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1. 2. 3. 4. 5. 6. PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ 11ª CÂMARA CÍVEL - PROJUDI RUA MAUÁ, 920 - ALTO DA GLORIA - Curitiba/PR - CEP: 80.030-901 Autos nº. 0053075-61.2018.8.16.0014 Apelação Cível n° 0053075-61.2018.8.16.0014 2ª Vara Cível de Londrina Apelante(s): LIBERALINA DA SILVA CARDOSO Apelado(s): Ministério Público do Estado do Paraná Relator: Desembargador Sigurd Roberto Bengtsson APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INTERDIÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA PELA AUSÊNCIA DE DETERMINAÇÃO DE REALIZAÇÃO DE NOVO LAUDO PERICIAL PARA INVESTIGAÇÃO DO REAL GRAU DE DEFICIÊNCIA QUE EVENTUALMENTE ACOMETE A APELANTE. INCONGRUÊNCIA ENTRE INFORMAÇÕES CONSTANTES DA AVALIAÇÃO MÉDICA E DO LAUDO REALIZADO PELA EQUIPE MULTIDISCIPLINAR. NECESSIDADE DE APURAÇÃO INEQUÍVOCA DE QUAIS SÃO OS IMPEDIMENTOS DA APELANTE. ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA QUE DETERMINA REALIZAÇÃO DE AVALIAÇÃO BIOPSICOSSOCIAL, O QUE NÃO ACONTECEU NO CASO CONCRETO. NECESSIDADE DE OITIVA DE PARENTE QUE MANTÉM CONTATO COM A APELANTE. SENTENÇA ANULADA. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E PROVIDO. Ação de interdição cumulada com nomeação de curador ajuizada pelo Ministério Público. Incongruência entre avaliação médica e laudo pericial realizado com a apelante. Respostas diferentes para mesmas afirmações, causando dúvidas. Necessidade de oitiva da prima da apelante, única parente com quem ainda tem contato, ainda que não haja possibilidade de acolhimento da apelante pela prima. Estatuto da pessoa com deficiência que determina realização de avaliação biopsicossocial para que seja constatada, sem dúvidas, a necessidade de interdição. Sentença anulada para que seja realizada nova perícia, com esclarecimentos de quais atos da vida civil a apelante eventualmente necessite de auxílio e qual grau de deficiência que a acomete. Recurso provido. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 0053075-61.2018.8.16.0014, da Comarca da Região Metropolitana de Londrina – Foro Central de Londrina – 2ª Vara Cível de Londrina, em que é L. DA S. C. apelante e apelado MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ. I – RELATÓRIO. Trata-se ação de interdição e nomeação de curador, ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Paraná em favor de L. DA S. C., afirmando impossibilidade de exercício pela interditanda dos atos da vida civil, requerendo a nomeação de O. Z. Z. como seu curador. Julgado procedente o pedido inicial (evento 44.1), declarando-a relativamente incapaz de exercer pessoalmente, apenas, os atos relacionados aos direitos de natureza patrimonial e negocial. Nomeado O. Z. Z. como curador, sujeitando-o a prestação anual de contas da administração dos bens da curatelada. Insurge-se o apelante (evento 52.1), alegando, em suma: i) “aparentes incongruências entre os laudos produzidos no âmbito do projeto justiça no bairro. Interrogatório da interditanda, aliás, que desmente em absoluto as alegações da inicial e as conclusões do laudo psicossocial. Indeferimento do pedido de interdição que se impõe. ”; ii) “parecem pouco fidedignas as conclusões adotadas no âmbito do Justiça no Bairro quanto à condição psíquica e intelectual da recorrente, que parece iii) preservada ou, no mínimo, condizente com sua idade, educação e contexto social.”; “A interdição é uma medida extremamente gravosa, que interfere numa esfera muito fundamental dos direitos da pessoa. É necessário, assim, que a ; iv) pretende a fixação de honorários recursais emincapacitação do sujeito seja verificada por procedimentos inequívocos.” favor do curador especial nomeado para atuar em favor da apelante. Apresentadas contrarrazões (evento 58.2). Manifestação do Ilustre Procurador de Justiça, Dr. Paulo Roberto Lima dos Santos (evento 8.1), pelo conhecimento e provimento do recurso de apelação, com retorno dos autos à origem, a fim de que a apontada incapacidade seja objeto de segura investigação. É a breve exposição. 1. II - VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO. Nulidade da sentença. Trata-se de recurso de apelação interposto contra a sentença que julgou procedentes os pedidos iniciais, declarando a ora apelante relativamente incapaz de exercer pessoalmente, apenas, os atos relacionados aos direitos de natureza patrimonial e negocial, nomeando como curador O. Z. Z., diretor da instituição de Longa Permanência para Idosos Lar Maria Tereza Vieira, local em que a apelante está há mais de 15 (quinze) anos. Fundamentado o recurso de apelação na incongruência entre a avaliação médica e o laudo pericial psicossocial realizado com a apelante (evento 1.2), alegando necessidade de nova perícia para que seja comprovada inequivocamente a incapacidade da apelante, ainda que parcial. Com razão a apelante. Iniciado o pedido de interdição da apelante pelo Ministério Público do Estado do Paraná, sob fundamento de ser pessoa idosa (75 anos) e com grave comprometimento físico e mental para executar ações e tarefas da sua vida pessoal, cívica e social comunitária, apresentando quadro clínico compatível com doença ou transtorno mental descrito no CID 10 F 33.9 (Transtorno Depressivo Recorrente não Especificado), o que a torna totalmente impossibilitada de exprimir sua vontade. Juntou com a petição inicial avaliação médica e laudo pericial psicossocial realizado pelo programa Justiça no Bairro (evento 1.2) e realizada audiência com a apelante (evento 24.2). Contestação apresentada pelo Curador Especial nomeado em favor da requerida, insurgindo-se quanto aos termos da avaliação médica e perícia psicossocial, alegando necessidade de esclarecimentos, bem como que fosse ouvida a prima da apelante, mencionada por ela na audiência de interrogatório (evento 37.1). Julgado procedentes os pedidos iniciais, fundamentando o magistrado desnecessidade de oitiva da E. S. S., única parente com quem a apelante mantém contato, em razão de o próprio Curador Especial ter mencionado que em contato com E. S. S., mencionou não ter condições de abrigar a interditanda. Quanto ao mérito, fundamentou necessidade de a apelante ser representada, haja vista o laudo pericial revelar que a interditanda apresenta “transtorno depressivo recorrente sem especificação” e que sua patologia é “irreversível e permanente”, sendo que é “totalmente impossibilitada de exprimir sua vontade, gerir e interagir de forma plena com o seu mundo pessoal e social-comunitário, bem como em responder sobre os atos de sua vida civil e financeira”. Embora o magistrado seja o destinatário das provas, sendo quem deve decidir a respeito das provas e diligências necessárias ao julgamento da lide, o refazimento da prova pericial ou, ao menos, determinação para que o fossem prestados esclarecimentos sobre o laudo médico apresentado era imprescindível para melhor instrução do feito. É sabido que o Estatuto da Pessoa com Deficiência alterou o Título IV do Livro IV do Código Civil de 2002, trazendo nova interpretação no que diz respeito a incapacidade, mencionando que a deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa: Art. 6oA deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa, inclusive para: I - casar-se e constituir união estável; II - exercer direitos sexuais e reprodutivos; III - exercer o direito de decidir sobre o número de filhos e de ter acesso a informações adequadas sobre reprodução e planejamento familiar; IV - conservar sua fertilidade, sendo vedada a esterilização compulsória; V - exercer o direito à família e à convivência familiar e comunitária; e VI - exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como adotante ou adotando, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas. No caso concreto, há discrepância nas respostas exaradas na avaliação médica e no laudo pericial psicossocial juntados ao evento 1.2. Constou da avaliação médica (fls. 02/05 – evento 1.2), assinada pela médica Dra. Viviane C. Lima ser a interditanda: i) orientada no espaço (lugares), temporal e em relação a si; ii) que a velocidade de sua fala é normal, que segue discurso linear, claro, lógico e objetivo; iii) que a modulação afetiva (demonstração dos sentimentos através da expressão facial), psicomotricidade e impulsividade são normais; iv) que sua atenção, memória imediata/recente e tardia, juízo crítico e insight (noção de sua própria doença/condição) estão preservados; v) que consegue expressar suas preferências e vontades; vi) que não consegue gerir sua própria vida geral de maneira plena e sem ajuda de terceiros, e não consegue realizar de maneira plena os atos do cotidiano como alimentação, vestimentas, higiene, lazer e cuidados com saúde; vii) que não consegue realizar de maneira segura e coerente os atos que importem em disposição de bens/direitos de natureza patrimonial/negocial, compra, vendas e trocas rotineiras, contratar e demitir empregados, utilizar adequadamente cartão bancário e cheque, movimentar conta corrente, realizar empréstimos bancários e financeiros, não tem noção/entende conceito geral de juros e não tem condições de administrar seus próprios bens; viii) que reconhece adequadamente dinheiro, consegue calcular troco e tem noção do valor do dinheiro; ix) que o transtorno/doença que a acomete é permanente e não apresenta condição mental de tomar decisões para administrar sua vida (saúde, finanças, atos). Concluiu a médica que “A pericianda não possui plena capacidade para gerir os atos de sua vida civil. ” Constou do Laudo Pericial Psicossocial (fls. 06/13 – Evento 1.2), realizado pela Equipe Multidisciplinar do Programa Justiça no Bairro, sem indicação da pessoa que assinou o laudo, que a interditanda: i) possui déficits no campo da comunicação, seja na recepção ou na produção de constructos verbais, tendo em vista que seu sistema cognitivo (compreensão, raciocínio, memória e audição) se encontra comprometido, limitando-se assim a uma linguagem pobre e por vezes sem nexo de conteúdo; ii) necessita ser supervisionado com relação ao seu banho, ato de se vestir, ir ao banheiro e demais cuidados e higiene corporal; iii) não consegue preparar sua própria refeição, fazer pequenas compras sozinha e administrar seus remédios. Não tem condições de morar sozinha, haja vista prejuízo de funcionamento do sistema cognitivo; iv) não tem condições alguma em gerir negócios; v) em razão do comprometimento do seu sistema cognitivo, o qual sua tendência é regredir ainda mais, encontra-se impossibilitado de realizar operações matemáticas simples; vi) orientação espacial e temporal encontra-se comprometida, assim como sua percepção de si mesmo e de noção do outro, haja vista o quadro clínico da doença afetar diretamente uma das funções mentais que é sensopercepção; vii) sofre variação de suas emoções com traços de euforia e depressão; viii) não consegue expressar sua vontade, desejo, juízo de valor ou discernimento, sejam estes para gerir sua própria saúde, seus direitos ou deveres; ix) o nível intelectual do entrevistado encontra-se limitado e com tendência a regressão devido ao processo do envelhecer somado ao transtorno mental; x) a avaliada se encontra debilitada e grave estado de saúde física e mental, sua verbalização está prejudicada , não retém informações e não completa frases ou constructos de sentenças. Conclui-se o laudo com a constatação de que “a avaliada possui GRAVE comprometimento físico e mental para executar ações e tarefas da sua vida pessoal, cívica e social-comunitária. Apresentando quadro clínico compatível com doença ou transtorno mental descrita no Código Internacional de Doenças (CID 10): TRANSTORNO DEPRESSIVO RECORRENTE NÃO ESPECIFICADO – CID 10 F33.9. O quadro clínico da doença diagnosticada é adquirido, irreversível e permanente que a torna TOTALMENTE IMPOSSIBILITADA de exprimir sua vontade, gerir e interagir de forma plena com seu mundo pessoal e social-comunitário, bem como em responder sobre os atos de sua vida civil e financeira. ” Possível verificar que embora ambos os documentos tenham mencionado que a apelante não teria capacidade para gerir, sozinha, os atos da sua vida civil, há discrepância na avaliação médica e no laudo pericial, principalmente no que diz respeito à orientação espacial, temporal, de pensamento, preservação de memória recente e tardia, juízo crítico, reconhecimento do dinheiro e do valor que dele. Nota-se respostas diferentes para as mesmas perguntas constantes da avaliação médica e do laudo pericial psicossocial, restando margem para dúvidas. Não está claro se a doença que acomete a apelante (CID 10 F 33.9 – Transtorno depressivo recorrente não especificado) impede que exerça sozinha os atos da vida civil, havendo necessidade de realização de nova perícia médica para que não restem dúvidas. O §1º do artigo 2º do Estatuto da Pessoa com Deficiência determina que em casos de necessidade de avaliação da deficiência, esta será biopsicossocial: Art. 2oConsidera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. § 1oA avaliação da deficiência, quando necessária, será biopsicossocial, realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar e considerará: (Vigência) I - os impedimentos nas funções e nas estruturas do corpo; II - os fatores socioambientais, psicológicos e pessoais; III - a limitação no desempenho de atividades; e IV - a restrição de participação. Cristiano Chaves de Farias, Rogério Sanches Cunha e Ronaldo Batista Pinto, ensinam: “A avaliação biopsicossocial é aquela que considera aspectos sociais que circundam o deficiente, além, por óbvio, de dados médicos capazes de demonstrar sua incapacidade. Na avaliação biopsicossocial há, portanto, a junção desses dois aspectos na abordagem do deficiente, superando-se, nessa linha de raciocínio, o simples modelo biológico, para se considerar, em acréscimo, fatores sociais outros como nível de escolaridade, profissão, composição familiar, etc. Como esclarece DANIEL PULINO, “a aferição da invalidez não se resume, portanto, numa comprovação de ordem exclusivamente médica – embora este seja uma condição necessária para a edição do ato de concessão do benefício -, compreendendo um juízo complexo, em que se deve avaliar a concreta possibilidade de o segurado conseguir retirar do próprio trabalho renda suficiente para manter sua subsistência em patamares, sendo iguais, ao menos compatíveis com aqueles que apresentavam antes de sua incapacitação, e que foram objetivamente levados em consideração no momento de quantificação das suas contribuições para o sistema – dentro, sempre, dos limites de cobertura do regime geral de previdência social” (A aposentadoria por invalidez no direito positivo brasileiro, São Paulo: LTr, 2001. P. 115). Nos termos do §2º, do art. 16 do Decreto 6..214/2007, que regulamente o benefício da prestação continuada, “a avaliação social considerará os fatores ambientais, sociais e pessoais”, enquanto que a avaliação médica "considerará as deficiências nas funções e nas estruturas do corpo, e ambas considerarão a limitação do desempenho de atividades e a restrição da participação social, segundo suas especificidades.”[1] São os pertinentes argumentos do Ilustre Procurador de Justiça: “(...) Na hipótese, além do interrogatório da interditanda, foi elaborado um único laudo por médica atuante no Projeto Justiça no Bairro, cujas respostas quanto à capacidade de L. de gerir seus bens foram, ao entendimento desta Procuradoria de Justiça, incongruentes (mov. 1.2). Referido documento, aliás, possui gritante contradição, pois, ao mesmo tempo em que a médica atesta que a apelante é orientada em relação a si, lugar e tempo, e tem preservadas a sua atenção, memória e juízo, diz, por outro lado, que ela é portadora de enfermidade que a impede de gerir sua própria vida geral sem ajuda de terceiros. Do mesmo modo, o relatório afirma que L. é capaz de reconhecer dinheiro e calcular o troco, porém, atesta que a idosa é não pode de gerir sua própria conta-corrente e realizar outras operações monetárias, inexistindo justificativa para esta conclusão. Outrossim, mesmo diante de um único laudo e apesar das manifestações do curador especial nomeado para defender os interesses da inteditanda no sentido de realizar nova perícia, houve o d. Juízo a quo por fundamentar o indeferimento deste pleito, sopesando, em sentença, que “a realização de perícia complexa é devida apenas quando necessária para avaliação da deficiência”, entendendo que “a condição da interditanda está suficiente demonstrada na Avaliação Médica e Laudo Psicossocial encartado no mov. 1.2”. Pois bem. Inobstante o respeitável pronunciamento judicial, vislumbra-se que o pleito, afora a questão da procedência ou não da pretensão inicial, não pode ser deferido desde logo, sem que mais provas a seu respeito sejam produzidas, haja vista a possibilidade de o Julgador de 2ª instância partilhar de entendimento diverso. À ausência de perícia judicial, some-se o fato de que o interrogatório da curatelada não é conclusivo quanto às alegadas limitações. Do contrário, deixa evidente a compreensão da Sra. L. quanto às perguntas que lhe foram dirigidas, sendo que sua própria narrativa (clara sobre os acontecimentos e pensamentos que possui) demonstra que, não obstante a patologia que a acomete, ela é, aparentemente, capaz de se autodeterminar e exprimir sua vontade com suficiente desenvoltura. In casu, em se tratando de possível interdição, é imprescindível a juntada de documentos pertinentes ao esclarecimento da quaestio, por se tratar, consoante exposto, de medida bastante drástica e limitadora. É que, apesar de ser o Julgador o destinatário da prova, ao decidir quais elementos probatórios poderão ser produzidos, não pode ele inviabilizar o direito das partes de usar de todos os meios para obter a tutela desejada e ao duplo grau de jurisdição, impedindo que provas pertinentes à controvérsia, ainda que contrárias/irrelevantes ao posicionamento a ser adotado na sentença, sejam produzidas e possam acompanhar eventual recurso, subsidiando futuro enfoque ao revisor de 2º grau. Com efeito, o princípio do duplo grau de jurisdição, que possui plena acolhida no ordenamento jurídico, assegura àquele que litiga em processo judicial o direito de, ao obter uma sentença que lhe é desfavorável, buscar a reforma do julgado mediante interposição de recurso à Órgão jurisdicional hierarquicamente superior. Tal diretriz guarda forte vínculo com os princípios da ampla defesa e do contraditório, pois tais preceitos visam assegurar que o litigante possa valer-se de todos os meios processuais previstos no ordenamento jurídico para alcançar a tutela jurisdicional que melhor satisfaça seus interesses. Neste pensar, ainda que o d. Magistrado a quo entenda pelo deferimento do pedido do apelado por entender que o único laudo anexado à exordial é suficiente para comprovar a incapacidade de L., pecou ao impedir a produção de provas necessárias ao exame da controvérsia por instância superior, inviabilizando, de consequência, eventual revisão e reforma do julgado pelo Juízo ad quem. Deste modo, tendo em vista que a apelante teve tolhido seu direito à ampla defesa, ao contraditório e ao duplo grau de jurisdição, pois, nos termos acima traçados, a restrição à ampla instrução probatória impossibilita a revisão da decisão que lhe é desfavorável, merece ser anulada a sentença, devendo, em seguida, ser dado prosseguimento ao feito em primeira instância, oportunizando-se a produção probatória.” Conforme nota de Theotonio Negrão, José Roberto F. Gouvêa, Luiz Guilherme A. Bondioli e Joao Francisco N. da Fonseca (Código de Processo Civil e legislação processual em vigor. 44. Ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 455): “Se havia provas a produzir, até em recurso especial pode ser anulado o julgamento antecipado da lide (RTJ 113/416, 123/666; STF-RT 599/246, 620/240). Neste caso, procede, inclusive, a rescisória da sentença proferida (TFR-1ª Seção, AR 1.040, Min. Nelson Naves, j. 1.4.87, DJU 18.6.87).” É a jurisprudência: “AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS – ROUBO DE CAMINHÃO COM MERCADORIA ESTACIONADO NO PÁTIO DA EMPRESA RÉ – JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE – CONTROVÉRSIA FÁTICA EXISTENTE – NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA PLEITEADA POR AMBAS AS PARTES – CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO – SENTENÇA CASSADA – RECURSO PROVIDO. É o juiz o destinatário das provas, cumprindo-lhe, dessarte, dirigir a instrução e, mesmo de ofício, determinar produção das provas necessárias ao acertamento do caso e, pois, ao julgamento do mérito (art. 370, CPC/15).” (TJPR – Apelação Cível n° 0003473-14.2016.8.16.0001 – Relator Desembargador Domingos Ribeiro da Fonseca. J. 21/06/2018. ) Ademais, há necessidade de ser ouvida a Sra. E. S. S., prima da apelante e única parente com quem ela mantém contato, ainda que já tenha explanado impossibilidade em abrigar a apelante, deve prestar seus esclarecimentos sobre a situação atual da interditanda. 1. Desse modo, diante do cerceamento de produção de provas e não havendo clareza nos documentos juntados com a petição inicial, anula-se a sentença, para que seja melhor investigado o grau de deficiência que acomete L. DA S. C., com realização de avaliação biopsicossocial e oitiva de E. S. S., nos termos do voto. Honorários advogado dativo pela interposição do recurso de apelação. Ajuizada ação de interdição pelo Ministério Público do Estado do Paraná em desfavor da apelante, julgado procedentes os pedidos iniciais e fixados honorários em favor do Curador Especial nomeado para atuar em favor da requerida no valor de R$ 1.700,00 (mil e setecentos reais) - (evento 44.1). Interposto recurso de apelação pela requerida, pretendendo a reforma da sentença para que seja julgado improcedente o pedido de interdição ou, alternativamente, realização de nova perícia, deve ser fixado honorários ao Curador Especial em razão da interposição do recurso. Os honorários de defensores nomeados pelo juízo devem ser fixados de acordo com o art. 85, § 2º, do CPC e a Resolução Conjunta nº 13/2016 – PGE/SEFA, que instituiu a tabela de honorários da advocacia dativa. A referida tabela de honorários prevê o pagamento de honorários pela interposição do recurso de apelação, no valor mínimo de R$ 750,00 (setecentos e cinquenta reais) e máximo de R$ 1.250,00 (mil duzentos e cinquenta reais) – item 2.10. Vale ressaltar que os valores indicados na mencionada tabela foram estabelecidos em consonância com o Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, conforme preceitua o art. 5º, §1º da Lei Estadual 1.8664/2015: Art. 5ºO advogado regularmente inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil - Seção do Paraná - OAB-PR, nomeado judicialmente para defender réu pobre em processo de natureza civil ou criminal, ou atuar como curador especial, após o trânsito em julgado da decisão, terá os honorários pagos pelo Estado, na forma disposta nesta Lei. § 1ºOs honorários a que se refere este artigo serão fixados pelo juiz na sentença de acordo com, tabela elaborada por resolução conjunta do Secretário de Estado da Fazenda e do Procurador-Geral do Estado, com prévia concordância do Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, a ser editada num prazo máximo de sessenta dias da vigência desta Lei. Considerando, portanto, os critérios estabelecidos no art. 85, § 2º, do NCPC: grau de zelo do profissional, natureza da demanda e o trabalho despendido pelo profissional e atendendo, ainda, a Resolução Conjunta nº 13/2016 – PGE/SEFA, os honorários advocatícios em razão da interposição do recurso de apelação devem ser fixados em R$ 750,00 (setecentos e cinquenta reais), por atender as peculiaridades do caso concreto e remunerar os serviços prestados pelo Curador Especial, sem prejuízo dos honorários fixados na sentença. Nesse sentido já decidido recentemente por esta 11ª Câmara Cível: “APELAÇÃO CÍVEL. REPRESENTAÇÃO PARA APURAÇÃO DE INFRAÇÃO ADMINISTRATIVA CONTRA GENITORES DE ADOLESCENTE QUE NÃO ESTAVA FREQUENTANDO A ESCOLA – SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA – APLICAÇÃO DA MULTA PREVISTA NO ART. 249 DO ECA, FIXADA EM TRÊS SALÁRIOS DE REFERÊNCIA. PRELIMINARES AFASTADAS – POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO E LEGITIMIDADE PASSIVA VERIFICADAS NO CASO DOS AUTOS. PRETENSÃO DE AFASTAR A CONDENAÇÃO – DESCABIMENTO – GENITORES QUE, CITADOS, DEIXARAM DECORRER O PRAZO IN ALBIS SEM APRESENTAR DEFESA – NEGLIGÊNCIA DOS PAIS DEVIDAMENTE COMPROVADA, A DESPEITO DA REVELIA – PRÁTICA DE INFRAÇÃO ADMINISTRATIVA POR DESCUMPRIMENTO DOS DEVERES INERENTES AO PODER FAMILIAR - NEGLIGÊNCIA NOS CUIDADOS COM A EDUCAÇÃO DO FILHO DEMONSTRADA. DECISÃO MANTIDA. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM FAVOR DO DEFENSOR DATIVO DOS APELANTES – ARBITRAMENTO CONFORME RESOLUÇÃO CONJUNTA Nº 04/2017 DA PGE/SEFA – ART. 5º, §1º DA LEI ESTADUAL Nº 18.664/2015. RECURSO DESPROVIDO.” (TJPR – 11ª Câmara Cível - 647-86.2016.8.16.0042 – Alto Piquiri – Rel.: Mario Nini Azzolini – J. 08.02.2018). Também já decidido pela 12ª Câmara Cível de idêntica competência: DIREITO CIVIL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. ADVOGADA DATIVA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PRELIMINAR. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. JUNTADA DA RESPECTIVA DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICO-FINANCEIRA, APÓS REGULAR INTIMAÇÃO. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DA BENESSE EM GRAU RECURSAL. MÉRITO. VALOR DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. NOMEAÇÃO DE ADVOGADA DATIVA À PARTE RÉ, EM RAZÃO DE CITAÇÃO POR EDITAL. §1º DO ART. 22 DA LEI N. 8.906/94. DEFESA REALIZADA POR NEGATIVA GERAL. ARBITRAMENTO DOS RESPECTIVOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NO VALOR DE R$ 350,00 (TREZENTOS E CINQUENTA REAIS). OBSERVÂNCIA DOS PARÂMETROS PREVISTOS NA TABELA DE HONORÁRIOS DA ADVOCACIA DATIVA INSTITUÍDA PELA RESOLUÇÃO CONJUNTA N. 13/2016 – SEFA/PGE. 1. A despeito da presunção relativa de necessidade emanada da declaração de hipossuficiência econômico-financeira juntada pela Apelante (Advogada dativa), tal circunstância, aliada à aceitação do encargo de desempenhar a função no processo em virtude da deficiência estrutural da Defensoria Pública do Estado na Comarca de origem, autoriza a concessão do benefício da gratuidade da justiça em seu favor. 2. O arbitramento dos honorários advocatícios em favor do Advogado dativo deve observar os parâmetros estabelecidos nas Resoluções pertinentes, em conformidade com o § 1º do art. 5º da Lei Estadual n. 18.664/2015. 3. A Tabela de Honorários estabelecida pela Resolução Conjunta n. 13/2016 – PGE/SEFA prevê expressamente para a “advocacia cível e família” realizada por “Curador Especial – por negativa geral”, o “valor mínimo” de R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais) e o “valor máximo” de R$ 350,00 (trezentos e cinquenta reais). 4. “O tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento” (§ 11 do art. 85 da Lei n. 13.105/2015). 5. Ao beneficiário da gratuidade da Justiça quando for a parte vencida, na demanda judicial, e/ou, assim, for condenado a arcar, ainda, que, parcialmente, com os ônus sucumbenciais, é reconhecida a condição suspensiva de exigibilidade prevista no § 3º do art. 98 da Lei n. 13.105/2015. 6. Recurso de apelação cível conhecido, e, no mérito, não provido. (TJPR – 12ª Câmara Cível - 0000472-16.2009.8.16.0082 – Formosa do Oeste – Rel.: Mario Luiz Ramidoff – J. 01.02.2018). 1. Por tais razões, fixa-se honorários em favor do Curador Especial nomeado pelo juízo, em razão da interposição do recurso de apelação, no valor de R$ 750,00 (setecentos e cinquenta reais), nos termos do voto. Conclusão. Pelo exposto, voto no sentido de se ao recurso de apelação, paradar provimento determinar a anulação da sentença, a fim de que sejam produzidas provas pertinentes ao deslinde do feito, nos termos do voto. III. DISPOSITIVO. Ante o exposto, acordam os Desembargadores da 11ª Câmara Cível do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ, por unanimidade de votos, em julgar pelo (a) Provimento do recurso de LIBERALINA DA SILVA CARDOSO. O julgamento foi presidido pelo (a) Desembargador Sigurd Roberto Bengtsson (relator), com voto, e dele participaram Desembargador Mario Nini Azzolini e Juíza Subst. 2ºgrau Fabiana Silveira Karam. 17 de julho de 2019 Desembargador Sigurd Roberto Bengtsson Juiz (a) relator (a) [1] FARIAS, Cristiano Chaves de. Rogério Sanches Cunha e Ronaldo Batista Pinto. Estatuto da pessoa . 2. rev., ampl. e atual. – Salvador: Ed. JusPodivm, 2016.com deficiência comentado. Artigo por artigo Pág. 25.
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