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Acórdão
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1 SEGUNDA TURMA RECURSAL RECURSO INOMINADO Nº 10156-77.2014.8.16.0182. ORIGEM: 1º Juizado Especial Cível de Curitiba (Matéria Bancária). RECORRENTE: Cid José Jardim. RECORRIDO: Banco Bradesco S/A. RELATOR: Juiz Marco Vinícius Schiebel. EMENTA: INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – AUTOR QUE É SÓCIO DE PESSOA JURÍDICA – IMPEDIMENTO DE REALIZAÇÃO DE SAQUE DE VALOR DA CONTA EMPRESARIAL E NÃO CONCESSÃO DE TOKEN PARA MOVIMENTAÇÃO BANCÁRIA VIA INTERNET – QUANTIA DESTINADA À VIAGEM INTERNACIONAL FRUSTRADA – RÉ QUE NÃO LIBERA TOKEN E ACUSA AUTOR DE FRAUDE NA DOCUMENTAÇÃO DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA – AUSÊNCIA DE INFORMAÇÃO SOBRE A NECESSIDADE DE AUTENTICAÇÃO DA DOCUMENTAÇÃO RELATIVA A ALTERAÇÃO CONTRATUAL– FALHA DA RÉ – CONSTRANGIMENTO 2 VERIFICADO – INVIABILIDADE DE VIAGEM E DESCASO COM O CONSUMIDOR – DANO MORAL ARBITRADO EM R$ 4.500,00 (QUATRO MIL E QUINHENTOS REAIS) – ÍNFIMO – MAJORADO PARA R$10.000,00 (DEZ MIL REAIS) – APLICAÇÃO DO ENUNCIADO 12.13, “A” DA TRU/PR – DANO MATERIAL – AUSÊNCIA DE PROVA DE QUE O AUTOR DESPENDEU QUANTIA PARA RESERVA DE HOTEL E BILHETES AÉREOS – ART. 333, I, CPC - SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. Recurso do autor conhecido e parcialmente provido. I. Relatório. Trata-se de demanda de indenização por danos morais e materiais, ajuizada por Cid José Jardim em desfavor de Banco Bradesco S/A., em virtude da negativa de concessão de token para movimentação de conta bancária e constrangimento em agência bancária. 3 Aduz o autor, em síntese, ter adquirido a totalidade das quotas sociais da empresa denominada “CJardim Investimentos Ltda.”, ocasionando a 11ª alteração do contrato social. Esclarece que a referida empresa é correntista da ré, restando esta avisada sobre o fato de apenas o autor poder realizar operações bancárias na conta da empresa, sendo entregue, para tanto, documentação pertinente. Afirma ter avisado à gerência da agência da ré que necessitaria realizar a transferência da quantia de R$ 100.000,00 para a conta da “CJardim Investimentos Ltda.” e, em seguida, sacar o valor que seria destinado para viagem ao exterior agendada para 25.12.2014, sendo informado sobre a inexistência de óbice à operação. Contudo, assevera ter sido surpreendido ao transferir o montante e ser impedido de efetuar o saque, assim como negada a entrega de token para movimentação bancária via internet, impossibilitando a viagem, e ocasionando o cancelamento de passagem aérea e reserva de hotel. Ainda, teve conhecimento da autorização de movimentação bancária pelo ex-administrador da empresa, a qual não poderia ter sido realizada sem a sua anuência. Dessa forma, pretende a apresentação de carta de crédito de consórcio levantada pelo ex-administrador; compensação por danos morais e restituição do valor de R$ 14.348,85 relativo às 4 passagens aéreas e U$ 968,99, correspondente à reserva de hotel cancelada. Em contestação (seq. 19.1), a ré alega ausência de ilicitude da postura adotada, já que o autor encaminhou documento de alteração contratual sem os selos de autenticação provenientes dos cartórios civis, ao que apenas foi disponibilizada via e-mail a dita alteração; argumenta pela inexistência de provas da não realização do saque; preliminar de incompetência do Juizado considerando o pedido cautelar de exibição de documento; inexistência de dano moral e material; descabimento da inversão do ônus probatório e impugna o valor pretendido pelo autor assim como correção monetária sobre o mesmo. Realizada audiência UNA (conciliação instrução e julgamento), os autos foram conclusos para julgamento (seq. 20.1). Sobreveio sentença de parcial procedência da pretensão autoral para o fim de condenar a ré ao pagamento de R$ 4.500,00 a título de danos morais. Insatisfeito, o autor opôs recurso inominado (seq. 29.1), arguindo nulidade da sentença, por lhe ser tolhida a oportunidade de realizar prova testemunhal; afirma pela demonstração dos danos materiais e requer a majoração do quantum arbitrado para fins compensatórios. É o breve relatório. 5 II. Passo ao voto. Satisfeitos os pressupostos processuais viabilizadores da admissibilidade do recurso, tanto os objetivos quanto os subjetivos, deve ser ele conhecido. Nulidade por cerceamento de defesa Não se vislumbra a nulidade suscitada pelo autor, na medida em que não obstante o tumulto ocorrido em audiência, restou consignado em ata assinada pelas partes, que não tinham interesse na realização de outras provas, inclusive, não consta sequer que o autor tenha levado testemunha para ser ouvida, ao que perfeito o julgamento antecipado da lide, não prosperando a preliminar de nulidade aventada. Mérito No caso em análise a relação é de consumo, conforme os conceitos elencados nos artigos 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor. A questão discutida nos autos se debruça sobre a irregularidade da conduta da ré de não permitir que o autor realizasse saque, tampouco movimentação bancária pela internet, 6 da conta empresarial, diante do não cumprimento de formalidade sobre alteração de contrato social, restando incontroversa a ocorrência de ato ilícito, sendo objeto de recurso apenas os danos morais e materiais. Quantificação do dano moral Inegável é o direito do promovente ao ressarcimento pelos danos sofridos, já que a rigor do disposto nos artigos 186 e 927 do Código Civil, aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. E aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Isso posto, constata-se a falha na prestação do serviço por parte do réu, pois frustrou a realização de viagem internacional pelo autor; obstou-o de realizar movimentação bancária e não lhe concedeu token para facilitação desta última. Relativamente ao pedido de danos morais, convém ressaltar a lição do ilustre Orlando Gomes: “Dano moral é, portanto, o constrangimento que alguém experimenta em conseqüência de lesão em direito personalíssimo, ilicitamente produzida por outrem. (...) Observe-se, porém, que esse dano não é propriamente indenizável, visto como indenização significa eliminação do prejuízo e das 7 consequências, o que não é possível quando se trata de dano extrapatrimonial. Prefere-se dizer que é compensável. Trata-se de compensação, e não de ressarcimento. Entendida nestes termos a obrigação de quem o produziu, afasta-se a objeção de que o dinheiro não pode ser o equivalente da dor, porque se reconhece que, no caso, exerce outra função dupla, a de expiação, em relação ao culpado, e a de satisfação, em relação à culpa”. (in “Obrigações”, 11ª ed. Forense, pp. 271/272). Quanto à necessidade de comprovação, importante notar que a caracterização do dano moral decorre da própria conduta lesiva, sendo aferido segundo o senso comum do homem médio, conforme leciona Carlos Alberto Bittar: “(...) na concepção moderna da teoria da reparação dos danos morais prevalece, de início, a orientação de que a responsabilização do agente se opera por força do simples fato da violação (...) o dano existe no próprio fato violador, impondo a necessidade de resposta, que na reparação se efetiva. Surge “ex facto” ao atingir a esfera do lesado, provocando-lhe as reações negativas já apontadas. Nesse sentido é que se fala em “damnum in re ipsa”. Ora, trata-se de presunção absoluta ou “iure et de iure”, como a qualifica a doutrina. Dispensa, portanto, prova em contrário. Com efeito corolário da orientação traçada é o entendimento de que não há que se cogitar de prova de dano moral.” ( in “Reparação Civil por Danos Morais”, Editora Revista dos Tribunais, 2ª Ed., pp. 202/204) 8 Neste sentido tem-se que a má prestação de serviço da ré, sua desídia e inobservância de seus deveres legais frente ao consumidor, geraram danos morais ao autor, ultrapassando os meros dissabores do cotidiano. Diante de tudo que consta nos autos, verifica-se a verossimilhança das alegações do autor, diferente do réu, que não apresenta nenhum documento ou prova para desconstituir o direito do autor. Tem-se que a situação vivenciada ultrapassa o “mero aborrecimento”. Portanto, estando caracterizada a falha na prestação do serviço pelo recorrente, impõe-se o dever de indenizar. Para a quantificação do dano moral deve-se considerar as circunstâncias do caso concreto, o valor do negócio jurídico entre as partes, a necessidade de evitar o enriquecimento ilícito, bem como para promover a pretendida indenização e coibir a reiteração da conduta, tem-se que a importância de R$ 4.500,00 (quatro mil e quinhentos reais) é ínfima, devendo ser majorada para R$ 10.000,00 (dez mil reais), no entendimento deste relator e precedentes desta Turma Recursal, com aplicação do enunciado 12.13, “A”, da TRU/PR, devendo a sentença ser reformada neste ponto. 9 Prova do dano material e liquidez De outro norte, no que é referente ao dano material, a prova dos autos é insuficiente, isso porque o autor apenas apresentou bilhetes aéreos, que são hábeis para comprovar o agendamento da viagem e os hotéis que se pretendia estadia, sem demonstrar, contudo, o modo de pagamento e quem arcou com tais dispêndios. Perfeitamente possível que terceiro possa ter realizado o pagamento da transação, assim como o montante da reserva tenha sido, ainda que em parte, restituído, inexistindo qualquer recibo, extrato, demonstrando o adimplemento, sendo temerário excogitar a respeito destes. Conforme art. 333, I, do CPC, caberia ao autor comprovar o que efetivamente despendeu, o que não fez. Oportuno esclarecer que no caso da compra efetuada em dólar americano, pacífica a Jurisprudência no sentido de que a moeda deve ser convertida em reais, considerando o valor do dólar para conversão o do dia da compra, sendo que, não obstante a impossibilidade de liquidação de sentença no Juizado Especial Cível, simples cálculos seriam suficientes para se inferir o valor pretendido. Nesta toada, merece parcial provimento o recurso inominado, para o fim de majorar a condenação ao dano moral para R$ 10.000,00 (dez mil reais), com aplicação do Enunciado 12.13, “A”, da TRU/PR. 10 É este o voto que proponho. III. Do dispositivo. Diante do exposto, resolve esta Turma Recursal, por unanimidade de votos, conhecer do recurso e, no mérito, dar- lhe parcial provimento, nos exatos termos do voto. Considerando o parcial sucesso do recurso inominado, deve o autor arcar com as custas processuais e honorários advocatícios no percentual de 10% sobre o valor da condenação. O julgamento foi presidido pelo Juízo Dr. Marco Vinicius Schiebel, com voto, e dele participaram os Juízes Dr. Marcelo de Resende Castanho e Dra. Giani Maria Moreschi. Curitiba, 09 de abril de 2015. Marco Vinícius Schiebel Juiz Relator
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