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Acórdão
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1. RelatórioTrata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão interlocutória proferida nos autos de cumprimento de sentença arbitral, sob o nº 0004960-80.2020.8.16.0194, em trâmite perante a 25ª Vara Cível do Foro Central da Comarca de Região Metropolitana de Curitiba, que negou a atribuição de efeito suspensivo à impugnação à execução com fulcro no art. 525 §6º do Código de Processo Civil, visto não haver garantia do “juízo com penhora caução ou depósito suficiente” (mov. 109.1).Irresignada, a parte agravante sustenta, em síntese, restar equivocada a decisão porquanto não se ateve ao fato de que nos autos nº 0012349-55.2020.8.16.0182 - ação anulatória de sentença arbitral - em trâmite perante o 11º Juizado Especial Cível de Curitiba, houve a determinação de suspensão dos efeitos da sentença arbitral sob o fundamento de aparente violação aos princípios de ampla defesa e contraditório no procedimento. Aduz que a execução da sentença que se encontra suspensa se mostra um tanto quanto equivocada “o que ocasionará risco à parte diante do prosseguimento dos atos expropriatórios antes que a ação que discute sua nulidade seja julgada, além de não observar a tutela de urgência concedida por evidente existência do Cerceamento de Defesa e Contraditório”.Sustenta que a nulidade não provém apenas da não nomeação de curador especial diante de uma citação feita por edital, mas também da “ausência de intimação da procuradora constituída, com procuração devidamente apresentada aos autos para comparecer na audiência, audiência na qual inclusive houve a abertura de prazo para defesa, sem que a defensora estivesse presente ou fosse intimada, mesmo com a habilitação constante dos autos”, sendo evidente a violação sofrida pela parte tanto no processo arbitral quanto na continuidade da execução do título extrajudicial (sentença arbitral). Salienta que a ação de nulidade foi proposta dentro do prazo de 90 dias, nos termos da Lei nº 9.307/96.Assevera que a probabilidade do seu direito é demonstrada pelo próprio ato jurisdicional, qual seja, decisão interlocutória que suspendeu os efeitos da sentença nos autos nº 0012349-55.2020.8.16.0182, enquanto que o risco de dano é clarividente na medida em que se pondera os iminentes atos expropriatórios na demanda executória, os quais acarretarão consideráveis prejuízos econômicos, razão pela qual pleiteia pelo conhecimento do presente agravo de instrumento com a concessão da tutela provisória recursal, a fim de determinar a suspensão do processo de execução (mov. 1.1).Nos termos da decisão de mov. 12.1, destes autos recursais, concedeu-se os efeitos da tutela recursal pretendida para atribuir efeito suspensivo à impugnação ao pleito de cumprimento de sentença. Contrarrazões à mov. 24.1. O agravado requereu o não provimento do recurso e a manutenção da decisão combatida. Após, vieram conclusos.Eis o relato do essencial.
2. Voto O recurso merece conhecimento, vez que presentes os pressupostos de admissibilidade recursal (cabimento, legitimidade recursal, interesse recursal, tempestividade, preparo, regularidade formal e inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer).Cinge-se a controvérsia recursal sobre a necessidade de suspensão do cumprimento de sentença até que se decida sobre nulidade da sentença arbitral, matéria discutida em autos apartados, sob o nº 0012349-55.2020.8.16.0182. Cuida-se de cumprimento de sentença arbitral proposta por Basi Assessoria Imobiliária Ltda. em face de Aace Telecel Ltda., Juliana Xavier Leme, Rogers Willian de Siqueira e Joana Maria Anastácio. O processo arbitral foi realizado junto à Câmara de Mediação e Arbitragem do Paraná (CMA), cujo objetivo era o pagamento dos aluguéis, encargos, multa contratual, reparos no imóvel e faturas de consumo de água e energia elétrica, proveniente de contrato de locação disposto à mov. 1.7 dos autos originários. A sentença arbitral foi proferida em 05 de fevereiro de 2020 (mov. 1.16), julgando-se procedente o pedido da empresa imobiliária para condenar os requeridos ao pagamento dos encargos devidos. Todavia, em virtude do não cumprimento da obrigação por parte destes, a empresa Basi Assessoria Imobiliária Ltda. propôs o cumprimento de sentença de título judicial ora analisado, com fundamento no art. 515, inciso VII, do Código de Processo Civil. O executado Rogers Willian de Siqueira apresentou impugnação ao cumprimento de sentença à mov. 102.1 dos autos originários. Naquela oportunidade, o executado informou que a sentença arbitral é objeto de ação anulatória em trâmite sob os autos nº 0012349-55.2020.8.16.0182, proposta dentro do prazo decadencial e com liminar deferida, conforme se vislumbra do mov. 51.1 daqueles autos.Na ação anulatória, a decisão de mov. 51.1 assim determinou: “Ante o exposto, diante dos elementos suficientes para a antecipação da tutela, DEFIRO o pedido liminar e determino, por ora, a suspensão dos efeitos da sentença arbitral proferida no movimento 1.30, fls. 53/57, até o julgamento definitivo da lide ou ulterior deliberação deste Juízo”. Apresentada impugnação ao cumprimento de sentença pelo executado Rogers Willian de Siqueira (mov.102.1), o pedido de suspensão da execução, com fulcro no artigo 525, § 6º, do Código de Processo Civil, restou indeferido, sob o argumento de que “não garantido o juízo com penhora, caução ou depósito suficientes” (mov. 109.1). Insatisfeito, o executado Rogers Willian de Siqueira, ora agravante, interpôs o presente recurso. Assiste-lhe razão.Imperioso mencionar, de início, que é plenamente possível a arguição de nulidade da sentença arbitral, em virtude do princípio da inafastabilidade da jurisdição, nos termos do art. 33 da Lei nº 9.307/1996: “A parte interessada poderá pleitear ao órgão do Poder Judiciário competente a declaração de nulidade da sentença arbitral, nos casos previstos nesta Lei”; desde que a anulação da sentença esteja elencada nas hipóteses previstas no artigo 32 da Lei de Arbitragem.
Nesse contexto, somente a título de argumentação, já que não se pretende adentrar no mérito da nulidade (ou não) da sentença arbitral, verifica-se que a ação de nulidade, sob o nº 0012349-55.2020.8.16.0182, fora proposta dentro do prazo decadencial (cf. art. 33, §1º, Lei nº 9.307/1996), bem como que preenchidos, a priori, os demais requisitos legais. Sabe-se que a propositura de ação anulatória, por si só, não se revela suficiente para suspender a execução, haja vista que o cumprimento de sentença arbitral será processado em caráter definitivo, bem como que referida ação não é dotada de efeito suspensivo automático. É, por esse motivo, inclusive, que este E. Tribunal de Justiça já se posicionou no sentido de não suspender o processo executório, ainda que houvesse ação anulatória em trâmite, prosseguindo-se com os atos expropriatórios em face do executado.
Nesse sentido: TJPR - 7ª C.Cível - 0023135-25.2020.8.16.0000 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR D'ARTAGNAN SERPA SA - J. 02.03.2021; TJPR - 11ª C.Cível - 0018829-47.2019.8.16.0000 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR MARIO NINI AZZOLINI - J. 04.11.2019.
Ocorre que, no caso sub judice, determinou-se a suspensão dos efeitos da sentença arbitral anteriormente proferida, conforme se vislumbra do mov. 51.1 dos autos nº 0012349-55.2020.8.16.0182. E mais que isso, um dos fundamentos da concessão da medida liminar era evitar o cumprimento da sentença arbitral que apresenta fortes indícios de nulidade. Confira-se:“No que tange ao perigo de dano irreparável ou de difícil reparação, evidente o prejuízo que pode sofrer a parte autora, ante a provável possibilidade de os réus ajuizarem ação de execução da sentença arbitral, nos moldes do disposto no art. 515, inciso VII, do CPC”.
Com essas considerações, torna-se imprescindível transcrever uma ementa do Superior Tribunal de Justiça:RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE SENTENÇA ARBITRAL. AÇÃO ANULATÓRIA. RECEBIMENTO COMO IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. POSSIBILIDADE EM TESE. 1. Controvérsia limitada a saber se é possível o recebimento de ação anulatória em curso como impugnação ao cumprimento de sentença arbitral, inclusive com a concessão de efeito suspensivo, nos termos do art. 475-M do CPC/1973.2. O cumprimento de sentença arbitral é sempre processado em caráter definitivo, circunstância que não se modifica em virtude do ajuizamento de ação anulatória.3. São duas as formas de impugnação judicial da sentença proferida em procedimento arbitral quando dela resulta a condenação ao pagamento de quantia certa: a) o ajuizamento de ação visando a declaração de nulidade da sentença, nos moldes do art. 33 da Lei nº 9.307/1996, e b) o oferecimento de impugnação ao pedido de cumprimento de sentença, nos moldes do art. 475-J, § 1º, do CPC/1973, observada a regra do parágrafo 3º do art. 33 da Lei da Arbitragem.4. A simples propositura de ação anulatória não é suficiente para suspender a execução, ressalvada a concessão de efeito suspensivo em atendimento a pedido de tutela provisória de urgência, o que não ocorreu na espécie.5. Possibilidade, em tese, de dar à ação de invalidação de sentença arbitral em curso o mesmo tratamento conferido à impugnação ao cumprimento de sentença, desde que oferecida a garantia e requerida tal providência ao juízo da execução dentro do prazo legal, cabendo a ele decidir, se for o caso, a respeito da suspensão do feito executivo.6. Hipótese em que a demanda pela qual se busca a anulação da sentença arbitral não apresenta a menor perspectiva de êxito, a afastar a pretensão recursal.7. Sentença arbitral devidamente fundamentada em princípios basilares do direito civil, apresentando solução que não desborda das postulações inicialmente propostas pelas partes.8. O mero inconformismo quanto ao conteúdo meritório da sentença arbitral não pode ser apreciado pelo Poder Judiciário. Precedentes.9. Recurso especial não provido.(REsp 1636113/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/06/2017, DJe 05/09/2017) (grifou-se) Retira-se do precedente que “a simples propositura de ação anulatória não é suficiente para suspender a execução, ressalvada a concessão de efeito suspensivo em atendimento a pedido de tutela provisória de urgência”, que é exatamente o caso dos autos.
Constata-se, ainda, a relevância da arguição de nulidade, posto que se fundamenta na ausência de nomeação de curador especial após a citação por edital dos réus, exigência prevista no art. 72, II Código de Processo Civil, o que pode, visivelmente, representar um desrespeito ao princípio do contraditório, o qual também deve nortear o processo de arbitragem, nos lindes do art. 21, §2º da Lei 9.307/96. Encontra-se facilmente jurisprudência no sentido de decretar a nulidade da sentença arbitral, por desrespeito ao contraditório, nos casos em que não nomeado curador especial ao réu citado por edital. Nesse sentido: TJPR - 11ª C.Cível - 0002738-13.2018.8.16.0000 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR RUY MUGGIATI - J. 20.07.2018. Sendo assim, no que se refere ao pedido de suspensão do cumprimento de sentença arbitral, evidencia-se que, dentre as hipóteses de suspensão da execução elencadas no art. 921 do Código de Processo Civil, está a existência de relação de prejudicialidade externa prevista no art. 313, inc. V, “a”, do mesmo diploma legal, in verbis: Art. 313. Suspende-se o processo:[..]a) depender do julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de relação jurídica que constitua o objeto principal de outro processo pendente; Da exegese dos artigos supramencionados, conclui-se que o processo deverá ser suspenso se depender do julgamento de outra causa e, no caso dos autos, a exigibilidade do título depende substancialmente da sentença a ser proferida na ação anulatória. Ora, resta clarividente executar uma sentença cujos efeitos estão suspensos por determinação judicial. E, muito embora o Juízo a quo tenha indeferido o pedido de suspensão do processo, fundamentando-se na ausência de prestação de garantia, não se ateve às peculiaridades do caso concreto, em especial, a sustação dos efeitos da sentença arbitral. Desprovido de razoabilidade, portanto, exigir garantia do executando enquanto houver fortes indícios (o que fora reconhecido por decisão judicial) de que a sentença arbitral está eivada de nulidades, considerando, ainda, que a suspensão da execução, sem a prestação de garantia, possui fundamentação legal, conforme artigo 921 do CPC (que faz referência ao art. 313, inc. V, “a”). Dessa forma, conclui-se que a sentença arbitral proferida não possui todos os requisitos legais, pois inobstante seja certa e líquida, não será exigível enquanto perdurar decisão judicial suspendendo os seus efeitos, ante a existência de indícios concretos de que está eivada de nulidade. A propósito, precedente do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE SENTENÇAARBITRAL. AÇÃO ANULATÓRIA DA SENTENÇA APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE SENTENÇA ARBITRAL. AÇÃO ANULATÓRIA DA SENTENÇA ARBITRAL. PRELIMINAR DE IMPOSSIBILIDADE DE EXTINÇÃO DO PROCESSO DA EXECUÇÃO ANTES TRÂNSITO EM JULGADO DA AÇÃO ANULATÓRIA ACOLHIDA. Nos termos do art. 313, V, suspende-se o processo, quando a sentença de mérito depender do julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de relação jurídica que constitua o objeto principal de outro processo pendente. É prudente que se determine a suspensão do presente processo até que ocorra ou que se comprove o trânsito em julgado da sentença proferida na ação anulatória. APELAÇÃO CONHECIDA EM PARTE E PROVIDA. SENTENÇA CASSADA.(TJGO, Apelação (CPC) 0177341-86.2011.8.09.0006, Rel. Des(a). ORLOFF NEVES ROCHA, 1ª Câmara Cível, julgado em 29/06/2020, DJe de 29/06/2020) (grifou-se) Desse modo, assim como disposto na ementa acima, prudente que se determine a suspensão do processo executório até o julgamento definitivo da ação anulatória ou ulterior deliberação daquele Juízo. Por derradeiro, frise-se que a suspensão ora determinada não apresenta riscos à pretensão do exequente, conquanto tinha pleno conhecimento da ação anulatória em curso, não tendo interposto qualquer recurso contra a liminar deferida. É dizer, em outros termos, que o exequente, ora agravado, detinha meios para “impedir” a suspensão da execução, refutando a nulidade arguida pelo executado e réu no processo de arbitragem.Diante do exposto, assiste razão ao recorrente, sendo incorreta a decisão a quo que indeferiu o pedido de suspensão do cumprimento de sentença arbitral, eis que há indícios concretos da alegada nulidade desta, havendo inclusive determinação judicial de suspensão de seus efeitos.
3. ConclusãoAnte a fundamentação aludida, voto pelo conhecimento do recurso interposto e pelo seu provimento, modificando-se a decisão recorrida para o fim de suspender o processo executório enquanto perdurar a determinação de suspensão dos efeitos da sentença.
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