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Acórdão
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ 15ª CÂMARA CÍVEL - PROJUDI RUA MAUÁ, 920 - ALTO DA GLORIA - Curitiba/PR - CEP: 80.030-901 Apelação Cível n° 0002139-85.2014.8.16.0074, da Vara Cível de Corbélia Apelantes (1): Sebastião Ludovico Neto e Outros Apelante (2): Banco do Brasil S.A. Apelados: As mesmas partes Relator: Desembargador Jucimar Novochadlo APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO ORIGINADA DE CÉDULA DE CUSTEIO RURAL. PRELIMINARES. 1. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. MÉRITO. 2. PRETENSÃO DE REVISAR AS CLÁUSULAS CONTRATUAIS. ALEGADA VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA, AO PRINCÍPIO DO E À FUNÇÃO SOCIAL DOPACTA SUNT SERVANDA CONTRATO. INOCORRÊNCIA. 3. REVISÃO DO CONTRATO ANTERIOR. IMPOSSIBILIDADE. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. 4. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO ORIGINADA DE RENEGOCIAÇÃO DE CÉDULA DE CUSTEIO AGRÍCOLA. DESVIO DE FINALIDADE CARACTERIZADO. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO RURAL. 5. PRORROGAÇÃO DE DÍVIDA EM DECORRÊNCIA DE FRUSTRAÇÃO DE SAFRA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA RECUSA DO CREDOR E DO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. 6. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. PACTUAÇÃO EXPRESSA. POSSIBILIDADE DE COBRANÇA. SÚMULA 93 DO STJ. 7. JUROS REMUNERATÓRIOS. PACTUAÇÃO SUPERIOR AO LIMITE LEGAL DE 12% AO ANO. LIMITAÇÃO NECESSÁRIA. 8. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE. DECRETO-LEI 167/67. 9. DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA. POSSIBILIDADE. COBRANÇA DE ENCARGOS INDEVIDOS DURANTE O PERÍODO DE NORMALIDADE. EXCESSO QUE NÃO ACARRETA A ILIQUIDEZ DO TÍTULO. PROSSEGUIMENTO DA EXECUÇÃO. 10. SUCUMBÊNCIA. REDISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS. 1. Não há ofensa ao princípio da dialeticidade se o apelante impugna especificamente os termos da sentença e expõe os fundamentos de fato e de direito do pretendido pedido de reforma. 2. Diante da mitigação do princípio do em face de práticaspacta sunt servanda contratuais abusivas e vedadas pelo ordenamento jurídico, é possível a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais, bem como a intervenção do Poder Judiciário nas relações jurídicas travadas entre particulares, visando restabelecer o equilíbrio contratual, devendo a análise ser realizada no caso concreto. 3. Diante de alegações genéricas acerca de supostas irregularidades existentes nos contratos anteriores firmados com a instituição financeira, deve-se restringir a análise ao contrato acostado aos autos. 4. Caracteriza desvio de finalidade a incidência de encargos diversos daqueles previstos pela legislação rural em cédula de crédito bancário originada de renegociação de cédula rural. 5. Para que seja declarado o direito de prorrogação das dívidas representadas por cédulas de crédito rural, além dos requisitos legais pertinentes, é necessário que os devedores comprovem a efetiva recusa do credor, o que não ocorreu no caso dos autos. 6. Nos termos da Súmula 93 do STJ, nos contratos de crédito rural, admite-se a pactuação de cláusula que preveja a capitalização mensal de juros. 7. Para que as taxas de juros sejam fixadas acima do patamar de 12% ao ano na cédula de crédito rural, deve haver expressa autorização do Conselho Monetário Nacional nesse sentido. No caso, como os juros remuneratórios foram pactuados em percentuais superiores ao patamar legal, necessária sua limitação em 12% ao ano. 8. É pacífica a jurisprudência do STJ no sentido de que a comissão de permanência não se aplica aos contratos de cédula rural, tendo em vista o Decreto-Lei 167/67 prever regramento próprio para as situações de inadimplência. 9. Presente a abusividade nos encargos exigidos no período de normalidade contratual, deve ser afastada a mora do devedor. Contudo, o reconhecimento de excesso de cobrança não tem o condão de afastar a liquidez do título e de obstar o prosseguimento da execução. 10. O ônus de sucumbência deve ser distribuído considerando o aspecto quantitativo e jurídico em que cada parta decai de suas pretensões. Apelação Cível 1 (Sebastião Ludovico Neto e Outros) – conhecido e não provido. Apelação Cível 2 (Banco do Brasil S.A.) – conhecida e parcialmente provida. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 0002139-85.2014.8.16.0074, da Vara Cível de Corbélia, em que figuram como Apelantes (1) Sebastião Ludovico Neto e Outros; e Apelante (2) Banco do Brasil S.A.; e Apelados as mesmas partes. Trata-se de recursos interpostos em face da sentença proferida nos autos de1. embargos à execução, pela qual foram julgados parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, para o fim de: a) determinar que na Cédula de Crédito Bancário nº 20/01613-1 seja aplicada a legislação referente à cédula de custeio rural; b) reconhecer a ilegalidade da capitalização de juros nas Cédulas de Custeio Agropecuário Tradicional MCR 40/09108-2 diferente da estabelecida legalmente, devendo incidir apenas a capitalização semestral de juros; c) limitar a taxa de juros remuneratórios no Custeio Agropecuário Tradicional MCR 40/09108-2 à taxa estabelecida no Decreto nº 22.626/33, qual seja, 12% ao ano; d) aplicar à taxa de juros moratórios o percentual de 1% ao ano, nos termos do parágrafo único do art. 5º do Decreto-Lei n. 167/1967; e) reconhecer a ilegalidade da cláusula de comissão de permanência; f) descaracterizar a mora da Cédula de Crédito Bancário nº 20/01613-1; g) extinguir a execução nº 0000629-37.2014.8.16.0074; e h) condenar a parte embargada ao pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, no termos do art. 85 do CPC. (mov. 92.1) Nas razões de recurso, defendem os apelantes (1), em síntese, que: a) não podem ser considerados em estado de mora imputável justamente por não terem concorrido para a fata de pagamento, que se deu por conta da severa frustração de safra e receitas nos períodos agrícolas de 2010 à 2013 das suas lavouras de soja, milho e feijão, conforme laudo técnico de frustração de safra em anexo; b) por esse motivo, o vencimento de suas operações rurais devem ser compulsoriamente prorrogadas, uma vez que foram incapazes de suportar os prejuízos sofridos na última safra; c) resta evidente o direito à prorrogação de seu débito oriundo dos contratos rurais, uma vez que preenchem os requisitos legais para tanto; d) necessária a modificação compulsória da data de pagamento determinada pela Lei 11.775/2008, combinada com o art. 14 da Lei 4.829/65 e com o Manual de Crédito Rural (Cap. 2, Sec. 6, item 9); e) aplicável aoe caso a Súmula 298 do STJ. Requerem, ao final, o conhecimento do recurso e, no mérito, seu provimento, para o fim de reformar a sentença, no sentido de decretar a prorrogação das parcelas vencidas e vincendas para pagamento em, no mínimo, 07 anos, com carência de 02 anos, bem como de decretar a inexigibilidade dos títulos até novo vencimento. (mov. 100.1)sub judice Por outro lado, o banco apelante (2), ora embargado, alegou, em resumo, que: a) a cédula de crédito bancário nº 20/01613-1 é regular, certa e líquida, bem como que suas disposições devem ser mantidas em razão do b) de acordo com o entendimento do STJ, tanto no REsppacta sunt servanda; 1291575/PR quanto na Súmula nº 300, é plenamente possível a execução da cédula de crédito bancário em questão; c) as taxas de juros praticadas são legais; d) inexiste cobrança de juros capitalizados, devendo tal alegação ser provada; e) a comissão de permanência é legal por haver expressa previsão contratual, nos termos da Súmula 294 do STJ; f) está caracterizada a mora dos executados. Requer, ao final, oe conhecimento do recurso e, no mérito, seu provimento para reformar a sentença, com o consequente prosseguimento da execução. (mov. 101.1) Devidamente intimadas as partes (mov. 107/108), apenas o embargado apresentou contrarrazões ao recurso dos embargantes e suscitou a preliminar de ofensa ao princípio da dialeticidade (mov. 109.3), enquanto que estes últimos quedaram-se inertes (mov. 110). É o relatório. Presentes os requisitos e pressupostos de admissibilidade recursal, conheço de2. ambos os recursos. Para melhor compreensão da controvérsia, os recursos serão analisados de forma conjunta. Preliminares Dialeticidade recursal Cumpre afastar a preliminar suscitada em contrarrazões de não conhecimento do recurso de apelação dos embargantes por ofensa ao princípio da dialeticidade. Infere-se dos autos que o apelante impugnou especificamente os fundamentos da decisão recorrida, nos termos do art. 1.010, II, do CPC. Assim, o conhecimento da apelação é de rigor e está em consonância com o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça: "1. A petição do recurso de apelação deve conter, entre outros requisitos, a exposição dos fundamentos de fato e de direito que, supostamente, demonstrem a injustiça (error in iudicandum) e/ou a invalidade (error in procedendo) da sentença impugnada, à luz do disposto no artigo 514, II, do CPC. 2. A regularidade formal é requisito extrínseco de admissibilidade da apelação, impondo ao recorrente, em suas razões, que decline os fundamentos de fato e de direito pelos quais impugna a sentença recorrida. 3. O excessivo rigor formal conducente ao não conhecimento do recurso de apelação, no bojo do qual se encontram infirmados os fundamentos exarados na sentença, não obstante a repetição dos argumentos deduzidos na inicial ou na contestação deve ser conjurado, uma vez configurado o interesse do apelante na reforma da decisão singular (Precedentes do STJ: AgRg no REsp 989.631/SP, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, julgado em 19.02.2009, DJe 26.03.2009; REsp 707.776/MS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 06.11.2008, DJe 01.12.2008; REsp 1.030.951/PR, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 14.10.2008, DJe 04.11.2008; AgRg no Ag 990.643/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 06.05.2008, DJe 23.05.2008; e REsp 998.847/RS, Rel. Ministro Aldir Passarinho Júnior, Quarta Turma, julgado em 18.03.2008, DJe 12.05.2008) (REsp 976.287/MG, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 08/09/2009, DJe 08/10/2009) Logo, não há ofensa ao princípio da dialeticidade se o apelante impugna especificamente os termos da sentença e expõe os fundamentos de fato e de direito do pretendido pedido de reforma, razão pela qual afasto a preliminar arguida pelo banco embargado. Mérito Em breve retrospecto, tem-se que a controvérsia recursal se origina dos autos de execução de título executivo extrajudicial (NPU 0000629-37.2014.8.16.0074) movida pelo embargado (Apelante 2) e fundada na Cédula de Crédito Bancário nº 20/01613-1 (mov. 1.5, da execução), cuja inadimplência pelos embargantes (Apelantes 1) resultou no débito de R$ 360.832,84. Na origem, os embargos foram acolhidos parcialmente, com a decretação de extinção da execução e de descaracterização da mora, por se entender aplicáveis à Cédula executada a legislação referente à cédula de custeio rural originária, determinando-se a incidência de capitalização semestral de juros, a limitação da taxa de juros remuneratórios em 12% ao ano e de juros moratórios em 1% ao ano, bem como reconhecendo-se a ilegalidade da comissão de permanência. Todavia, respeitado o entendimento do magistrado de primeiro grau, o cotejo das razões recursais dos litigantes com o acervo probatório coligido conduz à conclusão diversa. Dever de Cumprimento dos Contratos Inicialmente, cumpre asseverar que através do princípio da obrigatoriedade contratual, uma vez celebrados pelas partes, na expressão de sua vontade livre e autônoma, os contratos não podem ser modificados, a não ser por mútuo acordo. Devem ser cumpridos como se fossem lei (Fiúza, César. Direito Civil: curso completo. 12. ed. Revista, atualizada e ampliada. Belo Horizonte: Del Rey, 2008, p. 402). Entretanto, esse princípio só se aplica aos contratos realizados de acordo com a Lei. Os contratos, bem como as cláusulas contrárias ao Direito, reputam-se ilegítimos, saindo da esfera do referido princípio. Observa-se, portanto, a permissão de modificação de cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais para as partes contratantes, pelo que deve o Poder Judiciário intervir nas relações em busca do equilíbrio contratual e satisfação dos interesses das partes contratantes, relativizando o princípio da autonomia da vontade. Sobre a questão, oportuna é a lição de Claudia Lima Marques: "[...] a vontade das partes não é mais a única fonte de interpretação que possuem os juízes para interpretar um instrumento contratual. A evolução doutrinária do direito dos contratos já pleiteava uma interpretação teleológica do contrato, um respeito maior pelos interesses sociais envolvidos, pelas expectativas legítimas das partes, especialmente das partes que só tiveram a liberdade de (MARQUES, Claudia Lima. aderir ou não aos termos pré-elaborados." Contratos no Código de . 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 227.)Defesa do Consumidor Assim, quando o contrato satisfaz apenas um lado, prejudicando o outro, o pacto não cumpre sua função social, devendo o Judiciário promover o reequilíbrio contratual através da revisão, sem que isso implique em violação do princípio da boa-fé objetiva. Deste modo, afasto a alegação do Banco apelante de impossibilidade de revisão dos instrumentos contratuais e passo a análise dos contratos. Revisão do contrato anterior e aplicação da legislação rural Como visto anteriormente, conquanto se admita a revisão contratual diante da mitigação do princípio do , essa possibilidade não significa a ampliação automática epacta sunt servanda indiscriminada em sede de embargos à execução das matérias para além do título de Cédula de Crédito Bancário com que lastreada a ação executiva, como pretendem fazer crer os embargantes. Com efeito, apesar do pacífico entendimento de que a “renegociação de contrato bancário ou a confissão da dívida não impede a possibilidade de discussão sobre eventuais ilegalidades dos ” (Súmula nº 286 do STJ), para que tal revisão seja possível é imprescindível que fiquecontratos anteriores demonstrada a relação de dependência do título executivo com os contratos anteriores, bem como indícios de ilegalidade ou abusividade nas obrigações de origem, não se admitindo a alegação genérica. Sobre o assunto já se manifestou esta Colenda Câmara Cível: Embargos do devedor. Cédula de crédito bancário. Abertura de crédito em conta corrente. Execução instruída com o título e extratos demonstrando a utilização do capital. Título executivo extrajudicial. Art. 28 da Lei 10.931/2004. Pedido de revisão de contratos anteriores. Ausência de comprovação de vínculo entre os contratos. Embargos do devedor limitados ao título executado. Excesso alegado de modo genérico. Desatenção ao art. 739-A, § 5º, do CPC/1973, correspondente ao art. 917, § 3º e 4º, CPC/2015. Exigência legal não afastada pela aplicação do CDC e pedidos de inversão do ônus da prova, exibição de documentos e realização de perícia. Rejeição. Sentença mantida. Apelação conhecida e não provida. (TJPR - 15ª C.Cível - 0001933-80.2015.8.16.0092 - Imbituva - Rel.: Hamilton Mussi Corrêa - J. 14.03.2018) DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. EMBARGOS. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. REVISÃO DE CONTRATOS ANTERIORES. GENERALIDADE DAS ALEGAÇÕES. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INAPLICABILIDADE. CONTRATO DE CÂMBIO ACOMPANHADO DE EXTRATOS E DEMONSTRATIVO DO DÉBITO. DOCUMENTOS SUFICIENTES. OBRIGAÇÃO CERTA, LÍQUIDA E DETERMINADA. MERAS ALEGAÇÕES SEM INDÍCIOS DE PROVA. ALEGADO EXCESSO DE COBRANÇA. AUSÊNCIA DE MEMÓRIA DE CÁLCULO. VIOLAÇÃO AO ART. 702, §2º DO CPC/2015. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. 1. [...] 2. A generalidade das alegações sobre eventuais abusividades em pactos anteriores, impede a revisão dos primitivos, limitando-se a discussão ao contrato de câmbio, objeto da ação monitória. [...] APELAÇÃO NÃO PROVIDA. (TJPR - 15ª C.Cível - 0000097-07.2016.8.16.0070 - Cidade Gaúcha - Rel.: Hayton Lee Swain Filho - J. 02.05.2018) Portanto, exige-se que seja apontada de forma objetiva e individualizada as supostas abusividades existentes nos pactos precedentes, para que seja possível a revisão. No caso em apreço, a execução embargada tem por objeto a Cédula de Crédito Bancário nº 20/01613-1 (mov. 1.5, da execução), no valor de R$ 302.710,04 e vencida em 01/06/2017, a qual, por sua vez, contém descrição detalhada da dívida originária relacionada ao seguinte contrato: Em que pese a indicação de que o título executivo foi firmado para quitar o saldo devedor da Cédula de Custeio Agropecuário, a petição inicial dos embargos limitou-se a relatar a existência desse contrato, alegando genérica e abstratamente a nulidade de suas cláusulas por contrariarem a Legislação Rural (juros acima do limite legal de 12% ao ano, aplicação de correção monetária ilegal, ilegalidade da prática de capitalização diferente da semestral e anatocismo); sem, contudo, demonstrar como as supostas abusividades alterariam de modo concreto a composição da dívida originária. Tanto é assim que, ao apresentarem a planilha de cálculo do valor incontroverso (mov. 1.6), os embargantes se limitaram a recalcular o valor executado (R$ 360.832,84) a partir do saldo devedor renegociado (R$ 302.710,04), restringindo em R$ 12.595,97 o valor controvertido, sem qualquer demonstração efetiva quanto à irregularidade na composição da dívida anterior – fato esse que não dependia de perícia judicial. Em suma, verifica-se que os embargantes assumiram os riscos de oporem embargos mal instruídos em relação a essa matéria, pedindo a revisão da dividida originária de modo absolutamente genérico e abstrato, presumindo que a abusividade seria verificada após a exibição dos documentos pelo banco. Ademais, ainda que o banco embargado tenha descumprido a ordem de exibição da Cédula de Custeio Agrícola, é cediço que a sanção prevista no art. 400 do CPC não conduz à presunção de veracidade absoluta, ou seja, não implica, necessariamente, na procedência da ação, uma vez que não dispensa a parte autora de demonstrar os fatos constitutivos do direito (art. 373, I, CPC) e pode ser afastada pelo livre convencimento judicial formado com amparo na prova dos autos. Veja-se que por não terem se desincumbido de referido ônus, os embargantes experimentam consequências jurídicas desfavoráveis daí decorrentes, especialmente o não reconhecimento dos fatos alegados e não comprovados. Vale ressaltar, que a mera aplicação do Código de Defesa do Consumidor e consequente inversão do ônus da prova, como ocorreu no caso (mov. 69.1), não tem o condão de autorizar a procedência automática dos pedidos da parte, devendo demonstrar, pelo menos, indícios do seu direto. Nesse sentido: Sobre o ônus da prova, colhe-se da doutrina : [1] “Como, nas demandas que tenham por base o CDC, o objetivo básico é a proteção ao consumidor, procura-se facilitar a sua atuação em juízo. Apesar disso, o consumidor não fica dispensado de . Pelo contrário, a regra continua a mesma, ou seja, o consumidor, como autor daproduzir provas ação de indenização, deverá comprovar os fatos constitutivos do seu direito. (...) Deve ficar claro, porém, que o ônus de comprovar a ocorrência dos danos e da sua relação de causalidade com determinado produto ou serviço é do consumidor. Em relação a esses dois pressupostos da responsabilidade civil do fornecedor (dano e nexo causal), não houve alteração da norma de distribuição do encargo probatório do artigo 333 do CPC” (grifei) Ora, a análise da operação anterior só se mostraria pertinente se, em relação a elas, os embargantes tivessem apontado circunstâncias aptas à provocação da modificação dos respectivos saldos, o que, como visto, não ocorreu no caso dos autos. Neste mesmo sentido – e especificamente pelo viés de não demonstração, pelo embargante, de indícios de ilegalidade ou abusividade nas obrigações de origem – vale citar os seguintes precedentes: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. EMBARGOS. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. REVISÃO DE CONTRATOS ANTERIORES. GENERALIDADE DAS ALEGAÇÕES. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INAPLICABILIDADE. CONTRATO DE CÂMBIO ACOMPANHADO DE EXTRATOS E DEMONSTRATIVO DO DÉBITO. DOCUMENTOS SUFICIENTES. OBRIGAÇÃO CERTA, LÍQUIDA E DETERMINADA. MERAS ALEGAÇÕES SEM INDÍCIOS DE PROVA. ALEGADO EXCESSO DE COBRANÇA. AUSÊNCIA DE MEMÓRIA DE CÁLCULO. VIOLAÇÃO AO ART. 702, §2º DO CPC/2015. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. 1. O julgamento antecipado da lide não configura cerceamento de defesa, ante a não demonstração da utilidade da prova que a parte pretendia produzir e se os elementos constantes nos autos o justificam, notadamente se a alegação das supostas irregularidades na cobrança é genérica, sem atrelamento ao caso concreto. 2. A generalidade das alegações sobre eventuais abusividades em pactos anteriores, impede a revisão dos primitivos, limitando-se a discussão ao contrato de câmbio, objeto da ação monitória. 3. De acordo com o entendimento do e. STJ, a legislação consumerista aplica-se às pessoas naturais ou jurídicas que adquirem produto ou usufruam de um serviço com o fim de dinamizar ou instrumentalizar seu negócio lucrativo somente quando elas demonstrarem vulnerabilidade, seja técnica, fática ou jurídica, o que não ocorre no caso em apreço. 4. Deve ser constituído de pleno direito o título executivo judicial em que se funda a ação monitória, pelo valor cobrado devidamente registrado no contrato, extratos e demonstrativo, que retratam a evolução da dívida, especialmente se os embargos opostos pela devedora contêm apenas alegações genéricas, sem qualquer especificação das irregularidades arguidas. 5. Se o fundamento dos embargos à ação monitória consiste no excesso de cobrança, desde à origem da dívida, é imprescindível que a embargante, declare o valor que entende correto, apresentando demonstrativo discriminado e atualizado da dívida. Inteligência do art. 702, §2º do CPC/2015. APELAÇÃO NÃO PROVIDA (TJPR - 15ª C.Cível - 0000097-07.2016.8.16.0070 - Cidade Gaúcha - Rel.: Hayton Lee Swain Filho - J. 02.05.2018) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO MONITÓRIA. EMBARGOS MONITÓRIOS. CONTRATO DE CÂMBIO. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS E DATA DA CONVERSÃO CAMBIAL. INOVAÇÃO RECURSAL. NÃO CONHECIMENTO. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO VERIFICAÇÃO. CONTRATOS ANTERIORES. DISCUSSÃO. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. NÃO CABIMENTO. ANÁLISE ADSTRITA À AVENÇA QUE LASTREIA A MONITÓRIA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. CASO CONCRETO. INAPLICABILIDADE. RELAÇÃO FINANCEIRA MANTIDA POR PESSOA JURÍDICA. AUSÊNCIA DE VULNERABILIDADE OU HIPOSSUFICIÊNCIA. DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA. NÃO OCORRÊNCIA. ART. 940, CÓDIGO CIVIL. INAPLICABILIDADE. SENTENÇA. MANUTENÇÃO. 1. Não merecem conhecimento as matérias não suscitadas em primeiro grau, por consistir em inovação recursal. 2. O julgamento antecipado da lide não caracteriza cerceamento de defesa quando os documentos presentes nos autos são suficientes para resolução das controvérsias contidas na ação. 3. Embora seja possível a discussão de contratos anteriores, que teriam dado origem a contrato objeto de cobrança, a discussão deve ficar restrita a esse, se a respeito dos demais contratos foram formuladas apenas alegações genéricas. 4. É inaplicável o Código de Defesa do Consumidor e,de consequência, a inversão do ônus da prova, na hipótese em que a discussão refere-se a contrato firmado com instituição financeira para implemento da atividade desenvolvida por pessoa jurídica e quando não demonstrada vulnerabilidade ou hipossuficiência. 5. Mantidos os encargos contratuais, não há que se falar em descaracterização da mora. 6. É inaplicável o art. 940, do Código Civil, quando não se verifica a cobrança de dívida já paga. 7. Apelação cível parcialmente conhecida e, nessa parte, não provida. (TJPR - 15ª C.Cível - 0000479-97.2016.8.16.0070 - Cidade Gaúcha - Rel.: Luiz Carlos Gabardo - J. 25.04.2018) Logo, ainda que, em tese, fosse possível a revisão de obrigações anteriores, nos presentes autos tal discussão não se revela admissível, em face da formulação abstrata e genérica das alegações da parte, sendo vedada a revisão de contratos em tese, sob pena de ofensa à Súmula 381 do STJ. Desse modo, diversamente do que constou na sentença, a discussão na presente demanda deve se restringir à Cédula de Crédito Bancário nº 20/01613-1 objeto da ação executiva. Portanto, uma vez delimitada a revisão ao título executado, resta saber se é possível, no caso concreto, revisá-lo à luz da legislação rural. A resposta é positiva. Isso porque restou incontroverso no caso que o valor constante da Cédula de Crédito Bancário nº 20/01613-1 teve origem na renegociação da Cédula de Custeio Agrícola nº 40/09108-2, cuja natureza impede a incidência de encargos diversos daqueles previstos pela legislação rural. Nesse sentido, cita-se o seguinte precedente desta Corte: Embargos à execução de título extrajudicial - Cédula de crédito bancário. 1. Títulos exequendos emitidos para quitação de saldo devedor decorrente de notas de produto rural - Necessidade, então, de aplicação da legislação especial atinente ao crédito rural quanto à incidência dos encargos, sob pena de caracterização de desvio de finalidade - Precedentes desta Corte. 2. Taxa de juros remuneratórios - Limitação em 12% ao ano - Possibilidade, por se tratar de crédito rural - Omissão do Conselho Monetário Nacional - Decreto-lei n.º 467/1967, art. 5.º, caput - Observância, portanto, da Lei de Usura (Decreto n.º 22.626/33) - Inaplicabilidade da súmula 596 do Supremo Tribunal Federal na espécie. 2.1. Pretensão de limitação dos juros efetivos ao percentual de 6,75% ao ano, em atenção à Resolução n.º 4.106/2012, do Banco Central do Brasil - Impossibilidade - Limitação restrita ao crédito rural concedido com recursos obrigatórios. 3. Juros moratórios - Encargo estipulado em 12% ao ano - Impossibilidade - Redução para 1% ao ano - Decreto-lei n.º 167/67, art. 5.º, parágrafo único. 4. Alegação de impossibilidade de cumulação de multa moratória com multa por inadimplência - Títulos exequendos, entretanto, que preveem tão-só a cobrança de multa moratória no percentual de 2% - Exigência em conformidade com a legislação específica do crédito rural. 5. Descaracterização da mora - Possibilidade - Cobrança de encargos abusivos no período de normalidade contratual evidenciada - Entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça em incidente de recurso repetitivo no REsp 1061530-RS. 6. Ônus da sucumbência - Resultado do julgamento que enseja sua redistribuição. 7. Recurso parcialmente provido. (TJPR - 14ª C.Cível - AC - 1611863-7 - Francisco Beltrão - Rel.: Rabello Filho - Unânime - J. 15.02.2017) Assim, escorreita a sentença ao reconhecer a ocorrência de desvio de finalidade, razão pela qual as alegações recursais de legalidade dos encargos devem ser analisados com base na legislação que originou o crédito executado. Do alongamento da dívida Alegam os apelantes que, diante da frustração de safra e receitas nos períodos agrícolas de 2010 a 2013, têm direito à prorrogação da dívida segundo a sua real capacidade de pagamento, na forma da Lei 11.775/2008, combinada com o art. 14 da Lei 4.829/65 e com o Manual de Crédito Rural (Cap. 2, Sec. 6, item 9). Conforme entendimento da jurisprudência, para que seja declarado o direito de prorrogação da dívida representada por cédula de crédito rural, além dos requisitos legais pertinentes, é necessário que o devedor comprove ter requerido o alongamento da dívida e que a credora tenha recusado o pedido administrativo. Nesse sentido confiram-se os seguintes precedentes desta Câmara: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. CÉDULA DE CRÉDITO RURAL RENEGOCIADA POR CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIA. SENTENÇA SINGULAR QUE INTERPRETOU OS CONTRATOS SOB OS FUNDAMENTOS LEGAIS QUE TUTELAM O EMPRÉSTIMO RURAL. I. PRORROGAÇÃO DA DÍVIDA. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PROVA DE PEDIDO E RECUSA ADMINISTRATIVA PARA O ALONGAMENTO DO PRAZO DE VENCIMENTO DO DÉBITO. DOCUMENTOS INSUFICIENTES PARA COMPROVAR A INCAPACIDADE FINANCEIRA. II. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO DA TAXA A 12% AO ANO. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE EXPRESSA AUTORIZAÇÃO DO CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL PARA EVENTUAL COBRANÇA ACIMA DO PATAMAR PREVISTO EM LEI. III. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. POSSIBILIDADE. CÉDULAS RURAIS PIGNORATÍCIAS. PREVISÃO EM INSTRUMENTOS CONTRATUAIS. AUTORIZAÇÃO DE LEGISLAÇÃO ESPECIAL. IV. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA IMPOSSIBILIDADE DE COBRANÇA NAS CÉDULAS DE CRÉDITO RURAL. V. SEGURO PRESTAMISTA (PROTEÇÃO FINANCEIRA). COBRANÇA INDEVIDA ANTE AUSÊNCIA DE PACTUAÇÃO E DEMONSTRAÇÃO DE INCIDÊNCIA MEDIANTE ANÁLISE DOS EXTRATOS BANCÁRIOS JUNTADOS PELA COOPERATIVA. VI. PREQUESTIONAMENTO. VII. INVERSÃO ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA. VIII. PRELIMINAR DE CONTRARRAZÕES RECURSAIS. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E PROVIDA, EM PARTE. (TJPR - 15ª C.Cível - 0000982-98.2017.8.16.0130 - Paranavaí - Rel.: Shiroshi Yendo - J. 29.05.2019) Embargos do devedor. Execução de cédula de crédito bancário e cédula rural pignoratícia e hipotecária. Julgamento antecipado da lide. Dilação probatória desnecessária. Cerceamento de defesa inexistente. Prorrogação da dívida rural. Ausência de comprovação das condições legais exigidas. Capitalização de juros. Pactuação expressa. Possibilidade. Súmula 93 do STJ, artigo 5º do DL 167/1967 e artigo 28, §1º, I, da Lei 10.931/2004. Encargos de mora. Elevação da taxa de juros em 1%. Aplicação do Art. 5º, parágrafo único, DL 167/67. Adequação devida. Mínimo decaimento. Condenação exclusiva da apelante a arcar com o ônus da sucumbência. Inteligência do artigo 86, parágrafo único, CPC. Apelação conhecida e provida em parte. (TJPR - 15ª C.Cível - 0018951-69.2016.8.16.0031 - Guarapuava - Rel.: Hamilton Mussi Corrêa - J. 27.02.2019) APELAÇÃO CÍVEL. “AÇÃO CONSTITUTIVA NEGATIVA DE NULIDADE DE CLÁUSULAS EM CÉDULA DE CRÉDITO RURAL C/C COM DECLARATÓRIA E MANDAMENTAL DE PRORROGAÇÃO DE DÍVIDA”. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO – FINAME/BNDES PSI. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E LEGISLAÇÃO RURAL. INAPLICABILIDADE. JUROS REMUNERATÓRIOS E CAPITALIZAÇÃO. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE. PRORROGAÇÃO DA DÍVIDA. IMPOSSIBILIDADE. DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. SUCUMBÊNCIA. 1. (...). 4. Em não se tratando de crédito rural, não há que se falar em prorrogação SUCUMBÊNCIA. 1. (...). 4. Em não se tratando de crédito rural, não há que se falar em prorrogação do vencimento da dívida. Ad argumentandum tantum, ainda que, no caso, se tratasse de crédito rural, não seria possível acatar o pedido de prorrogação por falta de pedido administrativo neste sentido” (18ª Câmara Cível, AC 917.960-0, Rel. Des. Renato Lopes de Paiva, j. 24/10/2012, DJe 07/12/2012). (...). RECURSO NÃO PROVIDO (TJPR - 15ª C.Cível - 0019774-43.2016.8.16.0031 - Guarapuava - Rel.: Hayton Lee Swain Filho - J. 28.02.2018, sem supressões no original) No caso em apreço, não há demonstração de que os devedores tenham requerido à credora a prorrogação da dívida e que esta tenha recusado o pedido administrativo, sendo expresso, nas Resoluções nº 2.290/95 (art. 4º) e 2.238/96 (art. 3º) – posteriores à edição da Lei nº 9138/95 que dispõe sobre o crédito rural – a necessidade de formalização desse requerimento. Da mesma forma, não restou claro e evidente o fato da efetiva perda de safra decorrentes de condições climáticas desfavoráveis, bem como da frustração de receitas advindas da comercialização dos produtos por eles cultivados, pois não se pode admitir alegações genéricas, ou que o fato é de conhecimento notório, tendo em vista o disposto no item 9, seção 6, capítulo 2, do Manual de Crédito Rural, o qual diz que: "Independentemente de consulta ao Banco Central, é devida a prorrogação da dívida, aos mesmos encargos antes pactuados no instrumento de crédito, desde que se comprove incapacidade de pagamento do mutuário em conseqüência de: a) dificuldade de comercialização dos produtos. b) frustração de safras por fatores adversos; c) eventuais ocorrências prejudiciais ao desenvolvimento das explorações". Com base em tais premissas, não merece acolhida a pretensão dos apelantes, considerando que a prorrogação é formulada com base em meras alegações desprovidas de qualquer suporte comprobatório, tanto que, diversamente do contido na sentença, sequer houve a juntada do mencionado “laudo técnico de frustração de safra”, cujo fato não dependia de produção de prova pericial. Por essas razões, o não preenchimento das condições necessárias à prorrogação da dívida rural impõe o afastamento de referida pretensão tal como restou consignado na sentença, uma vez que não se pode generalizar a questão de dificuldades no setor agrícola ou de dificuldade de comercialização e frustração de safra. Assim, nega-se provimento ao recurso dos embargantes. Capitalização de juros Com razão o embargado ao defender a reforma da sentença na parte que reconheceu a ilegalidade da capitalização mensal de juros e determinou sua incidência semestral. Como se sabe, em se tratando de cédula de crédito rural, há muito não se discute mais sobre a impossibilidade de capitalização de juros (Decreto-Lei nº 413/69 e Lei nº 6.840/80). Nesse sentido, o enunciado da Súmula 93 do Colendo Superior Tribunal de Justiça dispõe que: “A legislação sobre cédulas de crédito rural, comercial, e industrial admite o pacto de capitalização de juros”. Saliente-se, ainda, que a fixação da periodicidade dos juros compete às partes contratantes, inexistindo qualquer vedação legal em sentido contrário. Nesse contexto, a capitalização mensal é uma das formas de contratação que o legislador possibilita, bem como a semestral e a anual. No caso em tela, foi pactuada a capitalização mensal dos juros, conforme se depreende da cláusula referente aos encargos financeiros assim reproduzida (mov. 1.5, da execução): Sendo assim, deve ser reformada a sentença quanto a este ponto, para o fim de afastar tanto a ilegalidade da capitalização mensal de juros expressamente pactuada como a determinação de seu expurgo. Juros remuneratórios Sustenta o embargado a legalidade da taxa de juros remuneratórios fixados na cédula de crédito bancária. Contudo, razão não lhe assiste, visto que caracterizado o desvio de finalidade em relação à natureza rural da dívida renegociada. Assim, por ser regulada por legislação específica (Dec-Lei n.º167/67), a cédula de crédito rural e sua respectiva renegociação não estão sujeitas às normas das Leis nºs 4.595/64 e 10.931/04 ou tampouco ao enunciado da Súmula 596 do STF. Desse modo, de acordo com o Dec-Lei nº 167/67, a fixação das taxas de juros pelo Conselho Monetário Nacional passou a ser um dever, conforme previsto em seu art. 5º: “As importâncias f o r n e c i d a s p e l o f i n a n c i a d o r vencerão juros as taxas que o Conselho Monetário Nacional fixar [...]”. Portanto, diante da omissão do Conselho Monetário Nacional quanto à fixação de juros, é de se aplicar as limitações do Decreto nº 22.626/33. Nesse sentido, já se pronunciou o Superior Tribunal de Justiça: COMERCIAL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CÉDULA RURAL PIGNORATÍCIA. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. CDC. APLICABILIDADE. SÚMULA N. 297-STJ. JUROS. LIMITAÇÃO (12% AA). AUSÊNCIA DE FIXAÇÃO PELO CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL. LEI DE USURA (DECRETO N. 22.626/33). INCIDÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. I. As questões não enfrentadas pelo Tribunal estadual recebem o óbice das Súmulas n. 282 e 356 do C. STF, não podendo, por falta de prequestionamento, serem debatidas no âmbito do recurso especial. II. "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras." - Súmula n. 297/STJ. III. Ao Conselho Monetário Nacional, segundo o art. 5º do Decreto-lei n. 167/67, compete a fixação das taxas de juros aplicáveis aos títulos de crédito rural. Omitindo-se o órgão no desempenho de tal mister, torna-se aplicável a regra geral do art. 1º, caput, da Lei de Usura, que veda a cobrança de juros em percentual superior ao dobro da taxa legal (12% ao ano), afastada a incidência da Súmula n. 596 do C. STF, porquanto se dirige à Lei n. 4.595/64, ultrapassada, no particular, pelo diploma legal mais moderno e específico, de 1967. Precedentes do STJ. IV. Não extrapola os limites da lide a conclusão de que a ausência de prova da autorização para livre contratação dos juros, concedida pelo Conselho Monetário Nacional, não permite a fixação das taxas além do teto que estabelece. Precedentes. V. Agravo improvido. (AgRg no REsp 841.487/PB, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 09/10/2007, DJ 10/12/2007, p. 378) No caso, analisando os autos, verifica-se que foram pactuados juros superiores a 12% ao ano, ou seja, em 12,683%. Logo, deve ser mantida a sentença que limitou os juros remuneratórios pactuados acima de 12% ao ano na Cédula de Crédito Bancário. Comissão de permanência Como se sabe, é pacífica a jurisprudência do STJ no sentido de que a comissão de permanência não se aplica aos contratos de cédula rural, tendo em vista o Decreto- Lei 167/67 prever regramento próprio para as situações de inadimplência, conforme se depreende dos seguintes precedentes: AGRAVO INTERNO NO ORECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL (CPC/73). AÇÃO DE COBRANÇA. CÉDULA DE CRÉDITO RURAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535, INCISO II, DO CPC/73. NÃO OCORRÊNCIA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APLICAÇÃO. ENUNCIADO N.º 297 DO STJ. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. COBRANÇA ILEGÍTIMA. PRECEDENTES. 1. Inexistência de ofensa ao art. 535, inciso II, do CPC/73, quando o acórdão recorrido, ainda que de forma sucinta, aprecia com clareza as questões essenciais ao julgamento da lide. 2. O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras - Enunciado n.º 297/STJ. 3. Nos casos de cédula de crédito rural, o STJ possui entendimento firme no sentido do não cabimento da cobrança de comissão de permanência em caso de inadimplência. 4. Não apresentação pela parte agravante de argumentos novos capazes de infirmar os fundamentos que alicerçaram a decisão agravada. 5. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. (AgInt no REsp 1496575/PB, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 12/12/2017, DJe 02/02/2018) AGRAVO INTERNO NO AGRAVO (ART. 544 DO CPC/73) - AÇÃO ORDINÁRIA DE COBRANÇA FUNDADA EM CONTRATOS BANCÁRIOS - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE DEU PARCIAL PROVIMENTO AO RECLAMO APENAS PARA AFASTAR A COBRANÇA DE COMISSÃO DE PERMANÊNCIA NA DÍVIDA ORIUNDA DE CÉDULA DE CRÉDITO RURAL. IRRESIGNAÇÃO DA PARTE AUTORA. 1. De acordo com o firme entendimento desta Corte Superior, não se mostra possível a incidência de comissão de permanência nas cédulas de crédito rural, comercial e industrial, na medida em que o Decreto-lei n. 167/1967 é expresso em só autorizar, no caso de mora, a cobrança de juros remuneratórios e moratórios (parágrafo único do art. 5º) e de multa de 10% sobre o montante devido (art. 71). 2. A possibilidade de revisão de contratos bancários prevista na Súmula n. 286/STJ estende-se a situações de extinção contratual decorrente de quitação, novação e renegociação. 3. Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp 857.008/SE, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 05/12/2017, DJe 13/12/2017) E no mesmo sentido é a jurisprudência deste Tribunal de Justiça: APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CÉDULA RURAL PIGNORATÍCIA. FRUSTRAÇÃO DE SAFRA. INADIMPLÊNCIA. EXCESSO DE EXECUÇÃO. 1. EXIGIBILIDADE DO TÍTULO. FORÇA MAIOR. INVASÃO DO MST. 2. SEGURO. RISCO EXCLUÍDO EXPRESSAMENTE PACTUADO. 3. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. 4. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. [...] 4. “(...) a comissão de permanência não deve ser aplicada às cédulas de crédito rural, tendo em vista possuir regramento próprio.” (REsp. 1.326.411, j. 05/02/2013, relator Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES) APELAÇÃO PROVIDA, EM PARTE. (TJPR - 15ª C.Cível - 0000578-61.2010.8.16.0140 - Quedas do Iguaçu - Rel.: Hayton Lee Swain Filho - J. 14.03.2018) No caso, analisando a Cédula de Crédito Bancário objeto da execução (mov. 1.5), verifica-se a existência de cláusula prevendo expressamente sua incidência em caso de inadimplemento contratual. Confira-se: Assim, uma vez caracterizado o desvio de finalidade em relação ao título executado e reconhecendo-se a necessidade de aplicação da legislação rural, deve ser mantida a sentença na parte que reconheceu a ilegalidade da comissão de permanência. Descaracterização da mora A questão da descaracterização ou não da mora em virtude da cobrança de encargos ilegais foi enfrentada pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do recurso repetitivo nº. 1.061.530/RS, no qual restou sedimentado que a cobrança de encargos ilegais no período da normalidade contratual desconfigura a mora do devedor. Traz-se à colação a orientação do Superior Tribunal de Justiça: "ORIENTAÇÃO 2 - CONFIGURAÇÃO DA MORA a) O reconhecimento da abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) descaracteriza a mora; b) Não descaracteriza a mora o ajuizamento isolado de ação revisional, nem mesmo quando o reconhecimento de abusividade incidir sobre os encargos inerentes ao período de inadimplência contratual". No mesmo sentido já decidiu esta câmara: AÇÃO CONSTITUTIVA-NEGATIVA DE NULIDADE DE CLÁUSULAS EM CÉDULAS DE CRÉDITO RURAL C/C DECLARATÓRIA E MANDAMENTAL DE PRORROGAÇÃO DE DÍVIDA. RECURSO DE APELAÇÃO 01 (AUTORES). I. SENTENÇA “CITRA PETITA”. RECONHECIMENTO “EX OFFICIO”. JUÍZO “A QUO” QUE NÃO ANALISOU O PEDIDO DE DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA. ANULAÇÃO PARCIAL DA SENTENÇA. APLICAÇÃO DO ART. 1.013,§3º, II, DO CPC/2015. JULGAMENTO IMEDIATO. II. DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA. DEVIDA. EXPURGO DE ENCARGOS REFERENTES AO PERÍODO DE NORMALIDADE CONTRATUAL. III. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. POSSIBILIDADE. CÉDULAS RURAIS PIGNORATÍCIAS. PREVISÃO EM INSTRUMENTOS CONTRATUAIS. AUTORIZAÇÃO DE LEGISLAÇÃO ESPECIAL. IV. PRORROGAÇÃO DA DÍVIDA. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PROVA DE PEDIDO ADMINISTRATIVO PARA O ALONGAMENTO DO PRAZO DE VENCIMENTO DO DÉBITO. DOCUMENTOS DA INICIAL INSUFICIENTES PARA COMPROVAR A INCAPACIDADE FINANCEIRA. V. MANUTENÇÃO DA DISTRIBUIÇÃO DOS ENCARGOS DE SUCUMBÊNCIA. [...] II. “ORIENTAÇÃO 2 - CONFIGURAÇÃO DA MORA a) O reconhecimento da abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) descaracteriza a mora; b) Não descaracteriza a mora o ajuizamento isolado de ação revisional, nem mesmo quando o reconhecimento de abusividade incidir sobre os encargos inerentes ao período de inadimplência contratual”. (REsp 1061530/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008, DJe 10/03/2009). [...] APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA. (TJPR - 15ª C.Cível - 0007021-86.2010.8.16.0056 - Cambé - Rel.: Shiroshi Yendo - J. 06.06.2018) No caso, constatada a cobrança indevida de encargos no período de normalidade (incidência de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano), resta configurada a descaracterização da mora, de modo que escorreita a sentença nesse ponto. Contudo, os efeitos de tal descaracterização implicam apenas no afastamento dos encargos da mora, com o abatimento do excesso deles decorrente, mas não constitui motivo para a extinção da execução. Nesse sentido, é o precedente desta Câmara: APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO.CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. I – (...). II - NULIDADE DO TÍTULO E DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA. NÃO VERIFICADAS. INTELIGÊNCIA DO ART.28 DA LEI DE Nº 10.931/2004. EVENTUAL EXCESSO DE EXECUÇÃO E, POR CONSEQUÊNCIA, DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA NÃO ACARRETAM A NULIDADE DO TÍTULO. III – (...). II - Além da cédula de crédito bancário constituir título hígido a lastrear execução, consoante art.28 da Lei de nº 10.931/2004, eventual excesso de execução e, por consequência, descaracterização da mora não acarretam a nulidade do título, devendo a execução prosseguir com a recálculo do débito. III - (...). APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA EM PARTE E, NESTA, NÃO PROVIDA. (TJPR - 15ª C.Cível - AC - 1634391-4 - Curitiba - Rel.: Shiroshi Yendo - Unânime - J. 05.04.2017, sem supressões no original) Logo, impõe-se dar parcial provimento ao recurso do embargado, para o fim de afastar a extinção do feito decretada pelo Juízo , determinando-se apenas o expurgo do excesso de execução.a quo Sucumbência Dispõe o artigo 86, do Novo Código de Processo Civil, verbis: “Se cada litigante for, em parte vencedor e vencido, serão proporcionalmente distribuídas entre eles as despesas”. Em consequência do parcial provimento do recurso da instituição financeira para afastar a extinção da execução, limitar a revisão apenas da cédula de crédito bancário e reconhecer a legalidade da capitalização mensal de juros, o que não pode ser considerado como decaimento mínimo do pedido, necessária a redistribuição da sucumbência, atribuindo-se a responsabilidade do ônus de 70% ao banco embargado e o restante aos embargantes, mantido o valor fixado na sentença para a verba honorária (10% sobre o valor atualizado da causa – R$ 360.832,84, em 26/05/2014 – a ser dividido entre as partes na mesma proporção). Pelo exposto, impõe-se: a) conhecer e negar provimento ao recurso de apelação 1; 3. b) conhecer e dar parcial provimento ao recurso de apelação 2, para o fim de limitar a revisão apenas dae cédula de crédito bancário, afastar a extinção da execução, determinando-se o seu prosseguimento com o recálculo do débito em relação à taxa de juros remuneratórios em 12% ao ano e ao afastamento dos encargos de mora, bem como para reconhecer a legalidade da capitalização mensal de juros, com a redistribuição do ônus da sucumbência de 70% ao embargado e o restante aos embargantes, nos termos da fundamentação. Ante o exposto, acordam os Desembargadores da 15ª Câmara Cível do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ, por unanimidade de votos, em julgar pelo (a) Não-Provimento do recurso de Sebastião Ludovico Neto, por unanimidade de votos, em julgar pelo (a) Não-Provimento do recurso de marta geiss ludivico, por unanimidade de votos, em julgar pelo (a) Não-Provimento do recurso de Estefânia Ludovico, por unanimidade de votos, em julgar pelo (a) Provimento em Parte do recurso de Banco do Brasil S/A. O julgamento foi presidido pelo (a) Desembargador Luiz Carlos Gabardo, sem voto, e dele participaram Desembargador Jucimar Novochadlo (relator), Desembargador Hamilton Mussi Corrêa e Desembargador Hayton Lee Swain Filho. Curitiba, 03 de julho de 2019. Jucimar Novochadlo Relator SANSEVERINO, Paulo de Tarso Vieira. Responsabilidade Civil no Código do Consumidor e a Defesa do Fornecedor. 3ª. Ed.[1] São Paulo: Saraiva, 2010, p. 354-5.
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