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Acórdão
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 38994-25.2013.8.16.0001, DA 12ª VARA CÍVEL DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA. APELANTE: FÁTIMA PEREIRA DA ROSA APELADOS: LISOLETA MEQUETTA GERONASSO E PEDRO GERONASSO RELATOR: DES. LAURI CAETANO DA SILVA USUCAPIÃO. AÇÃO AJUIZADA POR INTERMÉDIO DE DEFENSOR PÚBLICO. PEDIDO JULGADO PROCEDENTE. RÉU CITADO POR EDITAL. DEFESA FORMULADA PELA DEFENSORIA PÚBLICA, NA QUALIDADE DE CURADORA ESPECIAL. CONDENAÇÃO DA AUTORA AO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS E DOS HONORÁRIOS EM FAVOR DOS DEFENSORES PÚBLICOS. APELO DA AUTORA. 1. RESPONSABILIDADE PELOS HONORÁRIOS EM FAVOR DOS DEFENSORES. HONORÁRIOS COM NÍTIDO CARÁTER REMUNERATÓRIO. DEFENSORIA PÚBLICA QUE ATUOU NO EXERCÍCIO DE SUA FUNÇÃO INSTITUCIONAL. ARTIGO 4º, I E XVI DA LEI COMPLEMENTAR Nº 80/94. IMPOSSIBILIDADE DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS. PRECEDENTES DO STJ. 2. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. AUSÊNCIA DE RESISTÊNCIA AO PEDIDO. COMPROVAÇÃO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS À AQUISIÇÃO ORIGINÁRIA DO DOMÍNIO QUE É INERENTE À PRÓPRIA AÇÃO DE USUCAPIÃO, INDEPENDENTEMENTE DE CONTESTAÇÃO. RÉUS QUE NÃO DERAM CAUSA AO AJUIZAMENTO DA AÇÃO. O SIMPLES FATO DE FIGURAREM COMO PROPRIETÁRIOS REGISTRAIS DO IMÓVEL NÃO AUTORIZA ATRIBUIR-LHES RESPONSABILIDADE PELO AJUIZAMENTO DA DEMANDA. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA QUE, NO CASO DE RÉU REVEL CITADO POR EDITAL, SÃO DEVIDOS SOMENTE NO CASO DE VITÓRIA DO SUJEITO REPRESENTADO PELO CURADOR ESPECIAL. PRECEDENTES. 3. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA, APENAS PARA AFASTAR A CONDENAÇÃO DA AUTORA AO PAGAMENTO DE HONORÁRIOS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. “Descabimento de honorários de curador especial em favor de defensor público, que, consoante expressa previsão constitucional, apenas pode receber subsídio em parcela única, não sendo admitido o recebimento de qualquer outra espécie de verba remuneratória. O exercício da curadoria Apelação Cível nº 38994-25.2013.8.16.0001 2 especial é função institucional da Defensoria Pública, não se mostrando possível o recebimento de honorários pelo desempenho de múnus público” (STJ – REsp nº 1.297.354/SP, Rel.: Paulo de Tarso Sanseverino, T3, J.: 27.11.2012). 2. Os honorários de sucumbência são devidos pela parte contrária apenas na hipótese de o sujeito representado pelo curador sagrar-se vencedor na demanda (TJPR – AC nº 1.536.424- 4, Rel.: Fernando Paulino da Silva Wolff Filho, 17ª CC, J.: 31.08.2016). Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 38994-25.2013.8.16.0001, da 12ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba, em que é apelante Fátima Pereira da Rosa e são apelados Lisoleta Mequetta Geronasso e Pedro Geronasso. ACORDAM os Desembargadores integrantes da 17ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em dar parcial provimento ao recurso. I- RELATÓRIO 1. Fátima Pereira da Rosa, por intermédio da Defensoria Pública do Estado do Paraná, ajuizou “ação de usucapião extraordinário” em face de Lisoleta Mequetta Geronasso e Pedro Geronasso alegando que (a) exerce, desde 1993, de forma mansa, pacífica e ininterrupta, posse sobre o lote de terreno nº 18 da quadra nº 2 da Planta Vila Lisoleta, situado à rua Maria Balbina Costa Dias, nº 118; (b) o lote não possui matrícula própria, pertencendo a uma área maior de área total de 57.096,26m², a qual foi doada a Lisoleta Mequetta Geronasso e Pedro Geronasso em 31.10.1945, conforme transcrição nº 13.004, livro 3-L, do 6º Serviço de Registro de Imóveis de Curitiba. Dessa maneira, requereu a citação por edital dos proprietários do imóvel, Lisoleta e Pedro, e, ao fim, a procedência do pedido, declarando-se sua plena propriedade sobre o imóvel supracitado. Postulou, por fim, a concessão do benefício da assistência judiciária gratuita. O benefício da gratuidade judiciária foi deferido (mov.10.1). 2. Citados por edital (mov.34.2), os réus Lisoleta Mequetta Geronasso e Pedro Geronasso, por intermédio da Defensoria Apelação Cível nº 38994-25.2013.8.16.0001 3 Pública do Estado do Paraná (curadora especial), apresentaram defesa por negativa geral (mov.51.1). 3. Em sede de audiência de instrução e julgamento (mov.135.1), foi colhido o depoimento pessoa da autora, bem como promovida a oitiva de três testemunhas. Ato contínuo, o MM Juiz a quo prolatou sentença em audiência, julgando procedente o pedido deduzido na inicial, para declarar o domínio da autora Fátima sobre o imóvel descrito na exordial. Ao fim, condenou a autora ao pagamento de honorários em favor dos integrantes da Defensoria Pública do Estado do Paraná. A autora Fátima Pereira da Rosa opôs embargos de declaração (mov.136.1), requerendo a condenação dos réus ao pagamento das custas processuais e dos honorários à Defensoria Pública. Os embargos foram rejeitados. 4. A autora Fátima Pereira da Rosa, por intermédio da Defensoria Pública do Estado do Paraná, interpôs recurso de apelação (mov.147.1), pleiteando condenação dos réus ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que devem ser revertidos ao Fundo de Aparelhamento da Defensoria Pública do Estado do Paraná. Os réus Lisoleta Mequetta Geronasso e Pedro Gernasso apresentaram contrarrazões por intermédio da Defensoria Pública (mov.159.1). É o relatório. II- VOTO Presentes os pressupostos recursais de admissibilidade, intrínsecos e extrínsecos, conheço do recurso. 5. No caso em tela, requer a apelante, sinteticamente, a condenação dos réus ao pagamento de honorários em favor de fundo administrado pela Defensoria Pública. 5.1. Em razão do paradeiro dos réus Lisoleta Mequetta Geronasso e Pedro Geronasso ser incerto e desconhecido, a citação foi feita por edital (mov.34.2). A Defensoria Pública, na qualidade Apelação Cível nº 38994-25.2013.8.16.0001 4 de Curadora Especial, apresentou defesa por negativa geral (mov.51.1). A nomeação do Curador Especial é imposta pela legislação processual civil, a todos os réus citados por edital ou hora certa (art. 9°, CPC1). Nestes casos o processo só se desenvolve com a intervenção do curador, de modo a atender o princípio da ampla defesa. Tal curadoria será exercida preferencialmente pela Defensoria Pública; mas, na ausência ou desaparelhamento desta na localidade, tal mister poderá ser desempenhado por advogado dativo. Sem a intervenção do curador especial o processo instaurado pelo autor ficaria paralisado. Portanto, sua intervenção é do interesse do autor. Consequentemente, os honorários do curador especial são entendidos como despesa do processo, a qual deve ser suportada pela parte a quem a sua intervenção interessa, ou seja, à parte autora2. No entanto, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu inúmeras vezes que os honorários advocatícios (com caráter remuneratório) não são devidos à Defensoria Pública no exercício da curadoria especial, visto que a função faz parte de suas atribuições institucionais, conforme artigo 4º, XVI da Lei Complementar nº 80/943. Veja-se: PROCESSUAL CIVIL. CURADOR ESPECIAL. FUNÇÃO INSTITUCIONAL DA DEFENSORIA PÚBLICA. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS. IMPOSSIBILIDADE. 1. Os honorários advocatícios não são devidos à Defensoria pública no exercício da curadoria especial, visto que essa função faz parte de suas atribuições institucionais. 2. Recurso especial não provido. (REsp nº 1.203.312/SP, Rel.: Min Nancy Andrighi, T3, J.: 14.04.2011). RECURSO ESPECIAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. DEFENSORIA PÚBLICA. HONORÁRIOS DE CURADOR ESPECIAL. DESCABIMENTO. EXERCÍCIO DE FUNÇÃO INSTITUCIONAL. 1. Descabimento de honorários de curador especial em favor de defensor público, que, consoante expressa previsão constitucional, apenas pode receber subsídio em parcela única, não sendo admitido o recebimento de qualquer outra espécie de verba remuneratória. 2. O exercício da curadoria especial é função institucional da Defensoria Pública, -- 1 Art. 9o O juiz dará curador especial: I - ao incapaz, se não tiver representante legal, ou se os interesses deste colidirem com os daquele; II - ao réu preso, bem como ao revel citado por edital ou com hora certa. Parágrafo único. Nas comarcas onde houver representante judicial de incapazes ou de ausentes, a este competirá a função de curador especial. 2 Nesse sentido: AgRg no REsp nº 1.191.286/SP; REsp nº 957.422/RS. -- 3 São funções institucionais da Defensoria Pública, dentre outras: (...). XVI – exercer a curadoria especial nos casos previstos em lei; Apelação Cível nº 38994-25.2013.8.16.0001 5 não se mostrando possível o recebimento de honorários pelo desempenho de múnus público. Precedente específico da Corte Especial. 3. Ressalva do cabimento de honorários de sucumbência à Defensoria Pública, exceto quando a parte vencida for a pessoa jurídica de direito público à qual pertence a instituição. Súmula 421/STJ. 4. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. (STJ – REsp nº 1.297.354/SP, Rel.: Paulo de Tarso Sanseverino, T3, J.: 27.11.2012). Na sentença, o magistrado a quo pontuou que “devo ressaltar que não houve resistência à pretensão deduzida a ponto de carrear a sucumbência. Sendo assim, as custas do processo são de responsabilidade da autora, inclusive honorários de ambos os integrantes da Douta Defensoria, cada qual em mister individual nesses autos. Para tanto, a cada interveniente arbitro honorários de R$2.000,00”. Dessa maneira, verifica-se que o MM Juiz condenou o autor ao pagamento de honorários em favor dos Defensores Públicos, não sendo tais honorários, no entanto, de natureza sucumbencial. A verba honorária, em realidade, foi classificada como “custas do processo”, revelando o caráter remuneratório (e, portanto, não sucumbencial) dos honorários arbitrados pelo magistrado. No entanto, como salientado acima, os honorários advocatícios com caráter remuneratório não são devidos à Defensoria Pública no exercício da curadoria especial por se tratar de função institucional do órgão. O mesmo raciocínio deve ser aplicado à atuação da Defensoria Pública no exercício de defesa dos interesses dos necessitados, pois igualmente se trata de sua função institucional4. Assim, como a Defensoria Pública atuou somente no exercício de suas funções institucionais, incabível a condenação da autora ao pagamento de honorários, merecendo reforma a sentença nesse particular. 5.2. No que diz respeito à condenação dos réus ao pagamento de honorários de sucumbência em favor do Fundo de Aparelhamento da Defensoria Pública do Estado do Paraná, igual sorte não assiste à apelante. -- 4 Art. 4º São funções institucionais da Defensoria Pública, dente outras: I – prestar orientação jurídica e exercer a defesa dos necessitados, em todos os graus; Apelação Cível nº 38994-25.2013.8.16.0001 6 É que, considerando as peculiaridades da ação de usucapião, em que ao autor incumbe demonstrar o preenchimento dos requisitos necessários à aquisição originária da propriedade independentemente da conduta do réu, a defesa por negativa geral apresentada pelo curador especial não pode ser interpretada como resistência ao pedido, mas formalidade processual praticada no interesse do próprio autor. De igual maneira, não é possível assumir que os réus deram causa ao ajuizamento da ação pura e simplesmente por serem proprietários registrais do imóvel usucapiendo. A ação de usucapião possui caráter meramente declaratório, em que se analisa apenas o preenchimento ou não dos requisitos necessários à espécie, sendo que a citação dos réus é compulsória. Note-se que a pretensão de direito material não depende de conduta dos réus, mas do exercício de posse ad usucapionem pelo usucapiente, de maneira que não se pode atribuir aos proprietários de imóvel qualquer responsabilidade pelo ajuizamento da ação, não sendo possível se falar em causalidade e, portanto, em sucumbência. Por fim, ressalto que o entendimento jurisprudencial aponta no sentido de que os honorários sucumbências, no caso de réu revel citado por edital, são cabíveis apenas quando o sujeito representado pelo curador especial sagrar-se vencedor na demanda: AÇÃO DE USUCAPIÃO. APELAÇÃO INTERPOSTA PELO ESTADO DO PARANÁ. NOMEAÇÃO DE CURADOR ESPECIAL AOS RÉUS REVÉIS CITADOS POR EDITAL (ART. 9º, II, DO CPC/73). (...). NATUREZA DOS HONORÁRIOS DEVIDOS AOS CURADORES PELO ESTADO. REMUNERAÇÃO PELOS SERVIÇOS PRESTADOS. NÃO SE CONFUNDEM COM OS HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS, DEVIDOS PELA PARTE CONTRÁRIA E APENAS SE O REPRESENTADO FOR VENCEDOR NA DEMANDA. NOMEAÇÃO DE CURADOR ESPECIAL EM MOMENTO ANTERIOR AO INÍCIO DO FUNCIONAMENTO DA DEFENSORIA PÚBLICA ESTADUAL. ART. 22, § 1º, DA LEI Nº 8.906/94 QUE DEVE SER INTERPRETADO CONJUNTAMENTE COM OS ART.4º DA LEI COMPLEMENTAR Nº 80/94 E ART. 4º DA LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL Nº 136/11. APELAÇÃO DESPROVIDA.1. (...). 2. São devidos pelo Estado os honorários de curador especial nomeado pelo juízo, em razão da ausência ou inoperância da Defensoria Pública, para a defesa de réu revel citado por edital. 3. Esses honorários não se confundem com os honorários de sucumbência, devidos pela parte contrária e apenas na hipótese do sujeito representado pelo curador sagrar-se vencedor na demanda. (TJPR – AC nº 1.536.424-4, Rel.: Fernando Paulino da Silva Wolff Filho, 17ª CC, J.: 31.08.2016)5. -- 5 No mesmo sentido: AC nº 1.501.830-3, AC nº 1.519.805-5, AC nº 1.560.426-6, AC nº 1.319.022-2, AC nº 1.432.722-7. Apelação Cível nº 38994-25.2013.8.16.0001 7 Dessa forma, incabível a condenação dos apelados ao pagamento de honorários de sucumbência. 6. Diante o exposto, voto no sentido de dar parcial provimento ao recurso e afastar a condenação da autora ao pagamento dos honorários. III- DECISÃO ACORDAM os Desembargadores integrantes da 17ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em dar parcial provimento ao recurso. O julgamento foi presidido pela Desembargadora ROSANA AMARA GIRARDI FACHIN, sem voto, e dele participaram os Juízes Subst. em 2ºG. SANDRA BAUERMANN e FABIAN SCHWEITZER. Curitiba, 11 de dezembro de 2019. DES. LAURI CAETANO DA SILVA Relator
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