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Acórdão
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ 2ª CÂMARA CRIMINAL - PROJUDI Rua Mauá, 920 - Alto da Glória - Curitiba/PR - CEP: 80.030-901 Autos nº. 0011853-36.2016.8.16.0030 APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0011853-36.2016.8.16.0030, DA 3ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE FOZ DO IGUAÇU. APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO. : CAETANO SHINCARIOL FILHO e FERNANDO MACHADO SHINCARIOL.APELADO RELATOR: DES. FRANCISCO RABELLO FILHO RELATORA SUBST.: JUÍZA SUBST. 2º GRAU MARIA ROSELI GUIESSMANN APELAÇÃO CRIME. CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. ABSOLVIÇÃO PELA PRÁTICA DO CRIME PREVISTO NO ART. 1º, INCISOS I, II, IV, COMBINADO COM O ART. 11 E 12, I, DA LEI 8.137/90. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. PLEITO CONDENATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. ELEMENTOS PROBATÓRIOS INSUFICIENTES PARA A COMPROVAÇÃO DO DOLO. A SIMPLES FIGURAÇÃO COMO SÓCIOS NO CONTRATO SOCIAL NÃO É SUFICIENTE PARA A CONDENAÇÃO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. APELANTES QUE NÃO DETINHAM, FATICAMENTE, PODERES DE GERÊNCIA. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. I – RELATÓRIO Trata-se de Apelação Criminal interposta contra a sentença (mov. 261.1) que julgou improcedente a denúncia oferecida pelo Ministério Público para absolver, com base no artigo 386, VII, do Código de Processo Penal, os réus/apelados das sanções do art. 1°, inciso I, II e IV, combinado com o art. 11 e 12, I, todos da Lei n° 8.137/1990. Segundo a denúncia (mov. 8.1): A denúncia foi recebida em 09/06/2016. Não houve a suspensão do processo. Os réus foram regularmente intimados da sentença (mov. 294.1). Inconformado, o Ministério Público, sustentou que restou demonstrada a autoria e materialidade delitiva dos réus, bem como a existência de dolo na conduta dos réus, uma vez que, enquanto administradores e gerentes da empresa, detinham o conhecimento e poder de comando sobre as fraudes praticadas. Por fim, pugnou pela condenação dos réus nas sanções do artigo 1º, I, II e IV, da Lei 8.137/90. Foram oferecidas contrarrazões (mov. 281.1 e 282.1) no sentido de desprover o apelo, com a manutenção da sentença. A Douta Procuradoria de Justiça opinou pelo provimento do recurso. (mov. 14.1 – 2º Grau). II - VOTO E FUNDAMENTAÇÃO Presentes os pressupostos de admissibilidade intrínsecos (legitimidade, interesse, cabimento e inexistência de fato impeditivo ou extintivo) e extrínsecos (tempestividade e regularidade formal), conheço do recurso. O Ministério Público pretende a condenação dos acusados pela prática de crime previsto no artigo 1°, I, II e IV da Lei n° 8.137/90, sob o fundamento de que, enquanto sócios administradores e gerentes da empresa, detinham o domínio do fato. A materialidade delitiva está devidamente comprovada pelo Procedimento Administrativo Fiscal (mov. 5.4) e pelo Auto de Infração (mov. 5.4). Contudo, a autoria não pode ser atribuída ao apelado. O artigo 1°, incido I, II e IV da Lei n° 8.137/1990, dispõe acerca das condutas delitivas referentes a supressão ou redução de tributo: Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: I - omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias; II - fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal; [...] IV - elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato; Sobre o delito em questão, vejamos as lições de José Paulo Baltzar Junior :[1] “[...] o tipo objetivo do crime de sonegação de tributos em geral contém dois verbos: suprimir ou reduzir tributo, contribuição social ou qualquer acessório. Essa é a primeira parte do crime, sendo complementada, como já referido, por uma das condutas fraudulentas previstas nos incisos. O crime de sonegação de tributos em geral é composto pela soma da supressão ou redução de tributo com a presença da fraude prevista em, pelo menos, um dos incisos (TRF4, AC 20020401050778-1, Hirose, 7ª T., u., 18.10.05). A supressão do tributo acontece quando o agente não paga nada. Vamos supor que a pessoa explore uma atividade econômica, como, por exemplo, venda de doces, feitos em casa. Embora a atividade tome vulto, continua sem alvará, sem inscrição nos órgãos fazendários nem emissão de nota fiscal, suprimindo tributo. A redução do tributo acontece quando o agente recolhe parcialmente o valor devido.” Ademais, sabe-se que “em se tratando de crimes contra a ordem tributária, aplica-se a teoria do domínio do fato. É autor do delito aquele que detém o domínio da conduta, ou seja, o domínio final da ação, aquele que decide se o fato delituoso vai acontecer ou não. Tratando-se de tributo devido pela pessoa jurídica, autor será , podendoaquele que efetivamente exerce o comando administrativo da empresa ser o administrador, o sócio-gerente, diretor, administrador por procuração de sócio ou mesmo um administrador de fato que se valha de interposta pessoa, esta figurando apenas formalmente como administrador” (STJ – REsp 1489356 RS – Rel. Ministro Felix Fischer J. 29.08.2017). Em que pese a denúncia descrever as condutas ilícitas, que geraram o não recolhimento do ICMS – pela simulação da exportação dos produtos -, não é possível afirmar que os apelados possuíam o dolo de fraudar o fisco. Ao ser interrogatório em juízo (mov. 224.3), o acusado CAETANO SCHINCARIOL FILHO afirmou que: " [...] que entende a natureza da denúncia; que desde os 17 anos trabalha como diretor industrial; que possui várias funções dentro da empresa, dentro da área industrial; que não era responsável pela parte administrativa e contábil, somente pela parte operacional da fábrica; que desconhece a transação realizada com a empresa Potencial; que não dava determinações diretas aos funcionários das áreas de contabilidade e fiscal e nem a algum funcionário fora área industrial. ” O acusado FERNANDO MACHADO SCHINCARIOL, em seu interrogatório (mov. 224.2), afirmou: “[...] que não tem ciência se há documentos comprobatórios da exportação, porque não fica no departamento fiscal; que quem recebe estes documentos são funcionários que arquivam junto com as notas fiscais enviadas; que os funcionários falaram que estava tudo em ordem; que a exportação da empresa é pequena; que o responsável pela empresa Potencial mandou os documentos concernentes a venda, e estes foram arquivados; que as irregularidades foram verificadas apenas quando a fiscalização visitou a fábrica; que não estava lembrado de quem era responsável pela contabilidade da empresa na época dos fatos; que são muitas pessoas que trabalham na parte fiscal da empresa; que não chegou a manusear os documentos; que o advogado tributarista da empresa afirmou que os documentos estavam corretos; que a guia de informação e apuração de ICMS por substituição tributária não é de obrigação sua quando é o caso de exportação; que os documentos concernentes à exportação vinham diretamente da empresa Potencial; que as determinações em relação a quais documentos deveriam ser recebidos quando houvesse exportação vinham do advogado tributarista, sendo contratado terceirizado da empresa que auxiliava e comunicava o pessoal do faturamento, departamento fiscal e contábil.” Da análise das provas acostadas aos autos, especialmente do Procedimento Administrativo Fiscal, resta claro que os produtos vendidos pela empresa Malta à exportadora Potencial Comércio e Importação de Bebidas LTDA, não foram exportados, mas sim colocados em circulação no próprio território nacional e, portanto, demonstrada a fraude tributária decorrente da simulação de exportação dos produtos e da ausência de recolhimento do ICMS. Ocorre que não há provas nos autos capazes de comprovar que os apelados tinham conhecimento da fraude tributária perpetrada, especialmente porque, enquanto substitutos tributários, demonstraram que requereram à exportadora, as notas fiscais comprobatórias da exportação, as quais, posteriormente, foram consideradas inidôneas pelo Fisco Paraense. Veja-se que, conforme bem pontuou o MM. Magistrado , as notas fiscais erama quo produzidas de maneira unilateral e, no âmbito tributário, escorreita a responsabilização da empresa dos apelados em razão da falta de zelo ao examinar as notas fiscais. Contudo, na esteira penal, para a condenação, não é possível a presunção da culpabilidade dos acusados. Sobre a responsabilidade do administrador nos crimes contra a ordem tributária, confira-se: “A partir dos indícios e dados formais como o contrato ou o estatuto que relevam quem era o administrador, o presidente, o diretor, já se pode visualizar quem tinha aparentemente o poder de comando na empresa, sendo esse dado suficiente para o oferecimento e recebimento da denúncia (TRF4, HC 20070400041971-6, Élcio, 8ªT., u., 16.1.08). Mas esse tipo de indício tem que ser corroborado por outras provas, uma vez que ninguém pode ser condenado somente por figurar como diretor no estatuto da empresa (STJ, HC 13.597, J. Scartezzini, 5ª T., u., 13.11.00) ou como administrador no contrato social (TRF4, AC, 19997104002776-4, Vladimir, 7ª T., u., DJ 15.5.02), exigindo-se, para a condenação, a prova de que tenha poderes de gerência (TRF5, AC 200683000010299, Brunetta [Conv.], 2ª T., u., 9.12.14). Essa confirmação se dá especialmente pela prova oral, seja pelo interrogatório do próprio réu, que pode admitir que , administrava a empresa, pela inquirição das testemunhas o fiscal responsável pela autuação, os empregados ou ex- empregados e até mesmo clientes arrolados como testemunhas abonatória pela defesa podem revelar quem dirigia os negócios e com quem mantinham os seus contatos.”[2] Do interrogatório, extrai-se que, muito embora os apelados figurassem no contrato social como sócios gerentes, faticamente, nenhum deles exercia os poderes de gerência. Além disso, o ônus de provar que os apelados possuíam o dolo de sonegar os tributos incumbia ao Ministério Público, uma vez que eventual evasão tributária decorrente de culpa não caracteriza o delito previsto no artigo 1º, I, II e IV da Lei 8.137/90, em razão da ausência de previsão na modalidade culposa. Neste sentido é o entendimento desta 2ª Câmara Criminal: APELAÇÕES CRIME. CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA (ART. 1º, I E II, DA LEI Nº 8.137/90). SUPRESSÃO DE TRIBUTO MEDIANTE O LANÇAMENTO DE CRÉDITOS FICTÍCIOS. AUTORIA DUVIDOSA. DENÚNCIA QUE DESCREVE A PRÁTICA DE FRAUDE TRIBUTÁRIA, COM A INTENÇÃO DE SUPRIMIR OU REDUZIR TRIBUTOS. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE DOLO NA CONDUTA DOS RÉUS. AGENTES QUE CONSTAM NO CONTRATO SOCIAL COMO SÓCIOS, MAS QUE NÃO PRATICARAM AS CONDUTAS DELITIVAS, ENQUANTO ADMINISTRADORES DA EMPRESA. ACERVO PROBATÓRIO INSUFICIENTE PARA MANTER A CONDENAÇÃO. REFORMA DA SENTENÇA. RECURSOS PROVIDOS. 1. Segundo entendimento do Egrégio SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, “a conduta de inadimplir o crédito tributário, de per si, pode não constituir crime. Caso o sujeito passivo declare todos os fatos geradores à Administração Tributária, conforme periodicidade exigida em lei, cumpra as obrigações tributárias acessórias e mantenha a escrituração contábil regular, não há falar em sonegação fiscal (Lei n. 8137/1990,art. 1º), mas mero inadimplemento, passível de execução fiscal. Os crimes contra a ordem tributária, exceto o de apropriação indébita tributária e previdenciária, além do inadimplemento, pressupõem a ocorrência de alguma forma de fraude, que poderá ser consubstanciada em omissão de declaração, falsificação material ou ideológica, a utilização de documentos material ou ideologicamente falsos, simulação, entre outros meios” (RHC 72.074/MG, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 06/10/2016, DJe 19/10/2016). 2. Dessa forma, os agentes não agira com dolo necessário de suprimir ou reduzir imposto, lançando créditos fictícios, sem comprovação de origem idônea, pois acreditavam que os créditos tributários eram idôneos e aptos a compensar valores referentes às prestações de serviços da empresa com os créditos oriundos de aquisições de combustíveis e insumos. 3. Outrossim, não basta para a configuração das condutas típicas previstas no art. 1º da Lei 8.137/90 que o agente figure no contrato social da empresa formalmente como sócio, mas imperiosa a demonstração de que exerce a administração de fato da sociedade, tendo efetivamente (TJPR - 2ª C.Criminal -o dolo da sonegação. 0020610-23.2014.8.16.0019 - Ponta Grossa - Rel.: José Maurício Pinto de Almeida - J. 10.05.2018). APELAÇÃO CRIMINAL - INSURGÊNCIA MINISTERIAL CONTRA SENTENÇA QUE ABSOLVEU OS ACUSADOS DA IMPUTAÇÃO DE PRÁTICA DE CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA (ART. 1º, I, II, IV, DA LEI Nº. 8.137/90) - PLEITO MINISTERIAL DE REFORMA DA SENTENÇA, SOB A AFIRMAÇÃO DE EXISTÊNCIA DE PROVAS SUFICIENTES DA PRÁTICA DELITIVA NÃO ACOLHIDO - PROVAS PRODUZIDAS INSUFICIENTES A EMBASAR DECRETO CONDENATÓRIO - ("o simples fato de ser sócio, gerente ou administrador de empresa não autoriza a instauração de processo criminal por crimes praticados no âmbito da sociedade, se não restar comprovado, ainda que com elementos a serem aprofundados no decorrer da ação penal, a mínima relação de causa e efeito entre as imputações e a sua função na empresa, sob pena de se reconhecer a responsabilidade penal objetiva" (HC 171.976/PA, Rel.Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 02/12/2010, DJe 13/12/2010) - NÃO DEMONSTRAÇÃO NOS AUTOS QUE OS ACUSADOS CONCORRERAM PARA A PRÁTICA DO CRIME DE SONEGAÇÃO FISCAL - MANUTENÇÃO DAS ABSOLVIÇÕES.RECURSO DESPROVIDO. (TJPR - 2ª C.Criminal - AC - 1525700-2 - Ponta Grossa - Rel.: Roberto De Vicente - Unânime - J. 09.03.2017) Sendo assim, do exame do conjunto probatório coligido aos autos não é possível demonstrar a existência de dolo na conduta dos apelantes, consistente na vontade de reduzir tributos, motivo pelo qual a absolvição é medida que se impõe, consoante ao princípio da presunção da inocência e do .in dubio pro reo Assim, voto no sentido de ao recurso, nos termos daconhecer e negar provimento fundamentação. III - DECISÃO BALTAZAR JUNIOR, José Paulo. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. p. 805.[1] Crimes Federais. BALTAZAR JUNIOR, José Paulo. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. p. 800.[2] Crimes Federais. Ante o exposto, acordam os Desembargadores da 2ª Câmara Criminal do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ, por unanimidade de votos, em julgar CONHECIDO O RECURSO DE PARTE E NÃO-PROVIDO o recurso de MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO PARANA. O julgamento foi presidido pelo (a) Desembargador Laertes Ferreira Gomes, com voto, e dele participaram Juíza Subst. 2ºgrau Maria Roseli Guiessmann (relator) e Desembargador José Carlos Dalacqua. 03 de outubro de 2019 Maria Roseli Guiessmann Juíza Substituta em 2º Grau
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