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Acórdão
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ 12ª CÂMARA CÍVEL - PROJUDI APELAÇÃO CÍVEL Nº 000613-88.2016.8.16.0179, DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA – VARA DE REGISTROS PÚBLICOS. APELANTE:MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ. APELADO:CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA 6ª CIRCUNSCRIÇÃO DE CURITIBA. : ELZA ROSOT.INTERESSADA RELATOR:Desembargador ROBERTO MASSARO. APELAÇÃO CÍVEL SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA - – SENTENÇA QUE JULGOU PROCEDENTE A DÚVIDA CONSIDERANDO VÁLIDA A EXIGÊNCIA CARTORÁRIA – INSURGÊNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL -ALEGAÇÃO DE IMPOSSIBILIDADE DE EXIGÊNCIA DE INVENTÁRIO DO FALECIDO ESPOSO DA PARTE CASADA SOB REGIME DA SEPARAÇÃO LEGAL DE BENS, DIANTE DA PRESUNÇÃO LEGAL DE INCOMUNICABILIDADE PATRIMONIAL E MITIGAÇÃO DO ENTENDIMENTO TRAZIDO COM A SÚMULA Nº 377 DO STF – CONSTATAÇÃO - QUESTÃO DA COMUNICABILIDADE DOS BENS QUE SÓ PODE SER DISCUTIDA E COMPROVADA JUDICIALMENTE PELA DEMONSTRAÇÃO DE EMPREGO DE ESFORÇO COMUM MEDIANTE INTERPOSIÇÃO DE DEMANDA POR TERCEIRO INTERESSADO – PRESUNÇÃO LEGAL DE PATRIMÔNIO EXCLUSIVO DO TITULAR DO IMÓVEL – INTELIGÊNCIA DO ARTIGOS 1641 E 1687 AMBOS DO CÓDIGO CIVIL, COM TEMPERANÇA NA APLICABILIDADE DO ENTENDIMENTO TRAZIDO COM O VERBETE SUMULAR – POSSIBILIDADE DE PRENOTAÇÃO DO TÍTULO APRESENTADO PELA INTERESSADA – RECUSA INJUSTIFICADA – SENTENÇA REFORMADA – DÚVIDA IMPROCEDENTE – PRECEDENTES - HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS – NÃO CABIMENTO – ENTENDIMENTO DO STJ A RESPEITO. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E PROVIDO. 1. A presunção legal de incomunicabilidade dos bens adquiridos na constância do casamento regido pelo regime da separação legal, somente pode ser desconstituída, com a interposição de demanda ajuizada pelo prejudicado, demonstrando a aquisição com esforço comum. 2. Não se pode exigir a abertura de inventário do falecido esposo da parte como exigência prévia a prenotação cartorária de doação do imóvel pertencente a cônjuge supérstite. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 000613-88.2016.8.16.0179, da Vara de Registros Públicos, do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba, em que figura como Apelante MINISTÉRIO e DE REGISTRO DEPÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ Apelado CARTÓRIO IMÓVEIS DA 6ª CIRCUNSCRIÇÃO DE CURITIBA sendo , Interessada ELZA ROSOT. I – RELATÓRIO Trata-se de recurso de apelação cível interposto pelo Ministério Público Estadual contra decisão proferida nos autos de Suscitação de Dúvida nº 000613-88.2016.8.16.0179, tendo sido encaminhada pelo Cartório de Registro de Imóveis da 6ª Circunscrição de Curitiba, a pedido da parte interessada, que julgou procedente a dúvida suscitada, considerando válida a recusa da prenotação solicitada por Elza Rosot, extinguindo o procedimento. Por fim, condenou a Suscitante somente no pagamento das custas/despesas processuais. Inconformado, pretendendo a sua reforma, o Ministério Público interpôs recurso de apelação cível (mov. 36), alegando em suas razões, em síntese, que: após aa) vigência do Código Civil de 2002 a Súmula n. 377 do STF restou inaplicável, pois não há mais somente o regime legal de separação de bens, mas também o convencional, sendo que para ambos existe os mesmos efeitos legais e restrições; b) ainda que válida a referida súmula a comunicabilidade dos bens não se daria de forma automática, necessitando a intervenção de terceiro interessado para demonstrar e comprovar que os bens adquiridos durante o casamento foram mediante recurso de ambos; como a suscitante adquiriu os imóveis durante ac) vigência do casamento com o falecido esposo, mediante regime da separação legal de bens, seria dispensável que houvesse abertura de inventário, podendo ela dispor livremente de tais bens, sobretudo por estarem livres e desembaraçados, constando nas respectivas matrículas somente em seu nome, razão pela qual seria improcedente a dúvida suscitada, cabendo ao Cartório a averbação e registro de doação realizada nas respectivas matrículas imobiliárias. Ao final requereu o conhecimento e o provimento do recurso. Não houve manifestação pela parte Apelada consoante certificado na mov. 53. A douta Procuradoria Geral de Justiça apresentou seu r. parecer (mov. rec. 8), opinando pelo conhecimento e provimento do recurso. Em seguida, vieram-me conclusos para julgamento. É o relatório. II – VOTO Admite-se o recurso em ambos os efeitos legais, nos termos do artigo 131 da Lei de Registros Públicos. Presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, conhece-se do presente recurso. Sustenta o Apelante que a r. decisão deve ser reformada, reconhecendo-se a possibilidade de disposição do imóvel de titularidade da parte Interessada, por não estar albergado no regime matrimonial havido com o falecido, sendo desnecessário o Inventário, sendo inaplicável o verbete sumular nº 377 do STF ao caso, podendo as doações por ela procedidas serem registradas na matricula imobiliária, sendo caso de improcedência da dúvida suscitada. Em contrapartida, a decisão recorrida entendeu pela validade e pertinência da exigência feita pelo Cartório, dando procedência a dúvida solicitada, embasada na existência de respaldo legal a recusa do registro do título prenotado sob nº 488.452 apresentado pela parte interessada. Após a entrada em vigor do Código Civil de 2002, passou-se a existir grande controvérsia doutrinária e jurisprudencial acerca da aplicabilidade ou não do contido no verbete sumular nº 377 do Supremo Tribunal Federal. Assim dispõe a referida súmula: “No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento.” E isto porque o artigo 1641 do CC prevê a obrigatoriedade de adoção do regime[1] de separação legal de bens nos casos em que o nubente tiver mais de 70 anos, ou quando qualquer um deles (nubentes) necessite de suprimento judicial para casar, bem como o artigo 1687 também do referido Código dispõe que uma vez[2] aplicado ao matrimonio esse regime, seja ele convencional, ou seja eleito pelos nubentes, seja o imposto pela lei, poderia haver a individualidade patrimonial de cada um, afastando a comunicabilidade durante o casamento, aliás pressuposto do verbete sumular. Desta maneira, a discussão seria exatamente no fato de que a aplicabilidade da Súmula nº 377 do STF poderia trazer a imposição automática da divisão patrimonial dos bens adquiridos na constância do casamento, mesmo diante do regime de separação de bens, instigando o enriquecimento ilícito, contrariando frontalmente o entendimento preconizado pelo Código Civil, sobretudo dando conotação de uma comunhão parcial. No entanto, modernamente, a jurisprudência pátria tem feito uma releitura interpretativa da referida súmula, de maneira a compatibilizá-la com o regramento jurídico trazido com o Código Civil, afirmando que a comunicabilidade dos bens adquiridos na constância da união só poderia ser reivindicada a partir da prova de existência do esforço comum dos cônjuges. Corroborando, tem-se: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE FAMÍLIA. CASAMENTO. SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA DE BENS (ARTS. 258, II, DO CC/1916 E 1.641, II, DO CC/2002). PARTILHA. PATRIMÔNIO. ESFORÇO COMUM. PROVA. INDISPENSABILIDADE. SÚMULA Nº 377/STF. INTERPRETAÇÃO. ART. 1.829, I, DO CÓDIGO CIVIL. HERANÇA. CÔNJUGE. DESCENDENTES. CONCORRÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE. LEGISLAÇÃO. APLICABILIDADE. USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA. REVOLVIMENTO PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 1973 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. A jurisprudência desta Corte encontra-se consolidada no sentido de que, no regime de separação obrigatória de bens, comunicam-se aqueles adquiridos na constância do casamento desde que comprovado o esforço comum para sua aquisição, consoante interpretação conferida à Súmula nº 377/STF. 3. O regime da separação convencional de bens, escolhido livremente pelos nubentes, à luz do princípio da autonomia de vontade (por meio do pacto antenupcial), não se confunde com o regime da separação legal ou obrigatória de bens, que é imposto de forma cogente pela legislação (arts. 1.641 do Código Civil de 2002 e 258 do Código Civil de 1916) e no qual efetivamente não há concorrência do cônjuge com o descendente. 4. Eventual direito à divisão de bens objeto de esforço comum depende de prova, o que não pode ser avaliado nesta fase processual por ensejar usurpação de competência e pelo óbice da Súmula nº 7/STJ. 5. Agravo interno não provido. (AgInt no AgRg no AREsp 233788 / MG, rel. Min. RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, DJe 21/11/2018 – STJ). AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AÇÃO ANULATÓRIA - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA DA AUTORA. 1. Segundo a reiterada jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, não há que se confundir decisão contrária aos interesses da parte com negativa de prestação jurisdicional, nem fundamentação sucinta com ausência de fundamentação. Precedentes. 2. Nos temos da jurisprudência desta Corte, entende que não há como aferir eventual ofensa ao art. 373 do CPC/2015 e correlatos sem incursão no conjunto probatório dos autos. 2.1. Ilidir as convicções relacionadas à validade do testamento demandariam reexame das provas contidas nos autos. Incidência da Súmula 7/STJ. 3. Este Superior Tribunal de Justiça entende que, a partir da entrada em vigor do Código Civil de 2002, o cônjuge é herdeiro necessário, qualquer que seja o regime de bens, exceção feita ao regime da separação legal ou obrigatória, conforme expressamente definido nos artigos 1.641 e 1.829 do diploma civil. Precedentes da Segunda Seção. 3.1. No caso em tela, a Corte de origem verificou que as partes se casaram sob o regime da separação obrigatória, de modo que a cônjuge sobrevivente não é herdeira necessária. Incidência da Súmula 83/STJ. 4. Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp 1111415 / SE, rel. Min. MARCO BUZZI, DJe 19/09/2018 – STJ). No presente caso, como se constatada da matricula imobiliária juntada nos autos originários, o imóvel em questão poderia ser doado pela parte Interessada porque teria ele sido adquirido durante o casamento dela com o falecido Wanderland, cujo regime era o da separação legal de bens, desnecessitando a abertura de inventário para demostrar a ausência de comunicabilidade patrimonial decorrente do enlace conjugal, sobretudo porque a presunção seria de patrimônio exclusivo dela, cabendo a eventual terceiro interessado a interposição de demanda para revelar a comunicabilidade. Neste aspecto, seria o caso de reforma da sentença recorrida, reconhecendo na invalidade da exigência procedida pelo Cartório de Registro de Imóveis ao deixar de prenotar o título apresentado pela Interessada. Desta forma, VOTO no sentido de conhecer e dar provimento ao recurso de apelação, nos termos da fundamentação. Outrossim, não há que se falar em honorários sucumbenciais recursais em virtude de não ter sido arbitrado pela decisão recorrida. Afinal: "Os honorários recursais não têm autonomia nem existência independente da sucumbência fixada na origem e representam um acréscimo (o CPC/2015 fala em "majoração") ao ônus estabelecido previamente, motivo por que na hipótese de descabimento ou na de ausência de fixação anterior, não haverá falar em honorários recursais. (RESp n. 1703677/PE, rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe 01/12/2017 – STJ)". III - DISPOSITIVO Ante o exposto, acordam os Desembargadores da 12ª Câmara Cível do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ, por unanimidade de votos, em julgar pelo Provimento do recurso de PROMOTORIA DE JUSTIÇA VARA DE REGISTROS PÚBLICOS, ACIDENTES DE TRABALHO E PRECATÓRIAS CÍVEIS DE CURITIBA/PR. O julgamento foi presidido pelo Desembargador Roberto Antonio Massaro (relator), com voto, e dele participaram Juiz Subst. 2ºgrau Alexandre Gomes Gonçalves e Juiz Subst. 2ºgrau Kennedy Josue Greca De Mattos. Curitiba, 08 de maio de 2019. Des. ROBERTO MASSARO Relator [1] 641. É obrigatório o regime da separação de bens no casamento: - das pessoas que o contraírem comArt. 1. I inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento; - da pessoa maior de sessenta anos; – da pessoaII II maior de 70 (setenta) anos; - de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial.III [2] Art. 1.687. Estipulada a separação de bens, estes permanecerão sob a administração exclusiva de cada um dos cônjuges, que os poderá livremente alienar ou gravar de ônus real.
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