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Acórdão
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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ 2ª TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS Autos nº. 0032199-17.2020.8.16.0014 Recurso Inominado Cível n° 0032199-17.2020.8.16.0014 6º Juizado Especial Cível de Londrina Recorrentes: THIAGO PEREIRA DA SILVA, JOÃO PEDRO TOSIN DA SILVA, IFOOD.COM AGENCIA DE RESTAURANTES ONLINE S.A., JESSICA CHAGAS DOMINGUES MENCK e GRACE KELLY DA CRUZ FERNANDES SAIKAWA Recorridos: GRACE KELLY DA CRUZ FERNANDES SAIKAWA, THIAGO PEREIRA DA SILVA, IFOOD.COM AGENCIA DE RESTAURANTES ONLINE S.A., JESSICA CHAGAS DOMINGUES MENCK e JOÃO PEDRO TOSIN DA SILVA Relator: Marcel Luis Hoffmann RECURSOS INOMINADOS. CONSUMIDOR. AÇÃO INDENIZAÇÃO. PEDIDO DE REFEIÇÃO REALIZADO PELO APLICATIVO IFOOD. TRANSAÇÃO POR ELE INTERMEDIADA. APLICATIVO INTEGRANTE DA CADEIA DE CONSUMO. LEGITIMIDADE E RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA EVIDENCIADAS. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. PIZZAS DERRUBADAS NO ASFALTO, COLHIDAS PELOS MOTOCICLISTAS ENTREGADORES E ENTREGUES AOS CONSUMIDORES DESTINATÁRIOS. PROVA POR VÍDEO E FOTOGRAFIAS NOS AUTOS. ALIMENTO IMPRÓPRIO PARA CONSUMO E INGERIDO. EXPOSIÇÃO DOS AUTORES A RISCO CONCRETO DE SAÚDE. AUTORA QUE TEVE DENTE QUEBRADO POR CONSUMIR PRODUTO COM PEDRA NO INTERIOR DE ALIMENTO. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. QUANTUM INDENIZATÓRIO QUE COMPORTA ELEVAÇÃO. DISTINÇÃO DE INDENIZAÇÃO ENTRE REQUERENTES CONFORME MAIOR EXTENSÃO DO DANO A CADA QUAL. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. RECURSO DA REQUERIDA DESPROVIDO. RECURSO DOS AUTORES PROVIDO. 1. Trata-se de ação de indenização por danos morais em que os autores sustentam que adquiriram duas pizzas pelo aplicativo da requerida, e, que elas chegaram reviradas e desmontadas. Afirmam que as pizzas foram derrubadas, pelos entregadores, no chão de asfalto, sendo posteriormente entregue para consumo, sem comunicar o ocorrido. Alega a autora Jessica, que quebrou um dente ao ingerir o alimento. Os pedidos foram julgados parcialmente procedentes (evento nº 63.1 e 65.1), para condenar a ré ao pagamento de danos morais no importe de R$ 3.000,00 à autora Jéssica e R$ 1.000,00 aos demais autores. Inconformadas recorrem as partes em evento de nº 76.1 e 78.1. 2. De início, afasto a impugnação ao pedido de justiça gratuita dos autores porquanto, devidamente intimados para comprovar sua renda, realizaram o preparo (evento. 106.1 e 106.2). 3. Preliminarmente insta esclarecer que a presente relação se enquadra como consumerista, porquanto se trata de prestação de serviço de delivery cujo acesso é possível apenas por meio de utilização de aplicativo disponibilizado pela ré. Nessa toada, de todo aplicável o princípio da aparência, consoante jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o que atrai não só a legitimidade passiva da requerida como também sua responsabilidade civil solidária pelos prejuízos causados ao consumidor. 4. No caso em concreto, a empresa recorrente é receptora dos pedidos realizados pelos consumidores, realizando a transferência de dados à restaurantes e demais empresas parceiras que fornecem o produto, sendo receptora de pagamentos. Por essa atividade de intermediação, aufere lucro. Nesse raciocínio, evidente que integra a cadeia de consumo sendo daí responsável solidário pelos atos e produtos comercializados. Nesse sentido: TJPR - 3ª Turma Recursal - 0011360-05.2020.8.16.0035 - São José dos Pinhais - Rel.: JUIZ DE DIREITO DA TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS FERNANDO SWAIN GANEM - J. 02.08.2021. 5. Outrossim, da detida análise dos documentos colacionados, tenho que os requerentes comprovaram a compra das pizzas pelo aplicativo da requerida (evento nº 1.15), bem como o pagamento, que posteriormente foi estornado ao requerente Thiago (evento nº33.9), e que houve a falha na prestação de serviços ao passo que o pedido de fato foi derrubado ao chão conforme demonstra indiscutivelmente o vídeo de evento 1.9, 1.10, além das fotos das condições que os alimentos foram entregues (evento 1.11 a 1.14) e ingeridas (evento 50.2) pelos autores. Ademais, a requerente Jéssica comprovou que foi necessária a realização de consulta junto ao dentista para reparo de dente quebrado (cf. evento nº1.17), portanto, desincumbindo-se do seu ônus da prova (CPC, 373, I). 6. A respeito, decidiu o STJ que: A aquisição de produto de gênero alimentício contendo em seu interior corpo estranho, expondo o consumidor à risco concreto de lesão à sua saúde e segurança, ainda que não ocorra a ingestão de seu conteúdo, dá direito à compensação por dano moral, dada a ofensa ao direito fundamental à alimentação adequada, corolário do princípio da dignidade da pessoa humana. Precedentes. 3. Hipótese em que se caracteriza defeito do produto (art. 12, CDC), o qual expõe o consumidor à risco concreto de dano à sua saúde e segurança, em clara infringência ao dever legal dirigido ao fornecedor, previsto no art. 8º do CDC. 4. Na hipótese dos autos, a simples comercialização de produto contendo corpo estranho possui as mesmas consequências negativas à saúde e à integridade física do consumidor que sua ingestão propriamente dita. (REsp 1876046/PR, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/08/2020, DJe 07/08/2020). Por igual: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS. AQUISIÇÃO DE PRODUTO (BISCOITO RECHEADO) CONTENDO CORPO ESTRANHO EM SEU INTERIOR (LARVAS). NÃO INGESTÃO. EXPOSIÇÃO DO CONSUMIDOR A RISCO CONCRETO DE LESÃO À SUA SAÚDE E SEGURANÇA. FATO DO PRODUTO. DANO MORAL CONFIGURADO. ACÓRDÃO EM HARMONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. SÚMULA 83/STJ. PRECEDENTES. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. NÃO OCORRÊNCIA. SÚMULA 326/STJ. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 489 E 1.022 DO CPC/2015 NÃO CONFIGURADA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. (AgInt no REsp 1901134/CE, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/03/2021, DJe 25/03/2021). CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. CONSUMIDOR. AGRAVO INTERNO NO APELO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. AÇÃO INDENIZATÓRIA. COMERCIALIZAÇÃO DE PRODUTO IMPRÓPRIO PARA O CONSUMO. BOLACHAS DO MESMO PACOTE DE OUTRAS CONTENDO CORPO ESTRANHO. LESÃO EXTRAPATRIMONIAL CONFIGURADA. PRECEDENTES. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 2. A eg. Terceira, no julgamento do REsp nº 1.644.405/RS (Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, j. 9/11/2017, DJe 17/11/2017) firmou o entendimento de que, a aquisição de produto de gênero alimentício contendo em seu interior corpo estranho, expondo o consumidor à risco concreto de lesão à sua saúde e segurança, ainda que não ocorra a ingestão de seu conteúdo, dá direito à compensação por dano moral, dada a ofensa ao direito fundamental à alimentação adequada, corolário do princípio da dignidade da pessoa humana. (AgInt no REsp 1908651/SC, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/03/2021, DJe 25/03/2021). 7. No caso, porque comprovada a falha na prestação de serviços, tornando o alimento impróprio para consumo, bem como a sua ingestão pelos autores, tenho que restou inequivocadamente configurado o abalo extrapatrimonial, pois os autores foram expostos a risco concreto à sua saúde, configurando ofensa ao direito à segurança alimentar. 8. No que concerne ao arbitramento da indenização, observadas as particularidades do caso concreto, reputo que a indenização fixada em R$ 1.000,00 aos autores Grace, Thiago e João não é compatível ao tipo de dano sofrido, não só pelo risco concreto à sua saúde como também à repulsa e nojo íntimo dos autores, ausente correlação com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Daí porque proponho a majoração da indenização para R$ 2.500,00 para cada um, o que confere compatível poder compensatório a eles frente ao tipo de dano sofrido, à exceção de Jéssica. 9. Em relação a Jéssica, considerando que comprovado por ela maior gravidade dos fatos, decorrente do incidente (quebra do dente) em comparação com os demais autores, necessitando inclusive intervenção por dentista para reparação do dano causado, majoro igualmente a condenação para R$ 4.500,00, valor mais adequado para a justa reparação frente ao caso concreto, melhor observando os princípios de razoabilidade e proporcionalidade. 10. Fixado definitivamente o valor da indenização nesta seara recursal, a correção monetária, pelo índice fixado na sentença, incidirá a partir da data deste julgado, na forma da Súmula 362 do STJ. 11. Recurso da promovida desprovido. 12. Recurso dos autos provido para majorar a indenização por danos morais, na forma da fundamentação. 13. Condeno a requerida ao pagamento de honorários de advogado em 20% sobre o valor atualizado da condenação (art. 55, Lei 9.099/95). Porque provido o recurso dos autores, isento-os do pagamento de honorários de advogado. Custas por todos devidas na forma da Lei Estadual 18.413/14, arts. 2º, inc. II e 4º, e Instrução Normativa nº. 01/2015 - CSJEs, art. 18. 14. Dou por prequestionados todos os dispositivos constitucionais e demais normas legais suscitadas pelas partes neste processo Ante o exposto, esta 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais resolve, por unanimidade dos votos, em relação ao recurso de JESSICA CHAGAS DOMINGUES MENCK, julgar pelo(a) Com Resolução do Mérito - Provimento, em relação ao recurso de GRACE KELLY DA CRUZ FERNANDES SAIKAWA, julgar pelo(a) Com Resolução do Mérito - Provimento, em relação ao recurso de JOÃO PEDRO TOSIN DA SILVA, julgar pelo(a) Com Resolução do Mérito - Provimento, em relação ao recurso de THIAGO PEREIRA DA SILVA, julgar pelo(a) Com Resolução do Mérito - Provimento, em relação ao recurso de IFOOD.COM AGENCIA DE RESTAURANTES ONLINE S.A., julgar pelo(a) Com Resolução do Mérito - Não-Provimento, em relação ao recurso de GRACE KELLY DA CRUZ FERNANDES SAIKAWA, julgar pelo(a) Com Resolução do Mérito - Provimento, em relação ao recurso de JOÃO PEDRO TOSIN DA SILVA, julgar pelo(a) Com Resolução do Mérito - Provimento, em relação ao recurso de THIAGO PEREIRA DA SILVA, julgar pelo(a) Com Resolução do Mérito - Provimento, em relação ao recurso de IFOOD.COM AGENCIA DE RESTAURANTES ONLINE S.A., julgar pelo(a) Com Resolução do Mérito - Não-Provimento nos exatos termos do voto. O julgamento foi presidido pelo (a) Juiz(a) Irineu Stein Junior, com voto, e dele participaram os Juízes Marcel Luis Hoffmann (relator) e Maurício Doutor. 26 de novembro de 2021 Marcel Luis Hoffmann Juiz Relator
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