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Acórdão
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ 18ª CÂMARA CÍVEL - PROJUDI Rua Mauá, 920 - Alto da Glória - Curitiba/PR - CEP: 80.030-200 Recurso: 0019668-45.2014.8.16.0001 Classe Processual: Apelação Assunto Principal: Usucapião Especial Coletiva Apelante(s): ELENISE ROSA DOS SANTOS FRANCISCO ROSA DOS SANTOS LIDIA ROSA DOS SANTOS MARCOS ROSA DOS SANTOS GABRIEL ROSA DOS SANTOS MARIA DA CONCEIÇÃO SOUZA SAMUEL ROSA DOS SANTOS LILIAN ROSA DOS SANTOS Apelado(s): PEDRO PASCHOAL CEBOLA FLAVIO MIGUEL BREDA ANTONIO SEBASTIÃO COLOMBO APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE USUCAPIÃO ESPECIAL COLETIVA. PEDIDO DE JUSTIÇA GRATUITA. BENESSE JÁ CONCEDIDA. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. NÃO CONHECIMENTO. DECLARAÇÃO DO DOMÍNIO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO LAPSO TEMPORAL NECESSÁRIO AO RECONHECIMENTO DA USUCAPIÃO. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE NÃO RESPEITADA, IMPOSSIBILITANDO RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO AQUISITIVA. RECURSO CONHECIDO EM PARTE E, NA PARTE CONHECIDA, IMPROVIDO. 1. Restou incontroverso nos autos e devidamente documentado pelo Perito que os apelantes jamais exerceram a posse sobre a totalidade do terreno, mas tão somente sobre a área de 600m² e pequenas porções de terra adjacentes onde as residências foram construídas em área de preservação permanente ambiental – sobre as quais não restou comprovado o período de exercício de posse -, razão pela qual, o desprovimento do recurso é medida que se impõe. PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ 18ª CÂMARA CÍVEL - PROJUDI Rua Mauá, 920 - Alto da Glória - Curitiba/PR - CEP: 80.030-200 2. Considerando que não houve alteração da sentença, não há que se falar em redistribuição da sucumbência e, em atenção ao §11 do artigo 85 do CPC/15, levando em consideração o trabalho realizado pelo advogado do apelado no presente recurso, majoro para R$ 1.200,00 os honorários advocatícios anteriormente arbitrados, observada a justiça gratuita da autora/apelante. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº. 0019668-45.2014.8.16.0001, da 2ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba, em que são Apelantes ELENISE ROSA DOS SANTOS e OUTROS e Apelados PEDRO PASCHOAL CEBOLA E OUTROS. I – RELATÓRIO Trata-se de Ação de Usucapião Especial Coletiva proposta por FRANCISCO ROSA DOS SANTOS E OUTROS contra PEDRO PASCHOAL CEBOLA E OUTROS, através da qual pretendem a declaração de domínio do imóvel descrito na petição inicial (mov. 1.1). Após as tramitações legais, sobreveio sentença (mov. 680.1) nos seguintes termos, in verbis: Julgo improcedente o pedido veiculado na ação de usucapião. Condeno os Requeridos ao pagamento das custas, processuais e honorários advocatícios que fixo em R$ 1.000,00, conforme art. 20, § 4º, do Código de Processo Civil, considerando o trabalho desenvolvido pelo profissional, valor que deve ser corrigido monetariamente pela média IGP/INPC a partir desta data e acrescido de juros de mora de 1% ao mês a contar do transito em julgado. Assinalo que aplico o CPC/73 no que tange as condenações de PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ 18ª CÂMARA CÍVEL - PROJUDI Rua Mauá, 920 - Alto da Glória - Curitiba/PR - CEP: 80.030-200 honorários advocatícios para as demandas propostas na vigência do Código anterior por entender que o art. 85 do NCPC não é uma norma de direito processual, senão de direito substancial inserta em um diploma processual. Consigno que a execução da verba sucumbencial fica condicionada a mudança da situação financeira, no prazo de 05 (cinco) anos, que motivou o deferimento da assistência judiciária gratuita aos Requeridos. Embargos de Declaração foram opostos pela parte requerida no mov. 691.1, contrarrazoados pela parte autora no mov. 693.1 e acolhidos no mov. 695.1 a fim de retificar a parte dispositiva da sentença, condenando os requerentes ao pagamento das verbas sucumbenciais, na medida em que vencidos na demanda e não a parte autora, conforme constou equivocadamente. Inconformada, a parte autora interpôs o presente Recurso de Apelação (mov. 723.1), em cujas razões sustenta, em síntese, in verbis, que: a) o proprietário tem o dever e, portanto, o poder de empregar a sua coisa na satisfação das necessidades comuns de uma coletividade nacional inteira ou de coletividades secundárias; b) com o advento da Constituição da República de 1988, a propriedade foi inserida com um direito fundamental do cidadão, devendo ser observada sua função social; c) o Código Civil traz ainda uma importante inovação no que tange à possibilidade de o proprietário vir a ser privado do domínio que exerce sobre um bem imóvel. Quando tal bem consistir em área extensa e estiver sendo ocupado por um considerável número de pessoas, que exercem posse interrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, e nela houverem realizado – em conjunto ou separadamente – obras e serviços de PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ 18ª CÂMARA CÍVEL - PROJUDI Rua Mauá, 920 - Alto da Glória - Curitiba/PR - CEP: 80.030-200 interesse social e relevante, o proprietário não terá direito a reivindicar o bem; d) os Apelantes residem de boa-fé desde a época de seu avô no referido imóvel (ano de 1993) sendo que somente após adentrarem com usucapião (2014) é que os Apelados atentaram Reintegração de posse (2015); e) os Apelantes enquanto comunidade indígena são quem de fato desde o ano (1993) dão a referia terra função social, porquanto utilizam-se da mesma para moradia (direito fundamental) e também como meio de subsistência com seus artesanatos; f) detêm os Apelantes a posse direta mansa da referida área há 21 (vinte e um anos), configurando a prescrição aquisitiva exigida, assim como desde então se comportam como se donos fossem, configurando o “animus domini”; g) quanto à forma de aquisição da referida posse conforme comprovado nos autos de origem se deu de forma justa não maculada, ou seja, não violenta, clandestina ou precária, em conformidade com o que prescinde o Código Civilista (art. 1200); h) requer-se mui respeitosamente sua reforma para julgar procedente a demanda dos Apelantes para conferir justamente os direitos de propriedade da área total objeto da matrícula n° 59532 do 9° Registro de imóveis. Por tais razões, pugnou pelo conhecimento e provimento do recurso para o fim de reformar a sentença. Contrarrazões ao recurso foram apresentadas pela parte apelada no mov. 728.1. PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ 18ª CÂMARA CÍVEL - PROJUDI Rua Mauá, 920 - Alto da Glória - Curitiba/PR - CEP: 80.030-200 É a breve exposição. II - VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO: O recurso foi tempestivamente ofertado e preenche em parte os demais requisitos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser parcialmente conhecido. Preliminarmente, pugna a apelante pela concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita. Contudo, nota-se que tal benesse já lhe foi concedida pelo juízo singular (mov. 6.1) e mantida na sentença ora recorrida. Desta forma, não havendo notícias acerca de sua revogação, desnecessária nova análise por este Tribunal, de forma que não conheço do recurso neste ponto. No mérito, cinge-se o presente recurso acerca do preenchimento dos requisitos necessários ao reconhecimento da usucapião especial coletiva, argumentando os autores, ora apelantes, que se encontram sobre a totalidade do imóvel objeto da matrícula nº 59532 do 9º Registro de imóveis há mais de 21 (vinte e um) anos, e não apenas nos 600m² doados ao avô, tendo o imóvel sido abandonado pelo seu proprietário registral, razão pela qual, cabível o reconhecimento da aquisição do domínio, observando-se, ainda, a função social da propriedade. Pois bem. PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ 18ª CÂMARA CÍVEL - PROJUDI Rua Mauá, 920 - Alto da Glória - Curitiba/PR - CEP: 80.030-200 No tocante a alegação de preenchimento dos requisitos para o reconhecimento da aquisição do domínio do imóvel através da usucapião, tal matéria já restou devidamente analisada através do recurso de apelação interposto pelas ora apelantes na Ação de Reintegração de Posse nº 0028495-11.2015.8.16.0001, transitado em julgado (mov. 59 dos autos de apelação PROJUDI). Cabe destacar que, conforme já analisado em referidos autos, não restou comprovado o preenchimento dos requisitos exigidos para tanto. De acordo com o laudo pericial acostado no mov. 728.4, existem 9 edificações na área ocupada pelos apelantes, dentre as quais, 7 construídas fora dos 600m² sobre os quais exercem a justa posse e uma que se encontra parte para dentro e parte fora da área. Destacou o perito: 1) Edificação ocupada por Sra. Lídia Rosa dos Santos Na edificação da Figura 7 pode-se verificar o emprego de madeira aparentemente nova, e por informação da Sra. Roseli a construção tem aproximadamente 2 anos de idade. Esta edificação encontra-se fora da área de 600 m². 2) Edificação ocupada por Sra. Roseli do Rocio dos Santos de Morais e Sr. Damião Augusto de Brito A Sra. Roseli informou que reside nesta edificação da Figura 8 desde 19 de junho de 2.009. Esta edificação encontra-se fora da área de 600 m² e parte fora da área da matrícula 59.532. 3) Edificação ocupada por Sr. Daniel Rosa dos Santos A Sra. Roseli informou que o Sr. Daniel reside nesta edificação da Figura 9 há aproximadamente 40 anos. Esta edificação encontra-se fora da área de 600 m². PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ 18ª CÂMARA CÍVEL - PROJUDI Rua Mauá, 920 - Alto da Glória - Curitiba/PR - CEP: 80.030-200 4) Edificação ocupada por Sr. Davi Barbosa dos Santos A Sra. Roseli informou que o Sr. Davi reside nesta edificação da Figura 10 há aproximadamente 40 anos. Esta edificação encontra- se fora da área de 600 m². 5) Edificação ocupada por Sra. Denise Rosa dos Santos, Zaqueo Fernandes e seus dois filhos Ariane e Weverton. A edificação das Figuras 11 e 12 encontra-se parte dentro e parte fora da área de 600 m². A seta na Figura 12 indica o limite da linha dos fundos da área de 600 m², isto é, a esquerda da seta está fora da área. 7) Edificação ocupada por Sra. Cristina da Conceição Souza Pode-se verificar que a edificação da Figura 14 é recente, e por informação da Sra. Roseli a construção tem aproximadamente 2 anos de idade. Esta edificação encontra-se fora da área de 600 m². 8) Edificação ocupada por Sr. Francisco Rosa dos Santos. Pode-se verificar que a edificação da Figura 15 é recente, pelo emprego de madeira aparentemente nova, e por informação da Sra. Roseli a construção tem aproximadamente 2 anos de idade. Esta edificação encontra-se fora da área de 600 m². Assim, tem-se que, dentre as áreas ocupadas pelos apelantes que se encontram fora do terreno objeto do contrato de cessão, grande maioria foi construída recentemente, não preenchendo o requisito do lapso temporal hábil ao reconhecimento da prescrição aquisitiva. Apenas duas edificações - identificadas pelos números 3 e 4 da manifestação do perito de mov. 728.4 -, de acordo com o relato da requerida/apelante Roseli, foram construídas há mais de 40 (quarenta) anos, as quais, todavia, estão localizadas em Área de Preservação PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ 18ª CÂMARA CÍVEL - PROJUDI Rua Mauá, 920 - Alto da Glória - Curitiba/PR - CEP: 80.030-200 Permanente, conforme Relatório Geral da Secretaria Municipal do Meio Ambiente (mov. 1.9 dos autos nº 0028495-11.2015.8.16.0001), guia amarela emitida pela Prefeitura Municipal de Curitiba e figura nº 6 anexada a fls. 10 do Laudo Pericial de mov. 728.4, não sujeita à aquisição por usucapião e tampouco a construção de moradias, que lá se encontram, portanto, de forma irregular. Abre-se um parêntese para ressaltar a fragilidade da alegação de que as residências lá se encontram há mais de 40 (quarenta) anos, eis que embasadas somente no relato da própria parte interessada, de forma que, mesmo que tal área não fosse considerada como de preservação permanente, não teria a parte ré comprovado o exercício de posse mansa e pacífica pelo tempo alegado, inexistindo nos autos elementos que comprovem a data da realização da construção. O ônus da prova quanto a área ocupada pela parte autora a ela incumbia, nos termos do atual artigo 373, I, do CPC, de forma que, não restando comprovada que a área de sua posse não ultrapassava os 600m², incabível sua pretensão de reconhecimento da aquisição do domínio através da usucapião. Cumpre ressaltar que, através do presente recurso, não trouxeram os apelantes qualquer argumento novo apto a corroborar suas alegações e modificar o já consolidado entendimento acerca da usucapião, tanto que sequer combateu especificamente os pontos abordados na sentença, limitando-se a repetir as razões já expostas. Quanto a alegação de que o imóvel foi abandonado pela parte ré, tampouco assistem razão, eis que nos autos de nº 0028495- PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ 18ª CÂMARA CÍVEL - PROJUDI Rua Mauá, 920 - Alto da Glória - Curitiba/PR - CEP: 80.030-200 11.2015.8.16.0001, restou devidamente comprovado que o terreno desde 2003 sempre foi mantido e vistoriado pelo ora apelado, evidenciando a sua condição de possuidor, tampouco havendo que se falar em aplicação do princípio da função social da propriedade ao caso concreto. Ademais, não cabe ao particular (réu) a garantir aos apelantes o direito fundamental a moradia em detrimento de seu direito de propriedade, razão pela qual restando incontroverso nos autos e devidamente documentado pelo Perito que os apelantes jamais exerceram a posse sobre a totalidade do terreno, mas tão somente sobre a área de 600m² e pequenas porções de terra adjacentes onde as residências foram construídas em área de preservação permanente ambiental, razão pela qual o desprovimento do recurso é medida que se impõe. Da sucumbência e dos honorários Considerando que não houve alteração da sentença, não há que se falar em redistribuição da sucumbência. Em atenção ao §11 do artigo 85 do CPC/15, e levando em consideração o trabalho realizado pelo advogado do apelado no presente recurso, majoro para R$ 1.200,00 os honorários advocatícios anteriormente arbitrados na sentença, observada a condição de beneficiária da justiça gratuita da parte autora/apelante. III - DECISÃO Diante do exposto, acordam os Desembargadores da 18ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ 18ª CÂMARA CÍVEL - PROJUDI Rua Mauá, 920 - Alto da Glória - Curitiba/PR - CEP: 80.030-200 de votos, em conhecer em parte e, na parte conhecida, negar provimento ao presente recurso, nos termos do voto e fundamentação. Presidiu o julgamento o Desembargador ESPEDITO REIS DO AMARAL, com voto, e dele participou a Desembargadora DENISE KRUGER PEREIRA. Curitiba, 01 de agosto de 2018. Des. MARCELO GOBBO DALLA DEA Relator
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