva no que se refere a comportamentos estatais omissivos, ainda que situados no âmbito do risco administrativo. Como conseqüência, toda e qualquer responsabilidade decorrente da competência do Departamento de Estradas de Rodagem (DER) deverá ser apurada objetivamente. DA CONDUTA DO DER. Considerando que aferição da contribuição da conduta do DER para a ocorrência do sinistro pode prejudicar todos os demais requisitos caracterizados da responsabilidade civil, este é o primeiro elemento que deve ser analisado. Os autores alegam que o fato crucial para a superveniência do sinistro foi a omissão do réu na remoção de pedriscos ou pedregulho então existentes sobre a faixa de rolamento da rodovia, na mão de direção pela qual trafegava a vítima. A existência destes pedregulhos sem dúvida contribuiria para a perda da aderência de um veículo em trânsito sobre a rodovia, fato suficiente para muito aumentar o risco de acidentes. Logo, é curial verificar se tais seixos encontravam-se soltos ao longo da pista, ou se o réu efetivamente havia cumprido seu dever legal e os removido. Em primeiro lugar, nota-se que o Geólogo CELSO CONSELVAM, então o gerente de obras e serviços do DER não excluiu de plano a possibilidade de liberação de material granular da superfície da auto-estrada, em decorrência de fortes chuvas ocorrida na noite anterior ao acidente. A fim de elucidar este ponto controvertido foi produzida prova testemunhal. A primeira testemunha ouvida no processo foi NATALINO GARCIA, indivíduo que reside em frente ao local do acidente: Que reside na Fazenda Trento desde o ano de 2000; que o acidente narrado ocorreu na frente do domicílio do depoente; que não chegou a presenciar o acidente; que no dia dos fatos, bem no início da manhã, foi avisado por um peão da fazenda, que o acidente ocorrido na PR 471, sendo que se dirigiu ao local e ainda encontrou as vítimas no veículo e realizou chamada para a policia; que acredita que o acidente ocorreu em virtude de uma derrapagem do veículo, na curva existente no local; que no dia anterior o DER estava fazendo reformas na pista e havia muitos pedregulhos decorrente destes serviços; que no momento em que chegou no local do acidente ainda pode visualizar esse pedregulhos; que confirma após o acidente, houve um varredura na pista, pelo DER, para retirar esses pedregulhos; [...] que não havia sinalização pedindo para que a velocidade fosse reduzida no local; [...] que após o acidente foi colocado uma placa, na curva onde ocorreu o acidente; [...]. NATALINO GARCIA, fl. 249. A seguir foi tomado o depoimento de GERCINDO ROBERTO DE OLIVEIRA, então vereador do Município de Catanduvas PR, que passou pelo local do acidente do mesmo dia, ao se dirigir para Município de Cascavel: [...] que ao passar pelo local do acidente, viu quando alguns funcionários do DER faziam uma varredura na pista, do lado direito de onde ocorreu o acidente; que havia bastante pedra fina no local; [...] que não havia placa definitiva identificando as obras no início da rodovia; Outro testemunho pertinente para a questão este tomado por meio digital foi o de ALENIR AZEVEDO COUTINHO, policial militar que lavrou o boletim de ocorrência do sinistro discutido na
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demanda. Conforme seu relato, na área próxima ao acidente, a pista estava repleta de pedregulhos que não estavam devidamente sinalizados. Assim sendo, da análise desses depoimentos, percebe-se que a prova produzida é robusta no sentido de apontar que o DER efetivamente descumpriu seu dever legal de assegurar a segurança da pista, na medida em que não removeu dela as aludidas pedras, que geraram condições mais do que propícias para a ocorrência de acidentes como o notificado na inicial. Na hipótese, também não se verifica a existência de causas que rompam o nexo causal, tais como o fato do terceiro ou a culpa exclusiva da vítima. O réu afirmou que o então condutor do veiculo sinistrado, CÍCERO PEREIRA DE LIMA, não desenvolvia velocidade compatível com o trajeto, e também comprovou, durante a instrução, que este não possuía habilitação para dirigir veículo automotor. Com efeito, razão lhe assiste no que toca a assertiva de excesso de velocidade. Afirma-se isto com base nas fotos juntadas à fl. 61 dos autos, que indicam que o veículo capotou de forma violenta, afastando-se consideravelmente da faixa de rolamento. Data vênia, não nos parece que veículo transitando na velocidade permitida para o trecho (60 km/h) descreveria trajetória tão brutal para fora da pista e sofreria danos da monta indicada no boletim de ocorrência ao colidir com uma árvore, deixando-a a totalmente descascada no local do impacto, conforme ilustrado pelas fotografias de fl. 67. Mais além, a ausência da carteira de habilitação é fato gravíssimo, que lança sérias dúvidas acerca da perícia do então condutor CÍCERO ao volante. Não obstante, deve ser notado que a contribuição do fato de terceiro para a superveniência do dano deve ser análoga à culpa exclusiva da vítima. Deve ser de tamanha proporção que rompa completamente o nexo causal. Isto é, a contribuição para este nexo deve ser tanta que ainda que cumprido o dever legal do responsável objetivo, o prejuízo se realizaria de qualquer forma. Esta não é o caso desta demanda. Em que pese a velocidade desenvolvida por CÍCERO no momento do acidente, ou o fato de não estar habilitado para a direção de veículos, é possível afirmar com relativa segurança que os pedriscos não estivessem presentes na pista, o sinistro não teria ocorrido. Nota-se assim que o elemento essencial para a superveniência da fatalidade não foi a velocidade do veículo, ou a carência de habilitação do terceiro, mas sim, a presença de pedriscos da faixa de rolamento. Presentes objetos estranhos na pista que caracterizam o descumprimento do dever legal do DER, não se pode falar de culpa exclusiva da vítima, e muito menos de fato de terceiro. Isto é, embora se possa cogitar de contribuição de terceiro para o ocorrido, esta contribuição não foi exclusiva, o que não é suficiente para infirmar os deveres oriundos das disposições constitucionais e legais de responsabilidade objetiva. DOS DANOS. A petição inicial noticia que os autores sofreram danos de grande monta, tanto de cunho patrimonial, como pessoal. Com efeito, comprovado que o DER descumpriu seus deveres legais e considerando-se o respectivo regime jurídico de responsabilidade objetiva aplicável ao caso, verifica- se como certo seu dever de reparar os danos suportados pelos autores, advindos desta ilegalidade. DANOS EMERGENTES. Na hipótese constata- se que os autores sofreram danos emergentes de substancial monta
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experimentos pela vítima EDINEU e por sua família no custeio de seu tratamento e sobrevida após o evento fatídico. Com efeito, o autor efetivamente comprovou, por meio da documentação acostada à inicial os aludidos danos que compreendem despesas: boletim de ocorrência (fl.81); tomografia computadorizada (fl.93); UTI Móvel (fls. 94/95); transportes para realização de exames (fl. 96) e medicamentos (fls. 97/98). Ao tempo de sua realização, estas despesas totalizaram o montante de R$ 1.413,87 (mil quatrocentos e treze reais e oitenta e sete centavos, e deverão ser corrigidos monetariamente e acrescidas de juros de mora, com marco inicial na data do sinistro, em 16/07/2005, por se tratar de obrigação proveniente de ato ilícito, data qual também incidirá a correção monetária. DOS LUCROS CESSANTES. Os autores também ventilaram pretensão de lucros cessantes, consistentes na remuneração então auferida pela vitima EDINEU, e que não mais poderia ser percebida em decorrência de sua condição de tetraplégico. Comprovada a contribuição do DER para a enfermidade de EDINEU, e a conseqüente impossibilidade deste trabalhar e receber seus originais rendimentos, torna-se certo o dever da autarquia arcar com esses danos. No caso em tela, verifica-se que a pretensão perdeu em parte seu objeto, vez que a vítima EDINEU faleceu no decurso da lide, em decorrência das complicações provenientes de sua moléstia. Não obstante, a pretensão subsiste com relação aos seus filhos e seu cônjuge, na forma dos alimentos que receberiam da vítima se esta ainda fosse viva. Com relação aos filhos, verifica-se que o respectivo pedido merece guarida, já que na condição de menores de idade e absolutamente incapazes, gozam de presunção de dependência do autor EDINEU, fulminado pelo acidente. Quando este teve sua capacidade laboral ferida de morte pelo sinistro, sofreram considerável prejuízo em seu padrão de vida, já que a renda familiar foi substancialmente reduzida. Mas além, com o falecimento deste, foram privados de sua principal fonte de prestação alimentícia, razão pela qual o DER agora deverá assumir esse papel. Como conseqüência, fazem jus à percepção de pensão mensal até o momento em que cada qual completar 25 (vinte e cinco) anos de idade, faixa etária em que, em média, o cidadão brasileiro deixa o lar de seus pais para prover o próprio sustento e constituir família própria. Igual sorte merece a pretensão da então esposa do réu DALVINA RODRIGUES DE JESUS SILVA. Esta, ao tempo do acidente, desenvolvia atividades no seio do lar conjugal, cuidando dos afazeres domésticos e da criação dos filhos comuns. Ao contrário doa argumento pelo ilustre membro do parquet, esta situação, isto é, a existência de filhos e vida em comum, caracteriza, sem sobra de dúvidas, a dependência econômica, já que vive da renda do marido e implica na renuncia à própria educação e a sua inserção no mercado de trabalho, possibilidades progressivamente mais dificultosas com o avançar do tempo e da idade. Mais além, durante a instrução, o DER não logrou infirmar esta assertiva, isto é, a dependência econômica dos autores, em face da vitima EDINEU, de tal sorte que ela subsiste para todos os efeitos de direito, e assegura o acolhimento do pedido neste particular. Quanto ao requerimento de desconto das prestações previdenciárias do valor de eventual pensão arbitrada por este Juízo,
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estes absolutamente improcedem. Isto porque a relação previdenciária é autônoma, independente das relações civis, sendo própria do modelo de Estado Social encampado pela Constituição Federal de 1988. Tem regime de custeio próprio, e por ser patrocinada pelo Estado, é totalmente alheia às relações civis, como no caso em exame. É um mecanismo de redução de riscos sociais, baseado no princípio da solidariedade, e não no dever genérico de não lesar outrem que informa todo regime da responsabilidade civil e que foi violado no presente caso. No que se refere ao quantum da pensão, conforme a prova dos autos, fls. 82/85, nota-se que os rendimentos do autor seguiram a mesma trajetória do salário mínimo. Logo, este será o valor que será empregado para a fixação da pensão devida aos autores, mesmo porque, valores adicionais não foram comprovados. Entretanto, deve-se anotar que este valor não pode ser deferido integralmente, já que, ainda que estivesse vivo, o autor invariavelmente usaria no mínimo 1/3 (um terço) desta renda para custeio de sua própria subsistência. Como conseqüência, fixo a pensão em 2/3 (dois terços) do salário mínimo. As importâncias atrasadas deverão ser corrigidas monetariamente pelo INPC e acrescidas de juros de mora de 1% ao ano contados da data do ilícito em 16/07/2005 e do momento que cada pensão seria devida, o que faço com fulcro no artigo 398 do Código Civil. O marco final das pensões deve ser analisado com base no artigo 948, inciso II do Código Civil, dispositivo que determina que para fins de pagamento de prestações alimentícias devidas pela vitima deve ser analisada sua expectativa de vida. No momento de elaboração desta sentença, a expectativa de vida média do brasileiro é de 70 (setenta) anos de idade. Considerando que na data do acidente EDINEU contava com 39 (trinta e nove) anos de idade, ainda faltavam 31 (trinta e um) anos para que completasse 70 (setenta) anos. Assim sendo, o DER deverá pagar pensão mensal nos moldes supramencionados até 19 de julho de 2036, data em que a vítima atingiria os 70 (setenta) anos de idade. Esta pensão será rateada na razão de 50% (cinqüenta por cento) para o cônjuge sobrevivente e 50% (cinqüenta por cento) para os filhos, que dividirão sua cota em porções iguais. Os filhos receberão sua cota da pensão até a data que cada um complete a idade de 25 (vinte e cinco) anos, momento em que sua parte reverterá em favor de DALVINA RODRIGUES DE JESUS e do irmão que ainda não tiver atingindo essa idade limite. Após ambos os filhos alcançarem a mencionada idade limite, suas cotas-partes reverterão em prol exclusivo de DALVINA. A partir de então, a pensão vigorará até 19/07/2036, momento em que extinguirá o pleno direito. Na hipótese de DALVINA constituir um novo matrimônio ou união estável antes de seus filhos completarem 25 (vinte e cinco) anos de idade, sua presunção de dependência física afastada, e sua cota na pensão reverterá em favor da prole, até que estes alcancem a idade limite. Nesta conjectura, quando o primeiro irmão atingir a data final, o remanescente fará jus à sua cota, até o momento em que também completar 25 (vinte e cinco) anos, quando a pensão se extinguirá de pleno direito. DOS DANOS MORAIS ESTÉTICOS. Os autores também litigam por indenização referente a danos morais e estéticos sofridos por EDINEU. Sustentam que EDINEU sofreu danos morais
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originários dos transtornos decorrentes do acidente, bem como de sua condição de tetraplegia. Argumentam também que a vítima sofreu danos estéticos. Consistentes na substancial alteração de compleição física. Os demais autores por sua vez reclamam indenização por danos morais "por ricochete", resultantes do sofrimento experimentado ao ver ente querido passar pelos traumas descritos na exordial e também falecer decorrência deles. Com o falecimento da vítima durante a lide e a habilitação de seus sucessores, é incontestável que a pretensão EDINUE foi transmitida aos demais autores. No caso em tela, em que pese o pedido do autor mencionar danos morais e estéticos, entendo que se trata de partes de mesmo todo, que consiste na integralidade dos direitos da personalidade do individuo. O dano moral é concebido como toda e qualquer lesão aos direitos da personalidade, isto é, os direitos que decorrem da própria condição de ser humano, e que abrangem a integralidade física, psíquica, moral, entre outras. Compreendido neste arcabouço, situam-se tanto o direito ao corpo, a manutenção e respeito a sua integridade, bem como o direito de uma pessoa não ter sai psique indevidamente violada. Como o dano moral identifica toda lesão aos direitos da personalidade, um conjunto extremamente abrangente, que também engloba estética e beleza das formas humanas, entendo que a distinção entre danos morais e estéticos como institutos autônomos é inócua, pois, como já exposto, a idéia de dano moral já abrange a de dano estético a violação da beleza e simetria de uma pessoa a menos é claro, que a estética apresente expressão econômica autônoma (como no caso de moldes e artistas), caso em que, em verdade, se tratarão de danos emergentes e/ou lucros cessantes. Em suma, a estética é apenas uma entre outras das várias manifestações da personalidade, tais como a intimidade, a honra, a imagem, o decoro dentre tantas outras. A estética é conteúdo do abrangente continente que são os direitos da personalidade. Como o instituto do dano moral já tutela a estética humana, não há necessidade de separar um do outro por meio da idéia de dano estético. Não obstante, os argumentos dos autores não são impertinentes, pois servem para indicar a magnitude da lesão aos diversos direitos personalíssimos da vítima, ponto relevante para a fixação de eventual indenização. Na hipótese, verifico que as lesões sofridas por EDINEU foram substanciais, pois não só sofreu lesões corporais em decorrência do acidente, mas também ficou tetraplégico em decorrência delas. Não bastasse a dor dos ferimentos, também teve de enfrentar o sofrimento que resulta da sensação de estar encarcerado dentro de si mesmo, prisioneiro de seu próprio corpo, não podendo falar, se locomover, sequer expressar a angústia de estar em tal situação. Tendo em vista a monta do sofrimento experimentado por EDINEU, a capacidade econômica do ofensor o DER, autarquia estadual de notável solvência bem como a facilidade com que o infortúnio poderia ter sido prevenido, fixo a indenização por dano moral devida ao falecido no importe de R$ 100.000,00 (cem mil reais). Como no caso em tela seus sucessores se habilitaram regular e tempestivamente, ratearão essa indenização na proporção de 50% (cinqüenta por cento) para o cônjuge supérstite e 50% (cinqüenta por cento) para a prole, em partes iguais. No que toca aos danos morais sofridos pela esposa e filhos do
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réu, restam demonstrados de forma patente pelo conjunto probatório. Todos viram EDINEU se transformar, da noite para o dia, de um individuo saudável para praticamente um vegetal. Como se não bastasse, EDINEU ainda faleceu durante a lide, deixando uma viúva e crianças que não contarão com a presença do pai em fase criticas de seu desenvolvimento. Assim sendo, considerando a monta de sofrimento experimentado por EDINEU, a capacidade econômica do ofensor, bem como a facilidade com que o infortúnio poderia ter sido prevenido, fixo a indenização devida no importe de R$: 80.000,00 (oitenta mil reais) para cada um dos autores sobreviventes. (sic)"
O ponto crucial que merece análise mais profunda é sobre a aplicação do art. 944 do Código Civil no caso em exame. É fato incontroverso que a pista estava suja e que logo após o acidente foi feita uma varredura para limpar o local. Mas também foi muito bem ponderado que o veículo, diante do fato de que capotou e foi parar muito além da pista, além de sua destruição aparente, são causas reveladoras da alta velocidade que era desenvolvida pelo condutor no momento do acidente. Um veículo transitando em baixa velocidade poderia sofrer um acidente em razão das más condições da pista, mas não na proporção ocorrida no caso. As fotos anexadas às f. 67/69 demonstram a destruição do veículo, com danos de grandes proporções. Não foi, com certeza, um acidente ocorrido em baixa velocidade. Porém, em que pese o esforço da sentença na tentativa de aplicação do dispositivo acima citado, a alta velocidade, assim como a ausência de habilitação, segundo entendimento predominante, não pode ser considerada como causa primária, culpa exclusiva ou como culpa concorrente, para efeito de isenção ou amortização do dano. Apesar de a sentença ter mencionado que as circunstâncias do acidente (falta de habilitação associada à alta velocidade) são causas que servem para atenuar a indenização, com base no art. 944, parágrafo único, do Código Civil, o fato é que a sentença qualificou a responsabilidade como sendo objetiva, inclusive com menção ao art. 1º, § 3º, do CTB, ou seja, aquela que se caracteriza com a demonstração de três requisitos: conduta (ação ou omissão),
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dano e nexo de causalidade, não sendo exigido, portanto, a demonstração da culpa do agente. Pela expressão independentemente de culpa, se faz necessáriO para que haja obrigação de reparar o dano, a demonstração, pela vítima, do nexo de causalidade entre a conduta ilícita do autor do fato e o dano por ela sofrido. Nada mais. No entanto, o juiz aplicou a responsabilidade objetiva e atenuou a indenização, por existir, segundo sua versão, circunstâncias que minimizam a conduta do agente administrativo (falta de habilitação e alta velocidade), o que soa estranho, sobretudo porque a indenização, já que foi aplicada a responsabilidade objetiva, independe da análise de culpa. Na responsabilidade objetiva, repita-se, não se exige o pressuposto culpa para que reste configurada a obrigação de reparar, o que equivale a afirmar que, existindo dano, conduta e relação entre estes, tem-se configurada a responsabilidade da Administração Pública. Indefectível que existem causas que levam à irresponsabilidade, por eliminarem o nexo causal entre o dano e a ação ou omissão do agente, como é o caso da força maior e do caso fortuito, culpa exclusiva da vítima e, ainda, outro que atenua a dever de ressarcir, com é o caso da culpa concorrente da vítima, que tem na legislação expressa previsão legal no art. 945 do Código Civil:
"Art. 945. Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano."
Ou seja, a vertente que é extraída deste dispositivo pressupõe a "efetiva participação da vítima na causação do episódio que justifica o pedido de indenização, o que autoriza o abatimento proporcional da indenização devida pelo autor do dano à vítima ou a seus sucessores. (Código Civil Comentado por Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery, 4ª ed., RT, p. 634)"
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Da leitura dos termos da sentença, facilmente se concluiu que foi aplicada a redução proporcional dos danos, mas sem ter sido atribuído culpa pelo acidente ao autor da indenização. Neste ponto reside o equívoco da sentença. O que deveria ter sido considerado pela sentença, caso pretendesse atribuir culpa e, conseqüentemente, reduzir a indenização, é o art. 945 e não o 944 do CC, para acolhimento da tese de concorrência da vítima para a ocorrência do sinistro, visto que, segundo a doutrina: "O parágrafo único deste artigo adota a teoria da gradação da culpa, a influenciar o quantum indenizatório, mas somente possibilita sua diminuição diante de desproporção entre a gravidade da culpa e o dano. Esse parágrafo é inaplicável nas hipóteses de responsabilidade objetiva, em que não há apuração de culpa e, portanto, descabe a diminuição da indenização consoante critério aqui estabelecido. Desse modo, esse parágrafo é aplicável exclusivamente à responsabilidade civil subjetiva. (Washington de Barros Monteiro Curso de Direito Civil, 34ª ed., revista e atualizada por Carlos Alberto DAbus Maluf e Regina Beatriz Tavares da Silva, Saraiva, 2003, vol. 05, citado por Ricardo Fiúza in Novo CC Comentado, Saraiva, 5ª ed., p. 759)" A boa técnica recomenda que seja considerado fato concorrente da vítima, em lugar de redução dos danos porque algum ilícito administrativo tivesse influência no resultado, uma vez que o problema desloca-se para o terreno do nexo causal e não da culpa, quando a conduta da vítima, sem ter sido a causadora única do prejuízo, concorreu para o resultado, como já foi acima destacado. Neste segmento, prestadia a citação de Silvio Rodrigues, o qual, de forma pontual, assim afirma:
"São excludentes da responsabilidade a culpa da vítima, o fato de terceiro, o caso fortuito ou de força maior e, atuando exclusivamente no campo contratual, a cláusula de não indenizar. (...) Com efeito, se a culpa é exclusiva da vítima, inexiste, por definição, culpa do agente causador do dano, e obviamente não há relação de causa e efeito entre o ato culposo deste e o prejuízo, pois, repetindo, de acordo com a própria
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hipótese e por definição, a culpa foi da vítima e não do agente que deu causa ao prejuízo. (...) O evento danoso pode derivar de culpa exclusiva ou concorrente da vítima; no primeiro caso desaparece a relação de causa e efeito entre o ato do agente causador do dano e o prejuízo experimentado pela vítima; no segundo, sua responsabilidade se atenua, pois o evento danoso deflui tanto de sua culpa, quanto da culpa da vítima. (Direito Civil Vol. 04, Responsabilidade Civil, Saraiva, 1975, p. 168/169)"
Assim, de acordo com a doutrina, no caso de ser reconhecida a concorrência de culpa, indubitavelmente o juiz deverá dividir a indenização, apontando em que consiste a culpa, em suas três modalidades (negligência, imperícia e imprudência), para, a partir desta diretriz, dosar e repartir a indenização. Continua o Professor acima citado:
"Ordinariamente, em caso de concorrência de culpa, o julgador divide a indenização, e só impõe ao agente causador do dano o ônus de reparar por metade o prejuízo, deixando que a vítima arque com a outra metade. Assim, por exemplo, se na colisão entre um veículo de passeio e um caminhão, ambos trafegando em alta velocidade, aquele ficou praticamente destruído, a indenização pleiteada deve ser concedida por metade, ante a prova de culpa de ambos os motoristas. (obra citada, p. 170)"
O caso em exame não apresenta nenhuma destas hipóteses, tendo sido reduzido o valor indenizatório porque estaria o motorista em alta velocidade e sem habilitação, mas como foi frisado, ambas não se constituem como causa primária para o acidente ou mesmo para efeito de ser reconhecida a culpa concorrente. O excesso de velocidade gera culpa autônoma e não concorrência de culpas:
"O excesso de velocidade não implica o reconhecimento da culpa concorrente se nem foi a causa determinante do acidente nem do agravamento dos danos sofridos. Recurso especial conhecido e provido. (STJ Resp. 438925-CE, 3ª Turma, rel. Min. Ari Pargendler)"
A extensão das lesões sofridas pelo autor tem como causa o excesso de velocidade que o motorista do Fiat Uno imprimia, cabendo a ele e não ao DER
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responder por este fato, desde que o fosse comprovado de forma mais sólida. Afirma-se que se exige prova mais contundente porque a causa determinante do evento foram os pedregulhos espalhados na pista. Esta prova é consistente. Não se pode afirmar, com absoluta precisão, que o acidente teria ocorrido caso a pista estivesse limpa. Esta asserção fica no terreno hipotético, incapaz de gerar a conclusão de que tal conduta, que é reprovável, teria gerado ao acidente. Também não se pode afirmar que o acidente ocorreu porque o motorista do Fiat uno não tinha habilitação, visto que este fato, isolado, não é suficiente para gerar a responsabilidade civil ou para gerar a concorrência de culpas. Aliás, quanto a ausência de habilitação, cito o seguinte julgado:
"RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE CIRCULAÇÃO. INGRESSO EM ARTÉRIA PREFERENCIAL. DESPREZO AS CAUTELAS DEVIDAS. PREPONDERÂNCIA SOBRE EVENTUAL EXCESSO DE VELOCIDADE NA DETERMINAÇÃO DA CULPA. AÇÃO PROCEDENTE. APELO IMPROVIDO. PACÍFICO NA JURISPRUDÊNCIA QUE O PRECIPITADO INGRESSO EM VIA PRIORITÁRIA, SEM ADOTAR AS NECESSÁRIAS CAUTELAS LEGAIS, PREVALECE SOBRE EVENTUAL EXCESSO DE VELOCIDADE, NA CONFIGURAÇÃO DA CULPA, PARA FINS DE RESSARCIMENTO. ATO ILÍCITO. ACIDENTE DE AUTOMÓVEIS. MOTORISTA SEM HABILITAÇÃO POR SER MENOR. A FALTA DE HABILITAÇÃO PARA DIRIGIR, POR SI SÓ, NÃO CARACTERIZA A CULPA DO MOTORISTA, MUITO EMBORA ESTABELEÇA A PRESUNÇÃO DA IMPERÍCIA, CABENDO-LHE ÔNUS DA PROVA EM CONTRÁRIO. NECESSÁRIO, SEMPRE, EM TEMA DE RESPONSABILIDADE CIVIL, SEJA DESCRITA A CONDUTA CULPOSA DO NÃO HABILITADO A DIREÇÃO DO AUTOMÓVEL (AP. CIV. 27.818, DE BLUMENAU. DJE 7.523, DE 20/05/88. PAG. 15)." (TJSC - Apelação Cível n. 30.157, rel. Des. Volnei Carlin)"
Portanto, inexistente a relação de causalidade, não se pode impor a obrigação de reparar. De todo o exposto, não foi bem aplicado o disposto no art. 944, parágrafo único, do Código Civil, que trata da dosimetria da indenização, visto que é possível a redução do montante da indenização diante do grau de culpa do agente. Este dispositivo representa uma exceção ao princípio da reparação integral do dano. O critério da lei (art. 944 do CC) está assim disposto: "a indenização mede-se pela extensão do dano" (art. 944, caput). Em seguida, o
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parágrafo único expõe: "Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, eqüitativamente, a indenização". A regra geral é a do caput, ou seja, avalia-se o valor devido pelo infortúnio e fixa o juiz o montante indenizável No entanto, de acordo com o parágrafo único, é possível amortizar a regra do caput. Conclusão: somente com a aferição de culpa, mesmo que pequena, do agente, deve então ser fixada uma indenização parcial, reduzida eqüitativamente em consonância com a gravidade da culpa. Portanto, não se nega em momento algum que age com imprudência o condutor do veículo o qual, dirigindo em estrada em obras, sem sinalização adequada, imprime velocidade não compatível com o local, visto que a culpa, à semelhança do dolo, é uma atitude contrária ao dever. É, portanto, reprovável e punível. Não resta dúvida que o art. 944 acima citado não tem seu enfoque voltado para aplicação nos casos de responsabilidade civil objetiva e para indenização por dano material e não ao dano moral, visto que esta caracteriza-se com a demonstração da ação ou omissão, dano e nexo de causalidade, não sendo exigido, portanto, a demonstração da culpa do agente. Como discutir culpa nos casos em que a indenização independente de culpa? Aliás, as críticas ao art. 944 do Código Civil existem:
"Também o parágrafo único desse artigo, segundo nos parece, rompe com a teoria da restitutio in integrum ao facultar ao juiz reduzir, eqüitativamente, a indenização se houver `excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano'. Ao adotar e fazer retornar os critérios de graus da culpa obrou mal, pois o dano material não pode sofrer influência dessa gradação se comprovado que o agente agiu culposamente ou que há nexo de causa e efeito entre a conduta e o resultado danoso, nos casos de responsabilidade objetiva ou sem culpa. (Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial. 5º ed., São Paulo: RT, p. 13)"
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Segundo esta asserção, não se pode conceber que em determinado acidente em que o cidadão sofra um prejuízo, possa o juiz abrandar a indenização devida diante da maior ou menor gravidade da culpa do autor do dano, sob pena de se malferir o princípio da restitutio in integrum, que tem assento no art. 5º, inc. V e inc. X, da CF. Entretanto, apesar das críticas, a redução do dano e a responsabilidade civil objetiva não coexistem, de modo que não pode o juiz mitigar o valor da indenização, considerando todas as circunstâncias fáticas que envolvem o acidente com base neste dispositivo, o qual não tem incidência em caso de responsabilidade objetiva, porquanto a culpa do agente público não foi afastada, não tendo sido rompido o nexo causal e não foi atribuída culpa ao condutor do automóvel, mas sim aspectos infracionais no âmbito administrativo. Portanto, o permissivo do art. 944, parágrafo único, do CC, subvertendo o princípio de que a indenização mede-se pela extensão do dano, permite que o juiz investigue culpa para o efeito de reduzir o quantum debeatur, salvo nos casos de responsabilidade civil objetiva. E, finalmente, quanto ao reconhecimento de que a responsabilidade civil no caso é objetiva:
"1. Incide nos efeitos da responsabilidade civil, por força da teoria objetiva, o órgão público responsável pela conservação das estradas de rodagem, que não toma providência para sinalizar buracos existentes na pista" (TRF - 1ª Região, AC nº 96.01.44285-5/DF), 4ª Turma, DJ de 25/06/1999, relator Desembargador Federal Mário César Ribeiro). 2. Comprovado o nexo causal entre a conduta e o resultado danoso que reclama reparação, emerge inequívoca a obrigação da União relativa à recomposição dos danos experimentada pela autora, que tivera a perda irreparável de seu esposo, restando o dever do responsável minorar o sofrimento, com a recomposição dos danos materiais e morais experimentados. (...) (TRF 1ª Região, AC nº 2001.38.00.016866-7-MG, rel. Des. Federal Souza Prudente)"
Apesar de ter sido afastada a possibilidade de redução do valor da indenização, o que foi fixado na sentença, mesmo fosse aceita a tese de aplicação do art. 944 do CC, o valor se revela adequado para o caso em apreço.
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O dano moral, a despeito da impugnação feita pelo DER, foi bem ponderado, sobretudo porque o acidente ceifou a vida de Edineu Ribeiro da Silva, que era arrimo de família, em plena atividade laborativa. A vítima Edineu ficou tetraplégica, foi interditada em faleceu em seguida (f. 50/51, 53/54 e 70/71). Sua família, durante todo este processo, passou por inúmeras circunstâncias, para afirmar o menos, que os deixou em estado de choque ao ver seu pai naquela situação, dependente de cuidados médicos, sem movimentos, em estado vegetativo. Segundo a doutrina, o "Dano moral se trata de prejuízos que não atingem em si o patrimônio, não o fazendo diminuir nem frustrando o seu acréscimo. O patrimônio não é afectado: nem passa a valer menos nem deixa de valer mais". (...) "Há a ofensa de bens de caráter imaterial - desprovidos de conteúdo econômico, insusceptíveis verdadeiramente de avaliação em dinheiro. São bens como a integridade física, a saúde, a correção estética, a liberdade, a reputação. A ofensa objectiva desses bens tem, em regra, um reflexo subjectivo na vítima, traduzido na dor ou sofrimento, de natureza fisica ou de natureza moral". "Violam-se direitos ou interesses materiais, como se se pratica uma lesão corporal ou um atentado à honra: em primeira linha causam-se danos não patrimoniais, v.g., os ferimentos ou a diminuição da reputação, mas em segunda linha podem também causar-se danos patrimoniais, v.g., as despesas de tratamento ou a perda de emprego". (Inocêncio Galvão Telles Direito das Obrigações, Coimbra Editora, 6ª edição, p. 375)." Desta forma, a redução das indenizações feitas pela sentença não pode ser mantida, em razão da não incidência no caso da exceção prevista no art. 944, parágrafo único, do Código Civil, razão pela qual, no que pertine aos danos emergentes, o valor a ser ressarcido deverá ser de R$ 1.413,87, referentes às despesas com tomografia computadorizada (f. 93), transporte com UTI móvel (f. 94/95), transportes para realização de exames (f. 96) e medicamentos (f. 97/98). No que pertine aos lucros cessantes, em razão da condição de tetraplégico, cujo pedido perdeu seu objeto em parte, em razão do falecimento f. 19
do autor durante o trâmite processual, o valor de 2/3 de um salário mínimo em favor dos autores deve ser observado, visto que a sentença bem abordou esta questão ao considerar que a renda recebida pelo falecido seguiu "a mesma trajetória do salário mínimo", consoante documentos de f. 82/85. A sentença, destaca-se, também levou em conta o fato de que 1/3 do salário mínimo seria utilizado pelo falecido, caso vivo estivesse. Portanto, correta a decisão ao descontar esta parcela para efeito de fixação da verba. Finalmente, acertada a decisão também no que pertine ao termo final do pensionamento, em 19 de julho de 2036 para a esposa (desde que não se case ou venha a constituir nova união antes de seus, visto que neste caso, sua cota converterá em favor dos filhos), data em que a vítima completaria setenta anos, assim como, em relação aos filhos, até que estes completem vinte e cinco anos, quando sua parte converterá em favor da genitora. Quanto aos danos morais (e estéticos), mesmo fosse considerada a responsabilidade subjetiva, não poderia ser aplicada a regra da redução proporcional, haja vista que é pacífico o entendimento doutrinário acerca da dosimetria da indenização no caso de danos de ordem moral. Segundo a já citada doutrina de Regina Beatriz Tavares da Silva, Saraiva, 2003, vol. 05, citado por Ricardo Fiúza in Novo CC Comentado, Saraiva, 5ª ed., p. 759/760: "O dispositivo é, no entanto, insuficiente, já que seu caput se adapta somente ao dano material e não está adequado ao dano moral. (...) na reparação do dano moral não há ressarcimento, já que é praticamente impossível restaurar o bem lesado que, via de regra, tem caráter imaterial. O dano resulta, na maior parte das vezes, da violação a um direito de personalidade: vida, integridade física, honra liberdade, etc." Se o dano moral, diversamente do dano material, não tem caráter de ressarcimento, visto que jamais se alcança com o valor fixado a perda de uma vida, caso destes autos, não pode o juiz reduzir aquilo que nunca alcançou o êxito de reparação plena. O dano moral tem vinculação a uma compensação pelo direito afetado e nunca a equiparação com a perda, ou seja, mesmo que se arbitre o dano moral em valor estratosférico, jamais poderá ser considerado este f. 20
valor adequado para qualquer situação, sob pena de o Judiciário incorrer em indevido tabelamento de preços como, por exemplo, perda de um braço e igual a determinado valor, perda de uma vida é outro valor. Enfim, quando se trata de dano material, o cálculo refere-se exatamente ao desfalque sofrido no patrimônio da vítima, desde que comprovado e a indenização deve corresponder ao seu exato valor. Mas no caso de dano moral, a apuração do quantum indenizatório se complica, porque o bem lesado (a honra, o sentimento, o nome, etc.) não se mede monetariamente, ou seja, não tem dimensão econômica ou patrimonial. Casa indivíduo, dependendo da proximidade com a vítima, laços afetivos ou de parentesco, tem uma percepção sobre a perda. A perda atinge a todos, mas em diferentes graus emocionais, o que força ao juiz um arbitramento justo e compensatório, mas nunca, em hipótese algum, satisfatório do ponto de vista daquele que sofrerá com a ausência. Sobre a estimação do dano, imperioso citar a conclusão de Yussef Said Cahali:
"Os valores de afeição são, por natureza, personalíssimos e destituídos de economicidade; daí a necessidade de estimar-se a reparação a que deve corresponder, mediante arbitramento. (Dano Moral, RT, 2ª ed., p. 286)"
Desta forma, o valor da indenização por danos morais que foi por primeiro fixado, no importe de R$ 100.000,00 (cem mil) reais, deve ser mantido. Mantém-se, no entanto, a proporção de rateamento, em 50% para a esposa da vítima e 50% para os filhos. No que pertine ao dano moral em favor da esposa da vítima e em favor de seus filhos, tem-se que a fixação em R$ 80.000,00 para cada um dos sobreviventes foi elevada. A esposa e filhos receberão a indenização por morte do genitor no valor de R$ 100.000,00, em razão de sua morte durante o trâmite processual e em razão da transmissibilidade desta parcela aos herdeiros, como adiante se verá. Mas este valor, com, o devido respeito, está elevado.
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Logo, como em razão do falecimento da vítima, a indenização para os sobreviventes em R$ 30.000,00 (trinta) mil reais para cada um revela-se mais adequada. Explica-se: com tal verba, que tem caráter de compensação como visto acima, poderá a mãe, desde que administre esta quantia de forma responsável, manter uma boa condição de vida para sua prole, voltada para a alimentação adequada, educação, lazer, etc. Este valor, considerado o ganho do falecido à época do infortúnio, é bastante elevado. Receberá a família, antecipadamente, quantia que o falecido demoraria anos para receber, visto o reduzido valor de seu salário à época, lembrando sempre que não há dimensão econômica ou patrimonial precisas para a quantificação desta parcela da indenização. Aliás, destaca-se que nesta parte do recurso do DER, apesar de não se observar a necessária fundamentação para a revisão do valor, visto que as razões recursais insistem em poucas palavras que o dano não era razoável, em violação ao art. 514, inc. II, do CPC, ou seja, não foi impugnado de forma específica que o valor da indenização do dano moral deve ser arbitrado pelo juiz de maneira a servir, por um lado, de lenitivo para a dor psíquica sofrida pelo lesado, sem importar a ele enriquecimento sem causa ou estímulo ao abalo suportado e, por outro, deve desempenhar uma função pedagógica e uma séria reprimenda ao ofensor, a fim de evitar a recidiva, possível a redução porque mesmo no campo da argumentação fica difícil rebater um dano que deve ser arbitrado pelo juiz, ou seja, o Advogado, por mais que se esforce, não tem como impugnar e valorar de forma precisa o valor indenizatório. Por este motivo, apesar de resumido e conciso o recurso neste tópico, dele conheço, para reduzir o dano moral em favor da genitora e dos filhos. Quanto à compensação do pensionamento com o valor referente ao benefício previdenciário pago aos autores em decorrência do falecimento das vítimas, alegada pelo DER (f. 361), o apelo não logra êxito, visto que: "Consolidou-se a jurisprudência do STJ no sentido de que eventual benefício previdenciário não é compensável com indenização devida por
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danos decorrentes de ato ilícito. (STJ Resp. 251.433-RJ, 2ª Turma, rel. Min. Peçanha Martins, j. em 17 de novembro de 2005)" Também não logra êxito a afirmação de que o autor, por ter falecido, não poderia ter sido indenizado por danos morais, visto que há transmissão dos danos morais sofridos pelo autor, o qual faleceu antes do término do processo, aos herdeiros. O direito à indenização por danos morais é transmissível aos herdeiros. Apesar de os direitos personalíssimos terem como enfoque a pessoa, sendo indisponíveis e intransferíveis, conforme o art. 11 do CC: "Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária.", o Superior Tribunal de Justiça já se posicionou no sentido de admitir transferibilidade do dano moral, entendendo sobre a legitimidade dos herdeiros no recebimento desta parcela que compõe o valor total da indenização.. Confira-se, a este respeito:
"PROCESSO CIVIL. CIVIL. RESPONSABILIDADE. ACIDENTE. DANOS MORAIS. SUSPENSÃO DO PROCESSO. SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL. SENTENÇA PROLATADA. DESNECESSIDADE. TRANSMISSIBILIDADE. DIREITO PATRIMONIAL. POSSIBILIDADE. CULPA CONCORRENTE. RESPONSABILIDADE. EXCLUSÃO. IMPOSSIBILIDADE .MORTE DE CÔNJUGE DO QUAL A AUTORA ERA SEPARADA DE FATO. DANO MORAL. IMPROCEDÊNCIA. I. A morte da autora, no curso do processo, com a instrução finda, não obsta a prolação da sentença. II. A ação por danos morais transmite-se aos herdeiros da autora, por se tratar de direito patrimonial. (...) (STJ Resp. 647.562-MG, 4ª Turma, rel. Min. Aldir Passarinho Junior)"
No corpo do Acórdão foi citada outra decisão daquela Corte:
"DANO MORAL. MORTE DA VÍTIMA. TRANSMISSIBILIDADE DO DIREITO. O direito de prosseguir na ação de indenização por ofensa à honra transmite-se aos herdeiros. Recurso não conhecido. (REsp 440.626/SP, Rel. Ministro Ruy Rosado De Aguiar, 4ª Turma, julgado em 03.10.2002, DJ 19.12.2002, p. 373)"
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Cito, ainda, a seguinte decisão:
"O direito de ação por dano moral é de natureza patrimonial e, como tal, transmite-se aos sucessores da vítima (RSTJ - vol. 71/183)"
Doutrinariamente, invoca-se as seguintes ponderações:
"É preciso não olvidar que a ação de reparação comporta transmissibilidade aos sucessores do ofendido, desde que o prejuízo tenha sido causado em vida da vítima. (Maria Helena Diniz - Curso de Direito Civil Brasileiro, 7º volume - Responsalibilidade Civil. Saraiva, 1998, p. 143)"
"Embora intransmissíveis em sua essência, os efeitos patrimoniais dos direitos de personalidade são transmissíveis. A utilização dos direitos de personalidade, se tiverem expressão econômica, é transmissível. (Código Civil Comentado por Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery, 4ª ed., RT, p. 181)"
Quanto aos juros de mora e a correção monetária, tem razão o DER, visto que incide correção monetária sobre dívida por ato ilícito a partir da data do efetivo prejuízo (Súmula 43 do STJ) e os juros moratórios fluem a partir do evento danoso (Súmula 54 do STJ), em caso de responsabilidade extracontratual, com a ressalva de que tão-somente quanto ao valor da condenação por dano moral o termo inicial para a incidência da correção monetária é a data em que foi arbitrado o valor definitivo, ou seja, na sentença. E conclusão, a sentença fica mantida, ainda que por outros fundamentos, com pequena alteração na aplicação dos juros e correção monetária. Ante o exposto, voto pelo conhecimento de ambos os recursos e pelo provimento do recurso de Dieleffe Aparecida da Silva, Edson João da Silva e Dalvina Rodrigues de Jesus, para afastar a questão relativa a redução da indenização, mantendo o valor originalmente fixado, sem redução de 40%, haja vista que a responsabilidade no caso foi totalmente atribuída ao DER-PR e pelo provimento parcial do recurso do DER-PR, somente para alteração do valor da data inicial dos juros de mora e correção monetária, assim como para redução do dano moral, sem alteração da sucumbência, que foi bem dosada no caso e
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porque o acertamento da data da incidência dos consectários legais não afeta o ônus sucumbencial no caso, assim como não afeta a sucumbência a quantificação do dano moral, o qual fixou mantido, alterando-se somente seu valor. Acordam os membros integrantes da Primeira Câmara Cível, por unanimidade de votos, em conhecer de ambos os recursos, com provimento parcial de ambos, com alteração da sentença também em sede de reexame necessário. Presidiu o julgamento a Desembargadora Dulce Maria Cecconi, com voto, e dele participou o Desembargador Rubens Oliveira Fontoura. Curitiba, 11 de maio de 2010
Fernando Cés ar Zeni Juiz Substituto em 2º Grau - Relator
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