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Acórdão
Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Acórdão. Eventuais imagens serão suprimidas.
I – RELATÓRIOTrata-se de Apelação Cível interposta por T.S.G. em face da sentença (mov. 168.1), que em Ação de Indenização por Dano Moral, sob o nº 0005160-89.2015.8.16.0056, julgou improcedente o pedido inicial. Pela sucumbência, condenou a autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios ao patrono do requerido, os quais fixou em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, observada a justiça gratuita concedida ao mov. 6.1.
Irresignada, a autora interpôs recurso de Apelação Cível e, em suas razões, sustenta que a sentença deve ser reformada, tendo em vista que o seu pai a abandonou afetivamente, causando transtornos emocionais e traumas que a levaram a um quadro de depressão, de acordo com o relatório psicológico apresentado nos autos; que o seu pai a visitou uma única vez; que enfrentou um câncer e mesmo assim seu pai não foi visita-la; que a procurou apenas para conseguir uma procuração após o falecimento do seu avô, em razão da herança deixada por ele; que após conseguir a procuração o seu genitor desapareceu e não mantem contato, pois seu único interesse era o documento assinado. Defende que a omissão do Apelado em relação à sua filha caracteriza-se como ato ilícito, logo, passível de indenização. Requer a reforma da sentença para o fim de condenar o Apelado ao pagamento de indenização por dano moral decorrente do abandono afetivo e que seja concedida novamente a justiça gratuita. Contrarrazões ao mov. 177.1.É o relatório.
II – FUNDAMENTAÇÃOA Justiça Gratuita foi concedida à autora ao mov. 6.1. Em suas razões recursais, a Autora, ora Apelante, reitera o pedido de justiça gratuita. Ocorre que os benefícios da justiça gratuita compreendem todos os atos do processo até decisão final do litígio, em todas as instâncias (art. 9º, Lei 1.060/50). Destarte, o não conhecimento do recurso, no ponto, é medida que se impõe.Presentes os pressupostos recursais de admissibilidade intrínsecos e extrínsecos, conheço dos demais pontos do recurso.A Apelante insurge-se quanto a sentença proferida que indeferiu o pedido formulado na inicial para o fim de afastar a obrigação de reparação por danos morais decorrentes do abandono afetivo paterno filial, vez que não restaram comprovados os requisitos inerentes à espécie, quais sejam: ato ilícito, dano, nexo de causalidade (arts. 186, 187 e 927 do CC).Nesses termos, a Apelante pugna pela reforma da sentença para que o Apelado seja condenado ao pagamento de indenização por dano moral decorrente do abandono afetivo.Entendo que não merece acolhimento o pedido formulado.O conceito atual de família está intimamente ligado ao afeto e exige dos pais o dever de criar e educar os filhos sem lhes omitir o carinho necessário para a formação plena de sua personalidade.[1]No tocante ao abandono afetivo, a Constituição Federal no artigo 227[2] resguarda o direito da criança e do adolescente da convivência familiar, da dignidade, ao respeito, à educação, à alimentação, ao lazer, à profissionalização.Nesse sentido, a falta de convívio com os pais, em face do rompimento do elo de afetividade, pode gerar o dever de indenizar.No entanto, em se tratando da responsabilidade civil por abandono afetivo no âmbito familiar, faz-se necessário abordar os elementos caracterizadores da responsabilidade civil por abandono afetivo, quais sejam, o dano, a culpa e o nexo de causalidade.Vale ressaltar, ademais, que em matéria de responsabilidade civil subjetiva, como pressuposto para a caracterização do dever de indenizar, é necessária a presença dos requisitos elencados nos artigos 927 e 186, do Código Civil, quais sejam, a ação ou omissão culposa ou dolosa violadora de direito, o dano e o nexo de causalidade entre ambos, vejamos:“Artigo 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.”.“Artigo 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”Tem-se, assim, que a configuração do dano como elemento do dever de indenizar necessita de comprovação da culpa do genitor que deve ter se ocultado à convivência com a prole, e deliberadamente se negado a participar do desenvolvimento de sua personalidade, de forma negligente ou imprudente.Passo a análise do caso em apreço. Depreende-se dos autos que a genitora da Apelante e o Apelado estiveram em um relacionamento que se encerrou em 17/10/1995, quando a Apelada estava com 5 (cinco) meses de idade. De acordo com a Apelante, após o término do relacionamento entre o recorrido e a sua genitora, o Apelado a abandonou tanto na esfera afetiva quanto na forma material; que passou por momentos difíceis na infância em virtude de grandes necessidades financeiras em razão da falta de colaboração por parte do genitor; que o seu pai mantinha convívio esporádico e extremamente rápido até seus 3 (três) anos de idade; aos 6 (seis) anos de idade apresentou um quadro de câncer, submetendo-se a tratamento quimioterápico pelo período de 1 ano, e que o requerido fez apenas uma visita no hospital; que nesse período realizou acompanhamento psicológico, sendo atestado o seguinte: “esta criança deseja a presença do pai”; que soube da morte do avô paterno e se surpreendeu com a suposta aproximação de seu pai, pois pensou que com a morte do avô o pai estaria sensibilizado, no entanto, apenas aproximou-se para conseguir uma procuração para que pudesse vender os imóveis deixados pelo avô como herança a ela; que retomou o acompanhamento psicológico devido a seu quadro emocional alterado e depressivo, sendo usada apenas para satisfazer os interesses financeiros do pai, que jamais ofereceu amor, carinho, convívio familiar e cuidado (mov. 1.1).Em sede de contestação (mov. 16.1) o Apelado sustentou que a Autora não fez prova de suas alegações e que na minuta do acordo de separação judicial, ficou acordado que contribuiria mensalmente, a título de alimentos, com o equivalente a 04 (quatro) salários mínimos, até que as filhas menores atingissem a maioridade civil; que na época em que houve a separação, a genitora vendeu o imóvel em Anápolis e comprou outro na cidade de Cambé, Paraná, quando se mudou para ir morar juntamente com o avô materno e com o tio da autora, a 900 quilômetros de distância de Goiânia e, por isso, ficou impedido de programar visitas constantes; que no período em que a autora ficou doente e estava realizando o tratamento para o câncer, estava residindo em Alta Floresta do Oeste, Estado de Rondônia (a 2.363 quilômetros de Cambé), desde 12/1998, permanecendo até meados de maio/2006, quando então se mudou por razões de trabalho para Barcelona, Espanha, de lá regressando, em definitivo, para o Brasil tão somente em fevereiro/2013.Em seu depoimento pessoal (mov. 87.2), a autora narrou que:“(...) sua mãe se separou de seu pai desde quando a depoente nasceu; que moravam em Anápolis GO e que o requerido vendeu tudo da casa quando sua mãe ficou doente; que vieram morar na casa de sua tia e seu avó, de favor; que o requerido nunca ajudou em nada, nem com sua mãe e irmãs; que são em 3 irmãs e a mãe; que as vezes mandava 50 reais; que aos 6 anos de idade ficou doente e teve câncer; que sua mãe precisou parar de trabalhar para ficar com a depoente no hospital e seu avô bancava a casa, os vizinhos levavam comida para eles; que lembra do seu pai fazendo uma visita no hospital, pouco antes dele ir embora para a Espanha; que as vezes conversava com a gente pela internet; que tinha mais ou menos uns 14 anos de idade quando ele foi embora para a Espanha; que não se recorda muito bem o tempo que ele ficou na Espanha, mas acredita que foi de 4 a 8 anos; que quando conversavam pela internet era uma vez por semana; que hoje tem 21 anos de idade; que ficou traumatizada porque o requerido chamava toda sua família de gorda e que precisou fazer tratamento com psicóloga; que o requerido visitou umas 3 vezes desde que se mudou para cá; que quando ele veio para o Brasil, e o vô dele morreu, a depoente implorou para ir para lá, e que o pai comprou a passagem, mas que foi pior porque o requerido nem dava bola; que suas irmãs são mais velhas; que o requerido ainda mora em Anápolis; que o requerido já morou em Rondônia quando suas irmãs mais velhas nasceram e que seu avô deixou uma casa para as netas, no nome de uma de suas irmãs e que o requerido pediu uma procuração para elas, com o intuito de vender o imóvel; que elas deram a procuração para o requerido e depois nunca mais falou com elas; que essa cada de Anápolis estava em nome seu, de suas irmãs e da outra filha dele; que sua tia (irmã de seu pai) ajudou bastante elas; que quando vinha para cá, sempre ficava na sua casa; que não tem muito contato com sua outra irmã; que o requerido ajuda e paga pensão para a irmã do outro relacionamento; que nunca entrou com uma cobrança de alimentos, pensão; que seu pai sempre foi de esconder tudo o que tinha; que acredita que seu avô tenha deixado algo para ela e suas irmãs, mas que nunca vai saber; que seu avô tinha deixado gados e o requerido os vendeu; que sua faculdade é pelo Fies; que faz ciências contábeis; que o sentimento de tem pelo requerido é o mesmo, que não mudou; que o requerido deixou a casa de Anápolis para sua mãe e o carro também; que a casa de Anápolis foi vendida e comprada uma aqui; que se recorda que o requerido deixou um carro e uma carreta; que essa carreta foi parte da casa; mas que isso não iria sustentar para a vida inteira; que graças a Deus ele deixou um teto; que fez quimioterapia, e nada dele ajudar ou dar presente; que os valores que o requerido dava era pedido por facebook e ele depositava na conta; que suas irmãs não entraram com ação; que quando era pequena foi algumas vezes visitar o requerido em Anápolis, mas que depois de grande, foi só uma vez, que implorou para o requerido comprar a passagem para a depoente ir para lá, quando ele voltou da Espanha; que a depoente tinha um convívio com ele antes dele se mudar para a Espanha; que tem uma vida normal e que tenta se distrair; que está namorando faz um ano (...)”;A testemunha Sr. Davi Garcia de Assis, arrolada pela autora, assim afirmou (mov. 87.3): “(...) que conhece a autora desde pequena; que a autora e sua genitora frequentavam a mesma igreja que o depoente; que é pastor; que por força da convivência, sabiam das necessidades da época; que a autora tinha uns 2/3 anos; que sempre estavam dando assistência social (alimentos, financeiro); que não conhece o pai da autora; que sempre perguntavam sobre o pai e as meninas não falavam porque não tinham convivência; que nunca viu o requerido visitar as crianças; que faziam visitas para as casas das pessoas que mais necessitavam de ajuda; que a igreja acompanhou a autora quando ficou internada no hospital, fazendo orações, visitas; que já chegou a conversar com a autora sobre seu pai; que sempre escutou que seu pai era muito ausente; que se recorda que o requerido veio visitar uma vez, mas que não se recorda de outras vezes; que a autora é bem caseira, que fica mais com a mãe; que não tem intimidade com as irmãs e mãe da autora, mas que tem uma amizade por ser pastor da igreja; que não tem conhecimento se a mãe da autora entrou com ação de alimentos contra o requerido; que não tinha ajuda financeira do requerido; (...)”;O genitor, por seu turno, assim declarou (mov. 142.1): “(...) que foi casado com a mãe da autora por bastante tempo, mas não se recorda quanto tempo; que a autora foi a terceira filha do casal; que quando divorciou a autora não tinha nascido; que na separação, tinha uma transportadora e que tinha 3 carretas; que uma vendeu e comprou uma casa e um carro para a mãe da autora e que dava 4 salários mínimos, sendo depositados na conta do Bamerindus, aproximadamente 2 anos; que morou em Goiânia e ela na Anápolis; que em outubro/1996 teve um problema com a justiça e ficou preso 10 meses; que foi liberado em agosto/1997; que nesse período não pode ir visita-la; que a autora era bebe quando aconteceu tudo isso; que sua esposa depositava para elas enquanto estava preso; que depois teve um pouco de dificuldade financeira e diminuiu para 1 salário mínimo; que nunca respondeu ação de alimentos, que nunca foi pedido nada pela autora ou pelas irmãs ou mãe na justiça; que até pode ter sido um pai ausente mas nunca foi omisso; que sempre ajudava; que foi até o hospital visitar a autora quando ficou doente; que a distância onde morava até a casa da autora dava cinco mil quilômetros de distância e que não dava para ficar indo e voltando; que sempre visitava elas; se falavam pelo skipe, telefone; que em 2006 foi embora para Espanha e que morou até 2012 com a nova família; que se casou e teve outra filha; que a autora não reclamava de sua ausência e se surpreendeu com esta ação porque sempre estavam se falando; que quando retornou da Espanha, foi atropelado e ficou inválido por um tempo e que mandou uma passagem para a autora ir lá ficar com ele; que pagou o curso de farmácia para a autora; que em 2012 a autora esteve na casa da mãe do depoente e ficou com ele; que teve a procuração assinada pelas filhas; que esse imóvel que queria vender era seu usufruto; que seu pai tinha deixado para o depoente em usufruto; que nunca deixou de dar carinho, atenção para suas filhas; que essa ação não condiz com a realidade e que quando quebrou a perna, a única que foi visitar o pai foi a autora; que não foi até a casa da autora para ter a procuração assinada para vender o imóvel; que foi para isso, mas também por outras coisas para resolver tudo após a morte de seu pai; que não acredita que a autora esteja com depressão, porque vê suas postagens de passeios e viagens; que pagou o curso de farmácia da autora; que a autora nasceu depois do divórcio; que após o divórcio foi morar em Goiânia até 2002; que fazia visitas e que toda semana estava em Anápolis e que as vezes levava as 3 filhas para Goiânia; que o momento que ficou mais ausente das filhas foi quando ficou preso e quando foi morar na Espanha; que a autora sempre foi mais apegada ao depoente; que quando morava na Espanha veio 3 vezes para o Brasil; nas duas primeiras foi visitar suas filhas e na terceira vez foi quando seu pai veio a falecer; que não quis tocar no assunto do processo com a autora porque a convivência entre os dois sempre foi normal; que independente da ação em tramite ainda conversa com a autora, mas acredita que ela ficou um pouco envergonhada de ter feito isso (...)”;Nesse contexto, não resta comprovado que o abandono pela parte Apelada decorreu apenas de sua conduta voluntária. O que se verifica é que houve um afastamento entre as partes decorrente da localização de suas residências, em cidades distintas, bem como no período em que o Apelado esteve preso e, posteriormente, residiu na Espanha. No caso em apreço, apesar das alegações despendidas, não restou comprovado o abalo psíquico efetivamente causado à Apelante pela falta de contato com o genitor. Ainda que o pai tenha se ausentado em determinados momentos do convívio com a filha, ausentes provas mais robustas de que os alegados danos de ordem psicológica da autora advenham do distanciamento ocorrido entre as partes. Portanto, não há que se falar em conduta ilícita por parte do genitor, ou em danos morais indenizáveis.Cumpre salientar que a Apelante, em seu depoimento, afirmou que o requerido “vinha para cá, sempre ficava na sua casa”; ‘’que quando conversavam pela internet era uma vez por semana’’ e “que tinha um convívio com ele antes dele se mudar para a Espanha.’’ Do relato do Apelado se extrai que o “a autora nasceu depois do divórcio; que após o divórcio foi morar em Goiânia até 2002; que fazia visitas e que toda semana estava em Anápolis e que as vezes levava as 3 filhas para Goiânia; que o momento que ficou mais ausente das filhas foi quando ficou preso e quando foi morar na Espanha”.Tais afirmações não corroboram a alegação do abandono afetivo a que a autora se refere. O fato de o pai manter pouco contato com a filha, por mais doloroso que tenha sido para a Apelada, não configura, por si, ato ilícito. Não denota, por si, conduta omissiva ou negligente que configure a excepcional situação de abandono.Ademais, não há nos autos comprovação do dano psicológico, já que isso demanda estudo psicossocial. Note-se que a mera declaração de psicóloga (mov. 1.7) juntada aos autos de forma unilateral, não configura prova suficiente do dano psicológico que teria sofrido a autora, ou o nexo causal com o suposto abandono por parte do Apelado. Como bem observou o magistrado de origem, não consta dos autos qualquer documento apto a indicar que tal patologia seja decorrente de algum comportamento ativo ou passivo do requerido, não podendo tal enfermidade ser atribuída ao demandado. Em nenhum momento a Autora pediu pela produção de prova pericial quanto aos alegados danos que teria sofrido.Assim, a ausência de convivência paterno-filial não pode ser imputada ao genitor a título de ato ilícito, fator indispensável para configurar o dever de indenizar. Ademais, não restou demonstrada qualquer atitude de desprezo ou rejeição do requerido para com sua filha.O atual entendimento dos tribunais é que há necessidade de prova inequívoca de abandono afetivo – com a produção de estudo psicossocial que demonstre o comprometimento havido na esfera extrapatrimonial da vítima – e, ainda, nexo de causalidade entre a conduta ilícita e o dano psicológico sofrido em função disso. Sem tais elementos, ainda que o pai tenha se ausentado em determinados momentos do convívio com a filha, ausentes provas mais robustas quanto aos alegados danos de ordem psicológica à filha – não há falar em conduta ilícita, ou em danos morais indenizáveis.Não se olvide que as famílias e seus membros experimentam danos decorrentes dos conflitos, mas isso é inerente a tais situações. Como exaustivamente explanado, para que houvesse a hipótese de indenização, haveria que se ter um ilícito civil perpetrado pelo genitor e que culminasse em um dano concreto à filha, que não se confunde a falta da presença paterna sentida pela Apelante, ainda que haja naturalmente um sofrimento, não de somenos importância, desta situação.Inobstante a dureza do argumento, é o que prevalece, senão veja-se a vasta jurisprudência sobre a matéria:“RECURSO ESPECIAL. CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ABANDONO AFETIVO. NÃO OCORRÊNCIA. ATO ILÍCITO. NÃO CONFIGURAÇÃO. ART. 186 DO CÓDIGO CIVIL. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA CONFIGURAÇÃO DO NEXO CAUSAL. SÚMULA Nº 7/STJ. INCIDÊNCIA. PACTA CORVINA. VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM. VEDAÇÃO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. NÃO CARACTERIZADO. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. 1. A possibilidade de compensação pecuniária a título de danos morais e materiais por abandono afetivo exige detalhada demonstração do ilícito civil (art. 186 do Código Civil) cujas especificidades ultrapassem, sobremaneira, o mero dissabor, para que os sentimentos não sejam mercantilizados e para que não se fomente a propositura de ações judiciais motivadas unicamente pelo interesse econômico-financeiro. 2. Em regra, ao pai pode ser imposto o dever de registrar e sustentar financeiramente eventual prole, por meio da ação de alimentos combinada com investigação de paternidade, desde que demonstrada a necessidade concreta do auxílio material. 3. É insindicável, nesta instância especial, revolver o nexo causal entre o suposto abandono afetivo e o alegado dano ante o óbice da Súmula nº 7/STJ. 4. O ordenamento pátrio veda o pacta corvina e o venire contra factum proprium. 5. Recurso especial parcialmente conhecido, e nessa parte, não provido.” (REsp 1493125/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/02/2016, DJe 01/03/2016) (grifo nosso)‘’CIVIL. RECURSO ESPECIAL. FAMÍLIA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ABANDONO AFETIVO OFENSA AO ART. 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA. ALEGADA OCORRÊNCIA DO DESCUMPRIMENTO DO DEVER DE CUIDADO. NÃO OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA CONFIGURAÇÃO DO NEXO CAUSAL. APLICAÇÃO DA TEORIA DO DANO DIRETO E IMEDIATO. PREQUESTIONAMENTO INEXISTENTE NO QUE TANGE AOS ACORDOS E CONVENÇÕES INTERNACIONAIS. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS Nº.s 282 E 235 DO STF. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO CARACTERIZADO. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO.(…). 2. Considerando a complexidade dos temas que envolvem as relações familiares e que a configuração de dano moral em hipóteses de tal natureza é situação excepcionalíssima, que somente deve ser admitida em ocasião de efetivo excesso nas relações familiares, recomenda-se uma análise responsável e prudente pelo magistrado dos requisitos autorizadores da responsabilidade civil, principalmente no caso de alegação de abandono afetivo de filho, fazendo-se necessário examinar as circunstâncias do caso concreto, a fim de se verificar se houve a quebra do dever jurídico de convivência familiar, de modo a evitar que o Poder Judiciário seja transformado numa indústria indenizatória. 3. Para que se configure a responsabilidade civil, no caso, subjetiva, deve ficar devidamente comprovada a conduta omissiva ou comissiva do pai em relação ao dever jurídico de convivência com o filho (ato ilícito), o trauma psicológico sofrido (dano a personalidade), e, sobretudo, o nexo causal entre o ato ilícito e o dano, nos termos do art. Considerando a dificuldade de se visualizar a forma como se caracteriza 186 do CC/2002. o ato ilícito passível de indenização, notadamente na hipótese de abandono afetivo, todos os elementos devem estar claro e conectados. (...). 5. A ausência do indispensável estudo psicossocial para se estabelecer não só a existência do dano, mas a sua causa, dificulta, sobremaneira, a configuração do nexo causal. Este elemento da responsabilidade civil, no caso, não ficou configurado porque não houve comprovação de que a conduta atribuída ao recorrido foi a que necessariamente causou o alegado dano à recorrente. Adoção da teoria do dano direto e imediato. (...).’’ (REsp 1557978/DF, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/11/2015, DJe 17/11/2015.) (grifo nosso)Consoante julgamento deste órgão colegiado em situação análoga:‘’Apelação cível. Procedimento de Alimentos com Indenização por danos morais. Sentença que julgou parcialmente procedente o pedido inicial. Fixação da verba alimentar em 20% dos rendimentos líquidos do genitor. Indeferimento da indenização por danos morais. Não comprovação do dano psicológico à adolescente. 1. que pretende a majoração dos Recurso principal alimentos e a condenação por danos morais. Ausência de capacidade financeira do genitor que é doente e recebe apenas um salário mínimo. Valor que se mostra razoável ao atendimento das necessidades das menores. Inexistência dos requisitos necessários a provar o abandono afetivo alegado. Recurso conhecido e desprovido.2. do genitor para exonerar Recurso adesivo ou reduzir os alimentos arbitrados na sentença. Valor não excessivo e condizente com os rendimentos do genitor. Observância do trinômio necessidade, possibilidade e proporcionalidade. Recurso conhecido e desprovido. (...). 2. O mero distanciamento afetivo entre pais e filhos não constitui, por si, situação capaz de gerar dano moral, não se vislumbrando, no caso, nenhuma conduta ilícita. 3. Para que se configure a responsabilidade civil, no caso, subjetiva, deve ficar devidamente comprovada a conduta omissiva ou comissiva do pai em relação ao dever jurídico de convivência com o filho (ato ilícito), o trauma psicológico sofrido (dano a personalidade), e, sobretudo, o nexo causal entre o ato ilícito e o dano, nos termos do art. 186 do CC/2002.’’ (TJPR - 12ª C.Cível - 0053760-05.2017.8.16.0014 - Londrina - Rel.: Desembargador Rogério Etzel - J. 03.07.2019) (grifo nosso)Pelo exposto, não se vislumbra, na hipótese, elementos suficientes para a condenação do Apelado em danos morais a título de abandono afetivo, pelo que deve ser mantida a sentença em sua integralidade. Por fim, cumpre anotar que o caso em tela importa em majoração dos honorários da fase recursal, nos termos do art. 85, §11, CPC.O Juízo singular fixou os honorários da seguinte forma: ‘’Com esteio no exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos iniciais, com fundamento no artigo 487, I do Novo Código de Processo Civil, condenando a autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios devidos ao patrono do requerido, os quais fixo em 10% do valor da causa, com fulcro no art. 85, §2º do NCPC, atendendo ao trabalho desenvolvido, que não demandou maiores intervenções nos autos, e a pouca complexidade da matéria. Porém, ressalto que a exigibilidade da cobrança se encontra suspensa, tendo em vista que é beneficiária da justiça gratuita, a qual mantenho nos termos da decisão de seq. 6.1.’’ (grifo nosso)Assim, majoro os honorários para 12% sobre o valor da causa, ressalvada a justiça gratuita concedida em primeiro grau.
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