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Acórdão
Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Acórdão. Eventuais imagens serão suprimidas.
1. Trata-se de apelações interpostas em face da sentença proferida nos autos de Execução de Título Extrajudicial nº 0000121-86.1995.8.16.0097, oriundos da Vara Cível da Comarca de Ivaiporã, que extinguiu a ação em razão da prescrição intercorrente, condenando a executada ao pagamentos das custas processuais e de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa[1] (mov. 97.1 – processo originário). Nas razões do apelo 1, sustenta o exequente, em síntese: a) a ausência de análise, pelo decisum, da suspensão do processo em virtude do recebimento de embargos à execução com efeito suspensivo e, posteriormente, em face de Fumio Makito, em decorrência da declaração de insolvência civil, resultando no arquivamento provisório para aguardar a venda dos bens penhorados, o que impossibilitaria a contagem do prazo; b) o descabimento da aplicação do instituto da prescrição intercorrente, por se tratar de objeto de nova lei processual, de forma retroativa (mov. 101.1 – processo originário). Nas razões do apelo 2, assevera a executada, em suma, a necessidade de condenação do ente financeiro em honorários sucumbenciais, a serem arbitrados em, no mínimo, 10% do montante atualizado da execução, afastando-se a sua condenação (mov. 107.1 – processo originário). Apresentadas contrarrazões (movs. 106.1 e 113.1 – processo originário), vieram os autos a esta Corte. É o relatório.
VOTO 2. Em breve resumo, trata-se de execução de título extrajudicial, embasada em notas promissórias, movida pelo Banco Bradesco S.A. em face de Fumio Makita (avalista) e Cereal Cerealista Real Ltda., em maio de 1995. Expedido mandado de citação, houve a penhora de bens, que foram avaliados (mov. 1.3, f. 24 – processo originário). Os executados, por sua vez, opuseram embargos à execução, que foram recebidos com efeito suspensivo e, posteriormente, julgados improcedentes, na data de 04/03/1996 (mov. 1.3, fls. 58/69 – processo originário). Prosseguindo a execução, o banco pleiteou a elaboração de nova conta geral, em outubro de 1997 (mov. 1.3, f. 61 – processo originário), que foi juntada na sequência, com a qual os devedores não concordaram (mov. 1.3, f. 66 – processo originário). Novo laudo de avaliação dos bens anteriormente penhorados foi juntado, em março de 1998 (mov. 1.3, fls. 70/71 – processo originário). A execução foi novamente suspensa, em abril de 1998, consoante a certidão do mov. 1.3, f. 79 do processo originário, considerando a oposição de embargos de terceiros (nº 0000117-44.1998.8.16.0097, onde houve acordo, com o levantamento da penhora que recaiu sobre o imóvel matriculado sob n° 27.844). Não obstante, por meio da certidão do mov. 1.3, f. 87-verso do processo originário, foi informada a declaração de insolvência civil do avalista, Fumio Makita, nos autos nº 132/98 (atual nº 0000115-74.1998.8.16.0097). Ato subsequente, instado a se manifestar sobre a penhora dos imóveis lavrada anteriormente, o exequente informou que não registraria as constrições, considerando a insolvência declarada do avalista, pleiteando que a demanda aguardasse (mov. 1.3, f. 91 – processo originário). Assim foi feito, de modo que o processo ficou sem movimentação de fevereiro de 1999 até janeiro de 2001, quando sobreveio a seguinte certidão (mov. 1.3, f. 92-verso – processo originário):
Nova petição da instituição financeira somente foi apresentada em julho de 2005, quando postulou a suspensão da execução pelo prazo de 90 dias ou até ulterior requerimento. Pleito deferido (mov. 1.3, f. 95 – processo originário). Decorrido o prazo, intimado, o exequente pugnou que a execução aguardasse a venda dos bens penhorados nos autos da insolvência (mov. 1.3, f. 96 – processo originário), requerimento novamente deferido, sendo os autos enviados ao arquivo provisório em abril de 2006 (mov. 1.3, f. 98 – processo originário):
Assim sendo, o feito permaneceu paralisado desde então, sendo que somente em setembro de 2013 é que o banco pleiteou a “penhora online” (mov. 1.3, f. 99 – processo originário), o que foi deferido na decisão do mov. 10.1 do processo originário. Nesse contexto, foi apresentada exceção de pré-executividade pela executada Cereal Cerealista Real Ltda. (mov. 89.1 – processo originário), ensejando a sentença ora vergastada, que extinguiu a ação em razão da prescrição intercorrente, condenando a excipiente em custas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa. Sendo oportuno, é importante mencionar que a insolvência de Fumio Makita foi declarada em abril de 1998, com determinação de vencimento antecipado dos créditos sujeitos, arrecadação de todos os bens penhoráveis e instauração de concurso universal de credores, com a respectiva expedição de ofícios e publicação de editais, bem como nomeação de administradora da massa insolvente. Aliás, o exequente pleiteou a habilitação de seu crédito logo na sequência (vide autos nº 0000120-96.1998.8.16.0097), o que somente foi deferido em março de 2020, consoante decisão do mov. 76.1 dos autos de habilitação. Além disso, a citada insolvência ainda não teve seu desfecho, sendo que, atualmente, ainda está pendente a avaliação definitiva de bens. Pois bem.
Inicialmente, cumpre esclarecer que o instituto jurídico da prescrição intercorrente, criação doutrinária assimilada pela jurisprudência nacional, constitui-se em hipótese de extinção da exigibilidade judicial da prestação, que ocorre pela paralisação injustificada – por culpa do credor – da execução (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil - Execução. 3ª Ed. RT, 2011). Ademais, considerando as alegações tecidas nas razões recursais, vale consignar que foi justamente a notória divergência entre os entendimentos das Turmas que compõem a Segunda Seção do STJ que levou à instauração do incidente de assunção de competência no REsp nº 1.604.412/SC, a fim de uniformizar o entendimento a respeito do cabimento da prescrição intercorrente aos casos regidos pelo Código de Processo Civil de 1973. Convém mencionar que no recurso especial supramencionado, cujo julgamento ocorreu em 27 de junho de 2018, foram fixadas as seguintes teses: RECURSO ESPECIAL. INCIDENTE DE ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA. CABIMENTO. TERMO INICIAL. NECESSIDADE DE PRÉVIA INTIMAÇÃO DO CREDOR-EXEQUENTE. OITIVA DO CREDOR. INEXISTÊNCIA. CONTRADITÓRIO DESRESPEITADO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. As teses a serem firmadas, para efeito do art. 947 do CPC/2015 são as seguintes: 1.1 Incide a prescrição intercorrente, nas causas regidas pelo CPC/73, quando o exequente permanece inerte por prazo superior ao de prescrição do direito material vindicado, conforme interpretação extraída do art. 202, parágrafo único, do Código Civil de 2002. 1.2 O termo inicial do prazo prescricional, na vigência do CPC/1973, conta-se do fim do prazo judicial de suspensão do processo ou, inexistindo prazo fixado, do transcurso de um ano (aplicação analógica do art. 40, § 2º, da Lei 6.830/1980). 1.3 O termo inicial do art. 1.056 do CPC/2015 tem incidência apenas nas hipóteses em que o processo se encontrava suspenso na data da entrada em vigor da novel lei processual, uma vez que não se pode extrair interpretação que viabilize o reinício ou a reabertura de prazo prescricional ocorridos na vigência do revogado CPC/1973 (aplicação irretroativa da norma processual). 1.4. O contraditório é princípio que deve ser respeitado em todas as manifestações do Poder Judiciário, que deve zelar pela sua observância, inclusive nas hipóteses de declaração de ofício da prescrição intercorrente, devendo o credor ser previamente intimado para opor algum fato impeditivo à incidência da prescrição. 2. No caso concreto, a despeito de transcorrido mais de uma década após o arquivamento administrativo do processo, não houve a intimação da recorrente a assegurar o exercício oportuno do contraditório. 3. Recurso especial provido. (Sem destaque no original) Destarte, na hipótese, a primeiro ponto a ser ressaltado é que, em relação ao período questionado, a execução ficou paralisada porque aguardava o deslinde de outra ação, nº 0000115-74.1998.8.16.0097 (Insolvência Civil), conforme determinado na decisão que acarretou o arquivamento provisório do feito. Além disso, consoante relatado, verifica-se que referido processo ainda não teve seu curso encerrado, isto é, em momento algum cessou o motivo que levou à suspensão da execução. Por conseguinte, sem adentrar no mérito do acerto ou não do pronunciamento que deferiu a suspensão do feito executório até que fosse realizada a venda dos bens penhorados nos autos da insolvência e que levou à paralisação da execução, tampouco se era o caso de suspensão da demanda, já que proposta também em face da devedora principal e foi reconhecida apenas a insolvência do avalista, pessoa física, não se pode olvidar a ausência de desídia do credor em dar andamento ao processo e realizar as diligências, não podendo ser imputada ao ente financeiro a demora do deslinde do feito, que se deve à complexidade da questão dos autos. Em casos semelhantes, mutandis mutatis, já decidiu esta Corte: AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXECUÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL – TERMO DE RENEGOCIAÇÃO DE DÍVIDA – DECISÃO QUE AFASTOU A PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE – PRAZO QUINQUENAL – INTELIGÊNCIA DO ART. 205, DA LEI UNIFORME DE GENEBRA E ART. 206, §5°, I, DO CC E SÚMULA 150, DO STF – FEITO PARALISADO POR APROXIMADAMENTE 10 (DEZ) ANOS – CAUSA INTERRUPTIVA DA PRESCRIÇÃO – RECONHECIMENTO DA INSOLVÊNCIA CIVIL DO DEVEDOR PRINCIPAL – INSTAURAÇÃO DO CONCURSO UNIVERSAL PREVISTO NO ART. 777 DO CPC – AUSÊNCIA DE DESÍDIA DO CREDOR – DEMORA DECORRENTE DA COMPLEXIDADE DO FEITO CONSISTENTE NA ARRECADAÇÃO DE BENS E HABILITAÇÃO DE CREDORES – DECISÃO MANTIDA POR OUTROS TERMOS. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (TJPR - 16ª C.Cível - 0005910-26.2019.8.16.0000 - Castro - Rel.: Desembargadora Maria Mércis Gomes Aniceto - J. 03.07.2019. Sem destaque no original) AGRAVO DE INSTRUMENTO - INSOLVÊNCIA CIVIL - REJEIÇÃO DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE - INSURGÊNCIA DO INSOLVENTE – NÃO ACOLHIMENTO - APLICABILIDADE DAS NORMAS PREVISTAS NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973 QUANTO À INSOLVÊNCIA - VIGÊNCIA DETERMINADA PELO ART. 1.052 DO CPC/2015 - INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO PELA INSTAURAÇÃO DO CONCURSO UNIVERSAL - ART.777 DO CPC/1973 - MOROSIDADE DECORRENTE DA COMPLEXIDADE DA DEMANDA, NECESSIDADE DE ARRECADAÇÃO DE BENS E HABILITAÇÃO DE CREDORES - AUSÊNCIA DE DESÍDIA DO JUDICIÁRIO OU NEGLIGÊNCIA DA ADMINISTRADORA DA INSOLVÊNCIA - DILIGÊNCIAS NECESSÁRIAS E PERTINENTES - INEXISTÊNCIA DE PARALISAÇÃO - INOCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE - DECISÃO MANTIDA. Insolvência civil, previstas nos arts. 748 a 786-A do Código de Processo Civil de 1973, permanecem em vigor por determinação expressa do art. 1.052 do CPC/2015.2. A morosidade no trâmite processual decorre da complexidade do feito, da necessidade de arrecadação de bens em outros estados e do prévio julgamento das habilitações de crédito, não podendo ser imputada ao judiciário e, tampouco, à administradora da insolvência. 3. Inexistindo desídia ou mesmo paralisação indevida do processo, não há prescrição intercorrente, notadamente quando o curso dos prazos prescricionais se encontra interrompido, nos termos do art. 777 do Código de Processo Civil de 1973. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (TJPR - 17ª C.Cível - AI - 1651096-8 - Curitiba - Rel.: Rosana Amara Girardi Fachin - Unânime - J. 11.04.2018. Sem destaque no original) Mais que isso, bem se sabe que no curso da insolvência civil permanece suspenso o prazo da prescrição até a ultimação do processo, reiniciando a contagem no dia em que passar em julgado a sentença de encerramento da insolvência, conforme redação dos arts. 777 e 778 do CPC/73, que ainda permanece em vigor, nos termos do art. 1.052 do NCPC[2]. Nesse diapasão, bem como sendo Fumio Makita e a empresa executada devedores solidários, a interrupção ocorrida aproveita a todos, nos termos do art. 204, § 1°, do Código Civil: Art. 204. A interrupção da prescrição por um credor não aproveita aos outros; semelhantemente, a interrupção operada contra o co-devedor, ou seu herdeiro, não prejudica aos demais coobrigados.§ 1º A interrupção por um dos credores solidários aproveita aos outros; assim como a interrupção efetuada contra o devedor solidário envolve os demais e seus herdeiros. A propósito: Agravo de instrumento. Execução. Contrato particular de confissão de dívida garantido por nota promissória. Despacho agravado que acolhe a exceção de pré-executividade para reconhecer ‘a ocorrência de prescrição intercorrente da pretensão executiva’. Ausência de desídia da parte exequente. A interrupção efetuada contra o devedor principal envolve o avalista. Aplicação do art. 204, §1º, do Código Civil. Ausência de prescrição da pretensão. Decurso de tempo sem andamento por culpa do mecanismo judiciário que deixou de apreciar requerimento da parte. Ausência de prescrição intercorrente. A interrupção do prazo prescricional por um dos devedores solidários aproveita aos outros; assim como a interrupção efetuada contra o devedor solidário envolve os demais e seus herdeiros (art. 204, § 1º, Código Civil). A prescrição intercorrente não pode ser reconhecida na hipótese em que a paralisação do feito se deu por falha do Poder Judiciário e não por desídia da parte exequente. Recurso conhecido e provido. (TJPR - 15ª C.Cível - 0047812-90.2018.8.16.0000 - Castro - Rel.: Hamilton Mussi Corrêa - J. 20.02.2019. Sem destaque no original) Logo, não há que se falar em prescrição intercorrente no caso, já que não se verificou a desídia da parte, devendo ser cassado o ato hostilizado, com o prosseguimento do feito executório. Por conseguinte, prejudicado o recurso 2, que discutia apenas a condenação em honorários sucumbenciais. Ante o exposto, voto por conhecer e dar provimento à apelação 1, cassando a sentença que reconheceu a prescrição intercorrente, para determinar o ulterior prosseguimento da execução, e julgar prejudicada a apelação 2.
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