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Acórdão
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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ 2ª TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS Autos nº. 0007108-28.2021.8.16.0033 Recurso Inominado Cível n° 0007108-28.2021.8.16.0033 Juizado Especial Cível de Pinhais Recorrente(s): PAULO SERGIO RODRIGUES DA SILVA Recorrido(s): LOURIVAL JOSE DA SILVA Relator: Irineu Stein Junior RECURSO INOMINADO. MATÉRIA RESIDUAL. LOCAÇÃO COMERCIAL. RESTITUIÇÃO DE CAUÇÃO, COBRANÇA DE MULTA CONTRATUAL E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. NULIDADE DO PROCESSO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. NÃO ACOLHIMENTO. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015 QUE NÃO REPROZUIU A REGRA DO DIGESTO ANTERIOR. AQUIESCÊNCIA DO LOCADOR QUANTO A COMERCIALIZAÇÃO DO PONTO COMERCIAL. CONTRATO DE LOCAÇÃO COM O NOVO INQUILINO. TERMO DE QUITAÇÃO FIRMADO PELO LOCADOR. PRETENSÃO EM PEDIDO CONTRAPOSTO DE RECEBIMENTO DE VALORES POR RESCISÃO ANTECIPADA DO CONTRATO. INCOMPATIBILIDADE. TERMO DE QUITAÇÃO SEM RESSALVA IMPEDE A COBRANÇA DE EVENTUAIS VALORES RELATIVOS A ÉPOCA DA VIGÊNCIA CONTRATUAL. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE VÍCIO DO CONSENTIMENTO NA EXPEDIÇÃO DO TERMO DE QUITAÇÃO. INDENIZAÇÃO A TÍTULO DE DANOS MATERIAIS, AFASTADA. CAUÇÃO COBRADA NO INÍCIO DA RELAÇÃO CONTRATUAL. INEXISTÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA DEVOLUÇÃO AO TÉRMINO DO CONTRATO. RETENÇÃO INDEVIDA. DEVER DE RESTITUIR SOB PENA DE ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. MULTA CONTRATUAL. INTERPRETAÇÃO DO CONTRATO. INEXISTÊNCIA DE CLÁUSULA EXPRESSA PREVENDO A RESTITUIÇÃO DA CAUÇÃO. DANOS MORAIS. COBRANÇA VEXATÓRIA. PROVAS SUFICIENTES. CONFIGURAÇÃO DO ABALO EXTRAPATRIMONIAL. INDENIZAÇÃO ARBITRADA. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. Trata-se de Recurso Inominado interposto em razão da sentença que julgou improcedentes os pedidos iniciais, e parcialmente procedentes os pedidos contrapostos, nos autos de AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE CAUÇÃO C/C PEDIDO INDENIZATÓRIO E DANOS MORAIS ajuizada por PAULO SÉRGIO RODRIGUES DA SILVA em face de LOURIVAL JOSÉ DA SILVA Pretende o autor reforma da sentença. Apresentadas as contrarrazões, os autos vieram conclusos para julgamento. Relatório dispensado, como autorizado pelo artigo 46 da Lei nº 9099/95 e Enunciado 92 do FONAJE. Presentes as condições de admissibilidade do recurso, dele conheço. Pretensão jurisdicional voltada à restituição de valor de caução, multa por descumprimento contratual e indenização por danos morais. A parte ré formulou pedido contraposto sob a alegação de que a parte autora descumpriu o referido contrato de locação, objeto da demanda. O Juízo a quo, julgou improcedentes os pedidos iniciais, e parcialmente procedentes os pedidos contrapostos sob o seguinte dispositivo: “Diante do exposto, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, julgo improcedentes os pedidos iniciais, e parcialmente procedentes os pedidos contrapostos, para declarar a culpa do autor pela rescisão contratual, devendo este arcar com a multa prevista na cláusula 12ª do contrato, sobre a qual deverá recair o abatimento dos valores prestados a título de caução” A parte recorrente sustentou a ocorrência de nulidade do processo pela inobservância do princípio da identidade física do juiz. No que tange à tal ofensa, ao princípio da identidade física do juiz, cumpre esclarecer que o art. 132, do CPC/73, que estabelecia a vinculação do magistrado que houvesse concluído a instrução, não foi reproduzido no Código atual, de modo que, atualmente, o julgador que concluir a instrução processual não precisa, necessariamente, julgar a lide, ainda mais, no caso dos autos, em que há a previsão expressa no art. 40 da Lei dos Juizados Especiais: Art. 40. O Juiz leigo que tiver dirigido a instrução proferirá sua decisão e imediatamente a submeterá ao Juiz togado, que poderá homologá-la, proferir outra em substituição ou, antes de se manifestar, determinar a realização de atos probatórios indispensáveis. Assim, não há nulidade a ser declarada. Colhem-se dos autos que as partes firmaram em data de 20/09/2018 um contrato de locação comercial com prazo de duração de três anos. Antes do término do contrato, no mês de maio de 2021, o Requerente alienou o ponto comercial e, não há como acolher a tese exposta na peça de contestação de que o Requerido foi surpreendido em setembro daquele ano, com o novo inquilino, haja vista que, em data de 10/06/2021, emitiu termo de quitação em prol do Locatário, inclusive fazendo menção expressa de que o imóvel “foi usado como restaurante” (seq. 1.6). Aliado ao fato de que, em data de 01/06/2021, firmou novo contrato de locação com Eduardo de Vasconcelos (seq. 46.2). Dessa forma, a pretensão do Locador de recebimento de indenização por quebra de contrato não prospera, pois, a multa pactuada tem como função ressarcir o proprietário do bem alugado pelos prejuízos suportados pela rescisão antecipada, consistente dos prejuízos que venha a suportar ante a expectativa de recebimento de valores a título de alugueis até o final do prazo avençado. A partir do momento que o Locador firmou imediatamente novo contrato de locação (novo inquilino) e expediu termo de quitação em prol do anterior locatário e, em atenção ao princípio da segurança jurídica, descabe a pretensão de recebimento da multa contratual. Resta assim reformada a sentença para julgar improcedente o pedido contraposto. Por ocasião do início da relação contratual o Requerente entregou ao Locador a importância equivalente a três meses de locação, sendo um valor referente a locação em si e os outros dois a título de caução. Cediço que tal valor era destinado para cobrir eventuais parcelas de locação não adimplidas ou reparos necessários, por ocasião da restituição do bem, ao término do contrato. Considerando que inexiste a comprovação de mora por parte do Inquilino em relação aos alugueis e, frente ao termo de quitação expedido pelo Locador, atestando que nada mais tinha a cobrar do Locatário, a retenção do valor entregue a título de caução se torna indevida e caracteriza enriquecimento sem causa, nos termos do art. 884 do Código Civil Brasileiro. Acolhe-se a pretensão inicial para condenar o Réu a restituir a importância recebida a título de caução. O valor deverá ser corrigido monetariamente pelo índice média do INPC/IGP- DI, desde o desembolso e acrescido de juros de mora de 1% ao mês, estes contados da citação. A despeito da alegação de cobranças vexatórias, faz-se necessário esclarecer que indenização por danos morais é cabível em situações excepcionais, quando constatada violação aos direitos da personalidade ou à dignidade, o que, no caso concreto, há evidências efetivas de que tenha ocorrido abalo à honra da parte autora, ofensa à sua dignidade, e a ocorrência de situação excepcional a ensejar a pretendida reparação imaterial. O Superior Tribunal de Justiça tem sustentado na previsão do art. 944, caput, do CC/02, no princípio da reparação integral do dano e na vedação ao enriquecimento ilícito, sustenta que “a configuração do dano moral pressupõe uma grave agressão ou atentado a direito da personalidade, capaz de provocar sofrimentos e humilhações intensos, descompondo o equilíbrio psicológico do indivíduo por um período de tempo desarrazoado” (AgInt no REsp 1655465/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 24/04/2018, DJe 02/05/2018). Ainda, observa-se encontrar acostado aos autos prova cabal, capaz de demonstrar a ocorrência de violação dos direitos da personalidade, suficiente a ensejar condenação indenizatória por danos morais. As declarações acostadas com a inicial e não elididas pela defesa dão conta de que o Requerido realizava cobranças vexatórias, sem justa causa, conforme descrito nos termos de declaração (seq. 1.9 e 1.10), aliado ao testemunho colhido na seq. 45.5. Ressalte-se que nenhuma prova em contrário foi produzida pelo Requerido e nem mesmo foi ajuizado incidente de falsidade ideológica documental ou representação criminal pelo crime de falsidade, o que faz prevalecer as informações de seu modo de agir, constrangendo o inquilino, visando a cobrança de alugueis. Outrossim, não há justificativa para tais cobranças, porque não se tem prova de eventual mora, e mesmo que houvesse, a atitude de se postar em frente ao estabelecimento, ou tomar assento em suas mesas sem intenção outra que não buscar o recebimento de alugueis, caracteriza cobrança vexatória, em especial porque realizada na presença de clientes. Fixo a indenização por danos extrapatrimoniais em R$ 3.500,00 (três mil e quinhentos reais). O valor deverá ser corrigido monetariamente pelo índice média do INPC/IGP- DI, desde o julgamento por este Colegiado e acrescido de juros de mora de 1% ao mês, estes contados da citação. No tocante ao pleito de recebimento de multa contratual, cotejando o contrato encartado na seq. 1.4 não há o estabelecimento de cláusula em que obrigue a parte a restituir os valores a título de caução. A restituição deferida nesta decisão decorre de força de lei e não de vontade das partes fixadas no instrumento contratual A multa foi fixada apenas para descumprimento de obrigações contratualmente estabelecidas, não podendo ser estendida para quaisquer outras situações ou obrigações decorrentes do ordenamento legal. Ante a ausência de previsão contratual, descabe o pleito de recebimento de multa contratual, conforme postulado na inicial. Isto posto, conheço do recurso e dou parcial provimento para reformar a sentença julgando parcialmente procedente os pedidos constantes da petição inicial e improcedente o pedido contraposto, na forma da fundamentação. Frente ao parcial sucesso recursal resta o recorrente condenado ao pagamento de honorários advocatícios ao procurador do Recorrido, arbitrados em 10% sobre o valor da condenação (art. 55 da Lei 9.099/95). Custas de lei, conforme Lei Estadual 18.413/14, arts. 2º, inc. II e 4º, e Instrução Normativa - CSJEs, art. 18. Observe-se a gratuidade processual deferida. Ante o exposto, esta 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais resolve, por unanimidade dos votos, em relação ao recurso de PAULO SERGIO RODRIGUES DA SILVA, julgar pelo(a) Com Resolução do Mérito - Provimento em Parte nos exatos termos do voto. O julgamento foi presidido pelo (a) Juiz(a) Irineu Stein Junior (relator), com voto, e dele participaram os Juízes Alvaro Rodrigues Junior e Marcel Luis Hoffmann. 14 de abril de 2023 Irineu Stein Junior Juiz (a) relator (a)
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