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Acórdão
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ 4ª CÂMARA CÍVEL - PROJUDI RUA MAUÁ, 920 - ALTO DA GLORIA - Curitiba/PR - CEP: 80.030-901 APELAÇÃO CÍVEL Nº 0006556-28.2018.8.16.0014 DE LONDRINA - 1ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA APELANTE: INSTITUTO FILADÉLFIA DE LONDRINA APELADO: MUNICÍPIO DE LONDRINA RELATOR: JUIZ FRANCISCO CARDOZO OLIVEIRA APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO ORDINÁRIA – MULTA AMBIENTAL – CORTE DE ÁRVORES NÃO NATIVAS – ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA – NÃO OCORRÊNCIA - INDEFERIMENTO DE PRODUÇÃO DE PROVAS DISPENSÁVEIS À SOLUÇÃO DA LIDE – CONTROVÉRSIA EXCLUSIVAMENTE DE DIREITO - CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 55 DA LEI MUNICIPAL 11.996/2013 – NECESSIDADE DE AUTORIZAÇÃO PRÉVIA PARA CORTE DE ÁRVORES - INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO DO ART. 225, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL – FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE – SENTENÇA MANTIDA - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 0006556-28.2018.8.16.0014 da 1ª Vara da Fazenda Pública de Londrina, em que é apelante apelado o Instituto Filadélfia de Londrina Município de Londrina. RELATÓRIO 1. Instituto Filadélfia de Londrina propôs Ação Ordinária com pedido liminar em face do Município de Londrina com o fito de suspender a multa imposta por corte de árvores dentro do terreno de seu hospital veterinário localizada no perímetro urbano, na Rodovia Mabio Gonçalves Palhano, n° 3000, no Município de Londrina. Sustentou-se que: (a) embora o corte de árvores tenha ocorrido sem a prévia autorização da Secretaria Municipal do Ambiente de Londrina (SEMA), os espécimes extraídos tratam de grevíleas não nativas, desprovidas de proteção especial; o art. 55, VII da(b) Lei Municipal n. 11.996/2013 que fundamenta a penalidade é inconstitucional pois a necessidade de autorização prévia da Administração para o corte de árvores em propriedade privada urbana deve ser restrita a situações excepcionais, ao contrário da disciplina da Lei. Requereu, ao final, o reconhecimento de nulidade da multa de R$49.000,00 (R$500,00 por árvore cortada) aplicada (mov. 1.1). O Juiz da causa indeferiu o pedido de antecipação dos efeitos da tutela por entender ausente a verossimilhança das alegações da parte autora (mov. 15.1). O Município de Londrina formulou contestação sustentando, em síntese, que: não se sustenta o pedido de(a) nulidade do auto de infração, eis que todo o procedimento administrativo adotado está em consonância com a legislação que trata da matéria; ademais, ainda que notificado da lavratura do auto de infração, o autor deixou de apresentar defesa administrativa; a Lei Municipal n. 11.996/2013 está alinhada com os preceitos constitucionais, notadamente com o(b) art. 5º, XXIII, art. 182, caput, e art. 225, VII, eis que o direito à propriedade não é absoluto e deve atender a sua função socioambiental; o Município está autorizado a estabelecer, no âmbito local, normas de proteção ambiental, na medida(c) em que a tutela do meio ambiente está inserida nas suas atribuições de promoção do adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, parcelamento e ocupação do solo urbano (CF, art. 30, inciso VIII), bem como na elaboração da Política de Desenvolvimento Urbano e do Plano Diretor (art. 182, CF). Requereu, ao final, a improcedência da ação (mov. 29.1). O Instituto Filadélfia de Londrina apresentou impugnação à contestação (mov. 32.1). Intimados a especificar provas, o Município de Londrina requereu o julgamento antecipado da lide (mov. 38.1). O Instituto Filadélfia de Londrina requereu a oitiva dos fiscais da SEMA, e a produção das provas documentais consistentes nos três procedimentos administrativos anteriores e os três posteriores ao auto de infração em comento, procedimento administrativo de autuação e/ou termo de ajustamento de conduta com a empresa Muffato, em relação a poda realizada no Av. Juscelino Kubitscheck, 2606, Londrina, os três últimos procedimentos administrativos que geraram Termo de Ajustamentos de Conduta, e os três posteriores a autuação tratada nestes autos (mov. 39.1). O Juiz da causa julgou a ação improcedente, com resolução de mérito, e condenou a parte autora no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios arbitrados em 10% do valor da multa, atualizados pelo IPCA-E e com juros de mora de 12% ao ano, contados do trânsito em julgado da sentença (mov. 41.1). Instituto Filadélfia de Londrina interpôs Recurso de Apelação Cível sustentando: preliminarmente, a(a) nulidade da sentença por cerceamento de defesa pois o Juiz da causa indeferiu a produção de prova documental indispensável à solução da lide; a Lei Municipal n. 11.996/2013 é inconstitucional, não por incompetência legislativa(b) do Município acerca da matéria, mas por não fixar critérios objetivos à atuação da Administração na propriedade privada, cabendo ao agente municipal definir a extensão da medida compensatória pela infração ambiental. Requereu-se, ao final o provimento do recurso para que seja anulada a multa imposta (mov. 47.1). O Município de Londrina formulou contrarrazões sustentando, em síntese, que: não houve cerceamento de(a) defesa pois as provas indeferidas não são relevantes e em nada alterariam a análise do mérito; a Lei Municipal(b) 11.996/2013 dispõe que para o corte de acima de 60 árvores é necessária a apresentação de “memorial botânico” demonstrando as espécies das árvores sujeitas à erradicação; o apelante realizou o corte de noventa e oito árvores sem autorização prévia da SEMA e sem a apresentação do referido memorial, o que resulta em grave prejuízo ao meio ambiente, devendo a sentença ser mantida. Requereu-se, ao final, o desprovimento do recurso e a condenação do apelante em honorários advocatícios recursais (mov. 51.1). O Ministério Público, em parecer subscrito pelo Procurador de Justiça Valmor Antonio Padilha, deixou de apresentar manifestação de mérito por entender que a matéria não ventila interesse público (mov. 8.1). ADMISSIBILIDADE O recurso é tempestivo conforme o que se observa do cotejo entre a certidão de leitura de intimação no mov.2. 46.0 e o protocolo de interposição do recurso no mov. 47.0; o comprovante de recolhimento do preparo está acostado nos autos no mov. 47.3. Presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, intrínsecos e extrínsecos, o recurso deve ser conhecido. 1. 2. 3. 4. 5. VOTO 3. Trata-se de recurso de Apelação Cível em que é apelante e apelado o Instituto Filadélfia de Londrina .Município de Londrina Do plano fático, observa-se que foi juntado aos autos a Notificação n.° 42374/2017 que com base no Parecer da Comissão de Assessoria Técnica Administrativa do Município aplicou a multa de R$500,00 (quinhentos reais) por cada um dos 98 exemplares arbóreos cortados, perfazendo o total de R$49.000,00 (quarenta e nove mil reais) (mov. 1.5); Processo Administrativo Ambiental n.° 42374/2017 e Auto de Infração n.° 24976 (mov. 29.4). 3.1. Instituto Filadélfia de Londrina sustenta que a sentença é nula por cerceamento de defesa pois o Juiz da causa indeferiu a produção de provas documentais indispensáveis à solução da lide. O Juiz da causa indeferiu o requerimento da apelante sob o seguinte fundamento: 1. Indefiro o requerimento de produção de provas formulado no evento 39. 2. É incontroverso nos autos que a autora, sem prévia autorização da SEMA, realizou o corte de 98 grevilhas adultas que havia no terreno do Hospital Veterinário. Certo é, ainda, que os parâmetros para conceder autorização para a erradicação de árvores são os informados pela Secretaria do Meio Ambiente no SEI n. 1077256 (evento 29.2, resposta ao quesito 2). Trata-se de documento cuja veracidade e autenticidade, tanto na forma como na substância, não foram impugnadas na réplica. Desnecessário dizer que não tem qualquer cabimento indagar a respeito de como se comportou a fiscalização da SEMA em relação a empreendimentos de terceiros. O que importa saber, aqui e agora, é tão somente se o auto de infração impugnado na inicial foi . Admitindo-se para argumentar que os servidores dolavrado em conformidade com a lei e a Constituição órgão ambiental foram omissos ou complacentes em outras situações, cumpre corrigir e coibir a omissão infringente à legislação, e não estendê-la à demandante: o princípio da isonomia não se presta à finalidade de agravar a lesão ao primado da legalidade. É esse o magistério de José dos Santos Carvalho Filho: “A ilegalidade não pode ser suporte de extensão para outras ilegalidades, nem encontra eco em qualquer aspecto da equidade. O que é preciso, isto sim, é sanar a ilegalidade, corrigindo-a através da anulação do ato e restabelecendo a necessária situação de legalidade” (in Manual de Direito Administrativo, Ed. Atlas, 26ª ed., 2013, p. 81). Em suma, sendo as questões controvertidas exclusivamente de direito ou estando confortadas (CPC, art. 355, I). Nesse sentido vem sepela prova documental, cabível o julgamento antecipado do mérito pronunciando a jurisprudência: “(...) 1. NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. DESNECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE PROVA PERICIAL. DOCUMENTAÇÃO QUE SE REVELA IDÔNEA E SUFICIENTE PARA O JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE - Inexiste cerceamento de defesa quando a matéria não depende da dilação probatória e a prova documental revela-se suficiente e idônea a comportar o julgamento antecipado da lide” (TJPR - 18ª Câmara Cível – Apelação Cível n. 1.560.500-4 - Assis Chateaubriand - Rel. Péricles Bellusci de Batista Pereira - Unânime – julg. 31.08.2016). (mov. 41.1). No mov. 39 dos autos de origem, o apelante requereu a produção das seguintes provas documentais: Três procedimentos administrativos da SEMA anteriores à autuação que ora se discute; Três procedimentos administrativos da SEMA posteriores à autuação que ora se discute; O procedimento administrativo de autuação e/ou termo de ajustamento de conduta com a empresa Muffato, em relação a poda realizada no Av. Juscelino Kubitscheck, 2606, Londrina (PR); Os três últimos procedimentos administrativos que geraram Termo de Ajustamentos de Conduta; e Os três procedimentos administrativos que geraram Termo de Ajustamentos de Conduta posteriores a autuação tratada nestes autos. Dos autos, verifica-se que a lide discute se a aplicação da multa por infração ambiental ocorreu em conformidade com a Lei e a Constituição. Não se discute, pois, a materialidade dos fatos: o corte de noventa e oito exemplares arbóreos na propriedade do Instituto apelante é incontroverso e as questões controvertidas são puramente de direito. Além disso, cabe ao Juiz, levando em conta as necessidades do processo, aferir a imprescindibilidade das diligências requeridas pelas partes, indeferindo as desnecessárias ou protelatórias. Nos termos do artigo 371 do Código de Processo Civil , a atividade jurisdicional é pautada pelo princípio do[1] livre convencimento motivado, que permite ao juiz, a partir da interpretação da lei e da valoração das provas, construir a solução normativa. Como bem aduzido pelo Juiz da causa, considerando que todos os pontos controvertidos foram provados pelas provas constantes dos autos, e que a juntada de procedimentos administrativos alheios ao caso em nada contribuiriam para a solução da lide, não há que se falar que o julgamento antecipado do mérito acarretou em cerceamento de defesa da apelante. Nesse sentido: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. OFENSA AOS ARTS. 489 E 1.022 DO CPC/2015 NÃO DEMONSTRADA. AUTO DE INFRAÇÃO. PRESENÇA DE ADOLESCENTES EM EVENTO EM DESACORDO COM O ALVARÁ DE FUNCIONAMENTO. CERCEAMENTO DE DEFESA. PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. EXAME PREJUDICADO. TESE ANALISADA PELA HIPÓTESE DA ALÍNEA "A" DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL. 1. Na hipótese dos autos, não se configura a ofensa aos arts. 489 e 1.022 do Código de Processo Civil de 2015, uma vez que o Tribunal de origem julgou integralmente a lide e solucionou a controvérsia, em conformidade com o que lhe foi apresentado. 2. Cinge-se a controvérsia a saber se houve cerceamento de defesa em virtude do indeferimento de prova testemunhal. 3. Conforme legislação de regência, cumpre ao magistrado, destinatário da prova, valorar sua necessidade. Assim, tendo em vista o princípio do livre convencimento motivado, não há cerceamento de defesa quando, em decisão fundamentada, o juiz indefere . 4. Nota-seprodução de prova, seja ela testemunhal, pericial ou documental que o decisum objurgado evidenciou, de forma fundamentada, que a prova pretendida - depoimento dos genitores dos adolescentes flagrados dentro do estabelecimento do recorrente - era impertinente, pois, diante dos demais elementos de prova constantes dos autos, aquela seria uma prova frágil, inoportuna. 5. Assinale-se que fica prejudicada a análise da divergência jurisprudencial quando a tese sustentada já foi afastada no exame do Recurso Especial pela alínea "a" do permissivo constitucional. Precedentes. 6. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido. (REsp 1770220/ES, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/12/2018, DJe 19/12/2018). APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE IMISSÃO NA POSSE. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. 1. INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO. INOCORRÊNCIA. (...) 2. CERCEAMENTO DE DEFESA. INDEFERIMENTO DE OITIVA DE TESTEMUNHAS. PROVA PRETENDIDA INCAPAZ DE ALTERAR O RESULTADO FINAL DO FEITO. - O juiz é o destinatário das provas e a ele compete determinar a produção daquelas que entender necessárias, principalmente quando se convencer que a dilação probatória não é relevante para elucidar o caso posto à sua apreciação, pois presentes outros elementos suficientes ao julgamento da - Verifica-se que o indeferimento de produção de prova testemunhal não acarretou prejuízo à parte ré, posto que não alteraria o julgamento final. Recurso não provido. (TJPR - 18ª C.Cível - 0003253-56.2012.8.16.0130 – Paranavaí - Rel.: Péricles Bellusci de Batista Pereira - J. 29.08.2018). Tenha-se em conta ainda que a parte não indica nas razões de revisão o que, especificamente, podia ser provado com a juntada de outros procedimentos administrativos, para o efeito de demonstrar a tese de inconstitucionalidade. Desse modo, rejeito a preliminar arguida, pois não se verificou o cerceamento de defesa alegado. 3.2. O Instituto Filadélfia de Londrina requer a anulação da multa imposta pois foi aplicada com respaldo na Lei Municipal n. 11.996/2013 que, segundo suas razões, é inconstitucional por não fixar critérios objetivos à atuação da Administração na propriedade privada, cabendo ao agente municipal definir a extensão da medida compensatória pela infração ambiental. O Juiz da causa entendeu que a Lei 11.996/2013 é constitucional e julgou improcedente o pedido de anulação da multa, nos seguintes termos: A manutenção da vegetação arbórea, mesmo a existente em terrenos particulares, atende a um dos objetivos do Plano Diretor de Arborização do Município de Londrina qual seja, o de concorrer para a melhoria da, paisagem urbana, o amortecimento dos ventos, a redução da poluição sonora e atmosférica, a proteção dos recursos hídricos e a preservação da biodiversidade nativa (Lei Municipal n. 11.996/2013, art. 4º, III). Significa isso dizer que a legislação em questão, em total conformidade com o art. 5º, XXIII, 182, caput, c/c o art. 225, VII, ambos da CF, imprimiu ao direito de propriedade uma função social-ambiental cuja tutela extrapola os interesses exclusivamente privados do dono. Essa premissa é reforçada pelo parágrafo único do art. 1º do Estatuto da Cidade (Lei n. 10.257/2001), que preceitua: “Para todos os efeitos, esta Lei, denominada Estatuto da Cidade, estabelece normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental ” (grifei). Ajunte-se o art. 2º, VI, letras “a” e “g”, da mesma Lei, segundo o qual constituem diretrizes do pleno desenvolvimento da função social da propriedade urbana a ordenação e o controle do uso do solo, de forma a evitar “ ”, bem como a “a utilização inadequada dos imóveis urbanos poluição e a degradação ”. Por sinal, nem é dado duvidar da competência do Município de Londrina para legislarambiental concorrentemente sobre a matéria. A propósito, veja-se a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal em julgamento submetido a repercussão geral: “O Município é competente para legislar sobre meio ambiente com União e Estado, no limite de seu interesse local e desde que tal regramento seja harmônico com a disciplina estabelecida pelos demais entes federados (art. 24, VI c/c 30, I e II da CRFB)” (STF, Plenário, RE n. 586.224-SP, rel. Min. Luiz Fux, julg. 5.3.2015, DJ de 8.5.2015). Tudo isso legitima a conclusão de que a sujeição do corte da vegetação arbórea a prévia autorização da Administração (da SEMA, no caso) se revela compatível com a Constituição. Doutra ordem de ideias, sem consistência a crítica que se fez na inicial ao inciso VII do art. 55 da Lei Municipal n. 11.966/2013 Aí se prevê, como uma das várias hipóteses em que a. SEMA poderá autorizar o corte de vegetação arbórea, a implantação de empreendimentos, reformas ou benfeitorias, em bens públicos ou privados, quando comprovadamente não existir solução técnica que evite a necessidade do corte. Foi o que esclareceu a Gerência de Fiscalização da SEMA no SEI n. 1077256, aludindo até mesmo à possibilidade de realização do corte mediante compensação ambiental. Confira-se: “2. Esclareça qual o procedimento para se obter a licença para corte de árvores. R – O requerimento de autorização de corte de exemplar de vegetação arbórea, em área particular, deverá ser dirigido à Secretaria Municipal do Ambiente, em formulário próprio (SIP - Sistema Integrado de Processo) de Vistoria de árvores em áreas privadas, pelo proprietário do imóvel ou seu representante legal, devidamente comprovado por título de propriedade, documentos pessoais ou procuração do(s) titular(es), quando for o caso, e croqui indicando as árvores que se pretende abater. Nos casos de solicitação de corte de 60 indivíduos arbóreos ou mais e em outros casos, a critério da SEMA, é necessária apresentação de memorial botânico. O memorial botânico deverá incluir as espécies e quantidades de todos os indivíduos arbóreos com DAP - Diâmetro Altura do Peito em conformidade com a tabela abaixo, além de ART do profissional responsável pelo levantamento das árvores no local. A compensação ambiental para a erradicação de árvores localizadas em áreas privadas se dará através da doação de mudas, com 2,20 metros de altura, para o Viveiro Municipal...” (evento 29.2). Assim, a existência ou não da necessidade do corte para que se façam as obras de reforma, empreendimento ou benfeitorias será avaliada, em cada caso concreto, em laudo técnico devidamente motivado. Mais: caso a Administração chancele solução que se mostre tecnicamente insustentável, ao proprietário estarão sempre abertas as portas do Judiciário para suscitar a posteriori o controle do ato administrativo viciado por ilegalidade ou abuso de poder. No caso, porém, a demandante sequer solicitou a autorização para o corte. Tampouco justificou, quer na via administrativa (a defesa, insista-se, não foi apresentada), quer agora em Juízo, que não haveria outra alternativa técnica menos danosa ao meio ambiente para executar as obras que empreendeu – ou pretende empreender – na área do Hospital Universitário. A aplicação da multa – aliás, em seu valor mínimo (cf. anexo I da Lei Municipal n. 11.996/2013) –, pois, fez-se em conformidade com o bom direito. Pelo que só resta declarar a improcedência do pedido. A apelante foi multada no bojo do Processo Administrativo Ambiental de n.° 42374/2017 por realizar corte de árvores em sua propriedade, sem autorização da Secretaria Municipal do Ambiente – SEMA de Londrina, em descumprimento ao art. 55 da Lei Municipal n.° 11.996/2013 (mov. 29.4, fl. 5). Sustentou-se no recurso que a Lei 11.996/2013, ao exigir autorização prévia para corte de árvores em propriedade particular, e ao outorgar ao agente municipal a decisão quanto a extensão da respectiva medida compensatória pelo dano ambiental, restringe excessivamente o direito à propriedade, quando a Constituição Federal permite a intervenção do Estado na propriedade privada apenas excepcionalmente. O Plano Diretor de Arborização do Município de Londrina (Lei n.° 11.996/2013) dispõe o seguinte: Art. 55. O corte ou o transplante de qualquer exemplar da vegetação arbórea somente serão admitidos com prévia autorização da Secretaria Municipal do Ambiente, mediante laudo técnico, nos seguintes casos: (...) Art. 98. Respondem solidariamente pela infração às normas desta Lei: (...) III – o proprietário ou responsável pela data em cuja calçada houve o dano à árvore, quando não for comprovada outra autoria, com atenuação da multa, pela metade, neste último caso. Para a análise da constitucionalidade do referido diploma legal, é imperioso o destaque ao princípio da função social da propriedade em sua faceta socioambiental: como é cediço, o direito à propriedade está condicionado ao cumprimento de sua função social por força do art. 5ª, XXIII , e em decorrência de tal função, deve coadunar com a[2] preservação ambiental e com um meio ambiente ecologicamente equilibrado, capaz de proporcionar qualidade de vida à coletividade: O reconhecimento de uma (ou mesmo ) (arts. 5.º, XXIII, 170,função ecológica socioambiental da propriedade III e VI, e 186, e II, da CF/1988), conforme já anunciado em passagem anterior, acaba por revelar umacaput ordem jurídico-econômica vinculada ao dever de ,desenvolvimento sustentável 117onde, para a consecução do objetivo constitucional de tutela do ambiente, o direito de propriedade necessariamente sofrerá limitações. [3] Nesse sentido, o do art. 225 da Constituição projeta para além do dever de proteção estatal, também prevêcaput deveres fundamentais de proteção do ambiente ao encargo dos particulares proprietários ou possuidores: Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Conclui-se assim que o Plano Diretor de Arborização do Município de Londrina ao sujeitar o corte de árvores no Município a prévia autorização administrativa não apenas se monstra compatível com a Constituição, mas reforça uma diretriz constitucional. Não é o caso, desse modo, de suscitar incidente de inconstitucionalidade. Afastada a hipótese de inconstitucionalidade do art. 55 do referido diploma legal, o seu descumprimento é incontroverso: o apelante não contesta nos autos o corte de noventa e oito exemplares da vegetação arbórea sem autorização da SEMA, além de ter deixado de apresentar defesa administrativa, embora tenha sido intimado a fazê-lo, conforme demonstra o AR no mov. 29.4 assinado por Odair de Souza. Verifica-se ainda que o procedimento administrativo respeitou todas as formalidades, não podendo o Poder Judiciário rever o mérito administrativo em tais casos: APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS. À EXECUÇÃO FISCAL. MULTA AMBIENTAL DECORRENTE DO QUESTIONAMENTO DA APELANTE SOBRE O MÉRITO DOCORTE/PODA IRREGULAR DE ÁRVORES. ATO ADMINISTRATIVO. INADMISSIBILIDADE. FEITO ADMINISTRATIVO QUE TRAMITOU COM OBSERVÂNCIA DA AMPLA DEFESA, DO CONTRADITÓRIO E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. DECISÃO DEVIDAMENTE MOTIVADA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. (TJPR - 4ª C.Cível - 0002108-16.2015.8.16.0176 - Wenceslau Braz - Rel.: Maria Aparecida Blanco de Lima - J. 31.08.2018). Isso posto, não é o caso de anulação da multa, devendo a sentença ser mantida integralmente. Em decorrência da sucumbência do apelante, cabível a condenação em sucumbência recursal, conforme o disposto no art. 85, §11º, do Código de Processo Civil. Em face da simplicidade da causa e do recurso interposto, sopesando não apenas os critérios quantitativos, mas também qualitativos, presentes no art. 85, §2º, do Código de Processo Civil, fixo os honorários recursais em 2% (dois por cento) do valor da multa, totalizando a verba honorária em 12% (doze por cento) do valor da multa, conforme o que consta da sentença. A conclusão final que se impõe é a de que o recurso de Apelação Cível deve ser conhecido e provido. Vota-se, portanto, para CONHECER do recurso de Apelação Cível interposto e NEGAR-LHE .PROVIMENTO [1] Art. 371. O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento. [2] XXIII - a propriedade atenderá a sua função social; [3] Ingo Wolfgang Sarlet, Tiago Fensterseifer. Revista dos Tribunais. 3 ed. Em e-book baseada na 5 ed. impressaIn Direito Constitucional Ambiental. Acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores da 4ª Câmara Cível do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ, por unanimidade de votos, em julgar pelo (a) Não-Provimento do recurso de INSTITUTO FILADELFIA DE LONDRINA. O julgamento foi presidido pelo (a) Desembargador Abraham Lincoln Merheb Calixto, com voto, e dele participaram Juiz Subst. 2ºgrau Francisco Cardozo Oliveira (relator) e Desembargadora Astrid Maranhão De Carvalho Ruthes. 23 de julho de 2019 Juiz Subst. 2ºGrau Francisco Cardozo Oliveira Juiz (a) relator (a)
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