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APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE. INSTRUMENTO PARTICULAR DE CESSÃO DE DIREITOS PATRIMONIAIS E INTELECTUAIS. AUSÊNCIA DE VALOR FIXO QUE NÃO ENSEJA NA NULIDADE DO CONTRATO. NECESSÁRIA INTERPRETAÇÃO DA REAL INTENÇÃO DAS PARTES. NULIDADE AFASTADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Os direitos autorais podem ser total ou parcialmente transferidos a terceiros, por ele ou por seus sucessores, a título universal ou singular, pessoalmente ou por meio de representantes com poderes especiais, por meio de licenciamento, concessão, cessão ou por outros meios admitidos em Direito.2. Por cessão, compreende-se a transferência negocial de direitos, deveres ou bens, a título gratuito ou oneroso, onde o cedente assume a posição jurídica idêntica à do cessionário e, em se tratando do contrato de cessão de direitos autorais sub judice, operou-se a substituição subjetiva do titular de tais direitos, adquirindo o cessionário o direito de exploração, de forma absoluta e definitiva, cuja matéria encontra-se regulamentada através da Lei n° 9.610/98, atual Lei de Direitos Autorais, cujos artigos 49 e 50 estabelece os meios pelos quais a cessão pode ser efetivada.3. O magistrado singular declarou nulo o “Instrumento de Cessão de Direitos Patrimoniais e Intelectuais e outros Pactos” ao argumento de que a cessão se deu de forma onerosa e, embora clara a onerosidade da negociação, o documento firmado não indica o preço pactuado entre as partes, ferindo o supracitado artigo 50, §2° da Lei n° 9.610/98.4. Contudo, nem sempre o contrato traduz a exata vontade das partes no momento de sua celebração, não sendo raro que a redação das cláusulas mostrem-se obscuras ou ambíguas, de forma que mister se mostra interpretar o negócio jurídico a fim de precisar o sentido e alcance do conteúdo da declaração de vontade, em observância aos artigos 112 e 113 do Código Civil, de onde se extrai a intenção do legislador pela conservação do contrato, o qual deve ser interpretado observando-se o princípio da boa-fé, sem que haja a presunção de que os contratantes tenham celebrado um contrato carecedor de qualquer utilidade, prevalecendo, portanto, a interpretação que permita o seu aproveitamento dentro dos limites da vontade dos contratantes, evitando-se impor conteúdo diverso do realizado.5. Em que pese não constar no “Instrumento Particular de Cessão de Direitos Patrimoniais e Intelectuais e Outros Pactos” acostado no mov. 1.3, fls. 25/27, o preço fixo ajustado entre as partes, extrai-se da cláusula terceira que a cedente, por valor livre e mutuamente ajustado e dado como adequado, devidamente recebido no ato, deu quitação ao contrato, resguardado, ainda, o seu direito de usufruto vitalício no tocante aos direitos patrimoniais de autor sobre as criações intelectuais de Fernando Correia Dias e de Cecília Meireles, conforme estabelecido na Cláusula Quarta.6. Considerando o princípio da conservação do contrato, respeitando-se a real intenção dos contratantes, deve ser afastada a nulidade em razão de não constar no instrumento o valor fixo estipulado entre as partes, sobretudo quando se considera ser plenamente cabível a transferência de propriedade dos direitos de forma gratuita, conforme, inclusive, reconhecido pelo magistrado a quo na sentença de mov. 879.1, não sendo plausível, portanto, a declaração da nulidade do contrato em razão de suposta ausência de preço quando sequer havia a necessidade de estipular um preço.7. Ademais, não restou demonstrado qualquer prejuízo suportado pela cedente, a qual, vale ressaltar, possuía pleno conhecimento jurídico decorrente do exercício de sua profissão de advogada e formação em Direito, a qual já havia demonstrado sua insatisfação em relação à forma de administração dos direitos autorais de CECÍLIA MEIRELES, demonstrando preocupação em relação aos direitos patrimoniais e intelectuais adquiridos em razão de sucessões hereditárias.
(TJPR - 18ª Câmara Cível - 0064819-92.2014.8.16.0014 - Londrina - Rel.: DESEMBARGADOR MARCELO GOBBO DALLA DEA - J. 15.09.2021)
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Acórdão
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I – RELATÓRIO Trata-se de Ação Declaratória de Nulidade proposta por FERNANDA MARIA CORREIA DIAS DOS SANTOS contra RICARDO STRANG, através da qual pretende a declaração de nulidade do Instrumento Particular de Cessão de Direitos Patrimoniais e Intelectuais e outros pactos firmado pelo réu com Maria Mathilde Meirelles Correia (mov. 1.1). Após o regular trâmite processual, sobreveio sentença (mov. 879.1), nos seguintes termos, in verbis: Isto posto, JULGO PROCEDENTES os pedidos deduzidos na exordial, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil para declarar nulo o “Instrumento de Cessão de Direitos Patrimoniais e Intelectuais e outros Pactos” firmado originalmente entre Maria Mathilde Meirelles Correia e Ricardo Strang, nos termos da fundamentação.Ante a sucumbência, condeno o réu ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 20% sobre o valor atualizado da causa (INPC), com fulcro no art. 85, §2º, do Código de Processo Civil, atenta às diretrizes legais. Embargos de Declaração foram opostos pelo requerido no mov. 890.1 e rejeitados pelo magistrado prolator da sentença no mov. 913.1. Na sequência, o requerido interpôs o presente Recurso de Apelação (mov. 925.1), em cujas razões sustenta, em síntese, in verbis, que:a) a Lei 9.610/98 regula as normas sobre utilização e proteção dos direitos autorais entre os autores e produtores culturais. A cessão mencionada em seu art. 49 refere-se à permissão de exploração dos direitos autorais para edição e afins – modalidade especial de cessão conhecida como “licencimento”. A referida lei regula os contratos de comercialização dos direitos autorais com as editoras e afins, pois nessa modalidade a cessão significa a autorização temporária para a exploração da obra do autor através de um licenciamento temporário, o que nem de longe é o caso do contrato objeto da presente demanda;b) o contrato objeto da presente demanda não é um contrato de edição e sim um contrato civil - conforme foi inclusive reconhecido pelo M.M. Juízo de 1º Grau na r. sentença na parte em que rejeita a ocorrência de lesão - cujo objeto é a transferência de propriedade de um bem móvel, que são os direitos autorais, conforme disposto no art. 3º da Lei 9.610/98 os direitos autorais;c) o Réu, ora Apelante, não é um editor ou outra espécie de produtor cultural. Muito pelo contrário, ele é co-proprietário dos direitos autorais da poetisa Cecília Meireles, juntamente com a cedente e a Assistente da Autora, ora Apelada, da presente demanda. Ou seja, de forma alguma ele poderia ter celebrado um contrato de cessão de licenciamento de uso dos direitos autorais, pois, repita-se, ele não é um editor ou produtor cultural. O Réu, ora Apelante, celebrou um contrato de cessão de natureza civil onde se operou a transferência de propriedade da parte dos direitos autorais que pertencia a cedente, razão pela qual não há que se falar em aplicação na presente demanda do art. 49 e 50 da Lei 9.610/1998;d) o M.M. Juízo de 1º Grau que não há indicação de preço certo no contrato e somente por esse motivo, declarou nulo o contrato objeto da presente demanda. Ocorre que o referido entendimento macula a r. sentença de seq. 879, deixando-a obscura, na medida em que foi fundada no art.49 da Lei 9.610/98, o qual não exige “preço certo”, referindo-se apenas a “preço”. Dessa forma, o M.M. Juízo de 1º Grau jamais poderia declarar a nulidade em razão da falta de preço certo;e) diferentemente do entendido na r. sentença monocrática, o contrato objeto da presente demanda possui sim preço claro, conhecido e aferível (ainda que a posteriori), haja vista que as cláusulas Terceira e Quarta transcritas na r. sentença de seq. 879 são claras nesse sentido. Ficou convencionando entre o Réu, ora Apelante, e a cedente que foi instituído o usufruto vitalício em favor da mesma no tocante aos direitos patrimoniais. Ou seja, enquanto fosse viva a cedente continuaria a receber todos os frutos dos direitos autorais – agora, na qualidade de usufrutuária - ou seja, receberia todos os valores devidos pelas editoras e/ou demais produtores culturais ao Réu, na qualidade de novo proprietário daquele quinhão da obra, assim como aqueles frutos decorrentes da celebração de todos e quaisquer novos contratos de licenciamento das obras da poetisa Cecília Meireles;f) o usufruto não é um direito da cedente, pois, repita-se, no contrato de cessão, objeto da presente demanda, não houve o licenciamento da obra, onde o autor autoriza o seu uso e em troca pode ou não receber uma remuneração e continua titular da obra. No contrato objeto da lide houve a transferência da propriedade dos direitos autorais para o Réu, ora Apelante, o qual passou a ser o único titular daquela parcela dos direitos autorais e consequentemente seria o recebedor dos valores relativos aos eventuais contratos de licenciamento, caso não tivesse pactuado a cláusula de usufruto vitalício;g) uma vez que foram rechaçadas todas as infundadas alegações da Apelada para buscar a nulidade do contrato objeto da presente lide, é evidente que a r. sentença de seq. 879 não poderia declarar nulo o contrato com base na alegação de suposta ausência de preço. O contrato objeto da presente lide, possui preço estipulado, qual seja, o usufruto vitalício dos direitos patrimoniais, o que difere de valor. Um contrato pode ter um preço, mas não ter um valor certo estabelecido, pois isto dependerá dos frutos que serão afinal apurados e percebidos;h) inexiste vício no contrato em relação ao preço, tendo o M.M. Juízo de 1º Grau incorrido em erro em razão da grande confusão que a Autora, ora Apelada, fez na inicial e ao longo do processo entre contrato de alienação dos direitos autorais - que são considerados um bem móvel - regulado pelo Código Civil e contrato de edição (licenciamento de uso dos direitos autorais) regulado pela Lei 9.610/98;i) a transferência de propriedade dos direitos autorais objeto do contrato questionado na presente demanda poderia ter sido realizada de forma gratuita conforme reconhecido por esse M.M. Juízo na r. sentença de seq 879, razão pela qual se afigura completamente contraditório o reconhecimento de nulidade do contrato em razão de suposta ausência de preço, pois, repita-se, no contrato sequer havia a necessidade de constar um preço e caso a transferência de propriedade dos direitos autorais tivesse ocorrido de forma gratuita, seria também juridicamente válida;j) no dia 29/06/2007 a Sra. Mathilde, mais uma vez decepcionada e cansada da postura da Assistente, que, repita-se, tinha o hábito de entrar com ações na justiça e fazer notificações extrajudiciais tumultuando a administração da obra da poetisa Cecília Meireles, após receber mais uma notificação extrajudicial enviada pela ora Assistente, resolveu escrever-lhe uma carta de próprio punho, cuja cópia foi acostada na seq. 365.4, onde expressa toda a sua decepção e preocupação com a postura de sua irmã;k) assim, depois de tanto lutar, para alcançar o seu objetivo, a Sra. Maria Mathilde, dois meses após conseguir a vitória que tanto almejou, achou por bem celebrar o contrato de cessão com o Réu, ora Apelante, com vistas a assegurar que todo o seu esforço não fosse em vão, pois a mesma tinha total ciência que após o seu falecimento, não haveria um consenso entre seus três filhos, o que colocaria novamente em risco o futuro da obra de sua mãe. Por tais razões, pugnou pelo conhecimento e provimento do recurso para o fim de reformar a sentença. Contrarrazões foram apresentadas nos mov. 940.1 e 941.1. É a breve exposição.
II - VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO: O recurso é tempestivo e preenche os demais requisitos de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecido. A autora/apelada Fernanda Maria Correia Dias dos Santos é herdeira e inventariante de Maria Mathilde Meirelles Correia, filha de Cecília Meirelles, a qual herdou 1/3 dos direitos autorais da poetisa e do artista plástico Fernando Correia Dias. Ao abrir a sucessão de Maria Mathilde foi apresentado um “Instrumento Particular de Cessão de Direitos Patrimoniais e Intelectuais e Outros Pactos”, de acordo com o qual a Sra. Maria Mathilde, mãe da autora, cedia ao seu sobrinho, ora apelante, todos os direitos intelectuais e autorais que detinha da obra de Cecília Meirelles e Fernando Correia Dias, bem como bens móveis e demais itens relacionados. Assim, trata-se o presente caso de Ação Declaratória de Nulidade proposta por FERNANDA MARIA CORREIA DIAS DOS SANTOS contra RICARDO STRANG, através da qual pretende a declaração de nulidade do instrumento particular de Cessão de 1/3 dos Direitos Patrimoniais e Intelectuais adquiridos em razão de sucessões hereditárias, tanto do artista plástico FERNANDO CORREIA DIAS, como da poetisa CECÍLIA MEIRELLES, firmado entre MARIA MATHILDE MEIRELLES CORREIA DIAS, na qualidade de cedente, e RICARDO STRANG na figura do cessionário. A sentença julgou procedente o pedido inicial por entender que, em decorrência da aplicação da Lei nº 9.610/1998 ao caso, deveria constar expressamente no contrato o preço certo pela negociação realizada entre as partes, o que, contudo, inexiste no instrumento de mov. 1.3, faltando-lhe, por tal razão, elemento essencial à sua validade. No mérito, pretende o apelante a reforma da sentença a fim de reconhecer a validade do “Instrumento Particular de Cessão de Direitos Patrimoniais e Intelectuais e Outros Pactos”, ao argumento de que a transferência de propriedade dos direitos autorais objeto do contrato questionado na presente demanda poderia ter sido realizada de forma gratuita conforme reconhecido pelo Juízo na sentença de mov. 879, razão pela qual se afigura completamente contraditório o reconhecimento de nulidade do contrato em razão de suposta ausência de preço. Pois bem. Os direitos autorais podem ser total ou parcialmente transferidos a terceiros, por ele ou por seus sucessores, a título universal ou singular, pessoalmente ou por meio de representantes com poderes especiais, por meio de licenciamento, concessão, cessão ou por outros meios admitidos em Direito. Por cessão, compreende-se a transferência negocial de direitos, deveres ou bens, a título gratuito ou oneroso, onde o cedente assume a posição jurídica idêntica à do cessionário e, em se tratando do contrato de cessão de direitos autorais sub judice, operou-se a substituição subjetiva do titular de tais direitos, adquirindo o cessionário o direito de exploração, de forma absoluta e definitiva. Referida matéria encontra-se regulamentada através da Lei n° 9.610/98, atual Lei de Direitos Autorais, cujos artigos 49 e 50 estabelece os meios pelos quais a cessão pode ser efetivada, nos seguintes termos: Art. 49. Os direitos de autor poderão ser total ou parcialmente transferidos a terceiros, por ele ou por seus sucessores, a título universal ou singular, pessoalmente ou por meio de representantes com poderes especiais, por meio de licenciamento, concessão, cessão ou por outros meios admitidos em Direito, obedecidas as seguintes limitações:I - a transmissão total compreende todos os direitos de autor, salvo os de natureza moral e os expressamente excluídos por lei;II - somente se admitirá transmissão total e definitiva dos direitos mediante estipulação contratual escrita;III - na hipótese de não haver estipulação contratual escrita, o prazo máximo será de cinco anos;IV - a cessão será válida unicamente para o país em que se firmou o contrato, salvo estipulação em contrário;V - a cessão só se operará para modalidades de utilização já existentes à data do contrato;VI - não havendo especificações quanto à modalidade de utilização, o contrato será interpretado restritivamente, entendendo-se como limitada apenas a uma que seja aquela indispensável ao cumprimento da finalidade do contrato. Art. 50. A cessão total ou parcial dos direitos de autor, que se fará sempre por escrito, presume-se onerosa.§ 1º Poderá a cessão ser averbada à margem do registro a que se refere o art. 19 desta Lei, ou, não estando a obra registrada, poderá o instrumento ser registrado em Cartório de Títulos e Documentos.§ 2º Constarão do instrumento de cessão como elementos essenciais seu objeto e as condições de exercício do direito quanto a tempo, lugar e preço. No caso dos autos, o magistrado singular declarou nulo o “Instrumento de Cessão de Direitos Patrimoniais e Intelectuais e outros Pactos” firmado originalmente entre Maria Mathilde Meirelles Correia e Ricardo Strang, ao argumento de que, nos termos da cláusula terceira, a cessão se deu de forma onerosa e, embora clara a onerosidade da negociação, o documento firmado não indica o preço pactuado entre as partes, ferindo o supracitado artigo 50, § 2º da Lei n° 9.610/98. Contudo, nem sempre o contrato traduz a exata vontade das partes no momento de sua celebração, não sendo raro que a redação das cláusulas mostrem-se obscuras ou ambíguas, de forma que mister se mostra interpretar o negócio jurídico a fim de precisar o sentido e alcance do conteúdo da declaração de vontade, em observância aos artigos 112 e 113 do Código Civil, que assim estabelecem: Art. 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem. Art. 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração.§ 1º A interpretação do negócio jurídico deve lhe atribuir o sentido que: I - for confirmado pelo comportamento das partes posterior à celebração do negócio; II - corresponder aos usos, costumes e práticas do mercado relativas ao tipo de negócio; III - corresponder à boa-fé; IV - for mais benéfico à parte que não redigiu o dispositivo, se identificável; eV - corresponder a qual seria a razoável negociação das partes sobre a questão discutida, inferida das demais disposições do negócio e da racionalidade econômica das partes, consideradas as informações disponíveis no momento de sua celebração. § 2º As partes poderão livremente pactuar regras de interpretação, de preenchimento de lacunas e de integração dos negócios jurídicos diversas daquelas previstas em lei. Da leitura dos supracitados artigos extrai-se a intenção do legislador pela conservação do contrato, o qual deve ser interpretado observando-se o princípio da boa-fé, sem que haja a presunção de que os contratantes tenham celebrado um contrato carecedor de qualquer utilidade, prevalecendo, portanto, a interpretação que permita o seu aproveitamento dentro dos limites da vontade dos contratantes, evitando-se impor conteúdo diverso do realizado. No presente caso, em que pese não constar no “Instrumento Particular de Cessão de Direitos Patrimoniais e Intelectuais e Outros Pactos” acostado no mov. 1.3, fls. 25/27, o preço fixo ajustado entre as partes, extrai-se da cláusula terceira que a cedente, por valor livre e mutuamente ajustado e dado como adequado, devidamente recebido no ato, deu quitação ao contrato, resguardado, ainda, o seu direito de usufruto vitalício no tocante aos direitos patrimoniais de autor sobre as criações intelectuais de Fernando Correia Dias e de Cecília Meireles, conforme estabelecido na Cláusula Quarta, senão vejamos:
Assim, considerando o princípio da conservação do contrato, respeitando-se a real intenção dos contratantes, deve ser afastada a nulidade em razão de não constar no instrumento o valor fixo estipulado entre as partes, sobretudo quando se considera ser plenamente cabível a transferência de propriedade dos direitos de forma gratuita, conforme, inclusive, reconhecido pelo magistrado a quo na sentença de mov. 879.1, não sendo plausível, portanto, a declaração da nulidade do contrato em razão de suposta ausência de preço quando sequer havia a necessidade de estipular um preço. Ademais, não restou demonstrado qualquer prejuízo suportado pela cedente MARIA MATHILDE MEIRELLES CORREIA, a qual, vale ressaltar, possuía pleno conhecimento jurídico decorrente do exercício de sua profissão de advogada e formação em Direito, a qual já havia demonstrado sua insatisfação com as atitudes de sua irmã MARIA FERNANDA em relação à forma como administrava os direitos autorais de CECÍLIA MEIRELES, conforme se denota da carta por ela redigida de próprio punho em 29 de junho de 2007, dois meses antes de firmar o contrato de cessão, cuja cópia foi acostada no mov. 365.4, onde expressa toda a sua decepção e preocupação com a postura de sua irmã, demonstrando sua lucidez e preocupação em relação aos direitos patrimoniais e intelectuais adquiridos em razão de sucessões hereditárias. Portanto, após detida análise dos fatos e documentos acostados, conclui-se pela validade do contrato entabulado entre o apelante RICARDO STRANG na figura do cessionário e MARIA MATHILDE MEIRELLES CORREIA DIAS, na qualidade de cedente, razão pela qual voto pelo conhecimento e provimento do presente recurso a fim de reconhecer a total validade do contrato de cessão objeto da lide, julgando, assim, improcedente a presente ação. Da sucumbência e dos honorários Considerando a reforma da sentença, cabível a redistribuição do ônus da sucumbência para que as custas, despesas processuais e honorários advocatícios sejam arcados em sua integralidade pela parte autora, ora apelada, nos termos do artigo 85 do Código de Processo Civil. Mantém-se os honorários advocatícios de sucumbência, a serem arcados pela parte requerida em favor da parte autora/apelada, em 20% sobre o valor da causa, sendo incabível sua majoração, eis que não houve o preenchimento cumulativo dos requisitos estabelecidos pelo Egrégio STJ (Edcl no AgInt no REsp: 1573573 RJ 2015/0302387-9, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, DJ: 04/04/2017, T3 – Terceira Turma, Data de Publicação: DJe 08/05/2017).
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