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Acórdão
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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ 1ª TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS Autos nº. 0022138-68.2019.8.16.0035 Recurso Inominado Cível n° 0022138-68.2019.8.16.0035 1º Juizado Especial Cível de São José dos Pinhais Recorrente(s): GLOBO NISSAN PARANA COMERCIO DE VEICULOS LTDA, JORGE VICENTE SILVA, FLÁVIO LOPES BÚRIGO e DIOGO GUEDERT Recorrido(s): FLÁVIO LOPES BÚRIGO, DIOGO GUEDERT, JORGE VICENTE SILVA e GLOBO NISSAN PARANA COMERCIO DE VEICULOS LTDA Relator: Bruna Richa Cavalcanti de Albuquerque EMENTA: RECURSOS INOMINADOS. RESPONSABILIDADE CIVIL. ILEGITIMIDADE DA PESSOA JURÍDICA QUE NÃO ASSINOU A PEÇA PROCESSUAL QUE CONTÉM AS EXPRESSÕES AQUI DISCUTIDAS. INOCORRÊNCIA. PESSOA JURÍDICA QUE ERA A MANDANTE DOS PATRONOS QUE ATUAVA NA DEFESA DE SEUS INTERESSES. LEGITIMIDADE CONFIGURADA. ABUSO DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO, COM IMPUTAÇÃO AO AUTOR, ADVOGADO, DE CRIMES E FATOS LESIVOS A SUA HONRA. SITUAÇÃO QUE NÃO EXTRAPOLOU OS LIMITES DO DEBATE NOS AUTOS. IMUNIDADE PROFISSIONAL DO ADVOGADO QUE INCIDE NO CASO CONCRETO. INCIDÊNCIA DAS REGRAS EXTRAÍDAS DO ARTIGO 133, DA CRFB/88 E § 2º, DO ARTIGO 7º, DA LEI Nº 8.960/94. PESSOA JURÍDICA QUE NÃO ASSINOU A PEÇA PROCESSUAL. ADVOGADO QUE TEM LIBERDADE PARA ESCOLHER A MELHOR MANEIRA DE DEFENDER O CLIENTE. RESPONSABILIDADE CIVIL NÃO CONFIGURADA. SENTENÇA REFORMADA. Recurso da parte ré conhecido e provido. Recurso do autor prejudicado. RELATÓRIO Relatório dispensado nos termos do Enunciado n° 92 do FONAJE. VOTO Trata-se de ação de indenização por danos morais ajuizada por JORGE VICENTE SILVA em face de GLOBO NISSAN PARANÁ COMÉRCIO DE VEÍCULOS LTDA, FLÁVIO LOPES BÚRIGO e DIOGO GUEDERT. Sobreveio sentença de procedência, de condenou os réus ao pagamento de indenização por danos morais. Inconformadas, as partes interpuseram recurso inominado. Por um lado, os réus sustentaram preliminar de ilegitimidade da recorrente GLOBO NISSAN PARANÁ COMÉRCIO DE VEÍCULOS LTDA. No mérito, aduzem, em suma, que inexistem danos morais indenizáveis, e subsidiariamente, pugnam pela redução da indenização arbitrada. Por outro lado, o autor pleiteou o aumento do valor arbitrado de indenização por danos morais, com incidência de correção monetária desde a data da prolação da sentença e juros a partir do evento danoso (11/10/2018, quando foi protocolada a contestação na demanda em que ocorreu a ofensa. Pois bem. Preliminar: ilegitimidade de GLOBO NISSAN PARANÁ COMÉRCIO DE VEÍCULOS LTDA. Sobre a ilegitimidade da Globo, entendo que razão assiste à parte recorrente, considerando que as supostas ofensas foram proferidas pelos nobres Advogados constituídos e não diretamente pela Globo. Nada obstante a substanciosa tese aventada pela parte, o fato é que a parte é a mandante dos procuradores que agem em seu nome. Ademais, a extensão da responsabilidade pela peça processual é questão que versa sobre o merecimento do pedido, mas não é causa de extinção prematura do processo. Assim, verifica-se a legitimidade passiva ad causam também da pessoa jurídica. Preliminar rejeitada. Mérito: É incontroverso nos autos que os advogados FLÁVIO LOPES BÚRIGO e DIOGO GUEDERT, quando atuavam da defesa dos direitos de GLOBO NISSAN PARANÁ COMÉRCIO DE VEÍCULOS LTDA, nos autos do processo n. 0010427-03.2018.8.16.00 (em que o autor JORGE VICENTE SILVA litigava em causa própria, em face de corré GLOBO), subscreveram contestação em desfavor do autor, com os seguintes dizeres: “a Ré não tem dúvidas de que o contrato de locação de veículos apresentado pelo Autor, prevendo a cobrança de diária de R$500,00 por dia, bem como o recibo de pagamento apresentado no valor R$10.000,00, tratam-se de DOCUMENTOS SIMULADOS para o fim de dar foros de legalidade à sua ilegítima e criminosa pretensão. (...) Portanto, não há dúvidas de que o contrato de locação de veículo apresentado pelo Autor, bem como o recibo de R$10.000,00, são frutos de criminosa SIMULAÇÃO DE DOCUMENTOS.” (mov. 1.6 dos autos principais). A controvérsia reside em constatar se tais dizeres são aptos a gerar danos morais indenizáveis ao autor. Verifica-se que o caso em análise envolve questão tênue, pois sua solução encontra-se entre o limite da imunidade profissional do advogado e o excesso de exercício. É certo que o art. 133, da CFRB/88, e o § 2º, do artigo 7º, da Lei nº 8.906/94, garantem ao advogado imunidade profissional, por suas manifestações no exercício da profissão. Entretanto, tal prerrogativa não é absoluta, devendo ser exercida “nos limites da lei” e “sem prejuízos de sanções pelos excessos que forem cometidos”. Com efeito, já assente na jurisprudência que a imunidade do profissional de advocacia para o exercício de sua profissão não constitui salvo conduto absoluto para agir como bem entender, dirigindo ofensas a quem bem entender em manifesto excesso desinfluente ao debate da causa. Vale dizer, tal liberdade de atuação é limitada pela própria matéria objeto de discussão. No caso dos autos, entende-se que as alegações proferidas pelos recorrentes no âmbito da ação cível n° 0010427-03.2018.8.16.0035 ficou restrita ao exercício de retórica, dentro da medida necessária para a defesa dos interesses jurídicos de seus clientes, visando impugnar os documentos juntados pela parte autora, mas não no intuito de prejudicar ou ofender o requerente. Veja-se que a tentativa de impugnar os documentos juntados pela parte autora se encontra dentro do limite da matéria discutida no bojo daqueles autos que, com a desconsideração dos documentos, seria possível o indeferimento do pedido de danos materiais. Apesar do requerente ter considerado desagradáveis as afirmações deduzidas pelos requeridos, entendo que tais assertivas estão resguardadas pela imunidade conferida ao advogado. Além disso, o dano moral no presente caso não é presumido, ou seja, cabia ao requerente a comprovação de que sofreu abalos em decorrência das afirmações realizadas pelos requeridos que extrapolem o mero dissabor cotidiano, o que não aconteceu no caso. Aliás, nesse sentido é o entendimento desta Turma Recursal: “RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SUPOSTA INJÚRIA PRATICADA EM AÇÃO JUDICIAL QUE, POR SI SÓ, NÃO GERA O DEVER DE INDENIZAR. SITUAÇÃO QUE NÃO EXTRAPOLOU OS LIMITES DO DEBATE NOS AUTOS. IMUNIDADE PROFISSIONAL DO ADVOGADO QUE INCIDE NO CASO CONCRETO. INCIDÊNCIA DAS REGRAS EXTRAÍDAS DO ARTIGO 133, DA CRFB/88 E § 2º, DO ARTIGO 7º, DA LEI Nº 8.960/94. SENTENÇA MANTIDA. Recurso conhecido e desprovido”. (TJPR - 1ª Turma Recursal - 0000116-20.2020.8.16.0184 - Curitiba - Rel.: JUÍZA DE DIREITO SUBSTITUTO BRUNA RICHA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE - J. 11.11.2021) “RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SUPOSTAS INJURIAS E CALUNIAS PROFERIDAS EM AÇÃO JUDICIAL QUE, POR SI SÓ, NÃO GERAM O DEVER DE INDENIZAÇÃO. SITUAÇÃO QUE NÃO EXTRAPOLOU O DEBATE DOS AUTOS. IMUNIDADE PROFISSIONAL DO ADVOGADO. INCIDÊNCIA DOS ARTIGOS 133 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E 7º, § 2º, DO ESTATUTO DA OAB (LEI 8.960/94). SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO INICIAL MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. Recurso conhecido e desprovido”. (TJPR - 1ª Turma Recursal - 0010892-06.2019.8.16.0058 - Campo Mourão - Rel.: JUIZ DE DIREITO DA TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS NESTARIO DA SILVA QUEIROZ - J. 17.06.2021) Ademais, as assertivas constantes em peça jurídica, como regra, são de exclusiva responsabilidade daquele que a redige e assina, pois se trata da única pessoa com comprovado domínio acerca do conteúdo aposto em tal documento. Sobre o tema: “RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. DANO MORAL. INDENIZAÇÃO. ADVOGADO. VIOLAÇÃO AO ART. 535, DO CPC. INOCORRÊNCIA. I M U N I D A D E P R O F I S S I O N A L . E X C E S S O . 1. A inviolabilidade do advogado não é absoluta, estando adstrita aos limites da legalidade e da razoabilidade. 2. A responsabilidade daquele que escreve um documento e o torna público em um processo, atacando a honra de outrem, é de quem o subscreve, pouco importando se reproduz, ou não, declaração pública do cliente. (...) Recurso especial provido”. (STJ - REsp 988380/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 20/11/2008, DJe 15/12/2008). Neste caso, aliás, não restou demonstrada qualquer ingerência da parte em relação ao profissional, razão pela qual não se vislumbra conduta ilícita. A conduta ilícita é um dos requisitos da responsabilidade civil. Recurso da parte ré conhecido e provido e da parte autora prejudicado. CONCLUSÃO Diante do exposto, vota-se por conhecer do recurso da ré e lhe provimento, a fim de julgar improcedente o pedido formulado na petição inicial. Custas na forma da Lei 18.413/2014. Sem condenação em honorários advocatícios de sucumbência, uma vez que ao recorrido vencido não se impõe tal ônus, com fulcro no artigo 55 da Lei nº. 9.099/95. Ante o exposto, esta 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais resolve, por unanimidade dos votos, em relação ao recurso de GLOBO NISSAN PARANA COMERCIO DE VEICULOS LTDA, julgar pelo(a) Com Resolução do Mérito - Provimento em Parte, em relação ao recurso de JORGE VICENTE SILVA, julgar pelo(a) Com Resolução do Mérito - Não-Provimento, em relação ao recurso de DIOGO GUEDERT, julgar pelo(a) Com Resolução do Mérito - Provimento em Parte, em relação ao recurso de FLÁVIO LOPES BÚRIGO, julgar pelo(a) Com Resolução do Mérito - Provimento em Parte nos exatos termos do voto. O julgamento foi presidido pelo (a) Juiz(a) Melissa De Azevedo Olivas, com voto, e dele participaram os Juízes Bruna Richa Cavalcanti De Albuquerque (relator) e Nestario Da Silva Queiroz. 09 de junho de 2022 Bruna Richa Cavalcanti de Albuquerque Juiz (a) relator (a)
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