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Acórdão
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ 8ª CÂMARA CÍVEL - PROJUDI RUA MAUÁ, 920 - ALTO DA GLORIA - Curitiba/PR - CEP: 80.030-901 Autos nº. 0062127-28.2011.8.16.0014 Apelação Cível n° 0062127-28.2011.8.16.0014 7ª Vara Cível de Londrina WAJDI IBRAHIM EL-HAOULIApelante(s): GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA.Apelado(s): Relator: Desembargador Hélio Henrique Lopes Fernandes Lima Apelação cível. Ação de obrigação de não fazer c/c indenização por dano moral. Preliminar de inépcia recursal. Não caracterização. Responsabilidade civil de provedor de buscas (“google”). Matérias jornalísticas editadas pela Folha de São Paulo e pelo Estado de São Paulo que vinculam o nome do autor a fraudes na Sudam (Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia). Notícias comprovadamente falsas. Possibilidade da desvinculação do nome do ofendido com o resultado da pesquisa. Demonstração. Orientação do Superior Tribunal de Justiça. Danos morais. Não configuração. Ausência de responsabilidade pelo conteúdo das matérias divulgadas. Multa diária. Fixação. Sentença reformada. Adequação da sucumbência. Recurso provido parcialmente. 1. Não há que se falar em inépcia recursal, uma vez que o apelo ataca os fundamentos – ou sua falta – lançados em sentença, a fim de afastar a improcedência dos pedidos, de forma que atendido o Princípio da Dialeticidade, pois presentes os requisitos do art.1010, II, do CPC. 2. O Superior Tribunal de Justiça tem entendido pela não responsabilização dos provedores de busca pelos resultados encontrados, devendo o prejudicado dirigir sua pretensão contra os provedores de conteúdo, responsáveis pela disponibilização deste na internet. Contudo, há situações excepcionais que é necessária a intervenção do Poder Judiciário para cessar o vínculo criado nos bancos de dados dos provedores de busca, seja tanto pelo decurso de tempo, quanto pelo conteúdo versado se tratar de proposição falsa, situações que se amoldam ao caso concreto. 3. “(...) Há, todavia, circunstâncias excepcionalíssimas em que é necessária a intervenção pontual do Poder Judiciário para fazer cessar o vínculo criado, nos bancos de dados dos provedores de busca, entre dados pessoais e resultados da busca, que não guardam relevância para interesse público à informação, seja pelo conteúdo eminentemente privado, seja pelo decurso do tempo. (...) Nessas situações excepcionais, o direito à intimidade e ao esquecimento, bem como a proteção aos dados pessoais deverá preponderar, a fim de permitir que as pessoas envolvidas sigam suas vidas com razoável anonimato, não sendo o fato desabonador corriqueiramente rememorado e perenizado por sistemas automatizados de busca. (...) (STJ – 3ª T- REsp 1660168/RJ – Rel. Marco Aurélio Bellizze – Dje 05/06/2018). 4. Sem lugar o pleito de indenização pelos danos morais, haja vista que o provedor de pesquisa não se responsabiliza pelo conteúdo das matérias inseridas por terceiros. Sua responsabilidade atém-se ao descumprimento da ordem judicial específica de indisponibilidade do conteúdo apontado como infringente. 5. É de se reformar a sentença, a fim de julgar procedente em parte o pedido inicial, a fim de que o provedor de buscas demandado se abstenha de disponibilizar através de sua captação o acesso às reportagens indicadas na exordial que desabonam injustamente o recorrente, sob pena de multa, fixada nesta oportunidade. 6. Reconhecida a ocorrência da sucumbência recíproca (86/CPC), em igual proporção para cada parte, bem como fixada a verba honorária, em 20% vinte por cento do valor atualizado da causa (85, §2º, CPC). Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. , da 7ª Vara Cível00062127-28.2011.8.16.0014 do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Londrina, em que é apelante WAJDI IBRAHIM EL-HAOULI e apelado GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA. I – RELATÓRIO Wajdi Ibrahim El-Haouli propôs , sob n.ação de obrigação de não fazer c/c indenização por dano moral 0062127-28.2011.8.16.0014, em face de Google Brasil Internet Ltda. Em sentença (mov.80.1), os pedidos iniciais foram julgados improcedentes, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil, com a condenação do autor ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como honorários advocatícios fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor atualizado da causa, na forma do art.85, §2º, do CPC. Diante da r. sentença, o autor interpôs recurso de apelação cível (mov.85.1), sustentando: a) a nulidade da sentença, por violação do contraditório e do dever de fundamentação, pois não enfrentou todas as questões suscitadas no processo (11 c/c 489, §1º, IV, CPC); b) o Google tem captado reportagens jornalísticas antigas onde foram veiculadas notícias falsas sobre um suposto envolvimento do autor com fraudes na Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia – Sudam; as quais lhe trouxeram prejuízo comercial e graves repercussões pessoais; c) as notícias são falsas - “fake news” – e, assim, desaparece o requisito que legitima sua divulgação pelo exercício da liberdade de expressão; seu avivamento diário enseja a responsabilidade do ofensor; d) a falsidade da notícia é incontroversa, reconhecida em sentença transitada em julgado confirmada pelo TJPR, em ação indenizatória movida pelo autor contra o jornal que a publicou; apesar disso, ainda hoje o réu continua captando, divulgando e a propagando; e) deve ser preservado o legítimo interesse individual, não podendo prevalecer a liberdade de expressão relacionada a notícia falsa, tanto mais quando esta não guarda relevância para o interesse público; f) o Google confessou em juízo a possibilidade técnica de remoção do conteúdo, fato também incontroverso; g) deve ser atribuída a responsabilidade objetiva ao Google, pois assume o risco de disponibilizar serviço que eventualmente possa ser mal utilizado, lesando bens de terceiros; h) demonstrado o fato, consistente na captação, divulgação e propagação de notícia falsa, violadora da honra, imagem, dignidade e bom nome, não se exige do autor prova do dano, devendo ser compensado; não obstante, a prova oral demonstrou os danos sofridos; i) comprovada a falsidade da notícia e confessada a possibilidade técnica de controle e remoção do conteúdo falso, impõe-se a concessão de tutela de urgência para que o Google a exclua imediatamente, bem como se abstenha de fazer novas inserções, sob pena de multa diária, condenando-o, igualmente, a pagar indenização por danos morais. Ofertadas contrarrazões recursais (mov.90.1), oportunidade em que o apelado pugnou pelo não conhecimento do apelo, por inépcia recursal e, no mérito, manifestou-se pelo seu desprovimento. Vieram os autos. É o relatório. II – VOTO Cuida-se de ação de obrigação de não fazer c/c indenização por dano moral proposta por Wajdi Ibrahim El-Haouli em desfavor de Google Brasil Internet Ltda. Diante da sentença de improcedência, recorre o autor objetivando sua reforma. Antes da análise do apelo, necessário examinar a preliminar de não conhecimento lançada em contrarrazões. Contrarrazões recursais– inépcia recursal Sustenta o apelado que a alegação de “nulidade da sentença”, fundada na supressão da ampla defesa e do contraditório, se trata de mero inconformismo, uma vez que não houve impugnação da sentença com a demonstração dos argumentos trazidos, sendo o recurso inepto, mesmo que parcialmente. Sem razão, contudo. Verifica-se que no recurso, “item III”, o apelante aponta a falta de fundamentação da sentença ao não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo, a ação foi julgada improcedente, “sob o único fundamento de que a “liberdade de expressão tem proteção absoluta”. No “item IV” da peça recursal, sustentou o apelante que, em julgamento anterior o Tribunal havia anulado a sentença, fixando como determinante para atribuição de responsabilidade do apelado a comprovação da falsidade das notícias e a impossibilidade técnica de controle do “site” de buscas, pontos sobre os quais não houve pronunciamento. Assim, não há que se falar em inépcia recursal, uma vez que o recurso ataca os fundamentos – ou sua falta – lançados em sentença, a fim de afastar a improcedência dos pedidos, de forma que atendido o Princípio da Dialeticidade, pois presentes os requisitos do art.1010, II, do CPC, a propósito: Art. 1.010. A apelação, interposta por petição dirigida ao juízo de primeiro grau, conterá: (...) II - a exposição do fato e do direito; Nesta linha, é o entendimento jurisprudencial: AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. PRELIMINAR DE INÉPCIA RECURSAL. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE (ART. 1.010, II, DO CPC/15). INOCORRÊNCIA. RECURSO DE APELAÇÃO QUE SE CONTRAPÕE AOS FUNDAMENTOS DA SENTENÇA.PRELIMINAR AFASTADA. (...) (TJPR - 17ª C.Cível - AC - 1675486-4 - Guaratuba - Rel.: Fernando Paulino da Silva Wolff Filho - Unânime - J. 31.01.2018) INÉPCIA RECURSAL DO APELO DA AUTORA. NÃO CARACTERIZAÇÃO. Presentes os requisitos do art.1010, II, do CPC, não há que se falar em inépcia recursal. Recurso adequadamente fundamentado. Preliminar rejeitada. (...) (TJRS – Apelação Cível Nº 70076641570, 24ª Câmara Cível - Regime de Exceção - Relator: Jorge Alberto Vescia Corssac - Julgado em 29/08/2018) Neste quadro, é de se rejeitar a preliminar. Apelação cível a) Da responsabilidade civil Em preliminar, alega o apelante que a falta de enfrentamento de todas as questões suscitadas torna nula a sentença, devendo assim ser declarada, com base no art.11, CPC c/c 489, §1º, IV, CPC, a fim de que o Tribunal profira nova decisão, com fundamento no art.1013, §3º, do CPC. Quanto ao mérito, sustenta que apesar das notícias veiculadas serem falsas, o que afasta o requisito que legitima sua divulgação pelo exercício da liberdade de expressão, o recorrido continua as captando, divulgando e propagando, embora possível a remoção do conteúdo ofensivo. Tal conduta violadora da honra, imagem, dignidade e bom nome, dispensa a prova do dano moral, o qual deve ser compensado. Madura a causa para julgamento, possível a análise de todas as questões postas, à luz do art.1013, do CPC. Senão vejamos. O caso em tela versa sobre a responsabilidade civil do “site” provedor de pesquisas em função da captação, divulgação e propagação de duas reportagens veiculadas em 2001, pelos jornais Folha de São Paulo e pelo Estado de São Paulo as quais, segundo alegado, são inverídicas e denigrem a dignidade (em sentido amplo) do autor/apelante, um dos noticiados. Oportuno reproduzir os seguintes trechos das matérias: “FOLHA.com 21/04/2001- 03h18 Sudam tem pelo menos R$150 mi de prejuízo com projetos do Acre Eduardo Scolese e Jairo Marques, da Agência Folha O Acre entrou na lista dos Estados que contêm projetos fraudulentos com a Sudam (Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia). O prejuízo chega a pelo menos R$150 milhões, segundo uma primeira avaliação feita pelo Ministério Público Federal e que conta apenas com valores de um projeto. Dos 38 projetos beneficiados pela Sudam no Acre, 9 já foram considerados irregulares e outros 6, cancelados. A Procuradoria e a Polícia Federal reuniram provas para investigar três dos projetos na capital do Estado, Rio Branco, datados dos anos 80: Alcobrás – Álcool Brasileiro S/A., Cila (Companhia Industrial de Laticínios do Acre) e Agropecuária Vale do Rio Acre S/A. (...) No caso da Cila, segundo avaliação feita pelos procuradores, existe a prática de crime contra a administração pública e o sistema financeiro nacional. Outra suspeita é a empresa Agropecuária Vale do Rio Acre S.A., que, conforme a investigação do órgão, ofereceu em sua prestação de contas notas fiscais consideradas irregulares. O projeto teve financiamento aprovado em 1982. Em um período inferior a um ano, a empresa apresentou pelo menos 20 notas fiscais originárias de uma única firma, cujo dono já havia morrido. O total em notas emitidas atingiu cerca de R$1,2 milhão. A suspeita da Procuradoria da República é a de que tenha havido triangulações comerciais entre a Empreiteira Teles, a Agropecuária Papagaio S/A e a Agropecuária Vale do Rio Acre S/A. O procurador Aguiar Macedo pediu a quebra do sigilo bancário de Wajdi Ibrahim El Haouli, responsável pela Teles e pela Papagaio. As supostas notas frias teriam sido utilizadas para acobertar a saída de dinheiro da Vale do Rio Acre e para garantir a liberação de parcelas do financiamento. (...)” - (mov.1.4, fls.39/40). “ESTADÃO.COM.BR Sexta-feira, 20 de abril de 2001, 16.30/Online Sudam: Investigação prossegue no Acre Procuradoria-Geral da República no Acre pediu que fosse declarada a indisponibilidade de três empresas e seus sócios, suspeitos de desviar mais de R$152 milhões do Fundo de Investimento da Amazônia (Finam). (...) Em outra situação, o procurador Marcus Vinicius Aguiar identificou um esquema de falsificação de notas fiscais para o pagamento de serviços não executados no projeto da Agropecuária Vale do Rio Acre S/A, em Rio Branco. Segundo Aguiar, em 1996 foram emitidas 26 notas fiscais no total de R$1.215.182,17 pela Empreiteira Teles, firma individual cujo titular, Raimundo Teles do Nascimento, já havia morrido. Essa operação, afirma Aguair, envolveu também a Agropecuária Papagaio S/A e seu dono, Wajdi Ibrahim El-Haouli”. - (mov.1.4, f.41). As matérias se referem a projetos fraudulentos havidos na SUDAM-Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia, no Estado do Acre, os quais estavam sendo investigados pelo Ministério Público Federal. Segundo os jornais, as fraudes se davam mediante a emissão de notas fiscais frias para o pagamento de serviços não executados no projeto da Agropecuária Vale do Rio Acre S/A., as vinculando a empresas que , (Empreiteira Teles e Agropecuária Papagaio S/A.), permitindo oseriam de titularidade do autor/apelante desvio de dinheiro advindo do FINAM – Fundo de Financiamento da Amazônia. Ou seja, foi noticiada a existência de uma triangulação entre empresas para fraudar recursos públicos. anuladaInicialmente, o pedido indenizatório foi julgado improcedente (sentença, mov.1.21). Esta sentença foi por Acórdão de relatoria do e. Des. Albino Jacomel Guérios, a fim de permitir a produção de provas, para demonstrar a falsidade das notícias e a possibilidade técnica do provedor de retirar o conteúdo em questão (mov.1.36). Os autos baixaram à Origem, com a juntada de documentos e a realização de audiência de instrução e julgamento. Em nova sentença, o MM. Juiz singular asseverou que as reportagens “estão em absoluta consonância com a liberdade (e proteção) da imprensa em narrar fato, evidentemente, que, sua mera divulgação por sistema de buscas do Google também estão”. E que nos autos“houve simples veiculação de fato, narração de fato da vida, sem distorção, obtido junto aos órgãos de investigação e que porquanto se trata de atividade inerente à liberdade de informação. A valoração equivocada, a inclusão de adjetivos e de questões subjetivas, a notícia falsa e irresponsável é que podem ensejar a responsabilização do órgão de imprensa ou o site de busca/veiculação de notícias. Nada disso, contudo, se faz presente nas matérias hospedadas no site do réu”– (mov.80.1). Assim, os pedidos iniciais foram julgados improcedentes. Respeitado o entendimento singular, verifica-se que laborou com equívoco o MM. Julgador. Sobre os fatos lhe imputados, demonstrou o apelante que executou judicialmente a Agropecuária Vale do Rio Acre S/A, em razão de obrigação inadimplida, na Comarca de Campo Grande/MS, tendo a devedora pago parte da dívida mediante deposito em juízo de vários cheques de sua emissão, nominais ao recorrente, títulos cobertos com recursos advindos de financiamentos da SUDAM. Comprovou que não era proprietário das referidas empresas e que o valor recebido através dos cheques serviu para quitar obrigação lícita. Ainda, houve demonstração de que as notícias que vinculam o nome do apelante as citadas fraudes na SUDAM não se mostraram verdadeiras, tanto que a Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público Federal não foi proposta contra o autor, embora tenha o sido contra as demais pessoas físicas e jurídicas mencionadas nas reportagens (seq.29). Em razão da divulgação dos mesmos fatos, o apelante também ajuizou ação indenizatória contra a Repiquete Serviços Editoriais Ltda., periódico de Londrina, (sob n.502/2011, 10ª Vara Cível de Londrina), a qual foi julgada procedente, com o reconhecimento da falsidade quanto à vinculação do apelante com as fraudes. A orientação sentencial foi confirmada pelo Tribunal, tendo esta Câmara Cível apenas reduzido o valor da indenização fixada (J.23/08/2007, mov.1.4). Na hipótese em tela, é de se ter em mente que o “site” recorrido não produziu ou inseriu as notícias, mas, a despeito de sua falsidade, permite que esta seja captada e divulgada através de seu sistema de buscas. Desaparecido o requisito que legitimava a divulgação, a persistência da notícia após constatada sua falsidade, com a insistência de mantê-la viva seguramente traz prejuízos ao citado. Vale ponderar que, se mesmo a pessoa que cometeu um ilícito possui direito ao esquecimento, tanto o mais será aquele que foi vítima de notícia falsa ou inexata. Este entendimento foi o adotado pelo e. Des. Albino Jacomel Guérios, em Acórdão havido nestes autos em que o Colegiado decidiu por anular a primeira sentença, valendo a reprodução: “a) se as notícias são de fato falsas, porque não houve o envolvimento do autor em alguma fraude na SUDAM, algo parece certo: elas devem fazer parte do processo, lá permanecer, sem o seu avivamento diário;. a possibilidade de os dois jornais divulgar a notícia à época (em 2001) no exercício da liberdade de expressão e informação, desde que baseadas em peças oficiais de investigação, isto é, atendido o primeiro requisito da probabilidade da veracidade da notícia, parece ser algo diverso da persistência da notícia após constatada a sua falsidade, isto é, provado que os fatos noticiados não eram verdadeiros, porque aí, desparecido o requisito que legitimava a divulgação em um primeiro momento, a insistência em mantê-la viva ofende a honra da pessoa envolvida nos acontecimentos; sem dizer que, dependendo das circunstâncias do fato, sempre a partir do interesse público na lembrança do fato, por qualquer razão relevante que seja (...), qualquer pessoa tem direito ao esquecimento, mesmo quem praticou algum ilícito, com forma de, esquecido o passado, reestrutura-se e poder desenvolver sua personalidade (...). Isso quer significar, em termos mais explícitos, que o autor tem a faculdade (ou o direito) de tentar provar ou que a notícia é falsa (....), ou que mesmo verdadeira a reportagem não há mais interesse público na sua divulgação, etc. e para isso não serão necessária mais provas; (...) - (mov.1.36, Acórdão, 8ª C.Cível, J.04/09/2014). Entre outras possibilidades, a função principal de sites de buscas semelhantes ao “google”, é a de associar o critério de busca digitado pelo usuário com os dados existentes no meio virtual, gerando uma lista sobre o assunto. O Superior Tribunal de Justiça tem entendido pela não responsabilização dos provedores de busca pelos resultados encontrados, devendo o prejudicado dirigir sua pretensão contra os provedores de conteúdo, responsáveis pela disponibilização deste na internet. Entretanto, há situações em que se é necessária a intervenção pontual do Poder Judiciário para cessar o vínculo criado nos bancos de dados dos provedores de busca, casos em que a proposição se revela falsa, sem interesse público ou mesmo pelo decurso de tempo. Nestes casos excepcionais, orienta a Corte Superior que o direito ao esquecimento deverá preponderar, afim de evitar que a notícia fique perenizada nos sistemas de busca, sendo constantemente reavivada. Possível, nesta medida, desvincular o nome do prejudicado com o resultado da pesquisa. Nesta linha, é o precedente: RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. 1. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. AUSÊNCIA. 2. JULGAMENTO EXTRA PETITA. NÃO CONFIGURADO. 3. PROVEDOR DE APLICAÇÃO DE PESQUISA NA INTERNET. PROTEÇÃO A DADOS PESSOAIS. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. DESVINCULAÇÃO ENTRE NOME E RESULTADO DE PESQUISA. PECULIARIDADES FÁTICAS. CONCILIAÇÃO ENTRE O DIREITO 4. MULTA DIÁRIAINDIVIDUAL E O DIREITO COLETIVO À INFORMAÇÃO. APLICADA. VALOR INICIAL EXORBITANTE. REVISÃO EXCEPCIONAL. 5. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Debate-se a possibilidade de se determinar o rompimento do vínculo estabelecido por provedores de aplicação de busca na internet entre o nome do prejudicado, utilizado como critério exclusivo de busca, e a notícia apontada nos resultados. 2. O Tribunal de origem enfrentou todas as questões postas pelas partes, decidindo nos estritos limites da demanda e declinando, de forma expressa e coerente, todos os fundamentos que formaram o livre convencimento do Juízo. 3. A jurisprudência desta Corte Superior tem entendimento reiterado no sentido de afastar a responsabilidade de buscadores da internet pelos resultados de busca apresentados, reconhecendo a impossibilidade de lhe atribuir a função de censor e impondo ao prejudicado o direcionamento de sua pretensão contra os provedores de conteúdo, responsáveis pela disponibilização do conteúdo indevido na internet. Precedentes. 4. Há, todavia, circunstâncias excepcionalíssimas em que é necessária a intervenção pontual do Poder Judiciário para fazer cessar o vínculo criado, nos bancos de dados dos provedores de busca, entre dados pessoais e resultados da busca, que não guardam relevância para interesse público à informação, seja pelo conteúdo eminentemente privado, seja pelo decurso do tempo. 5. Nessas situações excepcionais, o direito à intimidade e ao esquecimento, bem como a proteção aos dados pessoais deverá preponderar, a fim de permitir que as pessoas envolvidas sigam suas vidas com razoável anonimato, não sendo o fato desabonador corriqueiramente rememorado e perenizado por sistemas automatizados de busca. 6. O rompimento do referido vínculo sem a exclusão da notícia compatibiliza também os interesses individual do titular dos dados pessoais e coletivo de acesso à informação, na medida em que viabiliza a localização das notícias àqueles que direcionem sua pesquisa fornecendo argumentos de pesquisa relacionados ao fato noticiado, mas não àqueles que buscam exclusivamente pelos dados pessoais do indivíduo protegido. 7. No caso concreto, passado mais de uma década desde o fato noticiado, ao se informar como critério de busca exclusivo o nome da parte recorrente, o primeiro resultado apresentado permanecia apontando link de notícia de seu possível envolvimento em fato desabonador, não comprovado, a despeito da existência de outras tantas informações posteriores a seu respeito disponíveis na rede mundial. 8. O arbitramento de multa diária deve ser revisto sempre que seu valor inicial configure manifesta desproporção, por ser irrisório ou excessivo, como é o caso dos autos. 9. Recursos especiais parcialmente providos. (STJ – 3ª T- REsp 1660168/RJ – Rel. p/ Acórdão Marco Aurélio Bellizze – j. 08/05/2018 – Dje 05/06/2018) – sublinhei. Acerca da possibilidade da exclusão ou indisponibilidade das reportagens esclareceu em audiência Paula Itimura, preposta do “Google do Brasil”, que a “google trabalha como provedor de pesquisa, então ela só retira informação por decisão judicial” (2’35’’ e seguintes). Atestou que se a Justiça determinasse teria como bloquear o acesso às notícias (5´18’’ e ss). O consegue retirar um conteúdo específico determinadogoogle judicialmente, não há como retirar todas as informações vinculadas àquela pessoa (8’50’’). Doutro lado, não demonstrou o apelante ter notificado o apelado requerendo a exclusão das reportagens inverídicas, a despeito de sua preposta ter atestado a inocuidade da medida. Embora o “google” não possa realizar censura prévia aos conteúdos inseridos, sob pena de direcionar ou mesmo esvaziar sua missão de pesquisa, é certo que tendo em conta a orientação do STJ, possível bloquear o acesso às notícias através de seu provedor de pesquisa. Nesta medida, não parece haver justiça na manutenção do nome de pessoa não vinculada as notícias ora questionadas, em prejuízo de seus negócios particulares, consoante confirmado pelas testemunhas ouvidas em juízo, considerando a possibilidade de cumprimento da ordem judicial. Assim, outra conclusão não há senão pela procedência do pedido de obrigação de não fazer, a fim de que o provedor de buscas demandado se abstenha de disponibilizar através de sua captação o acesso às reportagens indicadas na exordial que desabonam injustamente o recorrente (exordial, item 1), sob pena de multa. sanção prevista no art.537 do CPC, multa processual de natureza coercitiva ou “astreinte”,Vale anotar que a possui previsão legal e é meio eficiente de garantir o cumprimento da ordem judicial, podendo ser aplicada na fase de conhecimento, em tutela provisória ou sentença, fase de execução, desde que suficiente e compatível com a obrigação e que seja estabelecido prazo razoável para seu atendimento. Neste quadro, é de se fixar a sanção em R$500,00 (quinhentos reais)/dia, atribuindo prazo de 30 (trinta) dias para o cumprimento da obrigação, contados a partir da publicação deste Acórdão, momento em que foi reconhecido o direito do autor/apelante. b) Do dano moral Sem lugar o pleito de indenização pelos danos morais causados ao apelado, haja vista que o provedor de pesquisa não se responsabiliza pelo conteúdo das matérias postadas por terceiros. Apenas como ilustração, vale citar: A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça entende que a responsabilidade dos provedores de conteúdo de internet em geral depende da existência ou não do controle editorial do material disponibilizado na rede. No presente caso, a Corte de origem entendeu que não havia ingerência sobre o conteúdo, sendo a responsabilização indevida. (STJ-4ª T. - AgInt no REsp 1647548 / MT – Rel. Lázaro Guimarães – J.15/05/2018 – Dje 22/05/2018) É entendimento hodierno de que, sua responsabilidade, atém-se ao descumprimento da ordem judicial específica de indisponibilidade, do conteúdo apontado como infringente, na forma da Lei 12.965, de 23/04/14, (marco civil da internet), a qual estabelece princípios, garantias, direitos e deveres do uso da internet no Brasil. Embora a vigência da referida lei tenha se dado no curso dos presentes autos, apenas como parâmetro pode-se adotar o disposto em seu artigo 19: Art. 19. Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário. Desta maneira, não faz jus o autor/recorrente ao pedido de indenização por danos morais, cabendo frisar, uma vez mais que, no caso em tela o provedor de pesquisas não se trata do editor/criador das matérias, tampouco é responsável pela sua inserção no meio virtual. c) Da sucumbência Com a reforma da r. sentença, houve sucumbência recíproca entre as partes, na forma do “caput” do artigo 86 do CPC, devendo as partes responder a razão de 50% (cinquenta por cento) para cada uma, considerando que, dos dois pedidos iniciais (obrigação de fazer, sob pena de multa e indenização por danos morais), o autor obteve êxito em apenas um. Já a verba honorária é de ser fixada em 20% (vinte por cento) sobre o valor atualizado da causa (R$10.000,00-dez mil reais), na forma do art.85, §2º, do CPC, guardada a mesma proporção das custas e despesas processuais (50% para cada parte). Feitas estas considerações, os pedidos iniciais merecem parcial procedência, sendo reconhecido o direito do autor à obrigação de não fazer, sob pena de multa, nos termos da presente fundamentação. III – DECISÃO Ante o exposto, acordam os Desembargadores da 8ª Câmara Cível do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ, por unanimidade de votos, em julgar pelo (a) Provimento em Parte do recurso de WAJDI IBRAHIM EL-HAOULI. O julgamento foi presidido pelo (a) Desembargador Clayton De Albuquerque Maranhão, com voto, e dele participaram Desembargador Hélio Henrique Lopes Fernandes Lima (relator) e Desembargador Mário Helton Jorge. 28 de março de 2019 Hélio Henrique Lopes Fernandes Lima Des. Relator
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