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AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 668.592-5 E N° 671.733-1, DE MARINGÁ - 3ª VARA CÍVEL AGRAVANTES:ALVEAR PARTICIPAÇÕES LTDA, JR EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA E DIRCEU GALDINO CARDIN AGRAVADO :ASSOCIAÇÃO BENEFICENTE E EDUCACIONAL AGOSTINIANA RECOLETA, JR EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA E ALVEAR PARTICIPAÇÕES LTDA RELATOR : DES. JOSÉ CARLOS DALACQUA AGRAVO DE INSTRUMENTO INTERPOSTO PELA DENUNCIANTE. AÇÃO DE USUCAPIÃO. DENUNCIAÇÃO DA LIDE JULGADA IMPROCEDENTE. HIPÓTESE DO ARTIGO 70, INCISO I DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. EVICÇÃO. EXISTÊNCIA. AMEAÇA DE PERDA DA POSSE E DO DOMÍNIO DO IMÓVEL POR DECISÃO JUDICIAL FUNDADA EM MOTIVO JURÍDICO ANTERIOR. DIREITO DE REGRESSO. GARANTIA. DECISÃO REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. AGRAVO DE INSTRUMENTO INTERPOSTO PELA DENUNCIADA. PREJUDICADO. 1. A denunciação da lide é modalidade de intervenção de terceiros que somente se aplica quando existir relação jurídica de garantia entre o denunciante e denunciado, sendo que ao denunciado cabe o dever de garantir eventual condenação do denunciante na ação em curso, na medida de sua reponsabilidade. 2. A denunciação da lide tem por fim o exercício do direito resultante da evicção, sendo a primeira ação na qual o denunciante pode ser evicto o momento oportuno para fazê- lo. 3. Diante da possibilidade de perda da coisa, por decisão judicial fundada em motivo jurídico anterior, gerando direito de regresso do adquirente contra o alienante, é plenamente possível a denunciação da lide ao alienante do bem, com fulcro no artigo 70, inciso I do Código de Processo Civil. I Relatório VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 668.592-5, da 3ª. Vara Cível de Maringá, em que são agravantes Alvear Participações Ltda, JR Empreendimentos Imobiliários Ltda e Dirceu Galdino Cardin e agravados Associação Beneficente e Educacional Agostiniana Recoleta, JR Empreendimentos Imobiliários Ltda e Alvear Participações Ltda. Agravo de Instrumento n° 668.592-5: Trata-se de recurso de Agravo de Instrumento em face de decisão de fls. 16/17-TJ, proferida nos autos de Ação de Usucapião n° 1568/2008, pela qual o magistrado de primeiro grau julgou improcedente o pedido de denunciação da lide formulado pelo requerido por se tratar de venda do imóvel através de cláusula contratual "ad corpus". Inconformado, o requerido interpôs o presente recurso de Agravo de Instrumento em cujas razões alega em suma que a denunciação da lide é uma espécie de intervenção de terceiros, obrigatória em determinadas situações sob pena de perecimento de eventual direito, que no presente caso a denunciação é obrigatória, que a sentença de mérito está
limitada ao cabimento ou não da denunciação da lide, que estão presentes os elementos expostos pelo artigo 70, inciso I do Código de Processo Civil, que a decisão foi "extra petita" ao pronunciar-se sobre a venda "ad corpus" do bem, pois invadiu matéria atinente à ação regressiva, prejudicando inclusive direito de ação do agravante protegido constitucionalmente, em virtude do que, requer a declaração de nulidade da decisão determinando ao juiz que julgue a denunciação da lide sem ultrapassar os limites da demanda e de acordo com o que dispõe a letra da lei. Ainda, aduz que não é aplicável a cláusula "ad corpus" frente ao direito de evicção parcial, que mencionada cláusula tem sua aplicação restrita ao momento de escrituração do referido negócio jurídico, que o agravante corre o risco de perda parcial de seu imóvel em razão de uma ação de usucapião contra ele promovida, que a cláusula "ad corpus" não persiste na hipótese de evicção já que neste caso os danos causados ao adquirente devem ser ressarcidos, sob pena de enriquecimento sem causa do alienante/denunciado e que é plenamente possível a interposição do presente na forma de instrumento, uma vez que presentes lesão grave e de difícil reparação. Ao final pugna pela concessão do efeito suspensivo ao presente, bem como, que seja conhecido e provido o presente Agravo de Instrumento. (fls. 02/11-TJ) O efeito suspensivo foi negado às fls. 311/313-TJ. O juízo "a quo" prestou informações às fls. 318-TJ. O agravado JR Empreendimentos Imobiliários Ltda apresentou contra-razões às fls. 320/324-TJ. Os autos foram encaminhados à Douta Procuradoria Geral de Justiça, cujo representante legal manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do recurso. (fls. 330/333-TJ)
Agravo de Instrumento n° 671.733-1: Trata-se de recurso de Agravo de Instrumento em face de decisão de fls. 11/12-TJ, proferida nos autos de Ação de Usucapião n° 1568/2008, pela qual o magistrado de primeiro grau julgou improcedente o pedido de denunciação da lide formulado pelo requerido por se tratar de venda do imóvel através de cláusula contratual "ad corpus", condenando o denunciante ao pagamento dos honorários advocatícios devidos ao procurador da denunciada no montante de R$ 700,00. Inconformada, a denunciada interpôs o presente recurso de Agravo de Instrumento em cujas razões alega em suma que houve um equívoco grave na fixação de honorários de sucumbência, que o valor da verba de sucumbência é irrisória, dada a complexidade da causa, o zelo do profissional, bem assim o poder econômico da agravada, que foi aplicado de forma incorreta o artigo 20, §4° do CPC, tendo em v ista que o magistrado desconsiderou por completo o valor da causa, que é pacífico o entendimento dos tribunais pátrios no sentido de que, não havendo condenação, os honorários devem ser calculados com base no valor da causa, que os mesmos foram erroneamente fixados abaixo do mínimo de 10% sobre referido valor, que o valor da verba honorária deve ser majorado para R$ 15.000,00 e o que corresponderia a aproximadamente 5% do valor do valor atribuído à denunciação da lide. Ao final prequestiona a matéria e pugna pelo conhecimento e provimento do presente recurso. (fls. 02/09-TJ) Foi determinado o apensamento destes autos ao recurso de Agravo de Instrumento n° 668.592-5 para julgamento conjunto em razão da existência de prejudicialidade entre eles. (fls. 188/189-TJ) Os autos foram encaminhados à Douta Procuradoria Geral de Justiça cujo representante legal manifestou-se também pelo
conhecimento e não provimento do presente recurso. (fls.197/200-TJ) É o breve relatório. Decido. II VOTO E SEUS FUNDAMENTOS Presentes os pressupostos de admissibilidade, merecem seguimento os presentes recursos.
Agravo de Instrumento n° 668.592-5: O cerne da discussão é a possibilidade ou não de denunciação da lide no presente caso.
A denunciação da lide é modalidade de intervenção de terceiros que somente se aplica quando existir relação jurídica de garantia entre o denunciante e denunciado, sendo que ao denunciado cabe o dever de garantir eventual condenação do denunciante na ação em curso, na medida de sua responsabilidade.
Partindo da premissa que a denunciação da lide tem a ver com garantia, com ressarcimento, é possível afirmar que tal instituto equivale a uma ação de regresso antecipada para a hipótese de sucumbência do denunciante, admitida em virtude do princípio da economia processual.
Acerca do tema, importante mencionar os ensinamentos do doutrinador Fredie Didier Jr.1: "Denunciar a lide a alguém não é senão trazer esse alguém para o processo, por força de garantia prestada, ou em razão de direito regressivo existente em face dessa pessoa; aproveita o denunciante do mesmo processo para exercer a ação de garantia ou a ação de regresso em face do denunciado; visa, pois, a dois objetivos: vincular o terceiro ao quanto decidido na causa e a condenação do denunciado à indenização."
E, o artigo 70, inciso I do Código de Processo Civil preceitua que:
"Art. 70. A denunciação da lide é obrigatória: I ao alienante, na ação em que terceiro reivindica a coisa, cujo domínio foi transferido à parte, a fim de que esta possa exercer o direito que da evicção lhe resulta;" (Grifei)
Dessa forma, é possível concluir que a denunciação da lide tem por fim o exercício do direito resultante da evicção, sendo a primeira ação na qual o denunciante pode ser evicto o momento oportuno para fazê-lo. Resta analisar, portanto, se no presente caso o denunciante possui ou não o mencionado direito de evicção. Senão vejamos, a evicção pode ser conceituada como a perda da posse ou domínio do bem adquirido em virtude de decisão judicial fundada em motivo jurídico anterior à aquisição do bem discutido. Acerca da evicção o doutrinador Sílvio de Salvo Venosa leciona2: "A evicção significa, portanto, a perda em juízo da coisa adquirida (ou em situação assemelhada, (...)), isto é, a perda da coisa pelo adquirente em razão de uma decisão judicial. Tratando-se de uma garantia, o alienante é responsável pelos prejuízos em razão de ter transferido um "mau" direito, isto é, um direito viciado ou alheio." (Grifei) O ora agravante efetuou a compra de um imóvel de propriedade de JR Empreendimentos Imobiliários Ltda em data de 07.03.2008 (fls. 243-TJ), sendo que em data de 05.11.2008 (fls.23-TJ) foi-lhe proposta ação de usucapião por Associação Beneficente e Educacional Agostiniana Recoleta. Dessa forma, tem-se que o domínio e a posse do ora agravante está sendo ameaçado por terceiro, correndo o mesmo perigo de perdê-lo em face de decisão judicial. É possível concluir, então, que existe sim direito de evicção no caso em tela, havendo responsabilidade por parte do alienante do imóvel, devendo o mesmo ser denunciado da lide a fim de garantir eventual ação de regresso do adquirente, ora agravante. Neste sentido é o entendimento dos tribunais pátrios: "AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE USUCAPIÃO. DENUNCIAÇÃO DÀ LIDE. EVICÇÃO. POSSIBILIDADE DA PERDA DO DOMÍNIO DO IMÓVEL. DIREITO DE REGRESSO CONTRA OS ANTIGOS PROPRIETÁRIOS. ARTIGO 70, INCISO i, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. DERAM PROVIMENTO AO AGRAVO." (Grifei) (TJRS. Agravo de Instrumento Nº 70017900028, Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Alzir Felippe Schmitz, Julgado em 29/03/2007) "Denunciação da lide-Ação Possessória -Admissibilidade - Artigo 70, l do CPC e 1.107 do CC - Nos contratos onerosos, pelos quais se transfere o domínio, posse ou uso, será obrigatório o alienante a resguardar o adquirente dos riscos da evicção, toda vez que se não tenha excluído expressamente esta responsabilidade -
Evicção é a perda da coisa, por força de decisão judicial, fundada em motivo jurídico anterior, que a confere a outrem, seu verdadeiro dono, com o reconhecimento em juízo da existência de ônus sobre a mesma coisa, não denunciado oportunamente no contrato - Recurso provido para deferir o pedido de denunciação da lide." (Grifei)
Sendo assim, diante da possibilidade de perda da coisa, por decisão judicial fundada em motivo jurídico anterior, gerando direito de regresso do adquirente contra o alienante, tem-se que o caso se amolda perfeitamente à hipótese trazida pelo artigo 70, inciso I do Código de Processo Civil, merecendo reforma a decisão ora agravada a fim de permitir a denunciação da lide ao alienante do bem. Neste sentido, é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: "Processual civil. Embargos de terceiros. Denunciação à lide. Cabimento. I - Os embargos de terceiro, por constituírem ação autônoma que visa eliminar a eficácia de ato jurídico emanado de outra ação, comportam denunciação à lide para resguardo de possível risco de evicção. II - Recurso especial conhecido e provido." (Grifei) (REsp 161.759/MG, Rel. Ministro ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/05/2005, DJ 13/06/2005 p. 287)
Diante do exposto a proposta de voto é pelo conhecimento e provimento do presente recurso. Agravo de Instrumento n° 671.733-1: Em razão do provimento do outro recurso de Agravo de Instrumento, resta prejudicada a análise do presente, uma vez que a insurgência do recorrente versa sobre a fixação da verba honorária pela sentença por ora combatida e integralmente reformada.
III - DISPOSITIVO ACORDAM os Desembargadores integrantes da Décima Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em conhecer e dar provimento ao recurso 668.592-5, bem como em conhecer e julgar prejudicado o recurso n° 671.733-1, nos termos do voto do relator. n° Participaram da sessão de julgamento os Excelentíssimos Desembargadores Roberto de Vicente, Presidente sem voto, Ruy Muggiati e Mário Helton Jorge. Curitiba, 16 de junho de 2010.
JOSÉ CARLOS DALACQUA Relator
-- 1 DIDIER JR. Fredie. Curso de Direito Processual Civil Teoria Geral do Processo e Processo de Conhecimento. 11ª. ed. 1 vol. Editora Podivm: Salvador/BA, 2009. p. 353.
-- 2 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos. 4ª. ed. 2 vol. Editora Atlas S.A.: São Paulo/SP, 2004. p. 581
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