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Acórdão
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ 6ª CÂMARA CÍVEL - PROJUDI RUA MAUÁ, 920 - ALTO DA GLORIA - Curitiba/PR - CEP: 80.030-901 Autos nº. 0010249-91.2020.8.16.0000 Agravo de Instrumento n° 0010249-91.2020.8.16.0000 7ª Vara Cível de Curitiba VILA VELHA CORRETORA DE SEGUROS S/C LTDAAgravante(s): Alfredo de Castro e PLANO SERVIÇOS DE SEGUROS S/C LTDAAgravado(s): Relator: Desembargador Renato Lopes de Paiva DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DIREITO CONSTITUCIONAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DECISÃO QUE INDEFERIU PEDIDO DE SUSPENSÃO DA CARTEIRA NACIONAL DE HABILITAÇÃO (CNH) E APREENSÃO DE PASSAPORTE DO EXECUTADO. .RECURSO DA EXEQUENTE SUSPENSÃO DA CNH – PROVIDÊNCIA PLEITEADA QUE, A RIGOR, ALÉM DE ENCONTRAR AMPARO NO ARTIGO 139, INCISO IV, DO CPC/15, NA GRANDE MAIORIA DOS CASOS TEM SE MOSTRADO PROPORCIONAL E RAZOÁVEL – COMPATIBILIDADE DE TAL EXPEDIENTE COM O EXERCÍCIO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS – POSSIBILIDADE DE IMPOSIÇÃO DE MEDIDA EXECUTIVA ATÍPICA PARA ESTIMULAR O DEVEDOR A ADIMPLIR OBRIGAÇÃO DE PAGAR QUANTIA CERTA, QUANDO A UTILIZAÇÃO DOS MEIOS ORDINÁRIOS SE MOSTRAR INEFICIENTE – AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO A DIREITOS FUNDAMENTAIS, EM ESPECIAL A LIBERDADE DE LOCOMOÇÃO – DEVER DO PODER JUDICIÁRIO DE CONFERIR EFETIVIDADE ÀS SUAS DECISÕES – INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 139, IV, DO CPC/15 – HIPÓTESE CONCRETA QUE INDICA SER A MEDIDA IMPRESCINDÍVEL – REALIDADE FÁTICA DOS AUTOS INDICATIVA DE QUE OS MEIOS ORDINÁRIOS DE BUSCA DE BENS DO EXECUTADO JÁ FORAM ESGOTADOS, SEM, CONTUDO, RESULTADO EXITOSO – EXECUTADO QUE DEMONSTRA EM REDES SOCIAIS TER VIDA CONFORTÁVEL E LUXUOSA, INCOMPATÍVEL COM A INADIMPLÊNCIA ESPELHADA NOS AUTOS – SUSPENSÃO DA CNH DEFERIDA. ACAUTELAMENTO DE PASSAPORTE – PROVIDÊNCIA QUE RESTRINGE DIREITO DE LOCOMOÇÃO E QUE, PORTANTO, DEVE SER IMPLEMENTADA EM CARÁTER EXCEPCIONAL – VIGÊNCIA, POR ORA, DE OUTRA MEDIDA ATÍPICA (SUSPENSÃO DE CNH) DE MENOR IMPACTO, MAS QUE PODE PRODUZIR O RESULTADO ESPERADO PELA CREDORA – PEDIDO NÃO ACOLHIDO. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA REFORMADA EM PARTE. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. , relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nºVISTOS 0010249-91.2020.8.16.0000, do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba – 7ª Vara , em que é VILA VELHA CORRETORA DE SEGUROS S/C LTDA. e são Cível Agravante Agravados ALFREDO DE CASTRO e PLANO SERVIÇOS DE SEGUROS LTDA. I – RELATÓRIO: Trata-se de agravo de instrumento interposto por VILA VELHA CORRETORA DE SEGUROS S/C LTDA. proferida pelo MMº Dr. Juiz de Direito da 7ª Vara Cível da Comarca deem face de decisão[1] Curitiba/PR, nos autos nº. 0000748-82.1998.8.16.0001 de cumprimento de sentença, por meio da qual indeferiu a suspensão de passaporte e de carteira nacional de habilitação do executado, ora agravado. Sustenta a agravante, em suas razões recursais (mov. 1.1), que promove, na origem, cumprimento de sentença – decorrente de ação de cobrança – em face do agravado, em trâmite desde julho de 2009, sem que, até o presente momento, tenha obtido êxito em satisfazer seu crédito, não obstante as inúmeras diligências que realizou. Narra que, “conforme já demonstrado nos autos originários ao presente recurso, o agravado vem utilizando-se de diversas formas para ocultação e desvio de seu patrimônio, . Aduz, no que se refere à suspensão da carteira nacional devisando à insatisfação do crédito exequendo” habilitação, que tal medida não “está impedindo o direito de ir e vir do agravado, desde que não o faça como e que condutor de veículo automotor” “poderia até ser considerada desmedida na circunstância de profissionais que obtém seu sustento por meio da condução de veículos, mas esse não é o caso do agravado que, conforme exposto pelo mesmo, na petição de seq. 379.1 dos autos originários, supostamente trabalha . Quanto à suspensão de passaporte, alega que fazendo consultorias para empresas em home office” “não se trata, além do mais, de medida que viola os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, haja vista ser praticada pelos tribunais em casos semelhantes e totalmente adequada à atual situação da ora agravante: , bem como que extrema dificuldade em obter a satisfação do valor devido pelo agravado” “a retenção do passaporte não se configura desarrazoada ao cumprimento da execução, inclusive porque, não há de se admitir que o executado se utilize do seu patrimônio para viagens de lazer no exterior, antes de cumprir com . Argumenta que sua obrigação de quitar a dívida” “as medidas por si só não satisfazem a obrigação, e nem poderia. Elas são, no entanto, os meios encontrados pelo legislador para tornar essa satisfação possível, . Acrescenta, então, ser quando nenhum outro meio se faz viável ao requerente ou lhe logra qualquer êxito” “perfeitamente possível a utilização da suspensão do passaporte do executado, a fim de coagir o agravado a adimplir suas obrigações, tendo em vista que a referida execução tramita desde 2009 e o executado esta se . Pede, com esses argumentos, a reforma da decisãoeximindo de efetuar o pagamento da dívida” interlocutória, “suspendendo-se a carteira de habilitação e o passaporte do executado-agravado Afredo de .Castro, com base no artigo 139, IV, do Código de Processo Civil” O pedido liminar foi indeferido por meio da decisão de mov. 10.1. Contrarrazões no mov. 18.1, defendendo o não provimento do recurso interposto. É a breve exposição. II – VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO: 1. Admissibilidade do recurso resentes os pressupostos de admissibilidade intrínsecos P (cabimento , legitimação,[2] interesse e inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer) e extrínsecos (preparo, , conheço do recurso interposto e passo à análise do mérito.tempestividade e regularidade formal) 2. Mérito Inconformismo voltado contra decisão que, naquilo que por ora importa, indeferiu os pedidos suspensão de passaporte e de carteira de habilitação do executado, ora agravadode . O recurso comporta parcial provimento. 0000748-82.1998.8.16.0001) i. A leitura dos autos de origem (nº faz ver se tratar de ação de cobrança, em fase de cumprimento de sentença, promovida por VILA VELHA CORRETORA DE SEGUROS S/C LTDA. – ora agravante – em face de PLANO SERVIÇO DE SEGUROS S/C LTDA. e ALFREDO DE CASTRO – ora agravados. O cumprimento de sentença encontra-se em curso desde 17.07.2009 (mov. 1.2 – p. 10/15), sendo que até o momento a credora não obteve êxito em satisfazer o crédito perseguido. Diante do quadro de inadimplência, aliado às infrutíferas diligências realizadas com o objetivo de se encontrar bens do executado, passíveis de penhora, requereu a exequente uma série de medidas atípicas, com fundamento no art. 139, inciso IV, do CPC/15 (mov. 365.1). Foram elas: a) inclusão das sociedades empresárias Central Serviços Eireli – ME e Normandia Assessoria Ltda. no polo passivo do cumprimento de sentença; b) suspensão da carteira nacional de habilitação do executado; c) apreensão do passaporte do devedor; d) expedição de ofícios às instituições bancárias para que esclareçam sobre movimentações financeiras através do uso de cartões de crédito pelo agravado; e) expedição de ofício à Secretaria de Estado da Fazenda do Paraná para que informe acerca da existência de créditos e prêmios oriundos do Programa Nota Paraná em favor de todos os executados; f) expedição de ofício ao setor administrativo do Castelo Batel para que dê explicações sobre o valor das festas realizadas em comemoração ao aniversário das filhas do devedor; g) expedição de ofício para a Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização, para que diga se há plano de previdência privada de titularidade do recorrido; h) inclusão dos dados dos executados nos cadastros de inadimplentes; i) consulta de bens via Sistemas Bacenjud e Renajud em nome dos agravados; j) consulta por meio do Sistema Infojud sobre declaração de operações imobiliárias (DOI), para verificar se houve a realização de alienação ou compra de bens imóveis por parte dos executados; k) consulta via Sistema Infojud das 10 últimas declarações de Imposto de Renda dos devedores, bem como sobre operações imobiliárias realizadas pelos recorridos desde 1998, para possibilitar posterior busca de matrículas em registros de imóveis. Na decisão interlocutória recorrida (mov. 374.1), o Juízo acolheu em parte os pedidos“a quo” formulados pela exequente. Deferiu a expedição de ofício para a Secretaria de Estado da Fazenda; para a Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização; para instituições financeiras, a fim de que informem sobre gastos com cartões de crédito realizados pelos executados e, finalmente, a inclusão do nome dos executados em cadastros de devedores .[3] Por outro lado, indeferiu a inclusão das empresas Central Serviços Eireli – ME e Normandia Assessoria Ltda. no polo passivo do cumprimento de sentença, diante da ausência de trânsito em julgado do incidente de desconsideração da personalidade jurídica .[4] Por fim, rejeitou os pedidos de suspensão da carteira nacional de habilitação e apreensão de passaporte do agravado ALFREDO DE CASTRO. E, conforme alhures mencionado, o foco do presente recurso é justamente o indeferimento dos pedidos de suspensão da carteira nacional de habilitação e apreensão de passaporte. é de conhecimento notório a dificuldadeii. Apresentado esse panorama, cumpre frisar que experimentada pelo Poder Judiciário para efetivar suas decisões, sobretudo aquelas voltadas à condenação da parte ao adimplemento de obrigação de pagar quantia certa. Não raro se depara com casos de cumprimento de sentença ou execução que se arrastam há anos sem qualquer perspectiva positiva ao credor. Mesmo quando adotadas todas as medidas executivas típicas e ordinárias (multa, penhora, busca e apreensão de bens etc.), parece inegável, ao fim e ao cabo, ser a boa vontade do devedor o fator determinante para o credor ver seus direitos satisfeitos. Dentre as inúmeras razões que compõem este indesejado (e justamente criticado) cenário, é possível destacar a restrita gama de instrumentos legais de que dispunha o juiz – sob a égide do CPC/73 – para o fim de efetivar suas decisões relacionadas à execução pecuniária e fazer frente às garantias estabelecidas em favor do devedor. A análise dos artigos 461, §5 , e 461-A, §3º , do antigo CPC, bem evidencia isso, visto que[5] [6] a possibilidade de adotar medidas específicas para o cumprimento de decisões judiciais estava reservada apenas às obrigações de fazer e não fazer. O adimplemento das obrigações de pagar quantia, porém, até o advento do atual código, continuou fadado às medidas executivas típicas, nem sempre suficientes para garantir o direito do credor. Com a edição do CPC/15 esse cenário ganha novos contornos. A cláusula geral processual prevista no artigo 139, inciso IV, da novel legislação processual, apresenta-se como importante ferramenta capaz de auxiliar na mudança desse panorama. Ao expressamente permitir ao juízo a utilização de medidas executivas atípicas, inclusive com a finalidade de ver cumprida ordem judicial relacionada ao pagamento de quantia certa, a legislação brasileira “dá passos importantes para uma tutela mais efetiva, adequada e tempestiva de todos os direitos” .[7] A aplicação do mencionado preceito, contudo, além de excepcional , deve observar uma[8] relação de adequação e necessidade para a consecução do fim almejado, sob pena de desvirtuamento da execução civil e da admissão de medidas arbitrárias. A esse respeito, cabe lembrar a inafastável necessidade de compatibilizar, no caso concreto, a medida atípica determinada com as garantias estabelecidas em favor do devedor, como a menor onerosidade (art. 805, CPC ), além, é claro, dos direitos e garantias fundamentais constitucionalmente[9] previstos. Tudo sem olvidar, por óbvio, que a execução forçada se instaurou e se desenvolveu para satisfazer direito do credor estabelecido em lei. iii. No que se refere à suspensão da CNH, ao contrário do que se sustentou na decisão interlocutória, não constitui essa medida desarrazoada, nem incompatível com o exercício de direitos fundamentais. Não há, a rigor, violação ao direito de livre locomoção do devedor, pois, do contrário, dever-se-ia admitir que referido direito não é garantido ou, no mínimo, é sonegado em parte àqueles cidadãos que não possuem licença para dirigir – o que a toda evidência não é verdade. Por outro lado, é bem de ver que o incômodo derivado da restrição ao direito de dirigir causa embaraços ao cotidiano do inadimplente, erigindo-se em forma de estimular o devedor a cumprir sua , mas não tem intensidade suficiente para que seja confundido com espécie de punição – o que, seobrigação admitido, desvirtuaria o regime de execução civil. A esse respeito se manifestou recentemente o STJ: “PROCESSUAL CIVIL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. MEDIDAS EXECUTIVAS ATÍPICAS. CABIMENTO. RESTRIÇÃO DO DIREITO DE DIRIGIR. SUSPENSÃO DA CNH. LIBERDADE DE LOCOMOÇÃO. VIOLAÇÃO DIRETA. INOCORRÊNCIA. PRINCÍPIOS DA RESOLUÇÃO INTEGRAL DO LITÍGIO, DA BOA-FÉ PROCESSUAL E DA COOPERAÇÃO. ARTS. 4º, 5º E 6º DO CPC/15. INOVAÇÃO DO NOVO CPC. MEDIDAS EXECUTIVAS ATÍPICAS. ART. 139, IV, DO CPC/15. COERÇÃO INDIRETA AO PAGAMENTO. POSSIBILIDADE. SANÇÃO. PRINCÍPIO DA PATRIMONIALIDADE. DISTINÇÃO. CONTRADITÓRIO PRÉVIO. ART. 9º DO CPC/15. DEVER DE FUNDAMENTAÇÃO. ART. 489, § 1º, DO CPC/15. COOPERAÇÃO CONCRETA. DEVER. VIOLAÇÃO. PRINCÍPIO DA MENOR ONEROSIDADE. ART. 805, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC/15. ORDEM. DENEGAÇÃO. (...) 4. A suspensão da Carteira Nacional de Habilitação não configura dano ou risco potencial direto e imediato à liberdade de locomoção do paciente, devendo a . Precedentes.questão ser, pois, enfrentada pelas vias recursais próprias (...) 6. O processo civil moderno é informado pelo princípio da instrumentalidade das formas, sendo o processo considerado um meio para a realização de direitos que deve ser capaz de entregar às partes resultados idênticos aos que decorreriam do cumprimento natural e espontâneo das normas jurídicas. 7. O CPC/15 emprestou novas cores ao princípio da instrumentalidade, ao prever o direito das partes de obterem, em prazo razoável, a resolução integral do litígio, inclusive com a atividade satisfativa, o que foi instrumentalizado por meio dos princípios da boa-fé processual e da cooperação (arts. 4º, 5º e 6º do CPC), que também atuam na tutela executiva. 8. O princípio da boa-fé processual impõe aos envolvidos na relação jurídica processual deveres de conduta, relacionados à noção de ordem pública e à de função social de qualquer bem ou atividade jurídica. 9. O princípio da cooperação é desdobramento do princípio da boa-fé processual, que consagrou a superação do modelo adversarial vigente no modelo do anterior CPC, impondo aos litigantes e ao juiz a busca da solução integral, harmônica, pacífica e que melhor atenda aos interesses dos litigantes. 10. Uma das materializações expressas do dever de cooperação está no art. 805, parágrafo único, do CPC/15, a exigir do executado que alegue violação ao princípio da menor onerosidade a proposta de meio executivo menos gravoso e mais eficaz à satisfação do direito do exequente. 11. O juiz também tem atribuições ativas para a concretização da razoável duração do processo, a entrega do direito executado àquela parte cuja titularidade é reconhecida no título executivo e a garantia do devido processo legal para exequente e o executado, pois deve resolver de forma plena o conflito de interesses. 12. Pode o magistrado, assim, em vista do princípio da atipicidade dos meios executivos, adotar medidas coercitivas indiretas para induzir o executado a, de forma voluntária, ainda que não espontânea, cumprir com o direito que lhe é exigido. 13. Não se deve confundir a natureza jurídica das medidas de coerção psicológica, que são apenas medidas executivas indiretas, com sanções civis de natureza material, essas sim capazes de ofender a garantia da patrimonialidade da execução por configurarem punições ao não pagamento da dívida. 14. Como forma de resolução plena do conflito de interesses e do resguardo do devido processo legal, cabe ao juiz, antes de adotar medidas atípicas, oferecer a oportunidade de contraditório prévio ao executado, justificando, na sequência, se for o caso, a eleição da medida adotada de acordo com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. 15. Na hipótese em exame, embora ausente o contraditório prévio e a fundamentação para a adoção da medida impugnada, nem o impetrante nem o paciente cumpriram com o dever que lhes cabia de indicar meios executivos menos onerosos e mais eficazes para a satisfação do direito executado, atraindo, assim, a consequência prevista no art. 805, parágrafo único, do CPC/15, de manutenção da medida questionada, ressalvada alteração posterior. 16. Recurso em habeas corpus desprovido. (STJ. RHC 99.606/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/11/2018). Cumpre ter presente, igualmente, que, ainda que se viesse a considerar que medida judicial desse jaez pudesse, em tese, violar direito fundamental à liberdade de locomoção (CF, art. 5º, XV), não se pode olvidar que se está diante de colisão com outros direitos fundamentais, notadamente o direito de propriedade do credor (CF, 5º, XXII – inclusive refletido na proteção à atividade econômica – CF, art. 170), a garantia de acesso à jurisdição (CF, art. 5º, XXXV), o devido processo legal (CF, art. 5º LIV – tornando efetiva a tutela jurisdicional) e a razoável duração do processo (CF, art. 5º LXXVIII). Destaque-se, ainda, que constitui objetivo da República Federativa do Brasil (e aí o papel do Poder Judiciário ganha mais relevo) a construção de uma sociedade justa (CF, 3º, I). Nessa conjectura, tal providência tem se mostrado, na grande maioria dos casos, proporcional aos objetivos buscados em processos de execução em trâmite há anos, sem, contudo, efetividade .[10] É (adequação como aptidão para fomentar o resultado pretendido), porquanto, aoadequada causar incômodo ao executado, almeja que este cumpra com a obrigação inadimplida. É necessária (consistente na ausência de alternativa para a realização do objetivo perseguido), ao se identificar que medidas executivas ordinárias promovidas no curso do feito tenham sido ineficazes. Por fim, é proporcional (aferido pelo sopesamento entre a intensidade da restrição a direitos fundamentais e aem sentido estrito importância da realização do direito fundamental que com ele colide), dado que contribui para a valorização do direito à propriedade, para a efetividade da jurisdição em favor do jurisdicionado e para a construção de uma sociedade justa. Não se perca de perspectiva, a propósito, que o cumprimento de sentença – apenas esta fase – encontra-se em curso desde (mov. 1.2 – p. 10/15) e, até o presente momento, oprocedimental 17.07.2009 devedor não deu mostras de que pretende saldar a dívida cobrada. Ao contrário. Elementos probatórios apresentados pela agravante revelam que o executado ALFREDO DE CASTRO leva vida bastante confortável e de alto padrão e não tem qualquer constrangimento em demonstrá-la nas redes sociais, ao contrário do que o agravado tentou sustentar em contrarrazões, com argumentação genérica e desprovida de provas concretas (mov. 18.1). Jantares em restaurantes luxuosos (mov. 1.6), viagens nacionais e internacionais (mov. 1.7 e 1.8), presença em camarote no Rio de Janeiro/RJ, durante o feriado do carnaval (mov. 1.9), festas de aniversário das filhas em local destacado em Curitiba/PR (Castelinho da Batel), tudo isso a revelar que o padrão de vida que tem não condiz com a inadimplência que se apresenta nestes autos. Esse comportamento, atrelado ao inadimplemento faz tornar válida e justificável a medida atípica de suspensão da carteira nacional de habilitação do devedor, como forma de estimulá-lo a pagar o débito espelhado nos autos de origem. iv. Relativamente ao acautelamento do passaporte do executado, a medida, entretanto, não comporta acolhimento nesse momento. Com efeito, muito embora o cenário dos autos demonstre que a suspensão da carteira nacional de habilitação, nesta oportunidade, constitua expediente razoável e proporcional para que a exequente, ora agravante, possa ver satisfeito o crédito, o mesmo não se pode dizer em relação à apreensão de passaporte. Isto porque, nesta hipótese, há efetiva restrição à liberdade de locomoção do executado, já que se trata de documento que possibilita o ingresso e trânsito em território estrangeiro. Dessa forma, tal providência somente pode ser tomada em último caso, quando outras medidas atípicas não apresentarem resultado exitoso. E, a prevalecer o voto deste Relator, medida de menor intensidade, mas que pode produzir eficácia semelhante, já estará em vigor. Não se olvide, outrossim, que outras diligências também estão sendo realizadas, na tentativa de se encontrar bens do executado passíveis de constrição judicial, de sorte que não há, nesse momento, justificativa para a implementação de medida extrema. Registre-se que não se está impossibilitando, em definitivo, a implementação dessa medida atípica, mas apenas se estabelecendo que, por ora, tal não se mostra razoável e proporcional. Nesse sentido, aliás, é o entendimento do STJ, conforme precedente a seguir: RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. MEDIDAS COERCITIVAS ATÍPICAS. CPC/2015. INTERPRETAÇÃO CONSENTÂNEA COM O ORDENAMENTO CONSTITUCIONAL. SUBSIDIARIEDADE, NECESSIDADE, ADEQUAÇÃO E PROPORCIONALIDADE. RETENÇÃO DE PASSAPORTE. COAÇÃO ILEGAL. CONCESSÃO DA ORDEM. SUSPENSÃO DA CNH. NÃO CONHECIMENTO. (...) 2. Nos termos da jurisprudência do STJ, o acautelamento de passaporte é medida que limita a liberdade de locomoção, que pode, no caso concreto, significar constrangimento ilegal e arbitrário, sendo o habeas corpus via processual adequada para essa análise. 3. O CPC de 2015, em homenagem ao princípio do resultado na execução, inovou o ordenamento jurídico com a previsão, em seu art. 139, IV, de medidas executivas atípicas, tendentes à satisfação da obrigação exequenda, inclusive as de pagar quantia certa. 4. As modernas regras de processo, no entanto, ainda respaldadas pela busca da efetividade jurisdicional, em nenhuma circunstância, poderão se distanciar dos ditames constitucionais, apenas sendo possível a implementação de comandos não discricionários ou que restrinjam direitos individuais de forma razoável. 5. Assim, no caso concreto, após esgotados todos os meios típicos de satisfação da dívida, para assegurar o cumprimento de ordem judicial, deve o magistrado eleger medida que seja necessária, lógica e proporcional. Não sendo adequada e necessária, ainda que sob o escudo da busca pela efetivação das decisões judiciais, será contrária à ordem jurídica. 6. Nesse sentido, para que o julgador se utilize de meios executivos atípicos, a decisão deve ser fundamentada e sujeita ao contraditório, demonstrando-se a excepcionalidade da medida adotada em razão da ineficácia dos meios executivos típicos, sob pena de configurar-se como sanção processual. 7. A adoção de medidas de incursão na esfera de direitos do executado, notadamente direitos fundamentais, carecerá de legitimidade e configurar-se-á coação reprovável, sempre que vazia de respaldo constitucional ou previsão legal e à medida em que não se justificar em defesa de outro direito fundamental. 8. A liberdade de locomoção é a primeira de todas as liberdades, sendo condição de quase todas as demais. Consiste em poder o indivíduo deslocar-se de um lugar para outro, ou permanecer cá ou lá, segundo lhe convenha ou bem lhe pareça, compreendendo todas as possíveis manifestações da liberdade de ir e vir. 9. Revela-se ilegal e arbitrária a medida coercitiva de suspensão do passaporte proferida no bojo de execução por título extrajudicial (duplicata de prestação de serviço), por restringir direito fundamental de ir e vir de forma desproporcional e não razoável. Não tendo sido demonstrado o esgotamento dos meios tradicionais de satisfação, a medida não se comprova necessária. 10. O reconhecimento da ilegalidade da medida consistente na apreensão do passaporte do paciente, na hipótese em apreço, não tem qualquer pretensão em afirmar a impossibilidade dessa providência coercitiva em outros casos e de maneira genérica. A medida poderá eventualmente ser utilizada, desde que obedecido o contraditório e fundamentada e adequada a decisão, verificada .também a proporcionalidade da providência 11. A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que a suspensão da Carteira Nacional de Habilitação não configura ameaça ao direito de ir e vir do titular, sendo, assim, inadequada a utilização do habeas corpus, impedindo seu conhecimento. É fato que a retenção desse documento tem potencial para causar embaraços consideráveis a qualquer pessoa e, a alguns determinados grupos, ainda de forma mais drástica, caso de profissionais, que tem na condução de veículos, a fonte de sustento. É fato também que, se detectada esta condição particular, no entanto, a possibilidade de impugnação da decisão é certa, todavia por via diversa do habeas corpus, porque sua razão não será a coação ilegal ou arbitrária ao direito de locomoção, mas inadequação de outra natureza. 12. Recurso ordinário parcialmente conhecido. (STJ. RHC 97.876/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 05/06/2018, DJe 09/08/2018) Diante desses fundamentos, quanto à apreensão do passaporte, a decisão proferida em primeiro grau de jurisdição permanece inalterada. Ante o exposto, por ao recurso interposto,3. VOTO[11] conhecer e dar parcial provimento reformando em parte a decisão interlocutória e deferindo o pedido de suspensão da carteira nacional de habilitação do executado, nos termos da fundamentação supra. III – DECISÃO: Ante o exposto, acordam os Desembargadores da 6ª Câmara Cível do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ, por unanimidade de votos, , em e ao recursoconhecer dar parcial provimento interposto, nos termos do voto do Relator. O julgamento foi presidido pelo (a) Desembargador Ramon De Medeiros Nogueira, com voto, e dele participaram Desembargador Renato Lopes De Paiva (relator) e Desembargadora Lilian Romero. 03 de julho de 2020 Desembargador Renato Lopes de Paiva Relator Feita pública em 24.01.2020 – mov. 374.1 dos autos de origem.[1] [2] Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: (...) Parágrafo único. Também caberá agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas na fase de liquidação de sentença ou de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de inventário. Os dois últimos, discutidos nos autos do agravo de instrumento nº. 0009733-71.2020.8.16.0000. Quanto à inclusão dos[3] dados dos executados em cadastros restritivos de crédito, o Juízo , diante do agravo de instrumento interposto, se“a quo” retratou. O recurso manejado contra a decisão de mérito desse incidente está sob análise deste Relator (autos nº[4] 0014507-47.2020.8.16.0000). [5] “Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento. [...] § 5º Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial.” [6] “Art. 461-A. Na ação que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz, ao conceder a tutela específica, fixará o prazo para o ”cumprimento da obrigação. [...] § 3º Aplica-se à ação prevista neste artigo o disposto nos §§ 1o a 6o do art. 461. MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. [7] Novo Curso de Processo Civil: tutela dos , vol. 2. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p.775.direitos mediante procedimento comum Ressalte-se, pois pertinente, o conteúdo do enunciado n. 12, do Fórum Permanente de processualistas civis, segundo o[8] qual: “(arts. 139, IV, 523, 536 e 771) A aplicação das medidas atípicas sub-rogatórias e coercitivas é cabível em qualquer obrigação no cumprimento de sentença ou execução de título executivo extrajudicial. Essas medidas, contudo, serão aplicadas de forma subsidiária às medidas tipificadas, com observação do contraditório, ainda que diferido, e por meio de decisão à luz do art. 489, § 1º, I e II.” [9] “Art. 805. Quando por vários meios o exequente puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o executado. Parágrafo único. Ao executado que alegar ser a medida executiva mais gravosa incumbe indicar outros meios mais eficazes e menos onerosos, sob pena de manutenção dos atos executivos já determinados”. Sobre as regras de proporcionalidade e razoabilidade, ver o artigo: O Proporcional e o razoável. Virgílio Afonso da Silva.[10] Disponível em: . Acesso em 16.03.2018.http://www.revistas.unifacs.br/index.php/redu/article/viewFile/1495/1179 Alerte-se para o fato de que a oposição de embargos de declaração meramente protelatórios podem, em princípio,[11] autorizar condenação ao pagamento de multa (artigo 1.026 do CPC), sendo válido destacar que: (i) obscuridade implica na dificuldade de compreender os termos da decisão, e não na concordância com o resultado do julgamento; (ii) a contradição que rende ensejo aos aclaratórios é aquela presente entre trechos da própria decisão embargada (contradição interna); (iii) segundo o STJ, o órgão julgador não é obrigado a rebater todos os argumentos das partes, mas apenas os que forem relevantes e imprescindíveis à resolução da causa (REsp 1697908/SE, Rel. Min. Herman Benjamin); (iv) para fins de prequestionamento, a doutrina dispensa menção expressa ao número do ato normativo utilizado para embasar o acórdão (Fredie Didier Jr. e Leonardo Carneiro da Cunha, in . Vol. 3. 13ª ed. Salvador: Ed. JusPodvm,Curso de Direito Processual Civil 2016. p. 283), bastando que a questão de direito veiculada no recurso destinado ao Tribunal Superior tenha sido decidida pela Corte de origem (artigos 102 e 105 da CF); (v) entende o STF que “embargos de declaração não se prestam a corrigir possíveis (MI 1311 AgR-ED, Rel. Min. Celso de Mello) nem a rediscussão do julgado (AgReg. nos EmbDecl. no REerros de julgamento” com agravo nº 1.033.936/RJ, Rel. Min. Edson Fachin).
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