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Acórdão
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RELATÓRIO:Trata-se de Recursos de Apelação (movs. 474.1, 475.1 e 498.1) interpostos em face de sentença (mov. 404.1), proferida em autos de Ação de Reintegração de Posse proposta pelo Estado do Paraná contra Dorisvaldo dos Santos e outros, que julgou procedentes os pedidos iniciais, para o fim de determinar a reintegração da parte autora na posse do imóvel discutido.Ante a sucumbência, a parte requerida foi condenada ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios, estes arbitrados em R$ 2.000,00 (dois mil reais), ressalvada a gratuidade da justiça.Em sua fundamentação, assim definiu o MM. Juiz na sentença apelada:II - FUNDAMENTAÇÃO DO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE O feito comporta julgamento antecipado, nos termos do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil, vez que as teses aventadas pelas partes abrangem questões de direito ou dizem respeito a fatos já evidenciados pela documentação contida nos autos. Oportuno registrar que, no que tange à produção de prova documental, mais especificamente ao relatório de levantamento social das famílias ocupantes da área, tem-se que seja prescindível ao julgamento do feito. A verificação da situação de vulnerabilidade dos demandados, seu número exato e local de origem, apesar da relevância de que se reveste no plano social, diz respeito a questões marginais ao mérito da demanda, na qual se discute apenas e tão somente a posse do bem. Além disso, em relação à perícia, cuida-se de prova que, igualmente, nada contribuiria para o deslinde da controvérsia, haja vista que a aferição dos eventuais impactos ambientais advindos da continuidade da ocupação escapa nitidamente aos limites objetivos e subjetivos da lide em pauta. Atente-se que, como já exposto, as questões levantadas pelos demandados, pela nobre Defensoria Pública e pelo Ministério Público, de fato assumem especial relevância, porém não se tomado por base o ponto controvertido desta ação possessória. As provas requeridas talvez tivessem razão de ser em sede de ação civil pública movida contra os proprietários e possuidores do imóvel, todavia não existe razão alguma para que sejam produzidas no bojo da presente demanda, em que o objeto é pura e simplesmente a verificação do cumprimento dos requisitos do artigo 561, do Código de Processo Civil. Já no que concerne ao pedido de produção de prova oral deduzido pelos demandados, por se tratar de esbulho de imóvel público e em face da conjuntura fática retratada nos autos pela documentação que acompanha a inicial, verifica-se que nem mesmo por hipótese o depoimento de testemunhas alteraria a conclusão que será exposta quando da análise do mérito. Sendo assim, porque não alegada matéria de fato que demande produção de outras provas além daquelas já constantes nos autos, revela-se pertinente o julgamento antecipado. DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA Defiro os benefícios da Assistência Judiciária Gratuita aos requeridos, nos termos do art. 98 e seguintes, do Código de Processo Civil. DA INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL Não prospera a tese de que a petição inicial seria inepta, haja vista que satisfatoriamente preenchidos os requisitos do art. 319, do Código de Processo Civil, especialmente porque devidamente individualizada a área de eu cuida a demanda, qual seja, o “imóvel denominado “Fazenda Solidariedade”, localizado no Município de Campo Magro”. A esse respeito, deve ser destacado o fato de que não há respaldo legal para que se imponha ao autor da demanda possessória, o dever de trazer aos autos memorial descritivo, planta ou congênere em que conste, exatamente, qual porção exata do imóvel cada requerido ocupa individualmente. A ausência da referida delimitação específica não prejudica o regular exercício do direito de defesa, até porque o contexto fático em que ocorrido o esbulho denota a atuação coletiva e dinâmica dos requeridos. Ademais, tem-se que os requeridos contestaram o mérito da demanda, indicando, assim, que se fez plenamente possível a compreensão da pretensão contida na peça vestibular. DA IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA Não merece prosperar a impugnação deduzida em sede de contestação, eis que o que define o valor da causa é a repercussão econômica da pretensão da parte autora, e não o valor do imóvel. No caso em apreço, a referida repercussão econômica, por tratar-se de bem público, sequer pode ser estimada com segurança. Com isso, porque não se afigura viável estimar a repercussão econômica advinda de uma sentença de procedência/improcedência, bem como porque o valor atribuído na inicial, consideradas as peculiaridades que cercam o caso, não se revela desarrazoado, há que ser rejeitada a impugnação levada a efeito pelos requeridos. DA NULIDADE DE CITAÇÃO Quanto à preliminar relativa à higidez da citação, este Juízo não ignora o teor da regra estabelecida pelo art. 554, § 1º, do Código de Processo Civil, que prevê, nas hipóteses de ação possessória com elevado número de pessoas no polo passivo, a necessidade de citação por edital dos ocupantes que não puderem ser identificados. Neste sentido, inclusive, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça: (...) Entretanto, afigura-se nitidamente viável o distinguishing entre o precedente acima citado e o presente caso, assim como se nota que os fatos protagonizados pelas partes durante o trâmite processual não se subsumem à regra do art. 554, §1º, do Código de Processo Civil. Isso porque, primeiramente, a tese de nulidade deveria ter sido alegada na primeira oportunidade em que os requeridos tiveram de se manifestar nos autos. Além disso, dada a postura adotada pelos demandados, seja anteriormente ao ajuizamento da demanda, ou quando já estabelecida a relação jurídica processual, há que ser adotada como premissa a teoria da aparência, vez que o Movimento por Moradia se apresentou como representante dos ocupantes da área em litígio (todos, sem ressalva). Para tanto, o movimento esteve presente na reunião extrajudicial realizada sob coordenação do Ministério Público (Mov. 30.2), na audiência de mediação (Mov. 103.1), praticou todos os atos do processo pelos ocupantes da área, além de ter interposto 2 (dois) agravos de instrumento buscando resguardar os interesses dos requeridos. Passando-se as coisas dessa maneira, o Movimento por Moradia não pode agora questionar a higidez da relação jurídica processual por vício de representação. A adoção de entendimento diverso acarretaria, inclusive, violação à boa-fé objetiva processual, em especial a um de seus desdobramentos típicos, qual seja, o “venire contra factum proprium”, que proíbe a adoção de comportamento contraditório pelas partes. A citação por edital somente seria necessária nos moldes do art. 554, §1º, do CPC, acaso não fosse possível viabilizar o exercício do contraditório por todos os ocupantes da área. Não é o que ocorre nos autos, em que todos os demandados se fazem ouvir pela voz do Movimento por Moradia, que contestou, participou da audiência de mediação, interpôs recursos e requereu provas. A corroborar a referida conclusão, tem-se o teor da avença processual firmada por ocasião da audiência de mediação de Mov. 103.1, em que os demandados, sempre por intermédio do Movimento por Moradia, assumiram obrigações que exigem coordenação e interlocução com TODOS os ocupantes do imóvel. Assim, do panorama fático que se extrai dos autos, dúvida não há de que todos os ocupantes possuem plena ciência acerca dos fatos e dos atos processuais até então realizados, inclusive no que tange aos rumos adotados para a diligente defesa de seus interesses no bojo da presente demanda. Pelos mesmos motivos, não há que se falar na individualização de todos os ocupantes e sua inclusão na autuação como litisconsortes passivos, como pretende a Defensoria Pública, vez que a qualificação individual de todos os requeridos, além de inviável, afigura-se de todo desnecessária, justamente porque reconhecidamente representados pelo Movimento por Moradia, conforme já exposto. Rejeito, portanto, a preliminar suscitada nas contestações. DA FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL Deixo de analisar a questão como preliminar, tal como ventilada pela Defensoria Pública, eis que se confunde com o mérito segundo os preceitos que decorrem da Teoria da Asserção, mormente porque sua solução demanda valoração do conteúdo probatório (comprovação do prévio exercício de posse). DA ILEGITIMIDADE PASSIVA DO MUNICÍPIO DE CAMPO MAGRO Em relação à alegada ilegitimidade do Município de Campo Magro para figurar na lide, a prefacial arguida pelos requeridos sequer pode ser conhecida, ante a preclusão que se abateu sobre a matéria. Quando da realização de audiência de mediação (Mov. 103.1), as partes celebraram acordo que envolvia, dentre outras questões, a intervenção do Município de Campo Magro na lide, na condição de assistente simples: “D) As partes concordam com o ingresso do Município de Curitiba no feito, na condição de assistente litisconsorcial e do município de Campo Magro como assistente simples.” Diante disso, resta configurada a preclusão lógica em relação ao pleito em questão, razão pela qual deixo de conhecê-lo. DA DESIGNAÇÃO DE NOVA AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO Igualmente, não prospera o requerimento de designação de nova audiência de conciliação objetivando o cumprimento, pelo Município de Campo Magro, do acordo entabulado entre as partes, seja porque o cumprimento do acordo processual é matéria que restou devolvida ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Paraná nos autos de agravo; seja porque, tal como já exposto, trata-se, a elaboração de estudo social, de questão marginal ao mérito da demanda, que não influi, assim, no julgamento do mérito. Não bastasse isso, o autor expressamente afirmou não contar com interesse na solução conciliada para a lide (Mov. 396.1). DO MÉRITO A controvérsia havida nestes autos consiste na verificação dos requisitos expressos no artigo 561, do Código de Processo Civil para a reintegração da posse do imóvel descrito na inicial em favor da parte autora. Pois bem, a respeito da posse, leciona Fabrício Zamprogna Matiello: (...) Assim, a fim de que se verifique a quem toca a melhor posse sobre o bem, deve-se partir da premissa de que a posse é o exercício de fato de um dos poderes inerentes à propriedade, revelando-se irrelevante a apuração de quem detém o título de domínio. Nas demandas possessórias e, em particular, na ação de reintegração de posse, a defesa da posse impõe a prova do seu exercício anterior, bem como da ocorrência de esbulho (art. 561, do Código de Processo Civil). Conforme destacado por ocasião da deliberação liminar (Mov. 32.1), o caso em voga envolve bem público, de modo que há uma vinculação jurídica pré-estabelecida da coisa com a finalidade a que se destina por força de lei em sentido amplo. Se não é viável a aquisição da propriedade de bens públicos por particulares fora das hipóteses previstas no artigo 17, da Lei nº 8.666/93, e mesmo a usucapião não é meio de aquisição do domínio de referidos bens à luz da Súmula nº 340, do Supremo Tribunal Federal, nem mesmo por hipótese é possível cogitar o exercício de posse pelos requeridos. A dizer, se a propriedade daquele imóvel público não é nem potencialmente passível de ser adquirida pelos demandados, consequentemente não se pode falar em atos de posse sobre o bem, ao menos não enquanto fatos qualificados que sejam fonte do ius possessionis. Nessa esteira, é jurisprudência do Supremo Tribunal Federal: (...) Referido entendimento jurisprudencial repercute, também, nas instâncias ordinárias, inclusive nos julgados do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Paraná: (...) Sendo assim, o contato físico dos demandados com a coisa em litígio não passa de mera detenção. De toda sorte, e ainda que assim não fosse, percebe-se que o requerente já exercia a posse no local desde antes do esbulho praticado pelos requeridos, posse que se traduziu no fato de, na condição de possuidor direto da área em litígio (Mov.1.2), ter exercido o direito de sequela quando da primeira tentativa de ocupação da área em 23.05.2020 (Mov. 1.3/1.4). Com isso, mesmo que se descarte a tese afeta à mera detenção por parte dos demandados, os requisitos do artigo 561, do Código de Processo Civil (posse prévia e esbulho) estão fartamente demonstrados, em especial e principalmente porque os requeridos não negam a narrativa fática exposta pelo autor na inicial, apenas se opõe à conclusão acerca da repercussão jurídica decorrente de tais fatos. Ainda a esse respeito, restou comprovado, por meio das fotografias, vídeos, relatórios, e boletins de ocorrência colacionados aos autos, que o ingresso dos requeridos no terreno se deu forma clandestina na data de 26.05.2020, tendo sido edificadas diversas habitações improvisadas no local, fato este incontroverso. Aliás, eis aí mais uma razão que evidencia a viabilidade do julgamento do feito independente da coleta da prova oral. Cumpre mencionar, também, que não se nega a aparente inobservância da função social da propriedade e a violação ao direito fundamental de moradia dos demandados pelo requerente e seus congêneres municipal e federal. Ocorre que tais questões não socorrem os requeridos, ao menos não em sede de demanda possessória. Tanto o direito de moradia quanto a função social da propriedade poderiam perfeitamente servir de causa de pedir para uma ação civil pública, mas não conferem alicerce jurídico à pretensão dos requeridos frente ao direito do requerente nesta possessória. Este Juízo se compadece da situação de vulnerabilidade protagonizada pelos demandados, entretanto, a matéria ventilada na contestação deve ser deduzida na via própria, seja judicialmente, seja pelos canais políticos típicos do modelo republicano, conforme conceituado na norma do artigo 2º, da Constituição Federal. Acaso se acolhesse a tese dos requeridos para afastar a pretensão possessória do autor, estar-se-ia abandonando o direito enquanto critério de atuação do Estado-Juiz que, com isso, estaria se substituindo ao Estado-Administração sem contar com legitimidade para tanto. Mesmo que se levasse a efeito o sopesamento dos direitos alegados na peça inicial e na contestação, algo que o devido processo legal não permite neste feito, a conclusão seria desfavorável aos demandados. Tomando-se em conta que o sopesamento passa pela análise da necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito do resultado proposto, constata-se que apesar de necessária, a concessão da proteção possessória aos requeridos não seria adequada nem proporcional em sentido estrito. Não seria adequada porque, segundo já mencionado, os direitos dos requeridos serviriam de causa de pedir em ação civil pública ou, eventualmente, ordinária, mas não nesta possessória, principalmente se considerado que houve o esbulho anterior ao ajuizamento do feito. Também não se revela proporcional em sentido estrito, porque acaso permitida a manutenção dos demandados na posse do imóvel e imposta a regularização fundiária, o direito de terceiros estaria sendo violado por via transversa, na medida que há milhares de mutuários cadastrados nos órgãos responsáveis pela implementação de políticas públicas habitacionais que seriam preteridos. Enfim, não se pode negar a aparente violação ao direito fundamental de moradia dos requeridos, tampouco o desamparo de que padecem por inépcia dos órgãos de estado, todavia o devido processo legal é baliza intransigível da atuação do Estado-Juiz, razão pela qual a procedência do pedido é medida que se impõe.Inconformados, recorrem os requeridos aduzindo, em síntese, que: (a) deve ser concedido efeito suspensivo, por ser medida essencial à justiça, por haver risco concreto de dano grave aos apelantes e às demais famílias ocupantes da área; (b) deve ser reconhecida a nulidade da citação, uma vez que somente foram citados os requeridos nominados na petição inicial; (c) o Movimento Popular Pela Moradia compareceu espontaneamente à demanda, mas não representa todas as pessoas ocupantes do imóvel, sendo que não foi devidamente qualificado nos autos; (d) os ocupantes do imóvel que podem ser citados por oficial de justiça ao serem lá encontrados, assim devem ser citados, ao passo que, em relação aos que não forem encontrados, deve se proceder à sua citação por edital, o que não ocorreu; (e) em razão ausência de citação, claramente está configurado o cerceamento do contraditório e da ampla defesa e, em decorrência disso, resta demonstrado o prejuízo às partes, razão pela qual, requer-se a declaração de nulidade da citação e de todos os atos subsequentes; (f) houve cerceamento de defesa em decorrência do julgamento antecipado da lide, já que as provas requeridas (pericial, testemunhal e documental) destinavam-se à apuração de fatos cujo conhecimento poderia levar ao julgamento improcedente do pedido inicial; (g) os fatos em debate não são notórios, confessados, incontroversos ou presumidamente verossímeis, pelo que se mostra necessária a dilação probatória; (h) foi informado expressamente o propósito da prova testemunhal, qual seja, “demonstrar o estado de abandono do imóvel e ausência de posse do autor”; (i) também foi requerida a produção da prova documental, tendo em vista a existência de procedimentos administrativos entre o Estado do Paraná (cessionário) e a Fundação de Assistência Social – FAS (proprietária) acerca do imóvel em tela; (j) a Defensoria Pública do Estado do Paraná requereu a produção de prova pericial, a fim de demonstrar a “inexistência de dano ambiental significativo perpetrado pelos moradores”, eventuais responsáveis, as medidas tomadas para compensação ambiental, a possibilidade de permanência dos moradores no local, bem como a situação da área antes da ocupação”; (k) a i. Promotora de Justiça, Dra. Mariana Dias Mariano, visitou a ocupação e relatou um contexto de vulnerabilidade social, mas de organização, contrariando narrativas abordadas até o momento pelo Estado do Paraná, Município de Campo Magro e Município de Curitiba (mov. 179.1); (l) requer-se a declaração de nulidade da decisão recorrida e dos atos por esta atingidos, na parte em que procedeu ao julgamento antecipado da lide; (m) quanto ao mérito, não houve demonstração de posse prévia da parte autora, sendo certo que o imóvel se encontrava em situação de abandono; (n) o autor, ora apelado, não demonstrou que detinha a posse da coisa, mas tão somente acostou o termo de cessão que lhe fora conferido pela Fundação de Ação Social, a proprietária do imóvel, todavia, tal documento não comprova o uso, mas tão somente sua permissão; (o) o próprio Ministério Público requereu o prosseguimento do feito, com ulterior instrução probatória, precisamente porque “sequer foi comprovado com nitidez o exercício direto da posse pelo Estado do Paraná” (mov. 400.1); (p) os indícios de abandono do imóvel se confirmam pelos relatos da douta Promotora de Justiça ao mov. 179.2; (q) o próprio apelado reconhece que, embora houvesse tentado devolver o imóvel à proprietária Fundação de Ação Social-FAS em 2018, não o conseguiu “por não ter sido definido o valor da reparação dos danos causados no imóvel durante o período em que este teria sido utilizado pela SEJUF/PR” (mov. 1.1, fl. 5); (r) os danos causados ao imóvel pelo apelado se devem ao completo abandono do bem, de modo que a própria FAS negou-se a rescindir a cessão sem a devida indenização, sendo que as fotos acostadas na contestação de mov. 303.2 a 303.6 dão conta desse panorama de total abandono; (s) a proteção possessória, no atual marco civil-constitucional brasileiro, é devida àquele que cumpre a função social da posse, o que milita em favor dos ocupantes; (t) embora se desqualifique o uso dado à área pelos apelantes como mera detenção, ao argumento de impossibilidade de usucapião de bem público, é certo que, para fins de moradia, a legislação brasileira já possui mecanismos que, no mínimo, relativizam tal afirmação, como é o caso da Concessão de Uso Especial para fins de Moradia (CUEM) e a regularização prevista na Lei nº13.465/2017 (Lei da Reurb); (u) a criação de tais instrumentos afasta a noção de que os imóveis públicos estariam isentos de cumprir sua função social, sendo que a própria Constituição Federal não criou qualquer exceção a esse respeito; (v) fica evidenciado que o apelado não logrou comprovar sua posse e, portanto, não lhe cabe a proteção possessória postulada, a qual deve ser concedida a quem possui a melhor posse, no cumprimento da função social, pelo que a sentença recorrida deve ser reformada, a fim de se julgar improcedente a demanda; (x) o cumprimento de uma reintegração de posse jogaria ao relento centenas de famílias, marginalizando-os e, mais que isso, destruiria sua cultura, violaria sua dignidade humana e condição de cidadão ao defenestrar seus direitos sociais; (z) casos como o presente, de conflito coletivo por moradia, devem ser apreciados com todos os cuidados humanísticos que também estão presentes no direito positivo, possibilitando o indeferimento de medida extrema de reintegração de posse, ou mesmo sua total improcedência, diante da possibilidade de adoção de outras medidas para a resolução do impasse, sobretudo quando o próprio Estado/Executivo é parte na ação, tendo em vista sua responsabilidade pelas políticas públicas de moradia; (a2) o direito moderno exige a leitura do Código Civil à luz da matéria constitucional, tendo em vista a observância de princípios norteadores, em especial, aqueles atrelados à dignidade da pessoa humana e da cidadania, fundamentos do nosso Estado Democrático de Direito; (b2) o Brasil é signatário da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, também denominada Pacto de San José da Costa Rica, de 22.11.1969, incorporada pelo Decreto Legislativo nº 27, de 25.09.1992, e promulgada pelo Decreto nº 678, de 06.11.1992; (c2) requer-se a reforma da decisão à luz dos princípios da proporcionalidade e da ponderação; (d2) consideradas as peculiaridades do caso em exame, diante dos princípios constitucionais que se encontram em conflito, afigura-se recomendável a adoção daquilo que a doutrina define como uma "relação de precedência condicionada" entre os princípios concorrentes; (e2) considerando os componentes de fato da lide, considerando tratar-se de pessoas sem moradia, considerando que o próprio Estado reconhece o déficit habitacional, considerando a insuficiência ou até inexistência de políticas sociais de moradias e, finalmente, considerando que o terreno é público e o zoneamento permite, a improcedência da ação é viável; (f2) a função social da propriedade urbana deve ser observada para a garantia da proteção possessória, pois seu cumprimento é necessário à realização da política constitucional de desenvolvimento urbano; (g2) segundo o direito internacional, recepcionado e também reforçado pelo direito brasileiro, a realização de remoções de populações de áreas informais deve ocorrer apenas de maneira excepcional, e jamais sem a provisão de alternativa adequada de moradia àqueles que não possuem outros meios, sob pena de constituir grave violação de direitos humanos, o que se afigura no caso em tela; (h2) o Comentário Geral nº 7 do Pacto Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC) e a Resolução nº 10/2018 do Conselho Nacional de Direitos Humanos recomendam que a reintegração de posse deve ser considerada ultima ratio, ao mesmo tempo em que estabelecem como prioridade nesses casos a permanência no local enquanto não houver solução passível de assegurar a observância dos direitos humanos dos envolvidos; (i2) cita-se a Resolução nº 2004/2841 do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, segundo a qual “a prática de despejos forçados é considerada contrária às leis que estão em conformidade com os padrões internacionais de direitos humanos, e constitui uma grave violação de uma ampla gama de direitos humanos, em particular o direito à moradia adequada”; (j2) segundo recente decisão do Excelentíssimo Ministro Edson Fachin, prolatada no ARE 1158201/SP, em questões possessórias também incidem certas responsabilidades públicas irrevogáveis, sendo necessário buscar soluções mediadas ao conflito; (k2) o Conselho Nacional de Justiça tem incentivado a busca de soluções mediadas em casos de demandas possessórias coletivas, desde a criação do Comitê Executivo Nacional e do Fórum de Assuntos Fundiários do CNJ, ao passo que este e. Tribunal de Justiça também criou uma Comissão de Conflitos Fundiários, consoante Portaria n. 10777-D.M, bem como um CEJUSC Fundiário; (l2) é imprescindível o estabelecimento de diálogo com as partes, para fins de solução pacífica do conflito, com garantia dos direitos coletivos envolvidos.Facultado o contraditório, o Estado do Paraná apresentou contrarrazões, pelo desprovimento do apelo (mov. 484.1)O Ministério Público do Estado do Paraná também interpôs Recurso de Apelação sustentando, em resumo, que: (a) deve ser atribuído efeito suspensivo ao recurso, haja vista o risco de dano grave ou de difícil reparação no caso de cumprimento imediato da sentença; (b) o feito foi julgado antecipadamente, todavia os requerimentos de produção de prova pelo Ministério Público e pela Defensoria Pública são relevantes para melhor elucidar os fatos e, em especial, para afastar ou mitigar as consequências da desocupação forçada do local; (c) as provas requeridas têm o condão de interferir diretamente no resultado do julgamento e o indeferimento pode repercutir prejuízo significativo para mais de cinco mil pessoas, sendo certo que o julgamento antecipado da lide, no caso em tela, viola os princípios constitucionais do contraditório, ampla defesa e devido processo legal; (d) requer seja a sentença anulada, determinando-se a produção de provas requeridas pelas partes; (e) processo de reintegração de posse que envolve uma coletividade de pessoas ultrapassa os limites do processo civil clássico, exigindo a necessidade de se ampliar os limites objetivos da demanda, em vista da amplitude de direitos e interesses envolvidos e potencialmente atingidos; (f) para o enfrentamento do feito, é necessário mitigar ou até abandonar a ideia do processo civil clássico, já que este não é suficiente para fornecer a resposta adequada para demandas envolvendo tamanha complexidade e expressiva quantidade de pessoas; (g) o processo em epígrafe é um exemplo típico do que a doutrina vem chamando de processo estrutural, que impõe ao Juiz a necessidade de identificar a características do litígio e os interesses envolvidos, e, a partir daí, elaborar, juntamente com as partes, um plano para enfrentamento da questão e construção de soluções negociadas; (h) na solução, o Poder Judiciário não pode simplesmente se limitar aos requisitos formais da reintegração de posse, sendo necessário ir além para proteger os direitos fundamentais envolvidos; (i) não é possível invocar o princípio da adstrição para limitar-se a determinar a reintegração da posse, deixando de determinar obrigação ao Estado do Paraná e à FAS, detentoras da posse e propriedade do imóvel, de realizar diligências necessárias a evitar a violação dos direitos fundamentais de inúmeras famílias; (j) o Estado não só deixou de dar o destino que ensejou a concessão de uso do imóvel debatido nestes autos, como tentou devolver o imóvel no ano de 2018, mas a FAZ não aceitou, tendo em vista desavenças quanto ao valor cabível para indenização dos danos causados, sendo que, segundo se apurou, o local encontra-se, desde então, sem qualquer uso ou destinação social; (k) os imóveis que existiam encontravam-se, na primeira visita do Ministério Público ao local, em ruínas, sendo que, na última visita (08/10/2020), observou-se que foram feitos reparos nos telhados para que tais construções pudessem abrigar algumas famílias participantes da ocupação; (l) em meados do ano de 2020 parte do imóvel (não delimitada pelos requerentes) foi ocupada por famílias vinculadas a Movimento Social por Moradia e, segundo as lideranças informam, tais pessoas encontravam-se com dificuldades financeiras agravadas pela situação internacional de emergência em saúde decorrente da covid-19, e sem local para morar; (m) em situações como esta, a decisão judicial poderá ensejar forte violação a direitos fundamentais e significativa interferência na organização da cidade, haja vista que as famílias retiradas do local possivelmente não terão para onde ir, razão pela qual a preocupação com os direitos humanos deve estar presente durante todo o processo, ainda que se excedam as molduras estabelecidas para o conflito individual; (n) o Estado não demonstrou qual a parcela do imóvel ocupada pelas famílias, sendo certo que a ocupação não abrange a totalidade da Fazenda; (o) é notório o prévio descumprimento da função social por parte da demandante; (p) até o ano de 2009, a FAS, proprietária da Fazenda Solidariedade, de 42 alqueires, desenvolvia projeto voltado para dependentes químicos e pessoas em situação de rua, com atividades de lavoura, marcenaria, suinocultura, panificação e fitoterapia até que no ano de 2012 o Estado do Paraná foi contemplado com permissão de uso para instalação de projetos de responsabilidade da Secretaria de Justiça, Família e Trabalho, todavia, não só deixou de executar qualquer projeto no local, como o abandonou, deixando em ruínas as construções outrora utilizadas para acomodar pessoas em situação rua e dependentes químicos; (q) o mesmo Estado que recebeu a área para executar programas de cunho social e humanitário e não o fez, deixando o local às traças e em ruínas, agora quer expulsar cerca de 1200 famílias (número informado pelas lideranças da ocupação), sem qualquer plano voltado para o acolhimento e definição do destino de referidas famílias – em grande parte, compostas por crianças; (r) em que pese a área pública não seja passível de desapropriação, nada afasta a necessidade premente de observância, pelo Estado, dos princípios afetos à função social da terra, sendo que o Estado possui o dever de primar pelos imóveis sob sua responsabilidade, como deve garantir que seu patrimônio seja utilizado em benefício da sociedade, e consoante as disposições constitucionais aplicáveis; (s) não é possível que a discussão em uma ação de reintegração de posse envolvendo tantas famílias deixe de considerar a conduta negligente do possuidor do imóvel com relação ao cumprimento de sua função social; (t) tendo em vista a necessidade de se desenvolverem políticas habitacionais voltadas para atendimento da população vulnerável, e diante do fato de que a Fazenda Solidariedade encontrava-se sem qualquer uso ou função desde 2009, quando foram desativadas as atividades de acolhimento a pessoas em situação de rua e a dependentes químicos no local, é possível cogitar na destinação do local para a instalação de programa habitacional; (u) a parcela do imóvel ocupada localiza-se em região de Campo Magro bastante urbanizada. Situa-se, inclusive, em frente à Prefeitura Municipal de Campo Magro, de modo que o local é bem servido por transporte público, e possui fácil acesso a serviços essenciais; (v) os documentos juntados no Movimento 85.2 apontam que a área ocupada abrange, em parte (60%) zona de ocupação orientada II (com possibilidade de fracionamento de, no máximo, 5 mil metros quadrados) e a outra parte (40%) trata-se de zona de restrição à ocupação, sendo que toda a área está em região de influência do aquífero Karst; (x) há necessidade de aprofundamento nos estudos geológicos e ambientais que confirmem a existência de real impacto ambiental, na instalação de núcleo habitacional sustentável no local; (z) se possível tal solução, contemplar-se-ia a necessária preservação ambiental, o direito à moradia de mais de mil famílias e a destinação social de parcela de um imóvel que se encontra completamente sem uso, situado em local estratégico do Município de Campo Magro; (a2) no exercício de polícia, ao desfazer um loteamento clandestino em Área de Preservação Ambiental, o Município deve incluir as famílias despejadas em programas de habitação; (b2) a ocupação vem sendo acompanhada por pesquisadores da Universidade Federal do Paraná e o Ministério Público vem diligenciando no sentido de solicitar estudo técnico da situação territorial de uso e ocupação da área, no que tange a questões ambientais, urbanísticas e de moradia; (c2) referido estudo deverá trazer elementos essenciais para orientar a solução da presente demanda, de maneira a abarcar e contemplar com melhor precisão e segurança os ditames constitucionais afetos às pessoas envolvidas na ocupação e aos interesses difusos atinentes ao caso, daí a imprescindibilidade de produção de provas; (d2) em momento algum, o Estado do Paraná ou o Município de Campo Magro demonstraram preocupação em identificar o número de pessoas presentes na ocupação que pretendem desfazer, ou identificar quem são essas pessoas, para que possam exercer o contraditório nesta ação; (e2) seja por apreço ao princípio da ampla defesa e do contraditório, seja pela necessidade de se definir o impacto social e urbanístico do cumprimento da reintegração, as pessoas que se pretende remover deveriam ter sido identificadas e citadas; (f2) o Estado do Paraná, que possui a permissão de uso do local e requer agora a reintegração de posse, tem, antes de tudo, a obrigação de garantir e promover os direitos humanos das famílias acampadas, podendo tornar-se violador de direitos, se não adotados os procedimentos adequados a cada situação fática e também o Município, que ora ocupa o polo ativo desta demanda, possui obrigação com as famílias que ocupam seu território, independentemente do local onde se encontrem; (g2) o Estado do Paraná, requerente nesta ação, tem em sua estrutura, a Comissão de Mediação de Conflitos Fundiários, criada pelo Decreto nº 10.438, de caráter consultivo e opinativo, com atribuições relacionadas à solução consensual envolvendo os conflitos fundiários; (h2) na presente ação, referido órgão sequer foi acionado pelo requerente - o próprio Estado do Paraná - que não demonstrou qualquer preocupação com a violação de direitos envolvida, na reintegração de posse pleiteada; (i2) necessário que sobrevenha nova sentença, a fim de que se produzam as provas necessárias, que incluem o cadastramento das famílias residentes no local; (j2) a moradia é um direito fundamental previsto na Constituição Federal, a qual, em seu art. 23, IX, estabelece que a promoção de programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico é de competência comum da União, dos Estados e dos Municípios; (k2) na Região Metropolitana de Curitiba e na Cidade de Campo Magro há um preocupante déficit habitacional, de modo que não é possível utilizar o argumento de que eventual regularização da ocupação, caso se conclua pela sua viabilidade urbanística e ambiental, viria a afrontar supostas filas para moradia; (l2) ainda que se considerem eventuais cadastros existentes nos órgãos estaduais, deve-se considerar que as pessoas inscritas em cadastros habitacionais aguardam serem contempladas situações habitacionais que implicam em diversas formas de vulnerabilidade, pelo que a “ordem de chegada” ou o conhecimento da existência e inscrição em um cadastro habitacional, não são os fatores que determinam a priorização de atendimento; (m2) no caso de Campo Magro, consulta realizada pelo CAOP do Meio Ambiente aos dados da Secretaria do Tesouro Nacional, constata-se que o Município não destina nenhum recurso orçamentário para a habitação desde o ano de 2015; (n2) esse fato, liado à inexistência de programa federal para moradias de habitação, pode gerar situação de caos, caso haja o cumprimento da reintegração de posse ora aventada, com o desamparo de famílias, sem alternativas orçamentárias para que sejam contempladas com a produção de novas unidades por meio da política pública de habitação; (o2) é por conta desse sensível panorama que se entende ser o objeto transcendente à mera análise de requisitos acerca da ação possessória e instala-se na busca de solução pacífica dos interesses coletivos, já que envolve mais de cinco mil pessoas, integrantes de famílias de extrema vulnerabilidade, contando com crianças, pessoas com deficiência e idosos, além de haver a presença de migrantes oriundos da Venezuela e do Haiti; (p2) além da reintegração de posse, nos mesmos autos o Poder Público deve se organizar para planejar o destino dessas famílias e, em eventual remoção forçada, medida excepcional, deve ser estabelecida de forma participativa e humanizada; (q2) o Poder Público deve promover projeto disponível com antecedência, em idioma e dialeto das pessoas que serão atingidas, em linguagem acessível e buscar o menor impacto possível, sendo que a primeira medida para iniciar esse projeto seria a realização de diagnóstico, mediante mapeamento das pessoas atingida; (r2) caso não seja anulada a sentença para promover a instrução processual, o Ministério Público requer seja o direito à moradia adequada vinculado à decisão de reintegração da posse, determinando-se ao Estado do Paraná a promoção de diligências, mediante a apresentação de planejamento da desocupação forçada e a indicação de destinação dos requeridos, a fim de evitar que seus direitos fundamentais sejam violados.Concomitantemente, o Órgão Ministerial protocolou nesta Corte pedido autônomo de concessão de efeito suspensivo, que foi autuado sob o nº 63157-28.2020.8.16.0000 e distribuído a esta Relatora por prevenção ao Agravo de Instrumento nº 31518-89.2020.8.16.0000 (mov. 4.1 – TJ).O efeito almejado foi deferido (mov. 11.1 – TJ), sendo subsequentemente rejeitado o pedido de revogação da medida, formulado pelo Estado do Paraná (mov. 31.1 – TJ).Na origem, houve a apresentação de contrarrazões pelo Estado do Paraná (mov. 530.1) e pela Fundação de Ação Social de Curitiba (movs. 535.1 e 539.1) que suscitou preliminarmente a falta de interesse recursal do Ministério Público.Encaminhados os autos recursais a esta Corte, vieram distribuídos por prevenção a esta Relatora (mov. 3.1 – AC).Em seguida, determinou-se a retificação da autuação junto ao sistema Projudi, bem como a abertura de vista à douta Procuradoria-Geral de Justiça (mov. 24.1 – AC).O Órgão Ministerial apresentou parecer, deliberando pelo provimento do apelo (mov. 51.1 – AC).Intimadas, as partes envolvidas apresentaram suas manifestações (movs. 75 a 79 – AC).Determinou-se, na sequência, a remessa dos autos ao Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania do 2º Grau (CEJUSC), a fim de ser intentada a solução consensual da lide (mov. 81.1 – AC).A partir de então, foram realizadas várias audiências de conciliação, das quais participaram as partes e também terceiros, sendo que as deliberações foram acompanhadas pela Comissão de Conflitos Fundiários deste Tribunal.Na última deliberação ocorrida (mov. 372.1), acordou-se a criação de uma Grupo de Trabalho, que funcionará no âmbito do CEJUSC Fundiário, com o objetivo de estudar as soluções possíveis para o caso. Na mesma ocasião, determinou-se o retorno dos autos recursais a esta Relatora, para os devidos fins.É a breve exposição.
VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO:1. Preliminarmente1.1. UnirrecorribilidadeEm análise à tramitação processual, observa-se que a parte requerida interpôs, sequencialmente, dois Recursos de Apelação idênticos (movs. 474.1 e 475.1).É cediço que em face de uma mesma decisão é admissível a interposição de apenas um recurso por cada parte interessada, sob pena de violação ao princípio da unirrecorribilidade/singularidade.Assim se posiciona o Superior Tribunal de Justiça: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DUPLICIDADE DE AGRAVOS. PRINCÍPIO DA UNIRRECORRIBILIDADE RECURSAL. PUBLICAÇÃO DA PAUTA. RECURSO APRESENTADO EM MESA. INTEMPESTIVIDADE DO RECURSO ESPECIAL. INOBSERVÂNCIA DO PRAZO LEGAL DE 15 DIAS CORRIDOS. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. A interposição de dois agravos regimentais idênticos implica não conhecimento do interposto em segundo lugar, em nome do princípio da unirrecorribilidade recursal. 2. Nos termos do art. 159 do RISTJ, não cabe sustentação oral no julgamento de agravo regimental, o qual independe de prévia publicação da pauta para a intimação das partes, além de ser apenas apresentado em mesa. 3. É intempestivo o recurso especial interposto após o prazo de 15 dias da publicação do acórdão recorrido, consoante o art. 1.003, § 5º, do CPC. 4. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp n. 1.577.482/RJ, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 17/8/2021, DJe de 25/8/2021.) (grifou-se)Desse modo, tendo sido apresentados dois recursos pela mesma parte em face da mesma decisão, o não conhecimento do recurso subsequente é a correta medida a ser imposta.No caso, observa que os apelos em comento são idênticos, o que permite constatar a inexistência de qualquer prejuízo à parte, pelo que se dispensou a realização de intimação prévia nos termos do art. 10 do Código de Processo Civil.Portanto, uma vez manifestado o interesse em recorrer, restou exercido o direito de debater a sentença enfrentada, concluindo-se pelo não conhecimento do Recurso de Apelação interposto ao mov. 475.1.1.2. Interesse recursal do Ministério PúblicoEm suas contrarrazões, a Fundação da Ação Social suscita a ausência de interesse recursal do Ministério Público, ao fundamento de que a sentença de procedência apenas garantiu a tutela do patrimônio público e do meio ambiente equilibrado, bens jurídicos cuja proteção fazem parte da missão institucional do Parquet.Sem razão, contudo.É evidente o interesse recursal do Ministério Público, que atua no processo como fiscal da ordem jurídica, dado o inequívoco interesse social envolvido na lide, que contempla a pretensão de remoção de mais de mil famílias do local em que habitam.Da leitura das razões recursais apresentadas pelo Parquet, fica clara a preocupação com a garantia dos direitos humanos e fundamentais dos ocupantes, o que igualmente integra a missão institucional do Órgão Ministerial.Com efeito, o entendimento jurisprudencial vem se firmando no sentido de ser obrigatória a intervenção do Ministério Público em demandas que envolvem o conflito coletivo pela posse.A propósito, o seguinte precedente do egrégio Superior Tribunal de Justiça:AGRAVO INTERNO NO CONFLITO DE COMPETÊNCIA. CONFLITO NEGATIVO INSTAURADO ENTRE JUÍZOS ESTADUAL E FEDERAL. INTERESSE JURÍDICO DA UNIÃO AFASTADO PELA JUSTIÇA FEDERAL. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME DA REFERIDA DECISÃO PELO JUÍZO ESTADUAL. INCIDÊNCIA SÚMULAS 150, 224 E 254/STJ. PRECEDENTES DO STJ. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. JULGAMENTO DE PLANO. POSSIBILIDADE. ARTIGO 955, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC/15. SÚMULA 568/STJ. HIPÓTESES DE INTIMAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. NÃO EVIDENCIADAS NO PRESENTE CONFLITO. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.1. Trata-se de conflito negativo de competência suscitado pelo ora agravante em face do Juízo Federal da Vara de Passos - SJ/MG e do Juízo de Direito da 2ª Vara Cível de Piumhi/MG, na ação de reintegração de posse ajuizada por Furnas Centrais Elétricas, S/A.2. Com fundamento na orientação contida no artigo 955, parágrafo único, inciso I, do CPC/15, e na Súmula 568/STJ, cabível o julgamento monocrático do conflito, tendo em vista a existência de precedentes acerca da questão discutida.3. Nos termos do artigo 178, do CPC/15, o Ministério Público será intimado para intervir como fiscal da ordem jurídica nas hipóteses previstas em lei ou na Constituição Federal e nos processos que envolvam interesse público ou social e litígios coletivos pela posse de terra rural ou urbana, o que não ocorre no caso.4. Tendo o Juízo Federal reconhecido a ilegitimidade da União para figurar no polo passivo do litigio, é de rigor o processamento e julgamento da demanda pelo Juízo Estadual.5. Aplicação do entendimento firmado nas Súmulas 150, 224 e 254 do STJ.6. AGRAVO INTERNO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.(AgInt no CC n. 179.360/MG, relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Segunda Seção, julgado em 29/6/2021, DJe de 1/7/2021.)Igualmente, as Cortes Estaduais, inclusive este egrégio Tribunal:AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. CONFLITO COLETIVO. PESSOAS HIPOSSUFICIENTES. CITAÇÃO. INVÁLIDA. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO E DA DEFENSORIA PÚBLICA. O conflito possessório coletivo que tenha no polo passivo um grande número de pessoas hipossuficientes evidencia uma especial relevância social, exigindo, por imposição legal, a participação obrigatória do Ministério Público, para ciência e acompanhamento de todos os atos do processo, assim como a presença da Defensoria Pública, em virtude da hipossuficiência econômica dos litigantes interessados. Somente em hipóteses excepcionais de concessão de tutela de urgência e, mesmo assim, apenas em casos nos quais não se pode aguardar pela manifestação prévia do demandado, é possível atingir seu patrimônio, antes de chamá-lo a se defender nos autos, por intermédio da citação válida. (TJMG - Agravo de Instrumento-Cv 1.0000.19.168022-2/001, Relator(a): Des.(a) Vicente de Oliveira Silva , 20ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 19/08/2020, publicação da súmula em 20/08/2020) (grifou-se)AGRAVO DE INSTRUMENTO – CONCESSÃO DE LIMINAR DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE – LITÍGIO COLETIVO PELA POSSE DO IMÓVEL – INDÍCIOS NO SENTIDO DE SE TRATAR DE OCUPAÇÃO INICIADA HÁ MAIS DE ANO E DIA – NECESSIDADE DE DESIGNAÇÃO DE AUDIÊNCIA DE MEDIAÇÃO, COM INTIMAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO E DA DEFENSORIA PÚBLICA, DIANTE DA PARTICIPAÇÃO DE PARTE BENEFICIÁRIA DE GRATUIDADE DA JUSTIÇA (EXEGESE DO ARTIGO 565 DO CPC) – REQUISITOS OBJETIVOS PREVISTOS NO ART. 561 DO CPC – NÃO PREENCHIDOS – EXERCÍCIO DA POSSE PELO AUTOR - NÃO VERIFICADO, DE PLANO - TÍTULO DE PROPRIEDADE QUE NÃO SE EQUIPARA AO EXERCÍCIO POSSESSÓRIO – REQUISITOS DA TUTELA DE URGÊNCIA – NÃO DEMONSTRADOS – PRINCÍPIO DA CONSERVAÇÃO DO FÁTICO - REVOGAÇÃO DA DECISÃO INTERLOCUTÓRIA. 1. De acordo com a sistemática atual do CPC, no litígio coletivo pela posse (velha) de imóvel, a concessão de liminar depende de audiência prévia de mediação, com a intimação do Ministério Público e da Defensoria Pública, sempre que houver parte beneficiária de gratuidade da justiça. 2. Diante da controvérsia a respeito da ocorrência de esbulho possessório a embasar a liminar - requisito exigido pelos arts. 561 e 562 do Código de Processo Civil -, deve ser preservada a situação fática consolidada, com base no princípio do status quo. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJPR - 17ª Câmara Cível - 0011542-67.2018.8.16.0000 - Araucária - Rel.: DESEMBARGADORA ROSANA AMARA GIRARDI FACHIN - J. 22.11.2018)Assim, por ser nítida a intenção de proteção do direito de uma coletividade composta por pessoas vulneráveis, rejeita-se a preliminar.Presentes, portanto, os pressupostos de admissibilidade intrínsecos (legitimidade, interesse, cabimento e inexistência de fato impeditivo ou extintivo) e extrínsecos (tempestividade e regularidade formal, dispensado o preparo em relação ao Ministério Público e aplicada a gratuidade em relação aos requeridos), é de se conhecer de ambos os recursos interpostos.2. MéritoAdianta-se que, em razão de ambas as insurgências recursais veicularem pretensões convergentes – seja no intuito de anular a sentença recorrida, seja no de reformá-la, ou então de se observarem determinados preceitos no caso de cumprimento da reintegração –, a análise recursal se dará de modo conjunto.2.1. Síntese fáticaTrata-se, na origem, de Ação de Reintegração de Posse proposta pelo Estado do Paraná contra José Souza dos Santos e outros, sendo que a lide versa sobre a ocupação coletiva de imóvel público.Aduziu ser parte legítima para figurar no polo ativo, como possuidor do imóvel em questão, cedido ao Estado do Paraná pelo Município de Curitiba pelo Decreto nº 1971/2012, “o qual seria destinado preferencialmente para implementação de vários projetos sob a responsabilidade da Secretaria de Estado da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos, pelo prazo de 20 anos”.No mérito, sustentou que, “conforme os Boletins de Ocorrência juntados aos autos (doc. 02 e doc. 03), na data de 23.05.2020, houve a tentativa de ocupação do imóvel denominado ‘Fazenda Solidariedade’, localizado no Município de Campo Magro”. Acrescenta que “a Polícia Militar compareceu ao local e solicitou a desocupação do imóvel, ressaltando que, em caso de permanência, estaria configurado o crime de esbulho possessório” e “voluntariamente, os ocupantes deixaram o imóvel, a maioria em seus veículos e uma parte com o ônibus do Município de Campo Magro, que foi solicitado pelos policiais militares presentes na ocasião”.Narrou o requerente que “em 26.05.2020 houve nova invasão, agora com um número maior de pessoas, com a presença de advogados e representantes de movimentos sociais”. Alegou que “na data de 01.06.2020 foi encaminhado pelo Município de Campo Magro ao escritório regional da SEJUF/PR o ofício n. 102/2020, informando que o imóvel denominado ‘Fazenda Solidariedade’, com área de 1.017.666,73 m² e propriedade da Fundação de Ação Social de Curitiba – FAS, foi invadido por cerca de quatrocentas pessoas”. O requerente sustentou, ainda, que, “conforme comprovam os documentos 05 a 11, nas fotografias se veem os danos ambientais (queimadas) e aglomerações de pessoas (proibidas pelo Decreto Estadual 4230/2020), além de um grande número de veículos, o que comprova a inexistência de hipossuficiência dos ocupantes”.O autor afirmou que, assim, está configurado o esbulho possessório, pelo que pugnou pela reintegração na posse do imóvel.Diante das peculiaridades do caso, o juízo singular determinou a realização de audiência de mediação (mov. 7.1).A seguir, o autor manifestou-se novamente nos autos, informando que as lideranças da ocupação teriam descumprido acordo realizado com o Ministério Público em 03.06.2020, razão pela qual reiterou o pedido de deferimento da liminar de reintegração de posse.Sobreveio a decisão interlocutória de mov. 32.1, em que foi deferido parcialmente o pedido liminar para “determinar que os requeridos, bem como o movimento que representam e todos os ocupantes da área em litígio, cessem toda e qualquer construção no local, seja de alvenaria, madeira ou lona, bem como desfaçam aquelas já edificadas e, também, interrompam a ampliação da área de desmate e do parcelamento do solo”. Consignou-se, ainda, que “os requeridos deverão, ainda, adotar as medidas necessárias para que não ocorra o ingresso e permanência de novas famílias no local em litígio” e que “a interrupção das edificações e do desmate deverá se dar de imediato, ao passo que o desfazimento das obras já realizadas deve ocorrer até às 18:00h do dia 11/06/2020, sob pena de cumprimento imediato da liminar de reintegração de posse em favor do Estado do Paraná e cancelamento da audiência de mediação”.Os requeridos interpuseram Agravo de Instrumento, autuado nesta Corte sob o nº 31518-89.2020.8.16.0000 e distribuído a esta Relatora, que deferiu o pedido liminar de suspensão dos efeitos da decisão referida unicamente quanto à ordem de desfazimento das construções já edificadas no local.Posteriormente, em 17 de junho, as partes firmaram acordo em audiência de mediação (mov. 103.1).A seguir, o Estado do Paraná manifestou-se nos autos noticiando o descumprimento do acordo pelos requeridos (mov. 155.1). Pugnou, então, pelo deferimento da liminar de reintegração de posse.Os requeridos manifestaram-se ao mov. 181.1, alegando não haver descumprimento do acordo firmado entre as partes.O juízo singular, assim, proferiu a decisão interlocutória, em que foi reconhecido o descumprimento da avença pelos requeridos e, por conseguinte, deferido o pedido liminar de reintegração de posse formulado pelo Estado do Paraná.Inconformados, os requeridos interpuseram o Agravo de Instrumento autuado sob o nº 36317-78.2020.8.16.0000, no bojo do qual foi concedida a antecipação de tutela por esta Relatora, para o fim de suspender os efeitos da decisão agravada. Posteriormente, o julgamento do mérito recursal restou prejudicado, diante da prolação de sentença pelo juízo de primeiro grau (mov. 404.1).Irresignados, os requeridos interpuseram Recurso de Apelação (mov. 474.1), buscando a declaração de nulidade da citação, ou, subsidiariamente, a declaração e nulidade da sentença recorrida, por cerceamento de defesa. Superadas essas questões, pugnaram pelo provimento do apelo, a fim de julgar improcedentes os pedidos iniciais.O Ministério Público também interpôs Apelação (mov. 498.1), visando a anulação da sentença proferida, ou, em caso de desocupação forçada, garantir a inviolabilidade dos direitos fundamentais dos requeridos.Concomitantemente à interposição recursal, o Órgão Ministerial protocolou pedido autônomo de concessão de efeito suspensivo, o qual restou concedido por esta Relatora (mov. 11.1 – autos nº 63157-28.2020.8.16.0000).Com a chegada dos autos recursais a esta egrégia Corte de Justiça, iniciaram-se tratativas visando uma solução consensual para o conflito fundiário instaurado.Após diversas audiências envolvendo as partes, o Poder Público e terceiros, acordou-se a instituição de um Grupo de Trabalho, a fim de estudar a melhor solução para o caso, sob a coordenação da Desª Ana Cláudia Finger e com a participação do Município de Campo Magro, do MPPR, da PGE, da SUDIS, dos advogados das partes, do Movimento Popular por Moradia, da DPE, da UFPR, do Município de Curitiba, da COHAPAR, da AMEP, do IAT, da Câmara Técnica do KARST, do INCRA e do Ministério das Cidades.Com isso, determinou-se o retorno dos autos a esta Relatoria, para os devidos fins.2.2. Nulidade de citaçãoEm seu apelo, a parte requerida sustenta a ocorrência de nulidade de citação, em virtude da não observância da sistemática prevista no art. 554, §§ 1º e 2º, do Código de Processo Civil (CPC).Adianta-se que a nulidade não deve ser declarada na presente hipótese.A norma processual em comento preceitua que em, “ação possessória em que figure no polo passivo grande número de pessoas, serão feitas a citação pessoal dos ocupantes que forem encontrados no local e a citação por edital dos demais, determinando-se, ainda, a intimação do Ministério Público e, se envolver pessoas em situação de hipossuficiência econômica, da Defensoria Pública”.Em sequência, especifica que, ao cumprir tal desiderato, “o oficial de justiça procurará os ocupantes no local por uma vez, citando-se por edital os que não forem encontrados”.No caso em análise, observa-se da tramitação processual que, de fato, não houve estrita observância do procedimento acima exposto, já que se procedeu à citação por oficial de justiça dos ocupantes inseridos no polo passivo (movs. 46 a 50), sem que se tenha procedido à citação editalícia dos demais ocupantes.A despeito disso, em vista das particularidades da lide e dos cuidados tomados pelo juízo a quo, não se vislumbram prejuízos capazes de macular a validade do processo.É visível que a finalidade do procedimento citatório em comento é assegurar a observância do direito ao contraditório dos eventuais ocupantes, a serem atingidos pelas decisões proferidas no litígio coletivo da posse.No despacho inicial (mov. 7.1), ao ser determinada a realização da audiência de mediação prevista no art. 565 do CPC, consignou-se que a defesa dos vulneráveis foi incumbida à Defensora Pública designada para atuar na presente lide (Dra. Olenka Rocha), a qual, ressalta-se, foi intimada para acompanhamento dos autos já nesta primeira oportunidade.No caso, esse resguardo cumpriu a finalidade prevista na norma alegadamente violada, pois o ato subsequente à citação editalícia – prevendo-se a incontornável revelia de ao menos algum dos ocupantes indeterminados – seria justamente a designação de um Defensor Público para atuação nos autos, o que, em conclusão, foi observado.Ademais, pelo que se extrai da conjuntura do feito, há a participação dinâmica do Movimento Popular por Moradia no presente caso, exercendo uma espécie de liderança da ocupação. Nesse contexto, em que pese não represente oficialmente todos os ocupantes, sem dúvida desempenha o necessário intermédio no intuito de estabelecer a divulgação da lide perante os ocupantes.Nesse sentido, os seguintes precedentes do egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em situações semelhantes:AGRAVO DE INSTRUMENTO. LITÍGIO COLETIVO PELA POSSE. DECISÃO AGRAVADA QUE, EM ATENÇÃO ÀS DELIBERAÇÕES TOMADAS EM AUDIÊNCIA, DETERMINOU A EXPEDIÇÃO DO MANDADO LIMINAR DE REINTEGRAÇÃO POSSESSÓRIA. MATÉRIA PRELIMINAR. ARGUIÇÃO DE NULIDADE PROCESSUAL, CALCADA NA TESE DE AUSÊNCIA DE CHAMAMENTO PESSOAL DOS MORADORES ENCONTRADOS NA ÁREA EM DEBATE. QUESTÃO QUE AINDA PENDE DE APRECIAÇÃO POR PARTE DO DOUTO JUÍZO A QUO. IMPOSSIBILIDADE DE IMEDIATA INCURSÃO, POR ESTA CORTE, SOBRE TAL TEMÁTICA. RISCO DE SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA E DE AFRONTA AO PRINCÍPIO DO DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO. PRECEDENTES. PRELIMINAR NÃO CONHECIDA. MÉRITO. DECISÃO SUPERVENIENTE, PROLATADA EM PRIMEIRO GRAU, QUE DETERMINOU O CANCELAMENTO DA EXECUÇÃO DA MEDIDA REINTEGRATÓRIA. PERDA DO OBJETO RECURSAL NO TOCANTE AO ALUDIDO TEMA. ESTRITO ATENDIMENTO, COMO QUER QUE SEJA, AO DESFECHO CONFERIDO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 2227010-69.2021.8.26.0000, JÁ TRANSITADO EM JULGADO, POR MEIO DO QUAL ESTA TURMA JULGADORA CONFIRMOU A DECISÃO QUE DEFERIRA O PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA PARA DETERMINAR A REINTEGRAÇÃO DA AUTORA NA POSSE DO IMÓVEL EM COMENTO, CONDICIONANDO O SEU CUMPRIMENTO, NO ENTANTO, À REALIZAÇÃO DA "AUDIÊNCIA DE QUE TRATA O ART. 565, §§2º A 4º, DO CPC". AUDIÊNCIA REGULARMENTE REALIZADA NA ORIGEM, CONTANDO COM A EFETIVA PRESENÇA DAS PARTES, DA DEFENSORIA PÚBLICA, DO MINISTÉRIO PÚBLICO E DOS ÓRGÃOS RESPONSÁVEIS PELA POLÍTICA URBANA E ASSISTENCIAL. ADOÇÃO DE MEDIDAS SUFICIENTES PARA RESGUARDAR OS DIREITOS DOS OCUPANTES, DIANTE DA REDE DE APOIO CONSTITUÍDA PELAS SECRETARIAS MUNICIPAIS DE HABITAÇÃO, EDUCAÇÃO E DE DIREITOS HUMANOS, ALÉM DO CENTRO DE REFERÊNCIA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E DO CONSELHO TUTELAR, ATUANTES NO CASO. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS CONCRETOS EXTRAÍVEIS DOS AUTOS QUE APONTEM PARA EVENTUAL DESASSISTÊNCIA DOS MORADORES INSTALADOS NO LOCAL SUB JUDICE. DESNECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE NOVA AUDIÊNCIA. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA CELERIDADE E DA ECONOMIA PROCESSUAIS, BEM COMO DA COISA JULGADA FORMADA NO ÂMBITO DO CITADO AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 2227010-69.2021.8.26.0000. REJEIÇÃO DO INCONFORMISMO, NA EXTENSÃO PASSÍVEL DE CONHECIMENTO, QUE É MEDIDA DE RIGOR. CONCLUSÃO. DECISÃO MANTIDA. PRELIMINAR NÃO CONHECIDA. NO MÉRITO, RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, DESPROVIDO. (TJSP; Agravo de Instrumento 2262471-68.2022.8.26.0000; Relator (a): Jonize Sacchi de Oliveira; Órgão Julgador: 24ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional IX - Vila Prudente - 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 28/02/2023; Data de Registro: 28/02/2023) (grifou-se)APELAÇÃO – AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE – OCUPAÇÃO DE ÁREA DE NATUREZA PÚBLICA - SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA – OFENSA AO ARTIGO 554, § 1º, DO CPC – INOCORRÊNCIA – DEFENSORIA PÚBLICA QUE APRESENTOU CONTESTAÇÃO, MANIFESTOU-SE SOBRE AS PROVAS A SEREM PRODUZIDAS E APELOU – AUSÊNCIA DE PREJUÍZO AOS OCUPANTES QUE TIVERAM SEUS INTERESSES DEFENDIDOS – FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL NÃO VERIFICADA – NECESSIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL DIANTE DA PRETENSÃO DEDUZIDA – LIMINAR CONCEDIDA E NÃO EXECUTADA NO PRAZO DE UM ANO – AUSÊNCIA DE DESIGNAÇÃO DE AUDIÊNCIA DE MEDIAÇÃO NA FORMA DO ARTIGO 565, § 1º, DO CPC – NULIDADE CONFIGURADA – PRECEDENTES – RECURSOS PROVIDOS. (TJSP; Apelação Cível 0007103-04.2011.8.26.0348; Relator (a): Maria Olívia Alves; Órgão Julgador: 6ª Câmara de Direito Público; Foro de Mauá - 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 07/12/2021; Data de Registro: 07/12/2021) (grifou-se)Cumpre pontuar, outrossim, que no atual estado fático da ocupação, a declaração de nulidade do julgado para se determinar o procedimento citatório acima exposto (citação pessoal dos presentes e editalícia dos demais) mostrar-se-ia inócua, diante do contexto narrado.Desse modo, por não se vislumbrar efetivo prejuízo, deixa-se de acolher a alegação de nulidade.2.3. Cerceamento de defesaA despeito dos valorosos fundamentos trazidos por ambos os recorrentes, merece igualmente rejeição a alegação de nulidade por cerceamento de defesa.Conforme regra estampada no artigo 370, caput e § 1º, do Código de Processo Civil, “caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito”, podendo indeferir “as diligências inúteis ou meramente protelatórias”.No caso em debate, a solução dada pelo Meritíssimo Juiz sentenciante prescindiu da necessidade de dilação probatória. Isso porque, como relatado, a análise meritória ateve-se ao cumprimento dos requisitos estabelecidos no art. 561 do CPC e, nesse estrito contexto, os fatos se mostram incontroversos. O exercício possessório pelo ente público decorre da lei, da própria condição de imóvel integrante do patrimônio público, ao passo que o esbulho é incontroverso.Nesse tocante, observa-se que houve fundamentação expressa na decisão recorrida: DO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE O feito comporta julgamento antecipado, nos termos do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil, vez que as teses aventadas pelas partes abrangem questões de direito ou dizem respeito a fatos já evidenciados pela documentação contida nos autos. Oportuno registrar que, no que tange à produção de prova documental, mais especificamente ao relatório de levantamento social das famílias ocupantes da área, tem-se que seja prescindível ao julgamento do feito. A verificação da situação de vulnerabilidade dos demandados, seu número exato e local de origem, apesar da relevância de que se reveste no plano social, diz respeito a questões marginais ao mérito da demanda, na qual se discute apenas e tão somente a posse do bem. Além disso, em relação à perícia, cuida-se de prova que, igualmente, nada contribuiria para o deslinde da controvérsia, haja vista que a aferição dos eventuais impactos ambientais advindos da continuidade da ocupação escapa nitidamente aos limites objetivos e subjetivos da lide em pauta. Atente-se que, como já exposto, as questões levantadas pelos demandados, pela nobre Defensoria Pública e pelo Ministério Público, de fato assumem especial relevância, porém não se tomado por base o ponto controvertido desta ação possessória. As provas requeridas talvez tivessem razão de ser em sede de ação civil pública movida contra os proprietários e possuidores do imóvel, todavia não existe razão alguma para que sejam produzidas no bojo da presente demanda, em que o objeto é pura e simplesmente a verificação do cumprimento dos requisitos do artigo 561, do Código de Processo Civil. Já no que concerne ao pedido de produção de prova oral deduzido pelos demandados, por se tratar de esbulho de imóvel público e em face da conjuntura fática retratada nos autos pela documentação que acompanha a inicial, verifica-se que nem mesmo por hipótese o depoimento de testemunhas alteraria a conclusão que será exposta quando da análise do mérito. Sendo assim, porque não alegada matéria de fato que demande produção de outras provas além daquelas já constantes nos autos, revela-se pertinente o julgamento antecipado. Destaca-se que as demais diligências probatórias listadas nos recursos – relacionadas à vulnerabilidade social dos ocupantes, ao estado de abandono do bem, ao cumprimento da função social, ao cadastramento dos ocupantes para inserção em programas de moradia e à necessidade de observância de preceitos de direitos sociais e humanos na solução a ser adotada – avançaram em certa medida quando da remessa dos autos ao CEJUSC Fundiário e estão sendo aperfeiçoadas no bojo do Grupo de Trabalho instituído nesta Corte. Dessa forma, não subsiste fundamento para a declaração de nulidade da sentença para retorno dos autos à origem a fim de se adotar tais diligências.Assim, há que se rejeitar a preliminar de cerceamento de defesa arguida.2.4. Reintegração de posseCinge-se o mérito da controvérsia recursal à sentença que julgou procedente o pedido inicial formulado pelo ente estatal, para o fim de determinar sua reintegração na posse da área litigada.Adianta-se que a pretensão de reforma da sentença merece acolhimento, como se passa a expor.Ressalta-se que, pelo que se extrai dos autos, mais de mil famílias ocupam a área discutida, totalizando cerca de cinco mil pessoas, dentre as quais se inserem crianças, idosos e refugiados. O local se constituiu em um verdadeiro bairro, contando com vias de acesso e transição, tendo sido instalado comércio e outras comodidades.Não se ignora os conceitos clássicos acerca da posse e domínio dos bens públicos, os quais são inalienáveis (exceto se desafetados), imprescritíveis e impenhoráveis (arts. 100, 102 e 1.420 do Código Civil).Ocorre que o caso em análise, em virtude de suas particularidades, atrai a necessidade de se relativizar tais conceitos, de modo a se adotar uma solução mais consentânea aos preceitos constitucionais da função social da propriedade e da dignidade da pessoa humana.A esse respeito, veja-se a pertinente exposição do Ministro Gilmar Mendes no julgamento da Ação Cível Originária nº 1.602:Nossa Lei Maior, a par de consagrar a garantia institucional do direito de propriedade no art. 5º, XXII (é garantido o direito de propriedade), estabeleceu, logo no inciso seguinte, que a propriedade atenderá a sua função social (art. 5º, XXIII, da CF).A função social da propriedade – e, portanto, sua vinculação a um determinado fim social – assume relevo no estabelecimento da conformação ou limitação do direito.Assim, essencial para a definição e qualificação da propriedade passa a ser a “utilidade privada” (Privatnutzigkeit) do direito patrimonial, isto é, a relação desse direito patrimonial com o titular. Desse modo, o conceito constitucional de proteção ao direito de propriedade transcende à concepção privatística estrita, abarcando outros valores não só de índole patrimonial.Essa orientação permite que se confira proteção constitucional não só à propriedade privada em sentido estrito mas, fundamentalmente, às demais relações daí advindas, pois o direito de propriedade acaba por ter relação com outros direitos, tais como a dignidade da pessoa humana, a liberdade de profissão, o direito adquirido, a liberdade de construir, (...)No caso citado, ponderou-se e concluiu-se pela impossibilidade de concessão de reintegração de posse ao INSS, referente a um imóvel de sua propriedade, no qual havia sido instalada uma escola pública. Uma questão interessante pontuada, que, nas devidas proporções, se aplica ao presente caso, reside na indagação de qual finalidade pública seria dada ao bem objeto do pedido de reintegração. Naquele caso, vislumbrou-se que a retomada da posse pela autarquia federal traria mais danos à sociedade do que benefícios ao interesse público buscado (preservação do rol patrimonial da autarquia federal).Na presente hipótese, contempla-se qual finalidade será dada ao imóvel cedido em favor do Estado do Paraná em 2012, que nunca foi utilizado para o escopo previsto no instrumento celebrado (mov. 1.2), inclusive em relação ao qual tentou-se, sem sucesso, proceder à devolução ao cedente no ano de 2018 (mov. 1.1, fl. 5).Assim, ponderando-se os direitos constitucionais envolvidos – de um lado, o direito à propriedade e a inafastabilidade do interesse público e, de outro, a dignidade da pessoa humana, o direito à moradia e o cumprimento da função social –, conclui-se que na particular hipótese dos autos deve prevalecer a ocupação realizada no imóvel debatido.Vale ressaltar que em casos semelhantes ao ora discutido, porém envolvendo bens privados, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu pela manutenção da situação de moradia consolidada, indicando ser imperiosa uma solução adversa à pretensão possessória. Veja-se:PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. CASO CONCRETO. IMPOSSIBILIDADE. INVASÃO DO IMÓVEL POR MILHARES DE FAMÍLIAS DE BAIXA RENDA. OMISSÃO DO ESTADO EM FORNECER FORÇA POLICIAL PARA O CUMPRIMENTO DO MANDADO JUDICIAL. APOSSAMENTO ADMINISTRATIVO E OCUPAÇÃO CONSOLIDADA. AÇÃO REINTEGRATÓRIA. CONVERSÃO EM INDENIZATÓRIA. POSTERIOR EXAME COMO DESAPROPRIAÇÃO JUDICIAL. SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO E SOCIAL SOBRE O PARTICULAR. INDENIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE DO ESTADO E DO MUNICÍPIO. JULGAMENTO EXTRA PETITA E REFORMATIO IN PEJUS. NÃO OCORRÊNCIA. LEGITIMIDADE AD CAUSAM. JUSTO PREÇO. PARÂMETROS PARA A AVALIAÇÃO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. CÁLCULO DO VALOR. LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA.1. O Plenário do STJ decidiu que "aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça" (Enunciado Administrativo n. 2). 2. Hipótese em que a parte autora, a despeito de ter conseguido ordem judicial de reintegração de posse desde 1991, encontra-se privada de suas terras até hoje, ou seja, há mais de 2 (duas) décadas, sem que tenha sido adotada qualquer medida concreta para obstar a constante invasão do seu imóvel, seja por ausência de força policial para o cumprimento do mandado reintegratório, seja em decorrência dos inúmeros incidentes processuais ocorridos nos autos ou em face da constante ocupação coletiva ocorrida na área, por milhares de famílias de baixa renda.3. Constatada, no caso concreto, a impossibilidade de devolução da posse à proprietária, o Juiz de primeiro grau converteu, de ofício, a ação reintegratória em indenizatória (desapropriação indireta), determinando a emenda da inicial, a fim de promover a citação do Estado e do Município para apresentar contestação e, em consequência, incluí-los no polo passivo da demanda.4. O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido da possibilidade de conversão da ação possessória em indenizatória, em respeito aos princípios da celeridade e economia processuais, a fim de assegurar ao particular a obtenção de resultado prático correspondente à restituição do bem, quando situação fática consolidada no curso da ação exigir a devida proteção jurisdicional, com fulcro nos arts. 461, § 1º, do CPC/1973.5. A conversão operada na espécie não configura julgamento ultra petita ou extra petita, ainda que não haja pedido explícito nesse sentido, diante da impossibilidade de devolução da posse à autora, sendo descabido o ajuizamento de outra ação quando uma parte do imóvel já foi afetada ao domínio público, mediante apossamento administrativo, sendo a outra restante ocupada de forma precária por inúmeras famílias de baixa renda com a intervenção do Município e do Estado, que implantaram toda a infraestrutura básica no local, tornando-se a área bairros urbanos. 6. Não há se falar em violação ao princípio da congruência, devendo ser aplicada à espécie a teoria da substanciação, segundo a qual apenas os fatos vinculam o julgador, que poderá atribuir-lhes a qualificação jurídica que entender adequada ao acolhimento ou à rejeição do pedido, como fulcro nos brocardos iura novit curia e mihi factum dabo tibi ius e no art. 462 do CPC/1973.7. Caso em que, ao tempo do julgamento do primeiro grau, a lide foi analisada à luz do disposto no art. 1.228, §§ 4º e 5º, do CC/2002, que trata da desapropriação judicial, chamada também por alguns doutrinadores de desapropriação por posse-trabalho ou de desapropriação judicial indireta, cujo instituto autoriza o magistrado, sem intervenção prévia de outros Poderes, a declarar a perda do imóvel reivindicado pelo particular em favor de considerável número de pessoas que, na posse ininterrupta de extensa área, por mais de cinco anos, houverem realizado obras e serviços de interesse social e econômico relevante.8. Os conceitos abertos existentes no art. 1.228 do CC/2002 propiciam ao magistrado uma margem considerável de discricionariedade ao analisar os requisitos para a aplicação do referido instituto, de modo que a inversão do julgado, no ponto, demandaria o reexame do conjunto fático-probatório, providência vedada no âmbito do recurso especial, em face do óbice da Súmula 7 do STJ.9. Não se olvida a existência de julgados desta Corte de Justiça no sentido de que "inexiste desapossamento por parte do ente público ao realizar obras de infraestrutura em imóvel cuja invasão já se consolidara, pois a simples invasão de propriedade urbana por terceiros, mesmo sem ser repelida pelo Poder Público, não constitui desapropriação indireta" (AgRg no REsp 1.367.002/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 20/06/2013, DJe 28/06/2013). 10. Situação em que tal orientação não se aplica ao caso estudado, pois, diante dos fatos delineados no acórdão recorrido, não há dúvida de que os danos causados à proprietária do imóvel decorreram de atos omissivos e comissivos da administração pública, tendo em conta que deixou de fornecer a força policial necessária para o cumprimento do mandado reintegratório, ainda na fase inicial da invasão, permanecendo omissa quanto ao surgimento de novas habitações irregulares, além de ter realizado obras de infraestrutura no local, com o objetivo de garantir a função social da propriedade, circunstâncias que ocasionaram o desenvolvimento urbano da área e a desapropriação direta de parte do bem.. 11. O Município de Rio Branco, juntamente com o Estado do Acre, constituem sujeitos passivos legítimos da indenização prevista no art. 1.228, § 5º, do CC/2002, visto que os possuidores, por serem hipossuficientes, não podem arcar com o ressarcimento dos prejuízos sofridos pelo proprietário do imóvel (ex vi do Enunciado 308 Conselho da Justiça Federal). 12. Diante da procedência parcial da ação indenizatória contra a Fazenda Pública municipal, tem-se aplicável, além do recurso voluntário, o reexame necessário, razão pela qual não se vislumbra a alegada ofensa aos arts. 475 e 515 do CPC/1973, em face da reinclusão do Estado do Acre no polo passivo da demanda, por constituir a legitimidade ad causam matéria de ordem pública, passível de reconhecimento de ofício, diante do efeito translativo.13. A solução da controvérsia exige que sejam levados em consideração os princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e da segurança jurídica, em face das situações jurídicas já consolidadas no tempo, de modo a não piorar uma situação em relação à qual se busca a pacificação social, visto que "é fato público e notório que a área sob julgamento, atualmente, corresponde a pelo menos quatro bairros dessa cidade (Rio Branco), onde vivem milhares de famílias, as quais concedem função social às terras em litígio, exercendo seu direito fundamental social à moradia". 14. Os critérios para a apuração do valor da justa indenização serão analisados na fase de liquidação de sentença, não tendo sido examinados pelo juízo da primeira instância, de modo que não podem ser apreciados pelo Tribunal de origem, tampouco por esta Corte Superior, sob pena de supressão de instância.15. Recursos especiais parcialmente conhecidos e, nessa extensão, desprovidos.(REsp n. 1.442.440/AC, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 7/12/2017, DJe de 15/2/2018.)RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC/1973. NÃO OCORRÊNCIA. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. REQUISITOS DO ART. 927 DO CPC/1973 E 561 DO NOVO CPC. REALIDADE FÁTICA DO IMÓVEL MODIFICADA. IMÓVEL QUE SE TRANSFORMOU EM BAIRRO URBANO POPULOSO. IMPOSSIBILIDADE DE DESCONSIDERAÇÃO DA NOVA REALIDADE NA SOLUÇÃO DA CONTENDA. FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE E DA POSSE. DIREITO À MORADIA E MÍNIMO EXISTENCIAL. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. PONDERAÇÃO DE VALORES. NEGATIVA DA REINTEGRAÇÃO. POSSIBILIDADE DE CONVERSÃO DA PRESTAÇÃO ORIGINÁRIA EM ALTERNATIVA. ART. 461-A DO CPC/1973. RECURSO NÃO PROVIDO.1. "Havendo no acórdão declaração expressa quanto aos fatos e fundamentos que embasaram suas conclusões, não há como vislumbrar-se ofensa aos arts. 458 e 535, CPC, por negar-se o colegiado, em embargos declaratórios, a explicitar as razões pelas quais preferiu apoiar-se em certas provas, em detrimento de outras. O princípio do livre convencimento motivado é um dos postulados do nosso sistema processual". (Resp 50936/SP, DJ 19/09/94).2. O art. 927 do CPC/1973, reproduzido no art. 561 do novo diploma, previa competir ao autor da ação possessória de reintegração a comprovação dos seguintes requisitos: a posse; a turbação ou esbulho pela parte ré; a data da turbação ou do esbulho e a perda da posse.3. Ainda que verificados os requisitos dispostos no item antecedente, o julgador, diante do caso concreto, não poderá se furtar da análise de todas as implicações a que estará sujeita a realidade, na subsunção insensível da norma. É que a evolução do direito não permite mais conceber a proteção do direito à propriedade e posse no interesse exclusivo do particular, uma vez que os princípios da dignidade humana e da função social esperam proteção mais efetiva.4. O Supremo Tribunal Federal orienta que, tendo em vista a impossibilidade de haver antinomia entre normas constitucionais, sem a exclusão de quaisquer dos direitos em causa, deve prevalecer, no caso concreto, o valor que se apresenta consentâneo com uma solução razoável e prudente, expandindo-se o raio de ação do direito prevalente, mantendo-se, contudo, o núcleo essencial do outro. Para esse desiderato, recomenda-se a aplicação de três máximas norteadoras da proporcionalidade: a adequação, a necessidade e a proporcionalidade em sentido estrito.5. No caso dos autos, o imóvel originalmente reivindicado, na verdade, não existe mais. O bairro hoje, no lugar do terreno antes objeto de comodato, tem vida própria, dotado de infraestrutura urbana, onde serviços são prestados, levando-se à conclusão de que o cumprimento da ordem judicial de reintegração na posse, com satisfação do interesse da empresa de empreendimentos imobiliários, será à custa de graves danos à esfera privada de muitas famílias que há anos construíram suas vidas naquela localidade, fazendo dela uma comunidade, irmanada por idêntica herança cultural e histórica, razão pela qual não é adequada a ordem de reintegração.6. Recurso especial a que se nega provimento.(REsp n. 1.302.736/MG, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 12/4/2016, DJe de 23/5/2016.)Pela pertinência, destaca-se o seguinte excerto da fundamentação adotada pelo eminente Ministro Luiz Felipe Salomão no segundo dos precedentes citados:Nessa toada, em tema de ponderação de valores, o Supremo Tribunal Federal orienta que tendo em vista a impossibilidade de haver antinomia entre normas constitucionais, sem a exclusão de quaisquer dos direitos em causa, deve prevalecer, no caso concreto, o valor que se apresenta consentâneo com uma solução razoável e prudente, expandindo-se o raio de ação do direito prevalente, mantendo-se, contudo, o núcleo essencial do outro. Para esse desiderato, recomenda-se a aplicação de três máximas norteadoras da proporcionalidade: a adequação, a necessidade e a proporcionalidade em sentido estrito. Do voto proferido pelo Ministro Gilmar Mendes, na Intervenção Federal n. 2915-5/SP, julgada em novembro de 2003, retira-se preciosa doutrina: “O Judiciário não prolata sentenças simplesmente formais, sentenças que, sob o ângulo do conteúdo, mostram-se inúteis. É ele o responsável final pelo restabelecimento da paz social provisoriamente abalada, pela prevalência do arcabouço normativo constitucional, pelo equilíbrio nesse embate Estado-cidadão, evitando que forças direcionadas de forma momentânea e isolada venham a prevalecer, em detrimento de interesses da coletividade. (...) Diante desse conflito de princípios constitucionais, considero adequada a análise da legitimidade da intervenção a partir de sua conformidade ao princípio constitucional da proporcionalidade. O princípio da proporcionalidade, também denominado princípio do devido processo legal em sentido substantivo, ou ainda, princípio da proibição do excesso, constitui uma exigência positiva e material relacionada ao conteúdo de atos restritivos de direitos fundamentais, de modo a estabelecer um "limite do limite" ou uma "proibição de excesso" na restrição de tais direitos. A máxima da proporcionalidade, na expressão de Alexy, coincide igualmente com o chamado núcleo essencial dos direitos fundamentais concebido de modo relativo - tal como o defende o próprio Alexy. Nesse sentido, o princípio ou máxima da proporcionalidade determina o limite último da possibilidade de restrição legítima de determinado direito fundamental. A par dessa vinculação aos direitos fundamentais, o princípio da proporcionalidade alcança as denominadas colisões de bens, valores ou Documento: 1503673 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 23/05/2016 Página 1 3de 26 Superior Tribunal de Justiça princípios constitucionais. Nesse contexto, as exigências do princípio da proporcionalidade representam um método geral para a solução de conflitos entre princípios, isto é, um conflito entre normas que, ao contrário do conflito entre regras, é resolvido não pela revogação ou redução teleógica de uma das normas conflitantes nem pela explicitação de distinto campo de aplicação entre as normas, mas antes e tão-somente pela ponderação do peso relativo de cada uma das normas em tese aplicáveis e aptas a fundamentar decisões em sentidos opostos. Nessa última hipótese, aplica-se o princípio da proporcionalidade para estabelecer ponderações entre distintos bens constitucionais. Em síntese, a aplicação do princípio da proporcionalidade se dá quando verificada restrição a determinado direito fundamental ou um conflito entre distintos princípios constitucionais de modo a exigir que se estabeleça o peso relativo de cada um dos direitos por meio da aplicação das máximas que integram o mencionado princípio da proporcionalidade. São três as máximas parciais do princípio da proporcionalidade: a adequação, a necessidade e a proporcionalidade em sentido estrito. Tal como já sustentei em estudo sobre a proporcionalidade na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal ("A proporcionalidade na Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal", in Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade: Estudos de Direito Constitucional , 2ª ed., Celso Bastos Editor: IBDC, São Paulo, 1999, p. 72), há de perquirir-se, na aplicação do princípio da proporcionalidade, se em face do conflito entre dois bens constitucionais contrapostos, o ato impugnado afigura-se adequado (isto é, apto para produzir o resultado desejado), necessário (isto é, insubstituível por outro meio menos gravoso e igualmente eficaz) e proporcional em sentido estrito (ou seja, se estabelece uma relação ponderada entre o grau de restrição de um princípio e o grau de realização do princípio contraposto). Registre-se, por oportuno, que o princípio da proporcionalidade aplica-se a todas as espécies de atos dos poderes públicos, de modo que vincula o legislador, a administração e o judiciário, tal como lembra Canotilho (Direito Constitucional e Teoria da Constituição , Coimbra, Almedina, 2ª. ed., p. 264). (...) Por fim, consideradas as peculiaridades do caso em exame, diante dos princípios constitucionais que supostamente encontram-se em conflito, afigura-se recomendável a adoção daquilo que a doutrina define como uma "relação de precedência condicionada" entre os princípios concorrentes. Nesse sentido, ensina Inocêncio Mártires Coelho: Por isso é que, diante das antinomias de princípios, quando em tese mais de uma pauta lhe parecer aplicável à mesma situação de fato, ao invés de se sentir obrigado a escolher este ou aquele princípio, com exclusão de outros que, prima facie, repute igualmente utilizáveis como norma de decisão, o intérprete fará uma ponderação entre os standarts concorrentes - obviamente se todos forem princípios válidos, pois sós assim podem entrar em rota de colisão - optando, afinal, por aquele que, nas circunstâncias, lhe pareça mais adequado em termos de otimização de justiça”. (grifou-se)Perceba-se que, a despeito de o imóvel litigado se tratar de um bem público, não há impedimento para que se adote a mesma solução ao presente caso.Isso porque, se a Administração Pública (no primeiro caso supracitado, o Estado e o Município) pode ser condenada a indenizar o particular que perdeu a posse para uma situação de ocupação consolidada, com mais razão a parte que compõe o polo ativo do caso em análise deve assumir sua responsabilidade, tolerando a ocupação em comento e solucionando a questão da moradia dos ocupantes por uma via mais adequada, que não cause o despejo de milhares de pessoas.Também se mostra relevante pontuar que essa noção de preponderância rígida e absoluta do domínio público vem sendo relativizada por outros meios, como o caso da Concessão de Uso Especial para fins de Moradia (CUEM), regulada pela MP nº 2.220/2001, e da regularização fundiária prevista na Lei nº 13.465/2017 (Lei da Reurbanização). Ambos os institutos visam regularizar a moradia de pessoas que ocupam bem de domínio público. Nessa conjuntura, a despeito de os ora requeridos não atenderem os requisitos específicos previstos em tais normativas, evidencia-se que o ordenamento jurídico permite outras soluções para esse tipo de situação, que não a gravosa desocupação forçada do bem.Ademais, não se pode deixar de considerar que a realidade acerca da área litigada não mais condiz com aquela observada antes da ocupação discutida. O local, hoje, se assemelha a um bairro, contando com infraestrutura urbana, além de comércio local.A propósito, consoante consta nas razões apresentadas pela parte requerida (mov. 474.1), “a área ocupada, denominada Vila Nova Esperança, é atualmente local de moradia para 1.100 (mil e cem) famílias, com média de 5 pessoas por unidade familiar, ou seja, mais de 5 mil pessoas, segundo último levantamento”. Ainda, de acordo com o exposto pela douta Promotora de Justiça em suas razões (mov. 498.1), dentre os ocupantes encontram-se “diversos migrantes e/ou refugiados, 2.450 (duas mil e quatrocentos e cinquenta) crianças e 125 (cento e vinte e cinco) idosos”, tendo sido constatada também a presença de pessoas deficientes e gestantes.Nesse contexto, deve prevalecer o direito de moradia das diversas famílias que se encontram instaladas na área, sendo visível a desproporcionalidade da medida de desocupação, que causará consequências imprevisíveis e socialmente indesejadas.Diante do exposto, por medida de justiça, a sentença recorrida deve ser reformada, julgando-se improcedente a pretensão inicial, relegando-se a solução da controvérsia a meios mais adequados à regularização da ocupação coletiva.Sobre esse tocante, a presente decisão não prejudica – ao contrário, reforça – a continuidade dos trabalhos que estão sendo realizados perante o CEJUSC Fundiário, de modo que, a fim de se evitar a perpetuação da lide e da controvérsia, o atingimento da pretensão buscada pela parte autora deverá observar as conclusões a serem lançadas pelo Grupo de Trabalho já referenciado na presente fundamentação.Por fim, relevante citar as razões de voto convergente da Excelentíssima Desembargadora Substituta Luciane Bortoleto, lançadas em sessão de julgamento para o fim de complementar a fundamentação já desenvolvida por esta Relatora:"Em primeiro lugar, cumpre lembrar que realização dos interesses da sociedade constitui papel fundamental do Poder Público, previsto na Constituição Federal que, em seu artigo. 3º, dispõe que são objetivos fundamentais da República I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;II - garantir o desenvolvimento nacional;III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. A consecução desses interesses, por sua vez, depende não apenas do exercício do poder soberano do Estado como também da disposição de bens públicos,E nesse aspecto, há que se indagar, no caso concreto, sobre a função social do bem em questão, já que a Constituição Federal não delimitou ou atribuiu esta finalidade unicamente à propriedade privada.Na hipótese, não se trata de bem de uso comum ou especial, pelo que o bem cuja reintegração se requer se classifica como bem dominical, ou seja, sem afetação, integrando o domínio público exclusivamente para fins patrimoniais.Trata-se, pois de bem sem funcionalidade social dada pelo Estado e que, portanto, não atende ao bem comum e aos fins públicos.Por outro lado, o direito à moradia foi reconhecido e pressuposto para a dignidade da pessoa humana com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948, e recepcionado pela Constituição nacional, incluído dentre os direitos sociais que, para serem concretizados, exigem do Estado atuação positiva, por meio de políticas públicas, onde devem ser adotados programas eficientes e envidados esforços para sua efetivação, em especial no que diz respeito cidadãos menos favorecidos.Tendo por base tais premissas, a interpretação das normas deve levar em conta o respeito aos direitos fundamentais, que devem ser resguardados de forma a garantir que todos tenham um abrigo.E a respeito, cito trecho contido em artigo intitulado 'O Direito Fundamental à Moradia como Critério Inafastável de Interpretação das Normas Jurídicas e do Incremento da Função Social da Posse', da lavra da magistrada Simone Dalila Nacif Lopes (in https://www.emerj.tjrj.jus.br/serieaperfeicoamentodemagistrados/paginas/series/10/processocivil_275.pdf, visualizado em 11.07.2023):'Hoje o juiz é um guardião dos valores expressos na Lei Maior, dos quais não pode se apartar quando da aplicação da lei, que deverá ser afastada sempre que se encontrar em rota de colisão com os ditames constitucionais. Isso porque o juiz, ao ser empossado no cargo, assume uma invencível vinculação ao cumprimento da Constituição e à efetividade dos direitos fundamentais expressos em seu texto e daqueles decorrentes de seus princípios.Nesse passo, cotejando duas normas constitucionais em aparente conflito, há que ser feita uma ponderação de valores nelas insertos, devendo ser privilegiada aquela que se ancore nos princípios fundamentais da República, principalmente o da dignidade da pessoa humana. A função social e econômica deve prevalecer, na medida em que se trata de norma princípio, verdadeiro vetor do ordenamento jurídico'.Na hipótese, se o Estado foi omisso em conservar e dar destinação útil ao bem, o exercício da posse pelos seus atuais ocupantes deu-lhe função social, especialmente porque não se depreende que tenham sido adotadas quaisquer medidas para sua realocação, e até porque, aqui novamente citando a magistrada Dra. Simone, 'não há interesse público no aumento da população de moradores de rua. O direito de todos a um teto sobre sua cabeça se traduz no interesse social de uma cidade organizada e livre das mazelas da miséria'.Entendo que, no especial caso em exame, deve prevalecer o entendimento já adotado pelo Superior Tribunal de Justiça do Recurso Especial citado pela ilustre Relatora, da lavra do Excelentíssimo Ministro Luiz Felipe Salomão, no sentido de que, ainda que verificados os requisitos dispostos no Código de Processo Civil para a reintegração, o julgador não poderá furtar-se da análise de todas as implicações a que estará sujeita a realidade, na subsunção insensível da norma, não se concebendo a proteção da posse e da propriedade – ainda que pública – ante a iminente ofensa a bens jurídicos que requerem proteção essencial".É o voto, portanto, no sentido de (a) não conhecer do apelo interposto pela parte requerida ao mov. 475.1 e (b) conhecer e dar provimento aos Recursos de Apelação interpostos pelos requeridos e pelo Ministério Público aos movs. 474.1 e 498.1, para reformar a sentença recorrida e julgar improcedentes os pedidos iniciais, nos termos da fundamentação.Considerando o resultado deste julgamento em sede recursal, inverte-se o ônus da sucumbência.
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