Ementa
ATRASO NA ENTREGA DE IMÓVEL. COBRANÇA INDEVIDA. TAXA DE CONDOMÍNIO ANTES DA ENTREGA DA CHAVE. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL DO CONSUMIDOR. INOCORRÊNCIA. DEVOLUÇÃO EM DOBRO DO PERÍODO EM QUE RESTOU CONSTATADA MÁ-FÉ, APÓS, DEVOLUÇÃO SIMPLES. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. RECURSO DA RECLAMADA DESPROVIDO. RECURSO DO RECLAMANTE PARCIALMENTE PROVIDO. Reclamante relata, em síntese, que celebrou contrato de promessa de compra e venda de imóvel com a reclamada; que a entrega do imóvel estava prevista para 30 de setembro de 2.0105, mas recebeu as chaves somente em novembro de 2014. Entretanto, no período entre a conclusão da obra prevista contratualmente e a entrega efetiva do imóvel, foi obrigado a arcar com despesas a título de taxas condominiais; pleiteia a devolução em dobro dos valores pagos indevidamente e indenização por danos morais. Sentença julgou parcialmente procedente o pedido e condenou a reclamada ao pagamento de R$ 8.541,18 referente a devolução em dobro das taxas condominiais cobradas anteriormente à entrega das chaves, o que efetivamente teria acontecido em 05.06.2013. Insurgência recursal de ambas as partes. O recurso da reclamada defende que a entrega do empreendimento e a constituição do condomínio ocorreu na data de 26.11.2011, e que em 29.12.2011 foi emitido o Habite-se e de acordo com a cláusula 19 do contrato de promessa de compra e venda, o recorrido se obrigou ao pagamento de todas as taxas e despesas de condomínio a partir da data de conclusão da obra (habite- se); que o atraso na entrega das chaves para o autor após a entrega do empreendimento se deu por culpa do reclamante, que quedou-se inadimplente e optou por efetuar o pagamento parcial do valor das chaves em juízo. Alega que a ausência de má-fé descaracteriza a devolução em dobro. Pugna pela improcedência da demanda. O Recurso do reclamante sustenta que não recebeu o imóvel no momento em que as chaves foram depositadas em juízo (05.06.2013), mas sim na data em que as chaves foram liberadas à parte (novembro de 2014), pugna pela restituição dos valores em dobro das taxas condominiais assumidas no período de 10.11.2012 à 10.08.2014, requer ainda a condenação da reclamada ao pagamento de indenização por danos morais. É o relatório. Passo ao voto. a) Das taxas condominiais. Primeiramente, há de se observar que trata-se de uma relação consumerista, pois as partes enquadram-se nos conceitos de consumidor e fornecedor constantes nos artigos 2º e 3º do código de defesa do consumidor. Portanto, deve ser invertido o ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC. Se a reclamada deu causa ao atraso da obra, tem a responsabilidade de arcar com os prejuízos materiais e morais sofridos pela reclamante em decorrência do atraso, nos termos do art. 12 do CDC. A questão do atraso na entrega do imóvel não é o foco principal da presente ação, haja vista que a lide versa tão somente sobre as cobranças indevida das taxas condominiais, no período em que o imóvel não estava na posse do reclamante. Consta nos autos que o reclamante ajuizou outra ação contra a reclamada por entender indevida a cobrança de juros no período do atraso na entrega da obra, razão pela qual as chaves não foram entregues no momento da conclusão do imóvel – expedição do habite-se (dezembro de 2011). Naquela ação, as chaves foram depositadas em juízo em junho de 2013 (mov. 27.5), entretanto, foram efetivamente entregues ao reclamante somente em novembro de 2014 (mov. 1.9). Com relação às taxas condominiais, este relator já se posicionou em outras oportunidades que as taxas condominiais eram devidas pela construtora até a data do “habite-se”, entretanto, alinhando-se ao entendimento de outros membros da 1ª turma recursal, passou a entender que, salvo comprovação de que o consumidor deu causa à demora na entrega das chaves, a construtora deve arcar com as despesas condominiais até esta data. Veja-se: Recurso inominado. Ação de cobrança. Relação de consumo. Controvérsia acerca da responsabilidade pelo pagamento taxa condominial. Entrega das chaves. Obrigação da construtora de arcar com as despesas condominiais até a entrega das chaves, visto que não demonstrou o motivo da demora na entrega. Recorrente que não se desincumbiu do ônus de provar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, na forma do art. 333, II do CPC. Alegação de cerceamento de defesa. Inocorrência. (...) (TJPR - 1ª turma recursal - 0022885-09.2012.8.16.0182/0 - Curitiba - rel.: Eveline Zanoni de Andrade - - j. 02.03.2015)” e “Recurso Inominado. Ação de restituição de valor. Contrato de compra e venda de imóvel. Cobrança de taxa condominial. Devida somente após a entrega das chaves. Sentença mantida por seus próprios fundamentos. Recurso conhecido e desprovido. Ante o exposto, esta turma recursal resolve, por unanimidade de votos, conhecer e negar provimento ao recurso interposto, nos exatos termos deste voto. (TJPR - 1ª turma recursal - 0004237-10.2014.8.16.0182/0 - Curitiba - rel.: Fernanda de Quadros Jorgensen Geronasso - - j. 06.07.2015).
Diante do exposto, esta Turma Recursal resolve, por unanimidade de votos,
CONHECER e NEGAR PROVIMENTO ao recurso interposto por CENTRAL
VILLE EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA, CONHECER e DAR
PARCIAL PROVIMENTO ao recurso interposto por PAULO ROSALDO FERREIRA
XISTO nos exatos termos acima exposto
(TJPR - 1ª Turma Recursal - 0031049-55.2015.8.16.0182 - Curitiba - Rel.: JUIZ DE DIREITO DA TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS FERNANDO SWAIN GANEM - J. 14.07.2016)
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Acórdão
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Vistos. Recurso Inominado n.º 0031049-55.2015.8.16.0182 Origem: 13º Juizado Especial Cível de Curitiba Recorrentes: CENTRAL VILLE EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA e PAULO ROSALDO FERREIRA XISTO Recorridos: OS MESMOS Juiz Relator: Fernando Swain Ganem ATRASO NA ENTREGA DE IMÓVEL. COBRANÇA INDEVIDA. TAXA DE CONDOMÍNIO ANTES DA ENTREGA DA CHAVE. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL DO CONSUMIDOR. INOCORRÊNCIA. DEVOLUÇÃO EM DOBRO DO PERÍODO EM QUE RESTOU CONSTATADA MÁ-FÉ, APÓS, DEVOLUÇÃO SIMPLES. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. RECURSO DA RECLAMADA DESPROVIDO. RECURSO DO RECLAMANTE PARCIALMENTE PROVIDO. Reclamante relata, em síntese, que celebrou contrato de promessa de compra e venda de imóvel com a reclamada; que a entrega do imóvel estava prevista para 30 de setembro de 2.0105, mas recebeu as chaves somente em novembro de 2014. Entretanto, no período entre a conclusão da obra prevista contratualmente e a entrega efetiva do imóvel, foi obrigado a arcar com despesas a título de taxas condominiais; pleiteia a devolução em dobro dos valores pagos indevidamente e indenização por danos morais. Sentença julgou parcialmente procedente o pedido e condenou a reclamada ao pagamento de R$ 8.541,18 referente a devolução em dobro das taxas condominiais cobradas anteriormente à entrega das chaves, o que efetivamente teria acontecido em 05.06.2013. Insurgência recursal de ambas as partes. O recurso da reclamada defende que a entrega do empreendimento e a constituição do condomínio ocorreu na data de 26.11.2011, e que em 29.12.2011 foi emitido o Habite-se e de acordo com a cláusula 19 do contrato de promessa de compra e venda, o recorrido se obrigou ao pagamento de todas as taxas e despesas de condomínio a partir da data de conclusão da obra (habite- se); que o atraso na entrega das chaves para o autor após a entrega do empreendimento se deu por culpa do reclamante, que quedou-se inadimplente e optou por efetuar o pagamento parcial do valor das chaves em juízo. Alega que a ausência de má-fé descaracteriza a devolução em dobro. Pugna pela improcedência da demanda. O Recurso do reclamante sustenta que não recebeu o imóvel no momento em que as chaves foram depositadas em juízo (05.06.2013), mas sim na data em que as chaves foram liberadas à parte (novembro de 2014), pugna pela restituição dos valores em dobro das taxas condominiais assumidas no período de 10.11.2012 à 10.08.2014, requer ainda a condenação da reclamada ao pagamento de indenização por danos morais. É o relatório. Passo ao voto. a) Das taxas condominiais. Primeiramente, há de se observar que trata-se de uma relação consumerista, pois as partes enquadram-se nos conceitos de consumidor e fornecedor constantes nos artigos 2º e 3º do código de defesa do consumidor. Portanto, deve ser invertido o ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC. Se a reclamada deu causa ao atraso da obra, tem a responsabilidade de arcar com os prejuízos materiais e morais sofridos pela reclamante em decorrência do atraso, nos termos do art. 12 do CDC. A questão do atraso na entrega do imóvel não é o foco principal da presente ação, haja vista que a lide versa tão somente sobre as cobranças indevida das taxas condominiais, no período em que o imóvel não estava na posse do reclamante. Consta nos autos que o reclamante ajuizou outra ação contra a reclamada por entender indevida a cobrança de juros no período do atraso na entrega da obra, razão pela qual as chaves não foram entregues no momento da conclusão do imóvel – expedição do habite-se (dezembro de 2011). Naquela ação, as chaves foram depositadas em juízo em junho de 2013 (mov. 27.5), entretanto, foram efetivamente entregues ao reclamante somente em novembro de 2014 (mov. 1.9). Com relação às taxas condominiais, este relator já se posicionou em outras oportunidades que as taxas condominiais eram devidas pela construtora até a data do “habite-se”, entretanto, alinhando-se ao entendimento de outros membros da 1ª turma recursal, passou a entender que, salvo comprovação de que o consumidor deu causa à demora na entrega das chaves, a construtora deve arcar com as despesas condominiais até esta data. Veja-se: Recurso inominado. Ação de cobrança. Relação de consumo. Controvérsia acerca da responsabilidade pelo pagamento taxa condominial. Entrega das chaves. Obrigação da construtora de arcar com as despesas condominiais até a entrega das chaves, visto que não demonstrou o motivo da demora na entrega. Recorrente que não se desincumbiu do ônus de provar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, na forma do art. 333, II do CPC. Alegação de cerceamento de defesa. Inocorrência. (...) (TJPR - 1ª turma recursal - 0022885-09.2012.8.16.0182/0 - Curitiba - rel.: Eveline Zanoni de Andrade - - j. 02.03.2015)” e “Recurso Inominado. Ação de restituição de valor. Contrato de compra e venda de imóvel. Cobrança de taxa condominial. Devida somente após a entrega das chaves. Sentença mantida por seus próprios fundamentos. Recurso conhecido e desprovido. Ante o exposto, esta turma recursal resolve, por unanimidade de votos, conhecer e negar provimento ao recurso interposto, nos exatos termos deste voto. (TJPR - 1ª turma recursal - 0004237-10.2014.8.16.0182/0 - Curitiba - rel.: Fernanda de Quadros Jorgensen Geronasso - - j. 06.07.2015). Ressalta-se que o fato do consumidor ter ajuizado ação contra a reclamada por cobrança de juros abusivos, se deu por conta de atraso na entrega do imóvel, razão pela qual não lhe é imputável inadimplemento contratual. Desta feita, é devida a devolução dos valores que pagou a título de taxas condominiais antes da imissão na posse, ou seja, até novembro de 2014, portanto, o valor a ser devolvido é de R$ 8.812,22 (mov.1.6). b) Da devolução em dobro É entendimento deste relator que, quanto à aplicação do art. 42, parágrafo único do CDC, quis o legislador consumerista que o fornecedor que indevidamente cobrar o consumidor deva ser condenado à restituição em dobro da quantia. Portanto, não há previsão legal para a necessidade de observação de má-fé da conduta daquele que indevidamente realiza a cobrança, uma vez que o simples ato em si é penalizado por ser contrário aos ditames do CDC. Ressalta-se que este relator compactua com a melhor doutrina consumerista, representada por Claudia Lima Marques, nos dizeres da ilustre professora: Em vinte anos de CDC, a norma do parágrafo único do art. 42 tem alcançado relativa ou pouca efetividade. A explicação inicial é que talvez tivesse sido pouco compreendida. Mesmo sendo a única norma referente à cobrança indevida, em todas as suas formas, a jurisprudência ainda resiste a uma condenação em dobro do cobrado indevidamente. prevista como uma sanção pedagógica e preventiva, a evitar o fornecedor se “descuidasse” e cobrasse a mais dos consumidores por “engano”, que preferisse a inclusão e aplicação de cláusulas sabidamente abusivas e nulas, cobrando a mais com base nestas cláusulas, ou que o fornecedor usasse de métodos abusivos na cobrança correta do valor, a devolução em dobro acabou sendo vista pela jurisprudência, não como uma punição razoável ao fornecedor negligente ou que abusou de seu “poder” na cobrança, mas como um fonte de enriquecimento “sem causa” do consumidor. Quase que somente em caso de má-fé subjetiva do fornecedor, há devolução em dobro, quando o CDC, ao contrário, menciona a expressão “engano justificável” como a única exceção. Mister rever esta posição jurisprudencial. A devolução simples do cobrado indevidamente é para casos de erros escusáveis dos contratos entre iguais, dois civis ou dois empresários, e está prevista no CC/2002. No sistema do CDC, todo o engano da cobrança de consumo é, em princípio injustificável, mesmo o baseado em cláusulas abusivas inseridas no contrato de adesão, ex vi o disposto no parágrafo único do art. 42. Cabe ao fornecedor provar que seu engano na cobrança, no caso concreto, foi justificado”1. Todavia, tratando-se de matéria pacificada na segunda seção do STJ que a devolução em dobro prescinde de má-fé, este relator curva-se ao referido entendimento a fim de analisar a ocorrência ou não. A responsabilidade pelo pagamento de taxas condominiais é da promitente vendedora até a imissão da posse do promitente comprador. O fato da reclamada repassar esse custo para o consumidor constitui prática abusiva, posto que repassa ao consumidor pagamento que lhe era devido. Ademais constata-se que a reclamada deixou de entregar as chaves ao reclamante sob a justificativa de inadimplemento contratual do mesmo, entretanto, a primeira a descumprir o contrato foi a própria, pois deu causa ao atraso na entrega do imóvel. Assim, devida a restituição em dobro dos valores pagos pelo reclamante até momento que depositou as chaves em juízo (05.06.2013), e, após essa data, a restituição deve ocorrer na forma simples, haja vista que, nesse período, a entrega das chaves já não dependia mais da vontade da reclamada, mas de determinação judicial. c) Do dano moral Evidente o desgaste do reclamante que teve que arcar com custos com taxas de condomínio por aproximadamente três anos sem, no entanto, estar usufruindo do imóvel. Dano moral configurado. O arbitramento da indenização pelo dano moral deve sempre ter o cuidado de não proporcionar, por um lado, o enriquecimento ilícito do autor em detrimento do réu, nem por outro, a banalização da violação aos direitos do consumidor. Também deve ser considerada a dupla finalidade do instituto, qual seja, a reparatória em face do ofendido e a educativa e sancionatória quanto ao ofensor. Em face desses critérios, levando em conta ainda os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, arbitro a indenização por danos morais em R$ 3.000,00 (três mil reais). d) Da reforma da sentença Diante do exposto reformo parcialmente a sentença recorrida para o fim de: condenar a reclamada ao pagamento, na forma simples, dos valores pagos pelo 1 MARQUES, Claudia Lima. Comentários ao código de defesa do consumidor. 4.ª ed., RT, São Paulo, 2013, pág. 937. reclamante a título de taxas condominiais no período posterior a 05.06.213 até a efetiva entrega das chaves do imóvel ao reclamante (14.11.2014), quantia esta equivalente a R$ 4.541,63 (quatro mil, quinhentos e quarenta e um reais e sessenta e três centavos), com correção monetária pelo índice INPC desde a data dos desembolsos e juros de mora de 1% ao mês desde a citação; condenar a reclamada ao pagamento de R$ 3.000,00 (três mil reais) a título de danos morais, com correção monetária pelo índice INPC e juros de mora de 1% ao mês, nos termos do enunciado 12.13, “a” das Turmas Recursais do Paraná. Condenação da recorrente CENTRAL VILLE EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA ao pagamento dos honorários advocatícios fixados em 20% sobre o valor da condenação. Conforme previsão do art. 4º da lei estadual 18.413/2014, não haverá devolução das custas recursais. Dispositivo Diante do exposto, esta Turma Recursal resolve, por unanimidade de votos, CONHECER e NEGAR PROVIMENTO ao recurso interposto por CENTRAL VILLE EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA, CONHECER e DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso interposto por PAULO ROSALDO FERREIRA XISTO nos exatos termos acima expostos. Participaram do julgamento: os juízes Leo Henrique Furtado Araújo, Presidente com voto, e Aldemar Sternadt. Curitiba, 07 de julho de 2016 Fernando Swain Ganem, Juiz Relator.
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