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Acórdão
Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Acórdão. Eventuais imagens serão suprimidas.
1. Trata-se de apelação cível interposta por Nair Pires de Oliveira, da sentença[1] (mov. 337.1) que ao julgar improcedente a ação de indenização proposta em face de CSC Consultoria e Estética Ltda. ME, Ciram Serviços Ltda. EPP e Valkiria Prado Macedo de Carvalho, condenou-a ao pagamento das custas/despesas processuais e dos honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, com a ressalva de ser beneficiária da assistência judiciária.Em suas razões recursais (mov. 349.1), a Apelante alega, em suma, que: a) foi submetida a quatro procedimentos estéticos de grande porte – abdominoplastia, plástica mamária, lipoaspiração e blefaroplastia -, “realizados em mais de 40% do corpo”, o que demandou mais tempo em cirurgia do que o recomendável, conforme reconhecido no laudo pericial, mas tais “riscos foram criados (aumentados) pelas circunstâncias”, sem o seu devido conhecimento e aceitação, e “influenciaram no aumento das chances de que alguma complicadora viesse a lhe causar dano” no pós-operatório; b) tem apenas o ensino fundamental completo e assinou os termos de consentimento padrões apresentados pelo hospital, que não tratam da cumulação de procedimentos e “ninguém lhe informou sobre o risco aumentado de complicações por cumulação de procedimentos”, as quais ocorreram, como constatado no laudo pericial; c) a falta de informações adequadas está demonstrada pelo seu depoimento pessoal e pela conversa tida com a médica/ré, retratada no mov. 1.19.Enfim, conclui que “há conduta omissiva (falta de informação adequada) por parte dos requeridos e houve inversão do ônus da prova, razão pela qual pugna-se, respeitosamente, pelo provimento do presente recurso, de forma a se reformar a r. sentença e se julgar procedente o pedido contido na exordial”.Oferecidas as contrarrazões (mov. 359.1 e 360.1), os autos foram remetidos a este Tribunal.
2. Presentes os pressupostos de admissibilidade, a apelação comporta conhecimento, conforme exame a seguir. 2.1. Síntese fática/processualAo promover a ação em 01/11/2016, a Autora discorreu que: procurou “ajuda médica” para realização de cirurgias estéticas de implantação de próteses mamárias e correção das pálpebras, sendo-lhe indicada a realização também de lipoaspiração e abdominoplastia; Cleonice, proprietária do Hospital Santé, lhe repassou orçamento com valores e procedimentos; em 15/09/2015 firmou com a ré CSC o contrato de prestação de serviços para procedimento cirúrgico a ser realizado no Hospital Santé (ré Ciram), e passou a efetuar os pagamentos de forma parcelada; em 12/07/2016, “foi submetida à cerca de 9 horas de cirurgia no rosto (sobrancelhas – pálpebras), busto (implante de prótese mamária), e região do abdômen e barriga (abdominoplastia e lipoaspiração)”, o que configurou violação à “cartilha de segurança em cirurgia plástica ... que recomenda 4 horas de cirurgia” e apenas 2 procedimentos por cirurgia; teria que realizar drenagem pós-operatória e curativos, sendo que o primeiro retorno ocorreu em 18/07/2016, quando já apresentava sinais de necrose, conforme fotografia tirada de seu abdômen pela funcionária e repassada à médica responsável pela cirurgia, a ré Valkiria; em 21/07/2016, teve consulta com a ré Valkiria, que lhe disse estar tudo bem e normal, o que foi por ela reiterado em outros atendimentos, sendo evasiva e grosseira quando questionada via aplicativo WhatsApp, tendo manifestado que “queria realizar uma nova cirurgia em face da já realizada para consertar um erro médico, assim colocando novamente a Paciente/Autora em risco de vida e zerando toda a sua recuperação, que até este momento não era tão próspera”; fazia dois curativos diários e compareceu nas demais consultas indicadas, ocasiões em que “médicos, enfermeiros, ou qualquer dos funcionários do Hospital Santé que efetuaram curativos, drenagem ou tiveram acesso as cirurgias da Autora mencionaram que a paciente se encontrava em quadro clínico de risco, qual sem saber possivelmente contraiu necrose, por conta da imprudência, imperícia e negligência do Hospital e da médica com a Paciente/Autora, que de forma religiosa cumpriu o estipulado pelos médicos e responsáveis por seus cuidados”; em razão de dores abdominais fortíssimas, febre, insônia e características da ferida, procurou médico especialista que confirmou o diagnóstico de necrose, daí o ajuizamento da presente demanda contra “as pessoas e empresas que de forma (i) negligente; (ii) imperita; (iii) imprudente. Causaram risco de vida a Paciente/Autora”, buscando a condenação solidária dos Réus ao pagamento de indenizações pelos danos sofridos, quais sejam, estéticos, pelas cicatrizes que ficaram em seu corpo, no valor de 120 salários mínimos, materiais, pelo não cumprimento da obrigação de resultado contratada, com a devolução em dobro do valor pago com a cirurgia e demais despesas, e morais, pelo “seu psicológico totalmente abalado”, no valor de 200 salários mínimos, além da antecipação da tutela para seja custeado a continuidade do seu tratamento e acompanhamento médico em clínica diversa, considerando o “mau tratamento e atendimento que recebeu desde a referida cirurgia ... e muito embora a Reclamada médica Valkíria, tenha saído da clínica os procedimentos fora de padrão continuam a serem manifestados pelos médicos e até mesmo por uma das proprietárias da empresa Cleonice, que indicam a Autora para que efetuem uma raspagem e saturem a sua barriga, colocando a Autora novamente em risco”.A Autora incluiu no polo passivo: (1) CSC Consultoria e Estética Ltda. – ME, com quem celebrou o contrato de prestação de serviços para procedimento cirúrgico; (2) Ciram Serviços Ltda – EPP, denominado Hospital Santé, onde foi realizada a cirurgia, conforme cláusula 1.3 do referido contrato; (3) Valkiria Prado Macedo de Carvalho, médica que realizou os procedimentos e “prestou acompanhamento e retorno no pós-operatório”.Deferida parcialmente a antecipação da tutela provisória, para manutenção em favor da Autora pelas Rés do tratamento com acompanhamento médico em suas dependências, sem custos (mov. 15.1), aquela manejou recurso que posteriormente restou desprovido (mov. 120.1).Concedido à Autora o benefício da assistência judiciária (mov. 21.1), as corrés ofereceram defesas (movs. 59 e 60).A ré Valkiria Prado Macedo de Carvalho enunciou em relação aos fatos que: a Autora realizou “‘abdômen’, lipoaspiração mais enxerto de gordura no glúteo, mastoplexia com prótese de mama, mais correção e inversão do mamilo, mais blefaroplastia superior e inferior nas pálpebras” e “Todos os procedimentos foram realizados de forma correta e com total técnica cirúrgica”, de acordo com prontuário médico apresentado; com início às 8:50horas e término às 15:20 horas, “durou a cirurgia total, entre início de anestesia e até o último curativo, aproximadamente 06 (seis) horas” e a Autora pernoitou no hospital e teve alta “no dia seguinte, sem queixas e sem intercorrências”; no primeiro retorno agendado, a Autora estava com “ferida abdominal ... com ‘alo de sofrimento de pele supra púbico’, conforme foto 1 andamento 1.12, possível de acontecer em cirurgias do tipo”, passando a “trocar os curativos em períodos pré-determinados pelo hospital até que após um mês foi realizado um procedimento de ‘desbridamento’ que nada mais é que uma raspagem com retirada de tecido morto, denominado necrosado ou com perda de vitalidade biológica”; as fotografias de mov. 1.13 “mostram um estágio inicial de cicatrização da ferida, após o procedimento, demonstrando a evolução positiva do quadro, inclusive com aproximação das bordas do ferimento”, e as de mov. 1.14 “demonstram tecido de granulação em cicatrização, ou seja, procedimento correto no caso de aparecimento de necrose/perda de vitalidade biológica”; “Após o desbridamento passou-se a realização de curativos diários e medicação até que ela desistiu do tratamento, conforme ata notarial das gravações”; isso durou dois meses e a Autora estava alertada, conforme “termo de consentimento informado” juntado, que “a cicatrização total poderia durar até um ano, sendo que o abandono dela ao tratamento deu causa à complicação do quadro, inexistindo portanto nexo de causalidade entre a cirurgia e os resultados demorados da cicatrização e sim a ação da própria autora”, que “passou a tomar medicação por conta, se recusando à realização de novos exames, desistindo do tratamento”, mesmo depois da liminar concedida; se tivesse seguido as orientações, “a ferida fecharia, ‘por segunda intenção’ que é a cicatrização sem procedimento cirúrgico e seria realizada a correção da cicatriz após, tudo dentro do prazo pré-determinado” e por ela aceito; a Autora tinha ciência dos riscos da cirurgia, dentre eles a necrose, e não são suficientes para embasar uma condenação por erro médico a “mera insatisfação com o resultado” e “a ansiedade para o término do tratamento”.Os réus Ciram Serviços Ltda – EPP e CSC Consultoria e Estética Ltda. ME relataram que: a Autora firmou “contrato de prestação de serviços com os requeridos” e “Realizada a cirurgia conforme consta do relatório de enfermagem em anexo, a qual durou das 08:50 às 15:20 horas, esta recebeu alta no dia seguinte às 09:00 horas, e como de costume, recebeu a relação dos medicamentos adequados ao período pós-operatório tais como antitérmicos e anti-inflamatórios, bem como todas as instruções para os cuidados necessários no período pós-operatório quais sejam: data para retorno ao consultório do médico, uso de equipamentos para proteção das mamas (sutiã especial, faixas, etc) entre outros, e especialmente a restrição a determinados movimentos físicos e a forma adequada de higienização dos locais das cirurgias”; “aproximadamente 50 dias após a realização dos procedimentos cirúrgicos a autora abandonou voluntariamente o tratamento, não o retomando mesmo após a concessão de medida liminar pelo Juízo”; “não ocorreu qualquer falha seja por parte do hospital ou por parte da profissional médica na prestação do serviço, nem mesmo no período pós-operatório”; “a autora foi devidamente esclarecida sobre as técnicas a serem utilizadas na cirurgia, e especialmente orientada sobre os possíveis efeitos após a cirurgia, incluindo-se a eventual possibilidade de necrose, assim como que o período de completa recuperação poderia se estender por até 01 (um) ano”; “do relato da inicial, abstrai-se que a autora manifesta como sua única insatisfação o resultado obtido em face de a cirurgia de abdominoplastia, não relatando qualquer insatisfação com os demais procedimentos realizados”; a “necrose em abdominoplastia é uma complicação prevista em todas as literaturas médicas e a autora foi devidamente informada sobre essa possibilidade” e a infecção “decorreu unicamente da atitude relapsa da própria autora, que não seguiu com o rigor necessário as instruções para os cuidados necessários com o local da cicatriz cirúrgica, abandonou o tratamento pós-operatório e provavelmente optou até pela automedicação”, como também porque “seu organismo não reagiu satisfatoriamente buscando a recuperação do trauma cirúrgico, acarretando a infecção e os supostos danos relatados na inicial”, inexistindo nexo causal com a ação da médica.Impugnadas as contestações (mov. 64), as partes se manifestaram sobre a produção de provas (movs. 71, 75 e 76), e na sequência o juízo a quo saneou o processo (mov. 80), fixou os pontos controvertidos (se houve erro médico que ocasionou a necrose diagnosticada no pós-operatório; se houve negligência, imprudência ou imperícia das rés na realização de quatro procedimentos cirúrgicos concomitantemente; se existem danos materiais passíveis de indenização e a extensão dos danos; se existem danos morais a serem indenizados; se existem danos estéticos indenizáveis), inverteu o ônus da prova e deferiu a realização de provas pericial e oral.Apresentado o laudo pericial (movs. 202 e 243), houve manifestação das partes (movs. 215, 217, 219, 252, 254 e 255).Realizada a audiência de instrução, na qual foram tomados os depoimentos pessoais das partes (mov. 336), sobreveio a sentença (mov. 337) que julgou improcedente a demanda, ao concluir que “a médica e o hospital adotaram procedimentos hígidos na condução da contratação e execução das cirurgias estéticas, fornecendo informações pertinentes e necessárias, bem como conduzindo a cirurgia dentro dos parâmetros esperados”, de modo que “em que pese a alegada frustração e insatisfação da autora com os procedimentos cirúrgicos e com as complicações decorrentes do pós-operatório, não restou comprovada qualquer falha na prestação do serviço médico, o que afasta a responsabilidade civil dos réus”. 2.2. Responsabilidade Civil das corrés: médica, clínica e hospitalO art. 951 do Código Civil trata da responsabilidade dos profissionais da área de saúde: "Art. 951. O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho".Ainda, em exceção à responsabilidade objetiva que rege as relações de consumo, o Código de Defesa do Consumidor prevê no par. 4º do art. 14 que "A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa".Assim, a responsabilidade médica deve ser analisada sob o prisma da responsabilidade subjetiva (art. 186 do Código Civil), com a particularidade ainda de que a controvérsia decorre da realização de procedimentos cirúrgicos estéticos – lipoaspiração, mamoplastia com prótese, blefaroplastia superior e inferior, dermolipectomia abdominal convencional e correção de diástase abdominal (mov. 59.3) -, na qual a parte contratada se compromete a alcançar um resultado específico no paciente, que configura a própria obrigação.Na espécie, tendo a cirurgia plástica estética a natureza de obrigação de resultado, cuja responsabilidade médica é presumida, cumpre ao profissional demonstrar que os eventos danosos decorreram de fatos externos e alheios à sua atuação durante o procedimento, não sendo necessária a demonstração de sua negligência ou imperícia, ante a presunção de culpa. Por isso que quando a obrigação médica for de resultado deve ser invertido o ônus da prova, o que ocorreu na espécie.De outro lado, “A responsabilidade das sociedades empresárias hospitalares por dano causado ao paciente-consumidor pode ser assim sintetizada: (i) as obrigações assumidas diretamente pelo complexo hospitalar limitam-se ao fornecimento de recursos materiais e humanos auxiliares adequados à prestação dos serviços médicos e à supervisão do paciente, hipótese em que a responsabilidade objetiva da instituição (por ato próprio) exsurge somente em decorrência de defeito no serviço prestado (art. 14, caput, do CDC); (ii) os atos técnicos praticados pelos médicos sem vínculo de emprego ou subordinação com o hospital são imputados ao profissional pessoalmente, eximindo-se a entidade hospitalar de qualquer responsabilidade (art. 14, § 4, do CDC), se não concorreu para a ocorrência do dano; (iii) quanto aos atos técnicos praticados de forma defeituosa pelos profissionais da saúde vinculados de alguma forma ao hospital, respondem solidariamente a instituição hospitalar e o profissional responsável, apurada a sua culpa profissional. Nesse caso, o hospital é responsabilizado indiretamente por ato de terceiro, cuja culpa deve ser comprovada pela vítima de modo a fazer emergir o dever de indenizar da instituição, de natureza absoluta (arts. 932 e 933 do CC), sendo cabível ao juiz, demonstrada a hipossuficiência do paciente, determinar a inversão do ônus da prova (art. 6º, VIII, do CDC)” (REsp 1145728/MG, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Rel. p/ Acórdão Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 28/6/2011, DJe 8/9/2011).In casu, a última situação (responsabilidade objetiva indireta) é a configurada nos autos, pois além de se inferir do documento de mov. 60.5 que a médica/ré Valkiria trabalha em “sistema de parceria” com a clínica Lipcorpus, vê-se que em 15/09/2015 a Autora e a ré CSC Consultoria e Estética Ltda. (clínica Lipcorpus) celebraram o contrato de prestação de serviços “para procedimento cirúrgico” a ser realizado no Hospital Santé, que se trata da ré Ciram Serviços Ltda. (comprovante cadastral de mov. 1.10), conforme especificado nas cláusulas abaixo reproduzidas, mediante o pagamento de R$ 15.900,00, de acordo com o orçamento firmado na mesma data:contrato de mov. 1.6orçamento de mov. 1.21 Pelos demais documentos juntados aos autos, nos quais constam impresso “Hospital Santé” (mov. 1.21), percebe-se que o acompanhamento pós-operatório também ocorreu junto ao Hospital Santé, de modo que a ré Ciram faz parte da cadeia de fornecimento dos serviços médico/hospitalar, juntamente com a ré CSC, e ambas respondem objetivamente, desde que demonstrada a culpa da médica/ré (art. 14 do CPC e art. 932, III e 933 do CC), sendo-lhes aplicável o § 1° do art. 20 do CDC (“Havendo mais de um responsável pela causação do dano, todos responderão solidariamente pela reparação prevista nesta e nas seções anteriores”).Firmadas tais premissas, cabe analisar a irresignação recursal da Autora, que propôs esta ação em 01/11/2016, após quase quatro meses do ato cirúrgico a que se submetera em 12/07/2016.Sobre os fatos, o laudo pericial assim os resumiu, com embasamento nos documentos médicos acostados aos autos (mov. 202.1, f. 19):
Com efeito, no “TERMO DE CONSENTIMENTO INFORMADO”, datado de 12/07/2016, assinado pela Autora em todas as folhas, consta a sua autorização à ré Valkiria para a realização do procedimento cirúrgico então especificado – abdominoplastia + prótese mama + pálpebra inf. sup. + enxerto lipo - e explicado, entendendo que (mov. 59.5, com negrito e sublinhado conforme texto original): “A. Como resultado da cirurgia existirá uma cicatriz, que será permanente. Para melhor esclarecer sobre a evolução cicatricial, vamos relatar os diversos períodos pelos quais as cicatrizes infalivelmente passarão:Período Imediato: Vai até o 30º dia ...Período Mediato: Vai do 30º dia até o 12º mês ...Período Tardio: Vai do 12º ao 18º mês ...Todos os esforços serão para diminuir e/ou encobrir a cicatriz de forma a torná-la o menos evidente possível. Porém, existem fatores inerentes da própria pessoa em que a cicatriz poderá ficar hipertrófica (avermelhada e elevada) ou queloidiana (que significa uma má cicatrização própria e inerente de cada organismo).Contudo, todos os esforços serão feitos no sentido de encobrir e/ou diminuir a cicatriz, de forma a torna-la o menos visível possível. B. Poderá haver inchaço (edema) ...C. Poderá haver manchas na pele ...D. Poderá haver descoloração ou pigmentação cutânea ...E. Eventualmente, líquidos, sangue e/ou secreções podem se acumular na região operada, necessitando drenagem e/ou aspirações e/ou curativos e/ou cirurgia reparadora, até mesmo em mais de um tempo cirúrgico.F. Poderá haver diminuição ou perda de sensibilidade nas áreas operadas ...G. Poderão ocorrer assimetrias e irregularidades de superfície visíveis e ou palpáveis, perda da vitalidade biológica na região operada, ocasionada pela redução da vascularização sanguínea, acarretando alteração na pele e raramente, necrose da mesma, podendo necessitar para sua reparação de nova(s) cirurgia(s), com resultados paliativos.H. ... portanto, mesmo a cirurgia perfeita do ponto de vista técnico, pode evoluir com desníveis ou sobras de pele, passíveis de correção em um segundo tempo.I. Poderá haver dor ou prurido (coceira, ardor) no pós-operatório ...J. Ocasionalmente, poderá haver transtornos do comportamento afetivo, em geral, na forma de ansiedade, depressão ou outros psicológicos mais complexos.L. Poderão ocorrer alterações neuromusculares, problemas vasculares, tromboses, embolias, acidentes anestésicos, reações alérgicas de maior ou menor intensidade (choque anafilático), demais riscos de qualquer tratamento invasivo e morte.M. Poderá ocorrer dor pós-operatória, em maior ou menor grau de intensidade ....Portanto, de posse dessas informações:3. Eu reconheço que durante o ato cirúrgico podem surgir situações ou elementos novos que não puderam ser previamente identificados e, por isso, outros procedimentos adicionais ou diferentes daqueles previamente programados possam ser necessários ......5. Eu estou ciente que após a espera do resultado, na finalização do processo de cicatrização, que leva em torno de um ano, poderá existir a necessidade de retoques ...6. Eu concordo em cooperar com o ... tratamento até meu restabelecimento completo, fazendo a minha parte no contrato médico/paciente .......9. Estou ciente que a indicação do Dr(a) Valkiria Prado Macedo de Carvalho ... estará responsável pelo seu pós-operatório sendo os retornos ... após 10 dias de cirurgia, salvo em exceções determinadas pelo mesmo, e aos 3 meses e 6 meses, podendo ter mais retornos nestes intervalos ... O paciente que não retornar nos retornos obrigatórios conforme ordens médicas serão responsáveis únicos da evolução e consequente resultado da cirurgia, isentando o cirurgião da responsabilidade do resultado da mesma....12. A evolução pós-operatória própria, seja pela sua bioquímica, seja pela sua fisiologia ou outro fator poderá trazer consequências imprevisíveis ou indesejáveis. O paciente e respectivo(s) familiar(es) estão cientes que podem ocorrer limitações das atividades cotidiana por um período de tempo indeterminado”. A Autora também preencheu e assinou, em 12/07/2016, o termo denominado “DOCUMENTO COMPROBATÓRIO DE CIÊNCIA, CONSENTIMENTO E COMPROMISSO DO PACIENTE” (mov. 60.5), firmando ainda: em 08/07/2016, o “TERMO DE CIÊNCIA E RESPONSABILIDADE HOSPITAL SANTÉ CURITIBA” (mov. 60.3); em 08/07/2016, o “TERMO DE CONSENTIMENTO DA ANESTESIA” (mov. 60.4); em 12/07/2016, a “AUTORIZAÇÃO PARA CIRURGIA DE INCLUSÃO DE PRÓTESE(S) DE SILICONE PARA MASTOPLASTIA ESTÉTICA DE AUMENTO” (mov. 60.5); e o boletim pré-anestésico datado de 12/07/2016 (mov. 60.6). Ademais, a petição inicial foi instruída com as orientações impressas entregues à Autora respeitantes ao pré e pós-operatório (mov. 1.21).Ora, a presença de cicatrizes é um risco inerente aos próprios procedimentos cirúrgicos a que se submeteu a Autora, sobretudo na abdominoplastia e na mamoplastia, além de terem um período demorado de evolução e serem permanentes, com resultado final que decorre não só de processos orgânicos próprios de cada paciente, mas também da ausência de complicações pós-cirúrgicos, como deiscência de sutura (soltura de pontos) por necrose da pele da incisão da abdominoplastia, motivo pelo qual a necessidade de retoques é comum na cirurgia plástica estética.Tal aspecto foi inclusive objeto de quesito complementar formulado pela Autora, tendo a Expert concluído que ela fora devidamente informada sobre a possibilidade de ficar com cicatrizes e sobre o risco de necrose. Confira-se (mov. 243.1, 2/3):
A propósito, em 12/07/2016 a Autora assinou o “Termo de Consentimento Pós-operatório e de Responsabilidade” (mov. 60.5), no qual consta a sua declaração de “ter recebido através do(a) Dr(a) Valkíria Prado Macedo de Carvalho, CRM 13646, cirurgião plástico, a quem reconheço como profissional de minha confiança e que prestou todas as informações inerentes a cirurgia a ser realizada”.Logo, não subsiste a negativa da Autora de que não foi devidamente informada a respeito de todas as questões envolvendo os procedimentos cirúrgicos realizados (incluindo pré e o pós-operatório), e seus riscos.Aliás, o ônus de provar o consentimento do paciente sobre os riscos inerentes a qualquer procedimento, especialmente estético, cabe ao médico, e tal prova deve ser escrita, para revestir-se da formalidade necessária, como ocorreu na espécie.Por isso, impositivo reconhecer que a Autora recebeu explicação acerca da cirurgia e suas consequências, inclusive que poderia ocorrer necrose na região operada e ficar com cicatriz hipertrófica, de modo que a ré Valkiria não faltou com o dever de informação que lhe é exigido, em conformidade com o art. 6º, III do CDC, o art. 147 do CC e o art. 34 do Código de Ética Médica.Vale adicionar que quando do exame físico feito em 18/12/2018, a Autora disse à Expert (mov. 202.1, f. 13):
De acordo com material extraído da página na internet da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, a Perita expôs quais as possíveis complicações decorrentes dos procedimentos realizados, enfatizando que “Há termo de consentimento livre e esclarecido assinado pela autora no qual as referidas complicações são citadas, ou seja, havia ciência da autora que tais complicações poderiam ocorrer”, e salientou que dentre as possíveis complicações a Autora apresentou (mov. 202.1, f. 20/21): em relação à mamoplastia, cicatrizes desfavoráveis e má cicatrização das incisões; no tocante à abdominoplastia, cicatrizes desfavoráveis, má cicatrização e necrose de pele, estando a região no exame físico então realizado com o seguinte aspecto (mov. 202.1, f. 18):
A Perita esclareceu, ademais, que (mov. 202.1, f. 21/23): “O risco de necrose da pele distal na abdominoplastia é maior quando se associa a este procedimento a lipoaspiração abdominal como foi feito na autora. A irrigação da parede abdominal é feita pelos vasos epigástricos superiores e inferiores, e também de vasos perfurantes do músculo reto abdominal. Nas abdominoplastias, os vasos epigástricos inferiores e os perfurantes são cortados, com a lipoaspiração também há lesão dos vasos superiores e laterais, o que pode levar à isquemia da pele distal, como ocorreu na autora. Por esse motivo, alguns cirurgiões plásticos preferem não associar esses dois procedimentos”; “não há anotação da médica em relação à ferida pós-operatória e quais os cuidados locais necessários”, existindo o registro apenas dos retornos em 25/07/2016 e 15/08/2016; as fotografias que instruíram a petição inicial denotam que “houve deiscência da sutura da autora por necrose da pele da incisão da abdominoplastia, uma complicação que pode ocorrer neste tipo de procedimento”, e para o respectivo tratamento “é importante que não haja infecção, o que pode ser conseguido com antibióticos sistêmicos (prescrito pela Dra Valkiria) e também tratamento local, como o Saf-Gel prescrito pelo Dr Pietro ou o merthiolate e colagenase com cloranfenicol prescritos pelo Dr Cedrick. A deiscência pode ser tratada com ressutura da ferida ou fechamento por segunda intenção, como o que ocorreu com a autora. O fechamento por segunda intenção geralmente resulta em cicatriz alargada e inestética, que tardiamente pode ser ressecada cirurgicamente gerando uma cicatriz mais discreta e estética”; “os resultados de cicatrização variam de paciente para paciente” e em razão da deiscência da sutura por necrose da pele da incisão da abdominoplastia, a Autora não deveria ter sido necessariamente internada e dificilmente correu risco de morrer (mov. 243.1, f. 1/2, quesitos complementares 1, 3 e 6).Quanto ao tempo cirúrgico (mov. 202.1, f. 23), a Expert consignou que “A cirurgia da autora teve a duração de 6,5 horas de acordo com a ficha de anestesia, ou seja, um pouco acima do ideal”, adicionando que “O número de procedimentos cirúrgicos indicados concomitantemente não foram ideais, mas estão dentro do que pode ser considerado aceitável pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica” (mov. 202.1, f. 27).Por fim, o laudo pericial concluiu que “A necrose de pele com consequente deiscência da ferida e cicatriz hipertrófica não decorreu diretamente dos atos praticados pela ré, sendo complicação do procedimento relatada na literatura, a qual a autora estava ciente já que constava do termo de consentimento informado. Entretanto, a associação da lipoaspiração com a abdominoplastia pode ter aumentado o risco de necrose da pele que a autora sofreu” (mov. 202.1, f. 27), aspecto que ficou mais elucidado pela Perita com os seguintes quesitos (mov. 243.1, f. 2/3):
Ou seja, apesar de o laudo ter apontado que “as cicatrizes mamárias e da abdominoplastia são hipertróficas, em especial a da abdominoplastia em sua porção central, na qual há uma grande cicatriz alargada inestética proveniente de fechamento por 2ª intenção” (mov. 202.1, f. 19), “que tardiamente pode ser ressecada cirurgicamente gerando uma cicatriz mais discreta e estética” (mov. 202.1, f. 23), a Perita enfatizou que “A necrose de pele com consequente deiscência da ferida e cicatriz hipertrófica não decorreu diretamente de atos praticados pela médica ré, sendo complicação do procedimento relatada na literatura, a qual a autora estava ciente já que constava do termo de consentimento informado” (mov. 243.1, f. 2, quesito complementar 6).Assim, por mais que a Autora possa não estar satisfeita com o resultado cirúrgico alcançado, o que passou a manifestar com um mês da cirurgia, conforme demonstram as conversas via aplicativo WhatsApp mantidas com funcionária do hospital e reproduzidas no mov. 1.19, é de se anotar que ela foi cientificada da demora na evolução cicatricial e do aspecto seu final incerto, com possibilidade de reparo, tendo voluntariamente desistido do tratamento pós-operatório junto às Corrés.Desse modo, restando demonstrado que a Autora tinha pleno conhecimento de que, não obstante a melhor técnica utilizada, o resultado cicatricial da cirurgia plástica estava sujeito a eventuais reações orgânicas subjetivas, impositivo concluir que não há dever de indenizar das Corrés, ante a ausência de nexo de causalidade entre a atuação médica e os supostos danos; daí o desprovimento do recurso e a manutenção integral da sentença.Nesse sentido, é a Jurisprudência: “APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSO CIVIL. CONSUMIDOR. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. ALEGAÇÃO DE ERRO MÉDICO E RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO HOSPITAL – EXEGESE DOS ARTIGOS 932, III E 933 DO CÓDIGO CIVIL. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. CIRURGIAS PLÁSTICAS DE ABDOMINOPLASTIA, MAMOPLASTIA, LIPOASPIRAÇÃO, BLEFAROPLASTIA, SUSPENSÃO DE SUPERCÍLIO E REPARO DE LIPOASPIRAÇÃO – PROCEDIMENTOS ESTÉTICOS – OBRIGAÇÃO DE RESULTADO – CULPA PRESUMIDA – PROVAS DOS AUTOS QUE DÃO CONTA DE CORRETA CONDUTA MÉDICA NOS PROCEDIMENTOS ESTÉTICOS EM LIDE – AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE NEXO DE CAUSALIDADE E DANO EXPERIMENTADO. PROVA PERICIAL CONCLUSIVA PELA INOCORRÊNCIA DE FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO PELO MÉDICO RÉU QUE ATENDEU A PACIENTE – AUSÊNCIA DOS ELEMENTOS DO DEVER DE INDENIZAR NO CASO. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS RECURSAIS. APELAÇÃO DESPROVIDA”. (TJPR - 9ª C.Cível - 0019162-69.2014.8.16.0001 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR ROBERTO PORTUGAL BACELLAR - J. 17.06.2021) “APELAÇÃO CÍVEL – DIREITO CIVIL E DIREITO PROCESSUAL CIVIL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR LUCROS CESSANTES, DANOS ESTÉTICOS E MORAIS – ABDOMINOPLASTIA E LIPOASPIRAÇÃO DA REGIÃO DA CINTURA – SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA – PRELIMINARES EM CONTRARRAZÕES – ARGUIÇÃO DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE – REPRODUÇÃO DE MANIFESTAÇÃO ANTERIOR QUE NÃO DEIXOU DE IMPUGNAR OS FUNDAMENTOS DA SENTENÇA – PEDIDO DE REVOGAÇÃO DA JUSTIÇA GRATUITA CONCEDIDA À AUTORA – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE ALTERAÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS FÁTICAS QUE ENSEJARAM A CONCESSÃO DA BENESSE – REJEIÇÃO – MÉRITO – CIRURGIA ESTÉTICA E REPARADORA – ALEGAÇÃO DE ERRO MÉDICO E INFECÇÃO HOSPITALAR – PERITO QUE CONCLUI SER IRREPROVÁVEL A CONDUTA MÉDICA – INSATISFAÇÃO COM O RESULTADO QUE NÃO CARACTERIZA ERRO MÉDICO – HIPÓTESE EM QUE NÃO HOUVE INFECÇÃO, MAS NECROSE DO RETALHO ABDOMINAL – COMPLICAÇÃO INERENTE AOS PROCEDIMENTOS – DEVER DE INFORMAÇÃO ATENDIDO – SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO”. (TJPR - 8ª C.Cível - 0022690-53.2016.8.16.0030 - Foz do Iguaçu - Rel.: JUIZ DE DIREITO SUBSTITUTO EM SEGUNDO GRAU ADEMIR RIBEIRO RICHTER - J. 16.02.2021) “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E ESTÉTICOS DECORRENTES DE ERRO MÉDICO. CIRURGIA PLÁSTICA. ABDOMINOPLASTIA E MAMOPLASTIA. PRETENSÃO DE RETIRADA DE “ABDÔMEM EM AVENTAL” E “PTOSE MAMÁRIA”. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA. PROVA PERICIAL QUE ATESTOU A AUSÊNCIA DE FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO REALIZADO PELO CIRURGIÃO PLÁSTICO. DECISÃO MANTIDA. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM GRAU RECURSAL. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO”. (TJPR - 8ª C.Cível - 0006278-37.2016.8.16.0001 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR MARCO ANTONIO ANTONIASSI - J. 21.09.2020) “APELAÇÃO CÍVEL – “AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS, MORAIS E ESTÉTICOS” - ERRO MÉDICO – CIRURGIA DE MASTOPEXIA E ABDOMINOPLASTIA - APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – RELAÇÃO DE CONSUMO – RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DO PROFISSIONAL LIBERAL QUE NÃO AFASTA A INCIDÊNCIA DO CODEX CONSUMERISTA – INEXISTÊNCIA DE ERRO MÉDICO – CULPA DO PROFISSIONAL NÃO CONFIGURADA – CICATRIZES DECORRENTES DE REAÇÃO INTRÍNSECA DO ORGANISMO DA AUTORA - SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA – HONORÁRIOS RECURSAIS – CABIMENTO. RECURSO DE APELAÇÃO DESPROVIDO. 1 – Com base no conjunto probatório carreado aos autos, não é possível concluir pela ocorrência de erro médico, na medida em que, as cicatrizes decorrentes do procedimento cirúrgico realizado pelo requerido, são reações intrínsecas ao organismo da autora”. (TJPR - 10ª C.Cível - 0029775-17.2011.8.16.0014 - Londrina - Rel.: DESEMBARGADOR LUIZ LOPES - J. 27.09.2018) 3. Por fim, considerando o resultado deste julgamento, com a derrota da Apelante, os honorários advocatícios são majorados para 12% sobre o valor atualizado da causa, com base no art. 85, § 11, do CPC/2015, com a ressalva de ser beneficiária da assistência judiciária. 4. Diante do exposto, conclui-se pelo conhecimento e desprovimento da apelação, com a majoração dos honorários advocatícios pela fase recursal, nos termos da fundamentação.
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