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Acórdão
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1. 2. PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ 2ª CÂMARA CRIMINAL - PROJUDI Rua Mauá, 920 - Alto da Glória - Curitiba/PR - CEP: 80.030-901 Autos nº. 0001795-80.2011.8.16.0019 Apelação Criminal n° 0001795-80.2011.8.16.0019 1ª Vara Criminal de Ponta Grossa Apelante(s): MARCELO PINHEIRO Apelado(s): Ministério Público do Estado do Paraná Relator: Desembargador Luís Carlos Xavier APELAÇÃO CRIME – DELITO DE DESACATO – ARTIGO 331 DO CÓDIGO PENAL – PROCEDÊNCIA. APELO DO ACUSADO – 1. INCONVENCIONALIDADE DO DELITO DE DESACATO – ALEGAÇÃO DE QUE O ART. 331 FOI DERROGADO PELA CONVENÇÃO AMERICANA DOS DIREITOS HUMANOS (PACTO DE SAN JOSÉ DA COSTA RICA) – INOCORRÊNCIA – 2. ALEGADA OFENSA AO SISTEMA ACUSATÓRIO PELA CONDENAÇÃO DO ACUSADO APÓS PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO FORMULADO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO – NÃO ACOLHIMENTO – ARTIGO 385 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL – INEXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE OU OFENSA CONSTITUCIONAL – 3. PLEITO ABSOLUTÓRIO - AUSÊNCIA DE DOLO – INVIABILIDADE – PROVAS SUFICIENTES A DEMONSTRAR A AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVAS – SENTENÇA MANTIDA – 4. PEDIDO DE ISENÇÃO DE PENA – DESCABIMENTO – A EMBRIAGUEZ, VOLUNTÁRIA OU CULPOSA, PELO ÁLCOOL OU SUBSTÂNCIA DE EFEITOS ANÁLOGOS, NÃO EXCLUI A IMPUTABILIDADE PENAL (CP, ART. 28) – 5. PENA RESTRITIVA DE DIREITOS – PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE – IMPOSSIBILIDADE – ARTIGO 46 DO CÓDIGO PENAL – RECURSO DESPROVIDO, ALTERANDO-SE, DE OFÍCIO, A PENA RESTRITIVA DE DIREITOS. O artigo 331 do Código Penal encontra-se em plena vigência, não havendo que se falar em derrogação de tal norma legal, tampouco em incompatibilidade deste crime com a Constituição Federal e a Convenção Americana dos Direitos Humanos. "O sistema processual pátrio não adota o sistema acusatório puro. Daí, não há 2. 3. 4. 5. nulidade quando, diversamente do quanto requerido pelo Ministério Público, em alegações finais, o magistrado reconhece a responsabilidade do réu, ou o faz por infração penal mais grave do que aquela que, ao cabo da instrução, entendeu o Parquet por ser a adequada ao comportamento do acusado (HC n. 196.421/SP, Sexta Turma, Relª. Minª. Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 26/2/2014). Assim, no caso, não há falar-se em nulidade da condenação do paciente pelo simples fato de o Parquet .(HC 407.021/SC, Rel. Ministro FELIX FISCHER, Quintater requerido sua absolvição Turma, julgado em 19/09/2017, DJe 25/09/2017)". 3. Habeas corpus não conhecido." (HC 446.896/SP, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, ”.julgado em 24.05.2018, DJe 01.06.2018) In casu, não há como afastar a presença do elemento subjetivo específico na conduta do réu/apelante, ou seja, o dolo, uma vez que ficou satisfatoriamente configurada a vontade livre e consciente do agente em ofender o bem jurídico tutelado o prestígio, respeito e autoridade dos agentes militares em exercício de sua função pública, prática esta que subsume ao tipo penal previsto no art. 331 do Código Penal. O eventual estado de embriaguez voluntária do agente, não exclui a sua imputabilidade, notadamente porque embora haja indícios de que o acusado/apelante estivesse sob o efeito de álcool, não há qualquer demonstração de que o estado decorreu de caso fortuito ou força maior, não se cogitando eventual causa de isenção de pena ou de inimputabilidade. Nos termos do artigo 46 do Código Penal, a prestação de serviços à comunidade somente é aplicável às condenações superiores a 06 (seis) meses de privação da liberdade, devendo ser adequada, de ofício, a pena restritiva de direitos. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Crime nº 00001795-80.2011.8.16.0019, da 1ª Vara Criminal da Comarca de Ponta Grossa, em que é Apelante e Apelado o Marcelo Pinheiro Ministério Público do Estado do Paraná. Trata-se de Apelação interposta contra a sentença (mov. 115.1) proferida nos autos 0001795-80.2011.8.16.0019 de Ação Penal que julgou procedente a pretensão punitiva, para o fim de condenar pela prática do delito do art. 331, do Código Penal, à pena privativa deMarcelo Pinheiro liberdade de 06 (seis) meses de detenção, em regime aberto, sendo esta substituída por restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade. A denúncia, foi assim formulada (mov. 43.2): “Consta do presente Termo Circunstanciado que o ora denunciado, em data de 14/01/2011, por volta das 16:30h, na Rua Coronel Claudio, Centro, nesta cidade, local conhecido como ‘Calçadão’, foi abordado pelos policiais militares Sd. Silas Jean da Silva e Sd. Eliton Silvestre da Luz, de forma motivada, em virtude de que estava a causar desordens e ameaçar funcionários de um mercado, passando, então, a desacatá-los, chamando-os de ‘filho da puta’, dirigindo-se aos policiais e dizendo também ‘se eu te pegar na rua você vai ver o que vai acontecer’ e ainda ia chamar seus primos pra pegar os policiais tudo com a finalidade de menosprezar a autoridade daqueles.” Inconformado com o , decisum Marcelo Pinheirointerpôs recurso de Apelação (mov. 123.1), pugnando, em síntese: “a) A reforma da sentença com a absolvição do apelante quanto ao delito de desacato (art. 331 do CP), diante do reconhecimento da inconvencionalidade deste crime, com a absolvição do apelante, com fundamento no art. 386, inciso III, do Código de Processo Penal. b) A reforma da sentença com a consequente absolvição do apelante com relação ao delito de desacato diante da ausência de dolo, pois o apelante não teve intenção de ultrajar os policiais militares, eis que estava totalmente alterado, nos termos do artigo 386, III, do CPP. Subsidiariamente, requer-se a isenção de pena, nos termos do art. art. 28, inciso II, § 1º do Código Penal, diante da ausência de capacidade para entender o caráter ilícito de suas eventuais atitudes, em razão da alteração do seu estado psicológico. c) A indispensável reforma da sentença diante da observância do Princípio Acusatório e impossibilidade de condenação na hipótese de pedido de absolvição do Ministério Público; (...).”. Neste contexto, requer a reforma da sentença com a absolvição do apelante. O apelado apresentou contrarrazões, postulando pelo conhecimento e provimento do recurso, sob o fundamento de que: “procede o argumento do apelante de que o conjunto probatório constante no feito não é firme o bastante para ensejar sua condenação, diante da ausência de demonstração do seu dolo”. (mov. 132.1). Nesta instância, a douta exarou parecer pelo “Procuradoria Geral de Justiça conhecimento parcial do apelo, e nesta parte, pelo seu provimento para que o apelante seja absolvido ou, caso assim não se entenda, recomenda-se que, ex officio, seja afastada a prestação de serviços à comunidade com a fixação de outra pena restritiva de direitos no lugar.” (mov. 11.1). É o relatório. VOTO Presentes os pressupostos de admissibilidade, impõe-se conhecer o recurso. A pretensão recursal não admite acolhimento. Da inconvencionalidade do crime de desacato A defesa pugna pela absolvição do recorrente, com fundamento no art. 386, III, o Código de Processo Penal, sustentando a inconvencionalidade do crime de desacato. Sem razão. Em que pese o recente julgado pelo Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1640084/SP, no sentido de que “A Comissão Interamericana de Direitos Humanos - CIDH já se manifestou no sentido de que as leis de desacato se prestam ao abuso, como meio para silenciar ideias e opiniões consideradas incômodas pelo establishment, bem assim proporcionam maior nível de proteção aos agentes do Estado do que aos particulares, em contravenção aos princípios democrático e igualitário. 11. A adesão ao Pacto de São José significa a transposição, para a ordem jurídica interna, de critérios recíprocos de interpretação, sob pena de negação da universalidade dos valores insertos nos direitos fundamentais internacionalmente reconhecidos. Assim, o método hermenêutico mais adequado à concretização da liberdade de expressão reside no postulado pro homine, composto de dois princípios de proteção de direitos: a dignidade da pessoa humana e a prevalência dos direitos humanos. 12. A criminalização do desacato está na contramão do humanismo, porque ressalta a preponderância do Estado - personificado em seus agentes - sobre o indivíduo. 13. A existência de tal normativo em nosso ordenamento jurídico é anacrônica, pois traduz desigualdade entre funcionários e particulares, o que é inaceitável no Estado Democrático de Direito. 14. Punir o uso de linguagem e atitudes ofensivas contra agentes estatais é medida capaz de fazer com que as pessoas se abstenham de usufruir do direito à liberdade de expressão, por temor de sanções penais, sendo esta uma das razões pelas quais a CIDH estabeleceu a recomendação de que os países aderentes ao Pacto de São Paulo abolissem suas respectivas leis de desacato. 15. O afastamento da tipificação criminal do desacato não impede a responsabilidade ulterior, civil ou até mesmo de outra figura típica penal (calúnia, injúria, difamação etc.), pela ocorrência de abuso na expressão verbal ou gestual utilizada perante o funcionário público.” -, entendo que como referido recurso não foi julgado em conformidade com as normativas que regem os recursos repetitivos o mesmo não tem aplicação vinculativa dos demais tribunais, tratando-se ainda, de decisão isolada. Ainda é de se esclarecer que o delito de desacato está inserido no Título XI, do Código Penal que trata dos crimes praticados contra a administração pública, e estando os servidores públicos, exercendo suas funções no cumprimento da lei, não podem vir a serem desacatados em razão do direito à liberdade de expressão do indivíduo, consoante tutelado pela Convenção Americana de Direitos Humanos. Assim, ainda que seja garantido ao cidadão sua liberdade de expressão, a este não é dado o direito de desacatar o funcionário público no exercício de suas funções, vez que este representa a administração pública quando em serviço, a qual deve ser respeitada. Não se trata, portanto, da criminalização da ofensa à honra do funcionário público e sim, da preservação da moralidade da administração pública por ele representada quando em serviço. Desta feita, ao contrário do alegado, o artigo 331 do Código Penal encontra-se em plena vigência, não havendo que se falar em derrogação de tal norma legal, tampouco em incompatibilidade deste crime com a Constituição Federal e a Convenção Americana dos Direitos Humanos. Neste sentido é a jurisprudência: “APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES DE RESISTÊNCIA E AMEAÇA (ART. 329 E 147, AMBOS DO CP. DOIS RÉUS. CONCURSO MATERIAL DE CRIMES (ART. 69, DO CP). CONDENAÇÃO. (...) RECURSO DE APELAÇÃO 02 (MARCOS). ALEGADA NÃO RECEPTIVIDADE DO CRIME DE DESACATO PELO ORDENAMENTO JURÍDICO (ART. 5º, INC. IV, DA CF), E, AINDA, A INCOMPATIBILIDADE COM A CONVENÇÃO AMERICANA DOS DIREITOS HUMANOS, POR OFENSA À LIBERDADE DE EXPRESSÃO. TESES INSUBSISTENTES. CRIME DE DESACATO QUE TUTELA A PROBIDADE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, E NÃO A OFENSA À PESSOA DO FUNCIONÁRIO PÚBLICO. (...). 1. A criminalização do delito de desacato não diz respeito à honra do funcionário público, mas sim ao próprio prestígio da administração pública, que se faz representar na pessoa do agente público que sofre a ofensa. (...).” (TJPR, 2ª C.Criminal, AC 1592407-5, Ponta Grossa, Rel.: José Mauricio Pinto de Almeida, Unânime, J. 09.03.2017) “APELAÇÃO CRIME - SENTENÇA CONDENATÓRIA - AMEAÇA, DANO E DESACATO (ART. 147, CP, ART. 163, PARÁGRAFO ÚNICO, INC. III, E ART. 331, TODOS DO CP) - CRIME DE AMEAÇA – (...) CRIME DE DESACATO - ALEGAÇÃO DE NÃO RECEPÇÃO DO CRIME PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL - SEM RAZÃO - NORMA EM CONFORMIDADE COM A CARTA MAGNA - SUPOSTA DERROGAÇÃO DO DISPOSITIVO PELA CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS - INOCORRÊNCIA - COMPATIBILIDADE ENTRE AMBOS OS DIPLOMAS LEGAIS – (...).” (TJPR, 3ª C.Criminal, AC 1503442-1, Ponta Grossa, Rel.: José Cichocki Neto, Unânime, J. 21.07.2016) Afasta-se, portanto, esta alegação. Do sistema acusatório A defesa requer a reforma da sentença diante da observância do Princípio Acusatório e impossibilidade de condenação na hipótese de pedido de absolvição do Ministério Público. Sem razão. Isso porque, o magistrado não está vinculado ao pedido do Ministério Público apresentado em sede de alegações finais, tendo em vista que deve analisar as provas contidas nos autos e decidir conforme seu livre convencimento motivado. Nesse sentido, prevê o artigo 385 do Código de Processo Penal: "Art. 385. Nos crimes de ação pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição, bem como reconhecer agravantes, embora nenhuma tenha sido alegada." Sobre o tema, confiram-se julgados do Superior Tribunal de Justiça e desta Egrégia Corte: "HABEAS CORPUS SUBSTITUTO DE RECURSO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO EM ALEGAÇÕES FINAIS. CONDENAÇÃO. INFRAÇÃO AO SISTEMA ACUSATÓRIO. INEXISTÊNCIA. ART. 385 DO CPP. PRECEDENTES. 1. (...) 2. "O sistema processual pátrio não adota o sistema acusatório puro. Daí, não há nulidade quando, diversamente do quanto requerido pelo Ministério Público, em alegações finais, o magistrado reconhece a responsabilidade do réu, ou o faz por infração penal mais grave do que aquela que, ao cabo da instrução, entendeu o Parquet por ser a adequada ao comportamento do acusado (HC n. 196.421/SP, Sexta Turma, Relª. Minª. Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 26/2/2014). Assim, no caso, não há falar-se em nulidade da condenação do paciente pelo simples fato de o Parquet .(HC 407.021/SC, Rel. Ministro FELIX FISCHER, Quintater requerido sua absolvição Turma, julgado em 19/09/2017, DJe 25/09/2017)". 3. Habeas corpus não conhecido." (HC 446.896/SP, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 24.05.2018, DJe 01.06.2018) "APELAÇÃO CRIMINAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA POR VIAS DE FATO (ART. 21 DA LEI DE CONTRAVENÇÕES PENAIS, NA FORMA DA LEI Nº 11.340/06). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSOS DA DEFESA E DA ACUSAÇÃO. 1) ARGUMENTO DE QUE O PRONUNCIAMENTO REPRESSIVO AFRONTA O SISTEMA ACUSATÓRIO. TESE COMUM RECHAÇADA. MANIFESTAÇÃO MINISTERIAL [EM SEDE DE ALEGAÇÕES FINAIS] PELA ABSOLVIÇÃO DO SENTENCIADO QUE NÃO VINCULA O JULGADOR. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 385 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. MODELO PROCESSUAL ACUSATÓRIO QUE NÃO FORA VIOLADO COM A PROLAÇÃO DE ÉDITO CONDENATÓRIO. PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. INDEPENDÊNCIA DO PODER JUDICIÁRIO PARA RECURSOAVALIAÇÃO DO ACERVO PROBANTE. PRECEDENTES DO STJ. CONHECIDO E DESPROVIDO, COM DELIBERAÇÃO EX OFFICIO." (TJPR, 5ª C.Criminal, 0004877-84.2015.8.16.0147, Rio Branco do Sul, Rel.: Simone Cherem Fabrício de Melo, J. 07.02.2019) Constata-se, portanto, na espécie, que não há que se falar em ilegalidade ou violação ao sistema acusatório em razão do Juízo ter condenado o acusado após pedido de absolvição pelo Ministério Público em alegações finais. Da ausência de dolo A defesa pugna pela reforma da sentença com a consequente absolvição do apelante com relação ao delito de desacato diante da ausência de dolo, pois este não teve intenção de ultrajar os policiais militares, eis que estava totalmente alterado, nos termos do artigo 386, III, do CPP. Sem razão. Da análise dos autos, e a despeito do parecer favorável exarado pela douta Procuradoria Geral de Justiça, entendo que razão não assiste à defesa. Da análise dos autos, verifica-se que as provas produzidas nos autos revelam a prática pelo apelante do delito previsto no artigo 331 do Código Penal, que assim dispõe: “Art. 331. Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela. Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.” Observa-se , que a materialidade do crime acima indicado, assim como a autoria, restou, in casu devidamente comprovada através do Termo Circunstanciado de Infração Penal (mov. 1.1), bem como pela prova oral coligida aos autos. Em relação à autoria delituosa, inexistem dúvidas que a mesma recai sobre a pessoa do acusado/apelante. À propósito, destacam-se os depoimentos colhidos em Juízo, a seguir reproduzidos, :in verbis “O policial militar Eliton da Luz, quando ouvido em Juízo, afirmou que o acusado estava bem transtornado no dia, sendo que a equipe foi chamada por populares, uma vez que o denunciado estava ameaçando quem estava passando pelo local e o pessoal do mercado. Relatou que a equipe conseguiu controlar a situação, mas ante o estado de alteração do acusado, o mesmo começou a desacatar e agredir a equipe policial. Não se recordou das expressões proferidas pelo acusado, mas confirmou as informações relatadas no termo circunstanciado e no boletim de ocorrência. O outro policial responsável pela ocorrência, Sr. Silas Jean da Silva, relatou em Juízo que no dia dos fatos estava no estágio probatório, realizando a patrulhamento a pé no “Calçadão”, momento em que o pessoal do supermercado Condor relatou que tinha um indivíduo causando muito tumulto e desordem no estabelecimento comercial. No momento em que foram abordar o acusado, o mesmo começou a desacatar a equipe policial, afirmando iria chamar mais pessoas para “pegar nós”. Após isso, foi solicitado apoio de outra equipe e da viatura, a fim de realizar a condução do acusado em razão do desacato. Relatou que o acusado se encontrava bem alterado, contudo, não se recorda se o mesmo estava sob o efeito de álcool. Afirmou que não se recorda das expressões proferidas.” Nota-se que os depoimentos dos policiais são coerentes e possuem pleno valor probatório. E, de qualquer forma, é cediço que a palavra dos agentes públicos tem grande eficácia quando em conformidade com os demais indícios dos autos. Por isso, as declarações dos agentes públicos merecem credibilidade, até porque não há nos autos evidência de que tivessem interesse em incriminar indevidamente o apelante ou que tenham faltado com a verdade. Neste sentido, a jurisprudência de nossos Tribunais: "(...) CONDENAÇÃO FUNDAMENTADA NO DEPOIMENTO DE POLICIAIS. MEIO DE PROVA IDÔNEO. FRAGILIDADE DO CONJUNTO PROBATÓRIO NÃO DEMONSTRADA. (...) 2. Conforme entendimento desta Corte, o depoimento de policiais constitui meio de prova idôneo a embasar o édito condenatório, mormente quando prestado ou corroborado em Juízo, no âmbito do devido processo legal. Precedentes.” (HC 261.170/SP, Rel. Min. JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julg. 01.04.2014, DJe 10.04.2014). "(...). Conforme entendimento desta Corte, o depoimento de policiais responsáveis pela prisão em flagrante do acusado constitui meio de prova idôneo a embasar o édito condenatório, ainda mais quando corroborado em Juízo, no âmbito do devido processo legal. (...)" (STJ, HC 171817/RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, Dje 01.12.2011). Como é cediço, o crime de desacato se aperfeiçoa quando o indivíduo se dirige ao servidor público (policiais militares no caso) com atos ofensivos ou palavras grosseiras demonstrando o seu menosprezo ou ainda com a nítida intenção (dolo específico) de ofendê-lo ou humilhá-lo. Do que se evidencia dos autos, a conduta do apelante se amolda perfeitamente ao elemento subjetivo do tipo. Oportuno destacar os fundamentos constantes da sentença vergastada, :verbis “Diante disso, ante as provas existentes nos autos, é certo que o acusado incidiu no tipo penal previsto no art. 331 do Código Penal. Isso porque os policiais militares ouvidos em Juízo apresentaram versões uníssonas, ratificando as informações prestadas quando da ocorrência dos fatos, não deixando dúvidas de que a equipe policial foi desacatada pelo acusado. Tanto é que segundo consta no boletim de ocorrência anexado nos autos, no momento da prisão do denunciado, o mesmo afirmou “se eu te pegar na rua você vai ver o que vai acontecer”. Ainda, segundo relatado pelo policial Eliton da Luz, “[...] que os policiais conversaram com os envolvidos no local e tudo ficou resolvido, mas Marcelo apresentando sintomas de uso de drogas, passou a desacatar a equipe chamando os mesmos de filha de puta, na presença de populares [...]”. Neste ponto, importe mencionar, que não se está embasando um Juízo condenatório apenas com base nos elementos informativos colhidos em sede policial, o que afrontaria com o disposto no art. 155 do Código de Processo Penal. Veja-se que os policiais militares apresentaram versões semelhantes quanto ao fato, confirmaram que houveram xingamentos e ofensas, todavia, em razão longo lapso temporal, como também por presenciarem rotineiramente situações semelhantes, não trouxeram maiores detalhes, mas confirmaram em .Juízo as informações prestadas extrajudicialmente (...) Diante disso, restou plenamente configurado o delito de desacato, para o qual, segundo dispõe o Código Penal e a melhor doutrina, é necessário que o agente tenha praticado a conduta em desfavor de funcionários públicos no exercício de suas funções (ou em razão delas), a fim de atingir a Administração Pública, ou seja, necessário que as ofensas (menosprezo, humilhação, difamação etc) não estejam atreladas a questões pessoais entre as partes, mas sim vinculadas diretamente a função pública exercida. Ademais, ainda que sejam frágeis os indícios de que o acusado estaria sob o efeito de substâncias entorpecentes, caberia à defesa demonstrar que, em razão da referida condição, não houve dolo por parte do denunciado, nos termos do art. 156 do CPP. Ainda, mesmo que se demonstrasse eventual efeito das substâncias entorpecentes, a sua utilização voluntária não afasta a culpabilidade do agente. Assim, o que se tem nos autos, conforme já exposto, é que os policiais militares, enquanto encontravam-se no exercício de suas funções, foram desacatados e menosprezados pelo denunciado, inclusive perante a população que se encontrava no local. Diante disso, o acusado desabonou a função pública exercida pelos policiais militares, proferindo as expressões anteriormente mencionadas, sendo patente a sua condenação pela prática do delito previsto no artigo 331 do Código Penal.” (mov. 115.1 – grifo no original) Com efeito, não há como afastar a presença do elemento subjetivo específico na conduta do réu/apelante, ou seja, o dolo, uma vez que ficou satisfatoriamente configurada a vontade livre e consciente do agente em ofender o bem jurídico tutelado o prestígio, respeito e autoridade dos agentes militares em exercício de sua função pública, prática esta que subsume ao tipo penal previsto no art. 331 do Código Penal. Neste sentido a jurisprudência: “Apelação criminal. Desacato (CP, art. 331). 1. Requerimento, formulado pela ré, de concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita – Não cabimento neste momento procedimental – Postulação que deve ser deduzida perante o Juízo da execução penal – Recurso não conhecido nesse particular. 2. Pretensão de absolvição quanto à prática do delito tipificado no artigo 331 do Código Penal, de desacato – Elementos probatórios que evidenciam a autoria e materialidade do delito – Ré que, confessadamente, dirigiu impropérios aos policiais militares no exercício da função – Atipicidade da conduta não verificada – Dolo extraído do conjunto probatório – Estado de embriaguez, para mais, que não tem o condão de excluir a imputabilidade penal – Aplicação da teoria da actio libera in causa – Ré que com consciência e autodeterminação se embriagou – CP, art. 28, inc. II – Alegada incompatibilidade do delito de desacato com o artigo 13 da Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH) – Não acolhimento – Superior Tribunal de Justiça que, por sua Terceira Seção, debruçando-se especificamente sobre o tema no HC 379269-MS, posicionou-se assentando que o crime de desacato não fere a CADH – Precedente do Supremo Tribunal Federal reconhecendo a compatibilidade da tipificação do delito de desacato com a Constituição Federal – Condenação mantida.2.1. A prova oral produzida em Juízo, aliada àquelas atinentes à fase inquisitorial, demonstra que estão presentes todas as elementares do delito em análise.2.2. Conquanto evidenciado o estado de embriaguez da ré no momento da abordagem, não há como se possa deslembrar que o Código Penal autoriza a punição do autor do delito que no momento da conduta careça de capacidade e autodeterminação, porém, em momento anterior tenha se colocado, conscientemente, em estado de embriaguez ou drogadição; afinal, o entendimento e a autodeterminação, presentes em momento anterior, são projetados para o momento da prática da conduta delituosa (teoria da ação livre na causa – actio libera in causa).2.3. A tipificação do desacato, em princípio, não pretende impedir a liberdade de expressão, uma vez que palavras ultrajantes e agressivas em manifesto desprestígio para com o funcionário público no exercício de suas funções extrapolam o direito assegurado pelo artigo 5.º, inciso IX, da Constituição Federal, cabendo aqui lembrar que, do ponto de vista constitucional pátrio, não há direitos ou garantias absolutos.3. Fixação de honorários advocatícios em decorrência do trabalho desenvolvido pelo defensor dativo em grau recursal – Possibilidade – Observância dos parâmetros adotados na Resolução Conjunta da Procuradoria-Geral do Estado e da Secretaria de Estado da Fazenda n.º 4/2017 – Ausência, ademais, de vinculação desta Corte de Justiça à tabela divulgada pela OAB-PR.4. Recurso conhecido em parte, e nessa extensão, desprovido” (TJPR, 2ª C.Criminal, AC 0005487-60.2015.8.16.0112, Marechal Cãndido Rondon, Rel. Des. Rabello Filho, Unânime, J. 22.08.2019) “DESACATO. ARTIGO 331, DO CÓDIGO PENAL. PROVAS SUFICIENTES DA MATERIALIDADE E AUTORIA. DOLO ESPECÍFICO COMPROVADO. CLARO INTUITO DE OFENDER POLICIAIS NO EXERCÍCIO DE SUAS FUNÇÕES. CRIME CUJO SUJEITO PASSIVO PRINCIPAL É O ESTADO, VISANDO PROTEGER A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA EM GERAL. EMBRIAGUEZ VOLUNTÁRIA QUE NÃO EXCLUI A IMPUTABILIDADE PENAL. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 28, INCISO II DO CÓDIGO PENAL. IMPOSSIBILIDADE DE SE ESTABELECER REGIME MAIS BRANDO AO CUMPRIMENTO DA PENA. RÉU REINCIDENTE. SÚMULA 269 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO, COM FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS PELO TRABALHO REALIZADO EM SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO PELA DEFENSORA NOMEADA.” (TJPR, 2ª C.Criminal, AC 0002564-43.2017.8.16.0160, Sarandi, Rel. José Carlos Dalacqua, Unânime, J. 22.08.2019) Portanto, a sentença não merece reforma, porque a autoria é certa e recai sobre o apelante, havendo nos autos elementos suficientes para confirmar a condenação pela prática do delito relacionado na inicial acusatória. Da dosimetria A defesa requer a isenção de pena, nos termos do art. art. 28, inciso II, § 1º do Código Penal, diante da ausência de capacidade, do apelante, para entender o caráter ilícito de suas eventuais atitudes, em razão da alteração do seu estado psicológico. Sem razão. Como visto, quanto aos elementos do tipo objetivo e do tipo subjetivo, estes foram preenchidos, visto que o recorrente agiu com vontade de desacatar os funcionários públicos, ciente do desrespeito à função exercida por eles, bem como da reprovabilidade de suas condutas. Para a caracterização do delito de desacato, segundo entendimento jurisprudencial dominante, não é necessário que o agente tenha agido com ânimo calmo e refletido. Deste modo, descabida a absolvição por ausência de vontade consciente de desacatar em virtude de estar o apelante sob estado emocional exaltado. Ressalto ainda, que o eventual estado de embriaguez voluntária do agente, não exclui a sua imputabilidade, notadamente porque embora haja indícios de que o acusado/apelante estivesse sob o efeito de álcool, não há qualquer demonstração de que o estado decorreu de caso fortuito ou força maior, não se cogitando eventual causa de isenção de pena ou de inimputabilidade. Da pena restritiva de direitos Na sentença, após a fixação da pena privativa de liberdade no mínimo legal (06 meses) e do estabelecimento do regime aberto para início do cumprimento da pena, o magistrado substituiu a pena privativa de liberdade por prestação de serviços à comunidade. De fato, o art. 46, , do Código Penal é claro em estabelecer que:caput “Art. 46. A prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas é aplicável às condenações superiores a seis meses de privação da liberdade. Portanto, no caso, necessário afastar-se, de ofício, a pena restritiva de direitos de prestação de serviços à comunidade, porque ela somente é aplicável às condenações superiores a 06 (seis) meses de privação da liberdade, nos termos do artigo 46 do Código Penal, devendo ser alterada para prestação pecuniária, no valor de 01 (um) salário mínimo, a ser pago a entidade com destinação social fixada pelo Juízo da Execução. Neste sentido: “APELAÇÃO CRIME – PERTURBAÇÃO DO SOSSEGO ALHEIO, DESOBEDIÊNCIA E DESACATO (ART. 42, DECRETO-LEI 3.688/41 E ARTS. 330 E 331, AMBOS DO CP, EM CONCURSO MATERIAL) – PROCEDÊNCIA PARCIAL DA DENÚNCIA. APELO DO RÉU – 1. PLEITO PELA ABSOLVIÇÃO DO DELITO DE DESACATO – IMPOSSIBILIDADE – MATERIALIDADE E AUTORIA DEVIDAMENTE COMPROVADAS – 2. PENA RESTRITIVA DE DIREITOS – PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE – IMPOSSIBILIDADE – ARTIGO 46 DO CÓDIGO PENAL – 3. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – DEFENSOR DATIVO – CABIMENTO - RECURSO DESPROVIDO, ALTERANDO DE OFÍCIO A PENA RESTRITIVA DE DIREITOS. 1. A prova dos autos é adequada a comprovar que o apelante praticou o crime de desacato, inexistindo dúvidas sobre as suas condutas delituosas. 2. Nos termos do artigo 46 do Código Penal, a prestação de serviços à comunidade somente é aplicável às condenações superiores a 06 (seis) meses de privação da liberdade, devendo ser adequada, de ofício, a pena restritiva de direitos. 3. O Estado deve arcar com o pagamento de honorários advocatícios ao defensor dativo nomeado pelo juiz à parte, juridicamente necessitada, para apresentação das razões recursais.” (TJPR, 2ª C.Criminal, AC 0004708-45.2014.8.16.0014, Londrina, de nossa relatoria, Unânime, J. 13.06.2019) Nestas condições, impõe-se negar provimento ao recurso, com a alteração, de ofício, da pena restritiva de direitos, nos termos da fundamentação. ANTE O EXPOSTO, acordam os Desembargadores integrantes da 2ª Câmara Criminal do Tribunal de , Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso com a alteração, de ofício, da pena restritiva de direitos. O julgamento foi presidido pelo Desembargador e deleFrancisco Pinto Rabello Filho (com voto) participou o Desembargador .José Maurício Pinto de Almeida Curitiba, 23 de setembro de 2019. Des. Luís Carlos Xavier - Relator
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