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Acórdão
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Estado do Paraná PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA RECURSO DE AGRAVO EM EXECUÇÃO Nº 0020592-27.2018.8.16.0030, DA VARA DE EXECUÇÕES PENAIS DA COMARCA DE FOZ DO IGUAÇU. NÚMERO UNIFICADO: 0004191-50.2018.8.16.0030. RECORRENTE: JUAN RAMON VILLALBA AREVALOS. RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ. RELATOR: DES. JOSÉ CARLOS DALACQUA. RECURSO DE AGRAVO. EXECUÇÃO DA PENA. DECISÃO DE PRIMEIRO GRAU QUE INDEFERIU O PEDIDO DE RECONHECIMENTO DA CONTINUIDADE DELITIVA PARA UNIFICAÇÃO DAS PENAS. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO ARTIGO 71 DO CÓDIGO PENAL. HABITUALIDADE CRIMINOSA DO CONDENADO QUE IMPEDE O RECONEHCIMENTO DE CRIME CONTINUADO. DECISÃO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Agravo nº0020592-27.2018.8.16.0030, da Vara de Execuções Penais de Foz do Iguaçu, em que é Recorrente JUAN RAMON VILLALBA AREVALOS e Recorrido MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ. I – RELATÓRIO Trata-se de Agravo interposto em favor de JUAN RAMON VILLALBA AREVALOS, contra decisão que indeferiu o pedido de reconhecimento da continuidade delitiva para fins de unificação das reprimendas (mov. 41.1 – autos de Execução da Pena). Nas razões recursais alega o agravante que os delitos foram praticados nas mesmas circunstâncias de tempo, lugar, modo e execução, estando presentes todos os requisitos do artigo 71 do Código Penal, razão pela qual deve ser reconhecida a continuidade delitiva. Por fim, requereu a procedência do recurso para que na unificação das penas, seja reconhecida a continuidade delitiva (mov. 54.1 – execução). Estado do Paraná PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA fls. 2 Em sede de contrarrazões, o Ministério Público pugnou pela negativa de provimento ao recurso, de modo a manter a decisão recorrida (mov. 60.1 - execução). A MMª. Juíza condutora do feito manteve a decisão pelos próprios fundamentos (mov. 63.1 - execução). Nesta Corte, a Procuradoria Geral de Justiça, na pessoa de seu Eminente Procurador Saulo Ramon Ferreira, proferiu parecer no sentido de negar provimento ao recurso (mov. 8.1 - TJPR). É o breve relatório. II – VOTO E SEUS FUNDAMENTOS Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso interposto. Trata-se de agravo em execução objetivando a reforma da decisão que realizou a unificação das penas, indeferindo o pedido de reconhecimento da continuidade delitiva. Sustenta o recorrente em síntese, que a decisão merece reforma eis que “(...), é notório que os delitos são da mesma natureza (contrabando), praticados com o mesmo modua operandi e o lapso de tempo inferior de 12 meses” (mov. 54.1 – fl. 06/execução). Sem razão. De pronto, cabe mencionar que o agravante foi condenado nos seguintes processos: - Ação Penal nº 5003491-81.2015.4.04.7007/PR, pela prática dos delitos do artigo 334-A, §1º, inciso I, do Código Penal c/c artigo 3º do Decreto-lei nº 399/68 e artigo 70 da Lei 4.117/62, cometido em 24.09.2015, em Realeza/PR; - Ação Penal 5012537-12.2015.4.04.7002/PR pela prática dos delitos do artigo 334-A, §1º, inciso I, do Código Penal c/c artigo 3º do Decreto-lei nº 399/68, cometido em 22.01.2015, em Foz do Iguaçu/PR; - Ação Penal 5005331-44.2015.4.04.7002/PR, pela prática dos delitos do artigo 334-A, §1º, inciso I, do Código Penal, cometido em 15.04.2015, ocasião em que foi flagrado às margens do Rio Paraná com a mercadoria (causa de aumento referente ao Estado do Paraná PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA fls. 3 contrabando por meio fluvial); - Ação Penal 5000940-67.2016.4.04.7016/PR pela prática dos delitos do artigo 334-A, §1º, inciso I, do Código Penal c/c artigo 3º do Decreto-lei nº 399/68, artigo 307 do Código Penal, artigo 311 do Código de Trânsito Brasileiro e artigo 70 da Lei 4.117/62, cometidos em 20.02.2016, em Santa Rosa/PR. O juízo da 1ª Vara Federal de Francisco Beltrão determinou a unificação das penas, nos termos do artigo 11 da Lei de Execuções Penais c/c artigo 33 do Código Penal, fundamentando o somatório das penas, nos seguintes termos: “(...), resta inviável o reconhecimento da figura do crime continuado, tendo em vista que as condutas foram praticadas com intervalo de mais de 01 (um) ano, e cometidos em território de municípios diferentes, o que demonstra ímpetos e desígnios diversos para cada empreitada. (...). Além disso, verifica-se a ocorrência de delitos de espécies diversas, capitulados na ordem jurídica como ‘crimes praticados contra a administração em geral’; ‘crimes praticados contra as telecomunicações’, ‘crime praticado contra a fé pública’ e ‘crime cometido contra a legislação de trânsito’, cada qual imbuído de desígnios diversos, consistentes em introduzir no país mercadoria contrabandeada; operar equipamento de telecomunicação sem autorização do órgão competente e capaz de interferir nas comunicações regulares e das forças de segurança; atribuir-se falsa identidade e; empreender fuga em alta velocidade, expondo a risco outras pessoas em via pública. Assim, verifica-se que, obviamente, são vários os bens juridicamente protegidos que foram infringidos pelo condenado. (...). Nesta trilha, resta inviável o reconhecimento de crime continuado entre as espécies e fatos, posto que previstas em tipos penais diferentes e com tutela a bens jurídicos diversos, além de praticados em condições de tempo e lugar diferentes, demonstrando falta da unidade de desígnio”. (mov. 1.18 – execução). Estado do Paraná PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA fls. 4 Como já mencionado, o recorrente busca o reconhecimento da prática dos crimes em continuidade delitiva, nos moldes do artigo 71 do Código Penal, o qual assim dispõe: “Crime continuado Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica- se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços. Parágrafo único - Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo único do art. 70 e do art. 75 deste Código”. Para a configuração deste artigo, é necessário o preenchimento de determinados requisitos. Para isto, o Superior Tribunal de Justiça entende que: “AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. CONTINUIDADE DELITIVA. REQUISITO SUBJETIVO NÃO PREENCHIDO. DESÍGNIOS AUTÔNOMOS. REITERAÇÃO CRIMINOSA. REVOLVIMENTO DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. INVIABILIDADE NO ÂMBITO DO WRIT. AUSÊNCIA DE FLAGRANTE ILEGALIDADE. 1. A continuidade delitiva configura-se quando as circunstâncias de modo, tempo e lugar da prática dos ilícitos apresentam relação de semelhança e unidade de desígnios, acarretando o reconhecimento do desdobramento da prática criminosa, o que não se verifica na hipótese dos autos. 2. Impende registrar, por oportuno, que ''esta Corte, ao interpretar o art. 71 do CP, adota a teoria mista, ou objetivo-subjetiva, segundo a qual caracteriza-se a ficção jurídica do Estado do Paraná PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA fls. 5 crime continuado quando preenchidos tanto os requisitos de ordem objetiva - mesmas condições de tempo, lugar e modo de execução do delito -, quanto o de ordem subjetiva - a denominada unidade de desígnios ou vínculo subjetivo entre os eventos criminosos, a exigir a demonstração do entrelaçamento entre as condutas delituosas, ou seja, evidências no sentido de que a ação posterior é um desdobramento da anterior.'' (AgRg no HC 426.556/MS, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 22/03/2018, DJe 03/04/2018). 3. (...). 4. Agravo regimental não provido”. (destaquei). (STJ – AgRg no HC 438.232/SP – 5ª Turma - Relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca – Julgamento: 17.05.2018 – Publicação: DJe 30.05.2018). Assim, atento ao posicionamento jurisprudencial, observa-se que no caso em tela, não foram cumpridos os requisitos caracterizadores da continuidade delitiva, visto que as condutas não possuem vínculo subjetivo e nem são desdobramento um dos outros. Portanto, há desígnios autônomos entre os delitos. No caso, pode-se constar que recorrente pratica delitos de contrabando de forma habitual, não podendo, neste caso, ser aplicada a regra do artigo 71 do Código Penal, uma vez que há entendimento consolidado junto ao Superior Tribunal de Justiça quanto negativa de aplicação desta regra, confira-se: “PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. NÃO CABIMENTO. ROUBOS PRATICADOS EM CONCURSO MATERIAL. PRETENSÃO DE RECONHECIMENTO DE CONTINUIDADE DELITIVA. HABITUALIDADE. DESÍGNIOS AUTÔNOMOS. REEXAME DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. WRIT NÃO CONHECIDO. (…) II - Inviável, na hipótese, o reconhecimento da continuidade delitiva, na medida em que restou consignado pelas instâncias ordinárias que os crimes de roubo foram praticados em condições nas quais estaria configurada a habitualidade delitiva e a autonomia de desígnios, de modo que entender em sentido diverso implicaria em necessário reexame fático probatório, inviável na via eleita. III - In casu, o v. acórdão impugnado consignou, com base nas provas colhidas nos autos, que "os fatos descritos no PEC IV não guardam qualquer relação de tempo, lugar ou modo de execução com as Estado do Paraná PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA fls. 6 demais condenações, o que impossibilita que ela seja incluída em eventual continuidade delitiva como pretende a defesa. Sobre os PECs I, II e III, vislumbra-se que os delitos praticados possuem grande semelhança um com o outro [...] todavia, não obstante o preenchimento dos requisitos objetivos, a forma de execução e a reiteração dos delitos, demonstram que o agravante agia com habitualidade e possuía desígnios autônomos, ou seja, fazia da atividade criminosa sua 'profissão'" (fl. 66). Habeas corpus não conhecido”. (destaquei). (STJ – HC 445.214/SC – 5ª Turma – relator Ministro Félix Fischer – Julgamento: 05.06.2018 – Publicação: DJe 15.06.2018). Corroborando este entendimento, as recentes decisões desta Corte: “RECURSO DE AGRAVO – CRIMES DE ROUBO CIRCUNSTANCIADO – CONTINUIDADE DELITIVA – PRESSUPOSTOS OBJETIVO E SUBJETIVO NÃO ATENDIDOS – AGRAVO DESPROVIDO. Para ser reconhecida a figura da continuidade delitiva é necessário que estejam preenchidos, cumulativamente, os requisitos de ordem objetiva (pluralidade de ações, mesmas condições de tempo, lugar e modo de execução) e de ordem subjetiva, este entendido como a unidade de desígnios ou o vínculo subjetivo havido entre os eventos delituosos. No caso, se constata haver prática de atos independentes, característicos da reiteração criminosa indicativa de delinquência habitual ou profissional hábil a afastar a caracterização do crime continuado”. (TJPR – Agravo em Execução 0001439-05.2018.8.16.0031 – 5ª Câmara Criminal - Relator Rogério Coelho – Julgamento: 10.05.2018). “RECURSO DE AGRAVO – EXECUÇÃO PENAL – UNIFICAÇÃO DAS PENAS – PEDIDO DE CONTINUIDADE DELITIVA – ART. 71 DO CÓDIGO PENAL – IMPOSSIBILIDADE – ADOÇÃO DA TEORIA MISTA – NÃO PREENCHIMENTO DO REQUISITO SUBJETIVO – AUSÊNCIA DE UNIDADE DE DESÍGNIO – REITERAÇÃO DELITIVA – Estado do Paraná PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA fls. 7 INCOMPATIBILIDADE COM O CRIME CONTINUADO – REFORMA DA DECISÃO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO”. (TJPR – Agravo em Execução 0000471-41.2018.8.16.0009 – 5ª Câmara Criminal - Relator Luiz Osório Moraes Panza – Julgamento: 26.04.2018). “EMBARGOS INFRINGENTES - TRÁFICO ILÍCITO DE DROGA - CONTINUIDADE DELITIVA - IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO, NA HIPÓTESE - EMBARGOS REJEITADOS. A habitualidade não pode ser confundida com continuidade delitiva, pois, nesta, a sucessão de infrações é circunstancial, enquanto naquela a reiteração de condutas indica que a atividade criminosa é o modus vivendi do agente. Embargos rejeitados”. (TJPR – Embargos Infringentes 1.621.904-6/01 - 5ª Câmara Criminal - Relator Jorge Wagih Massad – Julgamento: 08.03.2018). Portanto, ausentes os requisitos necessários para o reconhecimento da continuidade delitiva, bem como demonstrada a reiteração criminosa do agravante, há que se manter a decisão recorrida. III - DISPOSITIVO Por estas razões, ACORDAM os Desembargadores integrantes da 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator. A Sessão foi presidida pelo Desembargador José Carlos Dalacqua. Participaram do julgamento e acompanharam o voto do Relator Excelentíssimos Senhores Desembargador Laertes Ferreira Gomes e o Juiz Substituto de Segundo Grau Doutor Mauro Bley Pereira Junior. Curitiba, 06 de setembro de 2018. JOSÉ CARLOS DALACQUA Relator
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