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Acórdão
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APELAÇÃO CRIME Nº 0010403- 64.2016.8.16.0028, DO FORO REGIONAL DE COLOMBO DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA (1ª Vara Criminal). Apelante: LEONIL PAULO. Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ. Relator: DES. JOSÉ MAURÍCIO PINTO DE ALMEIDA. APELAÇÃO CRIME. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO (ART. 14 DA LEI Nº 10.826/03). AUTORIA E MATERIALIDADE DEMONSTRADAS E INCONTESTES. ALEGADA ATIPICIDADE DE CONDUTA POR ESTAR A ARMA DE FOGO DESMUNICIADA. IRRELEVÂNCIA. CRIME DE PERIGO ABSTRATO OU PRESUMIDO. SIMPLES FATO DE PORTAR O ARTEFATO QUE CARACTERIZA O DELITO, SEM QUE SEJA Apelação Crime nº 0010403-64.2016.8.16.0028 NECESSÁRIA ALTERAÇÃO DO MUNDO EXTERIOR. PRECEDENTES DO C. STJ. DOSIMETRIA. AFASTAMENTO DA CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL RECONHECIDA NA PRIMEIRA FASE. IMPOSSIBILIDADE. QUANTIDADE DE MUNIÇÕES. MOTIVAÇÃO IDÔNEA. PENA QUE SE ENCONTRA NO MÍNIMO LEGAL. DESNECESSIDADE DE REPARO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. 1. A arma, por si só, possui potencial lesivo justamente por sua intimidação, pois, ao ser apresentada, não é possível identificar se há ou não munição (exceto quem lida com armas), o que gera temor, apreensão e outros sentimentos análogos, acarretando riscos à coletividade. 2. A grande quantidade de munições apreendidas justifica a valoração negativa das circunstâncias do crime e a exasperação da pena-base. Apelação Crime nº 0010403-64.2016.8.16.0028 I. Trata-se de apelação criminal interposta por LEONIL PAULO, denunciado pelo ilustre representante do MINISTÉRIO PÚBLICO, que lhe imputou a prática, em tese, do delito descrito no artigo 16, parágrafo único, IV, da Lei n° 10.826/03, em razão do seguinte fato narrado na denúncia: “No dia 23 de dezembro de 2016, por volta das 21h43min, em via pública, nas imediações da Avenida Argentina, em frente ao numeral 287, Bairro Campo Pequeno, neste Município e Foro Regional de Colombo/PR, o denunciado LEONIL PAULO, consciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, dolosamente, portava e transportava, sem autorização e Apelação Crime nº 0010403-64.2016.8.16.0028 em desacordo com a determinação legal ou regulamentar, 01 (um) revólver calibre .38, marca 'Taurus', nº de série HF52607, municiado com cinco cartuchos intactos do mesmo calibre e 30 (trinta) munições calibre 380, conforme auto de exibição e apreensão de fls. 14/15 e auto de constatação provisória de prestabilidade de arma de fogo de fls. 17/19.” O MM. Juiz de Direito julgou procedente a denúncia, conforme a r. sentença (mov. 102.1 – 22.08.2018), para condenar o acusado LEONIL PAULO quanto ao crime previsto no artigo 14 da Lei 10.826/03. Como consequência, foram-lhes aplicadas as penas definitivas de 02 (dois) anos de reclusão, a ser cumprida em regime inicial semiaberto, e de 10 (dez) dias-multa. Apelação Crime nº 0010403-64.2016.8.16.0028 O réu interpôs recurso de apelação (mov. 104.1), sustentando, em suma, que a sentença deve ser reformada, para os fins de reconhecer a atipicidade de sua conduta, pelo fato de a arma de fogo estar desmuniciada, não representando risco à coletividade. Em pedido alternativo, o afastamento da circunstância judicial da culpabilidade, com a aplicação da pena no mínimo legal. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ, em suas contrarrazões recursais (mov. 107.1 - PROJUDI), pugnou pela manutenção da r. sentença. Em parecer de fls. 64/71, a douta PROCURADORIA-GERAL DE JUSTIÇA1 se manifestou pelo desprovimento do recurso. II. O recurso não merece provimento. 1 Procurador de Justiça, Dr. Jorge Guilherme Montenegro Neto. Apelação Crime nº 0010403-64.2016.8.16.0028 Apesar de o apelante não se insurgir quanto à autoria e à materialidade, observa-se que estão devidamente demonstradas, consoante o auto de prisão em flagrante, boletim de ocorrência, laudo de exame de arma de fogo e nos depoimentos colhidos sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. O réu, em Juízo, confessou que adquiriu a arma de fogo para entregar para o caseiro do seu sítio, para segurança de todos. Afirmou que a arma estava desmuniciada e as munições estavam em uma sacola separada. Nas razões de apelo, sustenta a atipicidade da conduta, em razão de a arma estar desacompanhada das munições, e, por isso, não apresentou qualquer risco ao bem jurídico tutelado. Sem razão. Realce-se que o porte de arma é considerado crime de mera conduta e de perigo abstrato ou presumido, ou seja, basta a simples conduta de portar a arma para caracterizar o delito, não se exigindo que ela esteja municiada, ou que o agente a utilize alterando o mundo exterior. Apelação Crime nº 0010403-64.2016.8.16.0028 O delito se consuma independentemente da ocorrência de prejuízo ou lesão à sociedade, pois o bem jurídico tutelado é a segurança pública, a paz social. A arma, por si só, possui potencial lesivo justamente por sua intimidação, pois, ao ser apresentada, não é possível identificar se há ou não munição (exceto quem é conhecedor de armas), o que gera temor, apreensão e outros sentimentos análogos, acarretando riscos à coletividade. Ademais, cumpre ressaltar que o artefato estava apto a realizar disparos, consoante demonstrou o Laudo de Exame de Arma de Fogo (mov. 30.1), estando habilitada para uso. Nesse sentido, já se manifestou o COLENDO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA: “HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS, ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO E POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO. ATIPICIDADE. ARTEFATO DESMUNICIADO. NÃO CONFIGURAÇÃO. DELITO DE PERIGO ABSTRATO. MUNIÇÕES DESACOMPANHADAS DE Apelação Crime nº 0010403-64.2016.8.16.0028 ARMAMENTO. CONDUTA TÍPICA. SITUAÇÃO EXCEPCIONAL NÃO DEMONSTRADA. REGIME PRISIONAL INICIAL. ABRANDAMENTO EM RELAÇÃO A UM DOS RÉUS. ORDEM CONCEDIDA EM MENOR EXTENSÃO. 1. Em relação ao porte de arma de fogo desmuniciada, esta Corte Superior uniformizou o entendimento - alinhado à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal - de que o tipo penal em apreço é de perigo abstrato. Precedentes. 2. Não há falar em atipicidade material da conduta atribuída à acusada Renata de Souza Garcia, porque o simples fato de possuir, sob sua guarda, arma (dois revólveres com numeração suprimida) à margem do controle estatal - artefato que mesmo desmuniciado possui potencial de intimidação e reduz o nível de segurança coletiva exigido pelo legislador - caracteriza o tipo penal previsto no art. 16, parágrafo único, I, do Estatuto do Desarmamento, principalmente porque o bem jurídico tutelado pela norma penal não é a incolumidade física de outrem, mas a segurança pública e a paz social, efetivamente violadas. 3. No que tange à posse de munições desacompanhadas do artefato capaz de dispará-las, a Apelação Crime nº 0010403-64.2016.8.16.0028 Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp n. 1.699.710/MS, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, e do AgInt no REsp n. 1.704.234/RS, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, alinhou-se ao entendimento da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal e passou a reconhecer a atipicidade material da conduta (princípio da insignificância) em situações específicas de ínfima quantidade de munição, aliada à ausência do artefato capaz de disparar o projétil, que denote a incapacidade de gerar perigo à incolumidade pública. 4. A situação dos autos é diversa, pois (...) 8. Ordem concedida, em menor extensão, a fim de fixar o regime inicial semiaberto para o cumprimento da pena imposta à paciente Renata de Souza Garcia”. (HC 447.071/MS, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 14/08/2018, DJe 29/08/2018) [destacou-se]. No mesmo sentido, desta COLENDA SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL: Apelação Crime nº 0010403-64.2016.8.16.0028 “APELAÇÃO CRIMINAL. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO (ARTIGO 14, CAPUT, DA LEI Nº 10.826/2013). PLEITO ABSOLUTÓRIO. ALEGADA ATIPICIDADE DA CONDUTA EM RAZÃO DA ARMA ESTAR DESMUNICIADA. NÃO ACOLHIMENTO. CRIME DE PERIGO ABSTRATO E MERA CONDUTA. BEM JURÍDICO TUTELADO INCOLUMIDADE PÚBLICA. DESNECESSIDADE DA ARMA ESTAR MUNICIADA PARA CONFIGURAÇÃO DO DELITO. DESNECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DE OFENSIVIDADE. CONCURSO ENTRE A AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA E A ATENUANTE DA CONFISSÃO. COMPENSAÇÃO. POSSIBILIDADE DA COMPENSAÇÃO. DE OFÍCIO. MATÉRIA PACIFICADA NO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA POR OCASIÃO DO JULGAMENTO DO RESP Nº 1.154.752/RS. ENTENDIMENTO RECENTE. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO, COM A READEQUAÇÃO, DE OFÍCIO, DA PENA”. (TJPR - 2ª C. Criminal - 0000449-21.2013.8.16.0150 - Santa Apelação Crime nº 0010403-64.2016.8.16.0028 Helena - Rel.: José Carlos Dalacqua - J. 23.08.2018) [destacou-se]. A ser assim, afasta-se a tese de atipicidade de conduta, mantendo-se a condenação em primeiro grau. Na sequência, em pedido alternativo, roga o apelante pelo afastamento da circunstância judicial reconhecida como desfavorável, reduzindo-se a pena para o mínimo legal. Não procede o apelo. Em relação à circunstância judicial, assim motivou a Juíza singular na decisão: “(...) f) Circunstâncias: é modus operandi da conduta delitiva. No caso em tela, além da arma de fogo e das munições de calibre 38, o réu portava 30 munições de calibre 380. Nesse ponto, a conduta é mais grave do que aquela do porte de apenas uma arma de fogo, em razão da duplicidade de calibres e da quantidade de munições. Portanto, a pena deve ser majorada”. Apelação Crime nº 0010403-64.2016.8.16.0028 Com acerto agiu a Magistrada, porque a quantidade de munições não pode ser desprezada para efeitos de aumento da pena. Em caso semelhante já decidiu esta COLENDA CÂMARA CRIMINAL: “APELAÇÃO CRIME. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO. ARTIGO 16, CAPUT, DA LEI 10.826/2003. CONDENAÇÃO. INSURGÊNCIA. AUSÊNCIA DE PROVAS DA AUTORIA DELITIVA. INACOLHIMENTO. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. PENA- BASE. VALORAÇÃO NEGATIVA QUANTO AS CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. PLEITO DE AFASTAMENTO E CONSEQUENTE REDUÇÃO DA PENA PARA O MÍNIMO LEGAL. IMPOSSIBILIDADE. APREENSÃO DE ELEVADA QUANTIDADE DE MUNIÇÕES, ALÉM DE ARMA DE FOGO. PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. FIXAÇÃO ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. REDUÇÃO DO QUANTUM ESTABELECIDO PARA UM SALÁRIO Apelação Crime nº 0010403-64.2016.8.16.0028 MÍNIMO. POSSIBILIDADE. HONORÁRIOS. FASE RECURSAL. DEFERIMENTO. PARCIAL PROVIMENTO”. (TJPR - 2ª C. Criminal - 0008606-29.2011.8.16.0028 - Colombo - Rel.: Laertes Ferreira Gomes - J. 17.05.2018) Nada obstante o pleito almejado, consigne- se que a pena privativa do réu já se encontra no mínimo legal, porquanto, em que pese a Magistrada “a quo” tenha majorado a pena em sua primeira fase, reconheceu a atenuante da confissão espontânea, operando a sua redução. Assim, não merece reparo a decisão de primeiro grau. Por derradeiro, é de se determinar, após esgotados os recursos ordinários nesta instância, se houver e desde que não protelatórios, o início da execução provisória das penas impostas ao apelante LEONIL PAULO, segundo o novo entendimento do Excelso Pretório nas Ações Declaratórias Constitucionais 43 e 44, em 05 de outubro de 2016, confirmado no Recurso Extraordinário com Agravo nº 964246, em que, inclusive, se reconheceu a repercussão geral da matéria, em que o art. 283 do Código de Apelação Crime nº 0010403-64.2016.8.16.0028 Processo Penal não impede o início da execução da pena, após condenação em segunda instância. III. Desse modo, ACORDAM os Magistrados integrantes da Segunda Câmara Criminal do egrégio Tribunal de Justiça do Paraná, à unanimidade, em negar provimento ao apelo, nos termos do voto relatado. Deliberou, também, o Colegiado: a) após esgotados os recursos ordinários nesta instância: pela expedição de mandado de prisão do apelante, por este Tribunal de Justiça, iniciando-se a execução provisória da pena; e pela comunicação, oportunamente, ao Juiz de Direito da Comarca, para a formalização do processo de execução provisória, a quem deverão ser encaminhadas as peças processuais necessárias; b) pela imediata remessa de cópia deste acórdão, via Mensageiro, à prolatora da sentença DRA. TAYNA MATOZO SERAFIM. Presidiu o julgamento o Excelentíssimo Desembargador JOSÉ CARLOS DALACQUA, com voto, e dele Apelação Crime nº 0010403-64.2016.8.16.0028 participaram os Excelentíssimos Desembargadores JOSÉ MAURÍCIO PINTO DE ALMEIDA e FRANCISCO PINTO RABELLO FILHO. Curitiba, 08 de novembro de 2018. José Maurício Pinto de Almeida Relator
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