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Acórdão
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Apelação Cível nº 0001387-15.2017.8.16.0105 Vara Cível da Comarca de Loanda Apelante: Valdir Coronado Apelados: Luiz Carlos Coronado, Vanderlei Coronado e André Coronado Relator: Des. Péricles Bellusci de Batista Pereira APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO. PRETENSÃO FORMULADA POR HERDEIRO EM RELAÇÃO AOS DEMAIS. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL POR INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. NÃO CABIMENTO. POSSIBILIDADE DE O CONDÔMINO VIR A USUCAPIR IMÓVEL OBJETO DA HERANÇA SE COMPROVAR EXERCÍCIO DE POSSE EXCLUSIVA DURANTE O LAPSO TEMPORAL LEGALMENTE EXIGIDO. FATO QUE DEVERÁ SER OBJETO DE INSTRUÇÃO PROBATÓRIA. SENTENÇA CASSADA. RETORNO DOS AUTOS AO JUÍZO DE ORIGEM PARA REGULAR PROSSEGUIMENTO. - Em que pese a indivisibilidade do acervo hereditário, com a formação de condomínio “pro indiviso” dos bens da herança, excepcionalmente, pode-se admitir que um herdeiro venha a usucapir um imóvel objeto de herança, em detrimento dos demais, quando demonstrar o exercício de posse em nome próprio e com caráter de exclusividade durante o lapso temporal legalmente previsto. - No presente caso, o autor alega que, após o falecimento de sua genitora, passou a exercer posse exclusiva tanto sobre sua quota parte do imóvel objeto da herança, quanto sobre aquela pertencente aos demais herdeiros, o que deverá ser averiguado quando da instrução probatória, não sendo possível deliberar, neste momento, acerca da adequação da via eleita. Apelação Cível nº 0001387-15.2017.8.16.0105 Recurso provido. VISTOS, etc. I – RELATÓRIO: Valdir Coronado apela da sentença de mov. 9.1, em que, nos autos nº 0001387-15.2017.8.16.0105, de ação de usucapião extraordinário, ajuizada em desfavor de Luiz Carlos Coronado, Vanderlei Coronado e André Coronado, foi indeferida a petição inicial e julgado extinto o feito, sem resolução de mérito, por entender que “o instrumento processual apto à posse do imóvel não é a ação de usucapião extraordinária, mas a ação de inventário, meio pelo qual o requerente solicitaria a partilha e anuência dos demais herdeiros para o imóvel adquirido por sua genitora, tornando-se desta maneira o único proprietário do imóvel”. Ante a sucumbência, o autor foi condenado ao pagamento das custas processuais, não tendo sido fixados honorários advocatícios. Inconformado, relata o apelante que a magistrada entendeu que não teria decorrido o lapso temporal entre a data em que a sua genitora adquiriu o imóvel (1991) e aquela em que veio a óbito (1993). E, ainda, que, com o falecimento da autora da herança, os herdeiros adquiriram a posse direta do imóvel, de modo que a providência jurídica adequada a ser manejada seria a ação de inventário. Contudo, sustenta que, “ainda que entre a aquisição do imóvel pela genitora e o seu falecimento tenham decorrido apenas 02 (dois) anos, em última hipótese, abre-se um novo prazo para a contagem do lapso temporal, independentemente da abertura ou não de inventário”. Apelação Cível nº 0001387-15.2017.8.16.0105 Defende que, após o falecimento de sua mãe, permaneceu utilizando o imóvel como se dono fosse e pagando os respectivos impostos pelo lapso temporal legalmente exigido legalmente, de modo que faz jus ao direito reivindicado. Ressalta que seus irmãos/condôminos e os vizinhos lindeiros serão citados e poderão exercer de forma ampla o contraditório, “tudo na maior transparência, objetivando a busca da verdade real”. Argumenta que o princípio da saisine não interrompe a contagem do tempo para aquisição do direito de usucapir, “mas apenas estabelece que, com o falecimento, os herdeiros adquirem a posse indireta dos bens deixados por ‘causa mortis’”. Nesse contexto, assevera que, no caso em tela, os demais herdeiros nunca tiveram a posse do bem em questão e, portanto, só houve uma transmissão de fato do imóvel, e não de direito, abrindo-se um novo prazo para a contagem do lapso temporal. Aponta que a Apelação Cível nº 1.229.487-4 não pode ser utilizada como paradigma, uma vez que naquele caso os herdeiros estavam utilizando da medida judicial para atingir objetivos escusos e havia um processo de inventário em andamento. Com base nesses fundamentos, ambiciona o provimento ao recurso, com a reforma da sentença, a fim de que seja dado regular andamento ao feito até seus ulteriores termos. II – VOTO Insurge-se o autor/apelante contra a sentença que indeferiu a petição inicial, julgando-se extinto o feito, sem resolução de mérito, por entender pela inadequação da via eleita. Pois bem. O artigo 1.791 do Código Civil estabelece que, pelo princípio da saisine, consagrado no artigo 1.784 do mesmo diploma legal, aberta a sucessão, a propriedade Apelação Cível nº 0001387-15.2017.8.16.0105 e posse se transferem aos herdeiros como um todo indivisível até a partilha, de modo que os herdeiros passam a exercer a composse dos bens deixados pelo de cujus. Desse modo, via de regra, por força dessa indivisibilidade do acervo hereditário, com a formação de condomínio pro indiviso dos bens da herança, todos os herdeiros têm posse comum sobre a totalidade dos bens (a denominada composse) até que seja feita a partilha. Entretanto, excepcionalmente, pode-se admitir que um herdeiro venha a usucapir um imóvel objeto de herança, em detrimento dos demais, quando demonstrar o exercício de posse em nome próprio e com caráter de exclusividade durante o lapso temporal legalmente previsto. Como bem pontuou o Desembargador Espedito Reis do Amaral, quando do julgamento da Apelação Cível nº 1.564.338-4, “para que o condômino possa usucapir, em primeiro lugar, é necessário que essa característica não mais subsista, ou seja, não pode se verificar a prática de atos em nome da coletividade”. E, “em segundo lugar, é necessário que, apesar de o condomínio continuar a existir no mundo do ‘dever ser’, no mundo do ‘ser’ ele não mais subsista, ou seja, na prática, a propriedade é exercida com caráter de exclusividade, como se inexistisse condomínio”. Confira-se a ementa do julgado acima mencionado: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA.INDEFERIMENTO DA INICIAL. SUCESSÃO. CONDOMÍNIO ENTRE HERDEIROS. POSSIBILIDADE DE INVERSÃO DO TÍTULO DA POSSE. LEGITIMIDADE DO HERDEIRO PARA AJUIZAR AÇÃO DE USUCAPIÃO, CASO EXERÇA POSSE EXCLUSIVA SOBRE ÁREA CERTA E DELIMITADA. NECESSIDADE DE INSTRUÇÃO PROBATÓRIA PARA SE AFERIR OS FATOS ALEGADOS.SENTENÇA ANULADA. RECURSO PROVIDO.” (TJPR - 18ª C.Cível - AC - 1564338-4 - Foz do Iguaçu - Rel.: Espedito Reis do Amaral - Unânime - J. 22.02.2017) – destacamos. Tal hipótese se amolda ao presente caso. Apelação Cível nº 0001387-15.2017.8.16.0105 Isso porque, no caso em tela, o autor/apelante alega que, após o falecimento de sua mãe, passou a exercer posse exclusiva tanto sobre a sua quota parte do imóvel objeto da herança, quanto sobre aquelas pertencentes aos demais herdeiros/apelados, o que deverá ser averiguado quando da instrução probatória, não sendo possível deliberar, neste momento, acerca da adequação da via eleita. Veja-se que o fato de a genitora do requerente/recorrente ter adquirido o imóvel no ano de 1991 e ter vindo a óbito em 1993 é totalmente desinfluente para o deslinde do feito, eis que, repise-se, o lapso temporal considerado pelo autor/apelante é posterior ao óbito de sua mãe. Assim, diferentemente do que entendeu a magistrada, tem-se que “a existência de condomínio, por si só, não inviabiliza a aquisição da propriedade por usucapião” (Apelação Cível nº 1.564.338-4, Des. Espedito Reis do Amaral). Inclusive, convém mencionar que a Apelação Cível nº 1.470.980-3, cuja ementa restou colacionada no corpo da sentença, em nada se assemelha ao que se discute aqui, eis que naquela hipótese o autor ajuizou a ação de usucapião em desfavor de sua mãe, legítima proprietária, com quem residia, de modo que não restou comprovado o exercício da posse com ânimo de dono. E, ainda, a genitora do requerente veio a óbito no curso da demanda, razão pela qual restou consignado no acórdão que bens da autora da herança passaram aos herdeiros como um todo indivisível, devendo, pois, serem objeto de inventário e partilha. Forçoso reconhecer, portanto, o interesse de agir do requerente/recorrente para ajuizamento da presente usucapião, devendo os autos serem baixados ao juízo de origem, para regular prosseguimento, a fim de que se possa aferir, em instrução probatória, os fatos arguidos na inicial. Destarte, dou provimento ao recurso de apelação interposto por Valdir Coronado, para cassar a sentença e determinar a baixa dos autos ao juízo de origem para regular prosseguimento. Apelação Cível nº 0001387-15.2017.8.16.0105 III - DECISÃO: Acordam os integrantes do 18ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em dar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator. Participaram do julgamento os Desembargadores Marcelo Gobbo Dalla Dea e Espedito Reis do Amaral. Curitiba, 13 de junho de 2018 Péricles Bellusci de Batista Pereira Desembargador Relator
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