Ementa
AGRAVO DE INSTRUMENTO.ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO. AÇÃO DE GUARDA E REGULAMENTAÇÃO DE VISITAS .DISSOLUÇÃO DE RELAÇÃO AFETIVA. CONVÍVIO ANTERIOR DE
ANIMAL DE ESTIMAÇÃO.AQUISIÇÃO NA CONSTÂNCIA DO RELACIONAMENTO. INTENSO AFETO DOS COMPANHEIROS PELO ANIMAL. DIREITO DE VISITAS.POSSIBILIDADEDECISÃO LIMINAR EM PRIMEIRO GRAU
PARA ESTABELECER A GUARDA COMPARTILHADA DOS ANIMAIS, FIXANDO-SE O DOMICÍLIO DO TUTOR-AGRAVANTE COMO REFERÊNCIA. REGULAMENTAÇÃO DO DIREITO DE CONVÍVIO DA TUTORA, AUTORA ORA AGRAVADA. RECURSO. INSURGÊNCIA DO AGRAVANTE. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS À CONCESSÃO DA LIMINAR. INEXISTÊNCIA DE MAUS-TRATOS. AQUISIÇÃO E ADOÇÃO DOS CÃES PELO AGRAVANTE COM PROPÓSITO
DE CONTRIBUIR NO TRATAMENTO DE ALZHEIMER DA GENITORA DO RECORRENTE. ALEGAÇÃO DE QUE A PRETENSÃO DA AUTORA TERIA COMO OBJETIVO INDISPOSIÇÃO APÓS O TÉRMINO DO RELACIONAMENTO. MÉRITO. POSSE E GUARDA DE ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO. PROTEÇÃO AOS DIREITOS DOS ANIMAIS. POSSIBILIDADE. EXEGESE DO ARTIGO 225, §1º, INCISO VII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. APLICAÇÃO DO ENUNCIADO 11 DO IBDFAM À HIPÓTESE. REGULAMENTAÇÃO DO CONVÍVIO DA TUTORA COM OS ANIMAIS QUE SE FAZ DEVIDA. MAUS-TRATOS NÃO EVIDENCIADOS EM SEDE DE COGNIÇÃO EXAURIENTE. PROBABILIDADE DO DIREITO INVOCADO EM SEDE RECURSAL QUE NÃO SE FAZ PRESENTE. RISCO DE DANO OU PERIGO AO RESULTADO ÚTIL DO PROCESSO NÃO EVIDENCIADO. DECISÃO SINGULAR MANTIDA.RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.1.” RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL. ANIMAL DE ESTIMAÇÃO. AQUISIÇÃO NA CONSTÂNCIA DO RELACIONAMENTO. INTENSO AFETO DOS COMPANHEIROS PELO ANIMAL. DIREITO DE VISITAS.POSSIBILIDADE, A DEPENDER DO CASO CONCRETO.1. “Inicialmente, deve ser afastada qualquer alegação de que a discussão envolvendo a entidade familiar e o seu animal de estimação é menor, ou se trata de mera futilidade a ocupar o tempo desta Corte. Ao contrário, é cada vez mais recorrente no mundo da pós-modernidade e envolve questão bastante delicada, examinada tanto pelo ângulo da afetividade em relação ao animal, como também pela necessidade de sua preservação como mandamento constitucional (art.225, § 1, inciso VII - "proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade"). 2. O Código Civil, ao definir a natureza jurídica dos animais, tipificou-os como coisas e, por conseguinte, objetos de propriedade, não lhes atribuindo a qualidade de pessoas, não sendo dotados de personalidade jurídica nem podendo ser considerados sujeitos de direitos. Na forma da lei civil, o só fato de o animal ser tido como de estimação, recebendo o afeto da entidade familiar, não pode vir a alterar sua substância, a ponto de converter a sua natureza jurídica. 3. No entanto, os animais de companhia possuem valor subjetivo único e peculiar, aflorando sentimentos bastante íntimos em seus donos, totalmente diversos de qualquer outro tipo de propriedade privada. Dessarte, o regramento jurídico dos bens não se vem mostrando suficiente para resolver, de forma satisfatória, a disputa familiar envolvendo os pets, visto que não se trata de simples discussão atinente à posse e à propriedade. 4. Por sua vez, a guarda propriamente dita - inerente ao poder familiar - instituto, por essência, de direito de família, não pode ser simples e fielmente subvertida para definir o direito dos consortes, por meio do enquadramento de seus animais de estimação, notadamente porque é um munus exercido no interesse tanto dos pais quanto do filho. Não se trata de uma faculdade, e sim de um direito, em que se impõe aos pais a observância dos deveres inerentes ao poder familiar.5. A ordem jurídica não pode, simplesmente, desprezar o relevo da relação do homem com seu animal de estimação, sobretudo nos tempos atuais. Deve-se ter como norte o fato, cultural e da pós-modernidade, de que há uma disputa dentro da entidade familiar em que prepondera o afeto de ambos os cônjuges pelo animal.Portanto, a solução deve perpassar pela preservação e garantia dos direitos à pessoa humana, mais precisamente, o âmago de sua dignidade.6. Os animais de companhia são seres que, inevitavelmente, possuem natureza especial e, como ser senciente - dotados de sensibilidade, sentindo as mesmas dores e necessidades biopsicológicas dos animais racionais -, também devem ter o seu bem-estar considerado. 7. Assim, na dissolução da entidade familiar em que haja algum conflito em relação ao animal de estimação, independentemente da qualificação jurídica a ser adotada, a resolução deverá buscar atender, sempre a depender do caso em concreto, aos fins sociais, atentando para a própria evolução da sociedade, com a proteção do ser humano e do seu vínculo afetivo com o animal. 8. Na hipótese, o Tribunal de origem reconheceu que a cadela fora adquirida na constância da união estável e que estaria demonstrada a relação de afeto entre o recorrente e o animal de estimação, reconhecendo o seu direito de visitas ao animal, o que deve ser mantido.9. Recurso especial não provido.(REsp 1713167/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 19/06/2018, DJe 09/10/2018)2.Entende-se o caráter afetivo da posse e propriedade sobre animais de estimação onde se estabelece um vínculo que reflete sentimentos de companheirismo, presença e reconhecida relação de convivência entre tutores e tutorados .Inobstante o ordenamento jurídico não favoreça uma legislação objetivamente destinada a esta questão aproveitam-se os demais institutos similares ao fundamento pelo qual a vinculação ocorre entre tutores e seus animais de estimação
quer pelo viés constitucional de proteção e assistência aos animais, quer pelo viés legal de
posse
e propriedade
decorrentes do patrimônio material, moral e emocional das partes, quer pelo viés psico-social posto que a atualidade reclama companhia e os animais de estimação são , por sua essência, parte componente da saúde mental de quem os acolhe, cuida e protege.2. A considerar-se sujeito de direitos de proteção ambiental previsto na Agenda 2030 e diversas tratativas internacionais que cultuam a preservação das espécies no planeta, ao Judiciário incumbe apreciar os conflitos decorrentes da atuação de tutores que celebram a vida em comum e principalmente quando somam perdas emocionais e afetivas no desenlace afetivo restando os vínculos com objetos de preferência, divisão de patrimônio e preservação de referenciais amorosos com significantes próprios como
os animais de estimação. 3. O Enunciado 11 do IBDFAM, aprovado no X Congresso Brasileiro de Direito de Família, possui justamente esta dicção, verbis: "na ação destinada a dissolver o casamento ou a união estável, pode o juiz disciplinar a custódia compartilhada do animal de estimação do casal".
(TJPR - 11ª Câmara Cível - 0061506-58.2020.8.16.0000 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADORA LENICE BODSTEIN - J. 08.03.2021)
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