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Acórdão
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I – RELATÓRIOJaqueline Tais Alves agrava de instrumento em face da r. decisão de mov.52.1, proferida em ação de reparação de danos c/c danos morais e exibição de documentos, sob n.0009813-52.2019.8.16.0038, ajuizada em face de JMDG Loteamentos Ltda. e Construtora Fontanive Ltda., que declarou a ilegitimidade da ré JMDG, extinguindo o feito em relação a ela.Em suas razões, relata a agravante que adquiriu imóvel das agravadas que apresentou defeitos construtivos. Alega que a proprietária do terreno JMDG possui legitimidade passiva, pois participou da cadeia construtiva, obteve lucro na operação e em conjunto com a construtora celebrou o contrato de compra e venda, praticando atos típicos de incorporação imobiliária. Pugnou pela concessão de efeito suspensivo ao recurso e, ao final, seu provimento, a fim de que a ré JMDG seja mantida no polo passivo da demanda.Inicialmente, o recurso foi distribuído ao e. Des. Mário Luiz Ramidoff, o qual analisou e indeferiu o pedido de efeito suspensivo e, após, determinou sua redistribuição para uma das Câmaras afetas à responsabilidade civil (mov.8.1-AI).Ofertada contraminuta pela J.M.D.G. Loteamentos, vieram os autos. É o relatório.
II – VOTO Cinge-se a controvérsia acerca da legitimidade da empresa J.M.D.G Loteamentos Ltda para figurar no polo passivo da ação de reparação de danos c/c danos morais com pedido de exibição de documentos proposta por Jaqueline Tais Alves (agravante) em face de Construtora Fontanive Ltda e J.M.D.G Loteamentos Ltda (agravadas), em razão da existência de vícios construtivos no imóvel adquirido das rés, como “rachadura, infiltrações, problemas hidráulicos, elétricos, mal cheiro” (mov.1.1).Em contestação (mov.34.1), a requerida J.M.D.G Loteamentos Ltda arguiu, em preliminar, sua ilegitimidade passiva para integrar a lide, tendo em vista a existência de contrato de sociedade em conta de participação com a requerida Construtora Fontanive Ltda, alegando que atuou como mera proprietária da área utilizada pela construtora para a execução das obras.Pela decisão saneadora de mov.52.1, o MM. Juiz a quo acolheu a preliminar suscitada, extinguindo o feito sem resolução do mérito em relação à ré J.M.D.G Loteamentos Ltda, com fundamento no art.485, VI, do Código de Processo Civil, nos seguintes termos:“(...) 1.1. Da ilegitimidade da ré JMDGAduz a ré JMDG que é parte ilegítima para figurar no polo passivo da demanda visto que possui com a ré Fontanive contrato de Constituição de sociedade em conta de participação, restringido a sua participação no fornecimento do terreno de sua propriedade, para a implementação do empreendimento imobiliário. Assiste razão à ré.Denota-se do contrato, que a ré Fontanive é responsável pela construção do empreendimento. Ainda, na cláusula 5.16 a Fontanive assume, para si, toda a responsabilidade técnica da obra, inclusive em relação a solidez e segurança do conjunto das obras e infraestrutura.Portanto, denota-se que, por força do contrato assinado pelas rés, a requerida JMDG não possui qualquer responsabilidade quanto a execução da obra ora reclamada, sendo, tão somente, responsável, quando houver reclamações e ações judiciais atinentes a propriedade do imóvel (cláusula 5.7). Posto isso, acolho a preliminar arguida, ante a ausência de responsabilidade da ré JMDG e julgo extinta a presente demanda, tão somente em relação a ela, vez que parte ilegítima para figurar na demanda, o que faço com fulcro no artigo 485, VI do Código de processo Civil. Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios em favor do patrono da ré exclusiva, o qual ora arbitro em 10% sobre o valor da causa. (...)” (mov.52.1) - destaque no original. Objetivando a reforma da r. decisão, alega a parte agravante, em suma, que a agravada J.M.D.G Loteamentos Ltda participou do empreendimento, atuando como sócia da ré Construtora Fontanive Ltda, na medida em que forneceu o terreno, bem como auferiu lucro com a venda dos imóveis, sendo também responsável por eventuais danos oriundos da obra.Aduz que o contrato firmado entre as empresas agravadas é particular, não produzindo efeitos em relação ao agravante, que sequer participou ou anuiu os termos entabulados. Sustenta, ainda, que nas relações consumeristas a responsabilidade pela má prestação do serviço recai sobre todos os integrantes da cadeia de fornecimento, tendo em vista a presumida vulnerabilidade do consumidor.Contudo, razão não lhe assiste.Primeiramente, é de se ressaltar que a relação jurídica existente entre as empresas agravadas é orientada pelo Instrumento Particular de Constituição de Sociedade em Conta de Participação acostado ao mov. 34.2-34.3 (autos originários).Sobre a sociedade em conta de participação, preconiza o Código Civil:Art. 991. Na sociedade em conta de participação, a atividade constitutiva do objeto social é exercida unicamente pelo sócio ostensivo, em seu nome individual e sob sua própria e exclusiva responsabilidade, participando os demais dos resultados correspondentes. Parágrafo único. Obriga-se perante terceiro tão-somente o sócio ostensivo; e, exclusivamente perante este, o sócio participante, nos termos do contrato social. – sublinhei. Leciona a doutrina:“(...) A conta de participação se constitui da seguinte forma: um empreendedor (chamado sócio ostensivo) associa-se a investidores (os sócios participantes), para a exploração de uma atividade econômica. O primeiro realiza todos os negócios ligados à atividade, em seu próprio nome, respondendo por eles de forma pessoal e ilimitada (...). Os terceiros, com quem o sócio ostensivo contratou, na exploração da atividade econômica de conta de participação, não têm ação contra os sócios participantes. Estes respondem apenas perante o ostensivo, e nos limites do contrato firmado entre eles.” (COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. v. 2. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 513) Na hipótese, denota-se do contrato juntado aos autos que a agravada Construtora Fontanive Ltda figura na qualidade de sócia ostensiva, sendo esta a única responsável por eventuais danos oriundos do negócio jurídico, assumindo, para si, toda responsabilidade técnica da obra, inclusive quanto à “solidez e segurança do conjunto das obras de infra-estrutura do empreendimento”. (cláusulas 1.6 e 5.16 - mov.34.3, fls.03 e 08)Já a agravada J.M.D.G Loteamentos Ltda figura como uma das sócias participantes, não possuindo obrigações perante terceiros, mas tão somente junto à sócia ostensiva, nos limites estabelecidos no contrato (cláusulas 1.3 e 1.4 - mov. 34.2, f.03).Oportuno salientar que não obstante a previsão do art. 993, do Código Civil, de que “o contrato social produz efeito somente entre os sócios”, a própria legislação civil determina que, em se tratando de sociedade em conta de participação, somente o sócio ostensivo será responsável perante terceiros (art.991, parágrafo único, CC).Os sócios participantes somente responderão de forma solidária quando se envolverem nas relações estabelecidas entre o sócio ostensivo e terceiros, nos termos do art. 993, parágrafo único, do Código Civil, in verbis:Art. 993. O contrato social produz efeito somente entre os sócios, e a eventual inscrição de seu instrumento em qualquer registro não confere personalidade jurídica à sociedade.Parágrafo único. Sem prejuízo do direito de fiscalizar a gestão dos negócios sociais, o sócio participante não pode tomar parte nas relações do sócio ostensivo com terceiros, sob pena de responder solidariamente com este pelas obrigações em que intervier. De uma análise do caderno processual, tem-se que a J.M.D.G Loteamentos Ltda atuou apenas como proprietária da área em questão, negociando o terreno em que o empreendimento foi construído, não tendo qualquer participação na incorporação ou na execução da obra. Na prática, a responsabilidade pela construção e comercialização das unidades residenciais recaiu sobre a ré Construtora Fontanive Ltda, de modo que não se aplica à agravada J.M.D.G o disposto no art.12 do Código de Defesa do Consumidor, abaixo transcrito:Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos. Da mesma forma, o fato de a sócia participante ser proprietária do terreno sobre o qual o imóvel foi edificado, não leva automaticamente à incidência da Lei n.4.591/64 (Lei de incorporação imobiliária), mais especificamente à aplicação do art.29, conforme pretende a agravante, que dispõe:Art. 29. Considera-se incorporador a pessoa física ou jurídica, comerciante ou não, que embora não efetuando a construção, compromisse ou efetive a venda de frações ideais de terreno objetivando a vinculação de tais frações a unidades autônomas, (VETADO) em edificações a serem construídas ou em construção sob regime condominial, ou que meramente aceite propostas para efetivação de tais transações, coordenando e levando a têrmo a incorporação e responsabilizando-se, conforme o caso, pela entrega, a certo prazo, preço e determinadas condições, das obras concluídas. Destarte, os preceitos invocados pela autora, ora agravante, do Código de Defesa do Consumidor e da Lei n.4.591/64, não são capazes de estabelecer a responsabilidade solidária entre as empresas agravadas, restando, portanto, restando escorreita, portanto, a decisão singular que reconheceu a ilegitimidade passiva da agravada J.M.D.G Loteamentos Ltda e determinou a sua exclusão do polo passivo.Em casos análogos, já decidiu este E. Tribunal de Justiça: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS C/C DANOS MORAIS COM PEDIDO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. DECISÃO AGRAVADA QUE ACOLHE PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA E DETERMINA A EXCLUSÃO DO LITISCONSORTE DO POLO PASSIVO. 1. SOCIEDADE EM CONTA DE PARTICIPAÇÃO. AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE DO SÓCIO PARTICIPANTE PERANTE TERCEIROS. RESPONSABILIDADE EXCLUSIVA DO SÓCIO OSTENSIVO. INTELIGÊNCIA DO ART. 991 E PARÁGRAFO ÚNICO DO CÓDIGO CIVIL. PRECEDENTES. 2. AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE DO SÓCIO PARTICIPANTE PELO EMPREENDIMENTO IMOBILIÁRIO. AUSÊNCIA DE PARTICIPAÇÃO NA CONSTRUÇÃO DO EDÍFICIO E NA VENDA DAS UNIDADES RESIDENCIAIS. INAPLICABILIDADE DO ART. 12 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E DO ART. 29 DA LEI DE INCORPORAÇÕES. 3. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Em relação à responsabilidade do sócio participante, não ostensivo, já se pronunciou o Superior Tribunal de Justiça no sentido de que: “Deve ser afastada qualquer responsabilização solidária da recorrente pelo não adimplemento do contrato de promessa de compra e venda das unidades do apart-hotel, seja por não integrar a cadeia de fornecimento relativa à incorporação imobiliária, seja por não compor o mesmo grupo econômico das empresas inadimplentes, seja por também ter sido prejudicada, visto que sua pretensão de explorar o ramo hoteleiro na localidade foi tão frustrada quanto a pretensão da autora de ganhar rentabilidade com a aquisição e a locação das unidades imobiliárias”. (REsp 1785802/SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 19/02/2019, DJe 06/03/2019). (TJPR - 5ª C.Cível - 0034876-62.2020.8.16.0000 - Fazenda Rio Grande - Rel.: Juiz Luciano Campos de Albuquerque - J. 09.09.2020) AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. DECISÃO QUE RECONHECEU A ILEGITIMIDADE PASSIVA DA RÉ. CASO QUE NÃO SE AMOLDA ÀS HIPÓTESES DE RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA (ART. 13. CDC). CONTRATO CELEBRADO DIRETAMENTE COM A RÉ EMPREITEIRA. SOCIEDADE EM CONTA DE PARTICIPAÇÃO. OBRIGAÇÃO TÃO SOMENTE DO SÓCIO OSTENSIVO. INTELIGÊNCIA DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ARTIGO 991 DO CCB. SEM INDÍCIOS DE QUE A OUTRA RÉ NÃO TERÁ CONDIÇÕES DE ADIMPLIR A OBRIGAÇÃO. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. (TJPR - 17ª C. Cível - 0041020-23.2018.8.16.0000 - Fazenda Rio Grande - Rel.: Desembargador Fernando Paulino da Silva Wolff Filho - J. 17.04.2019) AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. DECISÃO QUE JULGOU EXTINTO O PROCESSO EM RELAÇÃO À AGRAVADA JMDG. INSURGÊNCIA DOS AUTORES. INCONFORMISMO AVENTADO EM CONTRARRAZÕES PELA AGRAVADA FONTANIVE – NÃO CABIMENTO. MÉRITO - ENTENDIMENTO MANTIDO QUANTO À ILEGITIMIDADE PASSIVA DA EMPRESA JMDG – MERA COMPOSIÇÃO DO QUADRO SOCIETÁRIO, COMO SÓCIA PARTICIPANTE, QUE NÃO IMPLICA A RESPONSABILIDADE DA AGRAVADA – SOCIEDADE EM CONTA DE PARTICIPAÇÃO – RESPONSABILIDADE DO SÓCIO OSTENSIVO PERANTE TERCEIROS. AUTONOMIA DAS PESSOAS JURÍDICAS. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE COMPROVEM A ATUAÇÃO DA JMDG NA EXECUÇÃO DA OBRA. .RECURSO DESPROVIDO (TJPR - 11ª C.Cível - 0003509-88.2018.8.16.0000 - Fazenda Rio Grande - Rel.: Desembargador Mario Nini Azzolini - J. 30.08.2018)DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS C/C DANOS MORAIS. DECISÃO ATRAVÉS DA QUAL O JUÍZO DE ORIGEM EXCLUIU DA LIDE UM DOS RÉUS POR ILEGITIMIDADE PASSIVA. INSURGÊNCIA DOS AUTORES. ALEGAÇÃO DE LEGITIMIDADE DO REQUERIDO EXCLUÍDO. NÃO PROVIMENTO. SOCIEDADE EM CONTA DE PARTICIPAÇÃO. RESPONSABILIDADE PERANTE TERCEIROS EXCLUSIVA DO SÓCIO OSTENSIVO, QUE SE COMPROMETE EM NOME PRÓPRIO PELA ATIVIDADE ECONÔMICA DESENVOLVIDA (ART. 991 DO CÓDIGO CIVIL). DECISÃO MANTIDA. CONDENAÇÃO DO RECORRENTE AO PAGAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS. NECESSIDADE. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (TJPR - 12ª C.Cível - 0041143-55.2017.8.16.0000 - Fazenda Rio Grande - Rel.: Desembargadora Ivanise Maria Tratz Martins - J. 07.06.2018) Nesse contexto, define-se o voto pelo desprovimento do recurso, nos termos da presente fundamentação.Diante da manutenção da decisão agravada, é de se majorar os honorários advocatícios sucumbenciais fixados na origem em favor dos patronos da ré excluída do polo passivo da lide de 10% (dez por cento) para 11% (onze por cento) sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, §11, do Código de Processo Civil.
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