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Acórdão
Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Acórdão. Eventuais imagens serão suprimidas.
Tratam-se de apelações cíveis em face da sentença proferida nos autos do Mandado de Segurança nº 0022270-23.2021.8.16.0014, que concedeu parcialmente a segurança pleiteada, paro fim de e determinar à autoridade impetrada que se abstenha de incluir na base de cálculo do ICMS os valores de mercadorias fornecidas pelo impetrante a título de bonificação, desde que não se trate de regime de substituição, sem efeitos patrimoniais pretéritos à impetração da presente ação (mov. 38.1 - MS).Da sentença recorre o ESTADO DO PARANÁ (mov. 43.1 - MS), sustentando que o impetrante não logrou êxito em comprovar que as operações bonificadas estão vinculadas a compra e venda mercantil, não se desincumbindo de seu ônus probatório, razão pela qual requer a improcedência dos pedidos iniciais.Contrarrazões (mov. 50.1 - MS).De igual modo recorre a impetrante, DE SANGOSSE AGROQUÍMICA LTDA (mov. 49.1 – MS), pleiteando o reconhecimento do direito à repetição/compensação dos valores de ICMS pagos indevidamente, relativamente ao período de cinco anos anteriores ao ajuizamento do Mandado de Segurança, atualizados pela taxa SELIC a partir da data do pagamento, mediante restituição em dinheiro ou compensação.Contrarrazões (mov. 53.1 - MS).A D. Procuradoria de Justiça externou parecer pelo provimento do recurso do Estado do Paraná, bem como pela prejudicialidade do recurso da postulante e do reexame necessário (mov. 18.1 – AP).É o relatório.
Voto.Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço dos apelos.Em breve síntese, a apelante impetrou Mandado de Segurança em face do DELEGADO DA RECEITA ESTADUAL DO PARANÁ EM LONDRINA, para que fosse declarada a inexistência de relação jurídica entre as partes, no que concerne à incidência do ICMS sobre os descontos incondicionais/bonificações, nos termos no artigo 13, §1º, inciso II, alínea a, da Lei Complementar nº 87/96. Ainda, para que fossem revisados e anulados todos os créditos tributários e dívidas ativas correspondentes à exação impugnadas, reconhecendo-se o direito à repetição/compensação dos valores pagos.O juízo de origem concedeu parcialmente a segurança pleiteada, paro fim de e determinar à autoridade impetrada que se abstenha de incluir na base de cálculo do ICMS os valores de mercadorias fornecidas pelo impetrante a título de bonificação, espécie de desconto incondicional, desde que não se trate de regime de substituição tributária (mov. 15.1 – MS).Posto isto, cinge-se a controvérsia quanto a possibilidade de utilização do Mandado de Segurança para a finalidade acima delineada, observado que a impetrante juntou aos autos (i) notas fiscais cuja natureza das respectivas operações era a “Remessa em bonificação, doação ou brinde” (mov. 1.7); (ii) “Registros Fiscais da Apuração Do ICMS” (mov. 1.8 ao 1.11); (iii) “Registros Fiscais Dos Documentos de Entradas de Mercadorias e Aquisição De Serviços” (mov. 1.12); (iv) “Registros Fiscais dos Documentos de Saídas de Mercadorias e Prestação de Serviços” (mov. 1.13 e 1.14).Nos termos do art. 1º da Lei 12.016/2009: “Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça”.Em razão do caráter célere da ação mandamental é descabida a instrução probatória, razão pela qual exige-se prova pré-constituída, indene de dúvidas, quanto a prática de conduta ilegal ou abusiva por parte de autoridade no exercício de função pública. À propósito:[...] 2. O Mandado de Segurança visa proteger direito líquido e certo, ou seja, tem como pressuposta a certeza do direito a ser tutelado. Trata-se de direito plenamente verificável, e não se admite, para tanto, direito de existência duvidosa ou decorrente de fatos ainda não determinados. [...] (AgInt no RMS 64.370/RN, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/06/2021, DJe 01/07/2021).O direito líquido e certo alegado pela impetrante seria o direito à não serem tributadas suas operações envolvendo produtos cedidos à título de bonificação, por não estarem incluídos no conceito de mercadoria, em operação onerosa, que elemento essencial para a incidência de ICMS, nos termos do art. 155, I da Constituição Federal e art. 2º e 13 da Lei Complementar 87/96.Em análise detida aos autos, verifica-se que o suporte probatório juntado pelo impetrante na petição inicial é insuficiente para aferir a regularidade das operações de venda de mercadorias, bem como da remessa de produtos em bonificação, doação ou brinde.Como bem observado pela D. Procuradoria de Justiça (mov. 18.1), “sequer foram anexadas as notas fiscais relativas às aquisições das mercadorias que supostamente viabilizaram o aludido desconto, sendo certo que essa prova não pode ser suprida pelo mero fato de as notas colacionadas, no ponto alusivo aos seus “dados adicionais”, fazerem referência a um ou mais pedidos cujos objetos são desconhecidos.”A título de exemplo, a Nota Fiscal nº 26.928 (mov. 1.7, fl. 59), emitida em 28.05.2020, contém os produtos “CUPINICIDA, 400P NITROSIN, GRIFO 2P NITROSIN, NITROFORMIGA NITROSIN e NITROFORMIGA ROSA NITROSIN” e nenhum deles sofreu incidência do ICMS, o que sugere que todos foram remetidos em bonificação, não havendo vinculação com os produtos que efetivamente foram vendidos ao adquirente.Ainda, verifica-se que a Nota Fiscal nº 27.776 (mov. 1.7, fl. 63), emitida em 19.08.2020, possui valor total de R$ 1.075,00, indicando a venda dos produtos “NITROFORMIGA NITROSIN, NITROPULGA NITROSIN, NITROCID C/ EXPOSITOR, MAKI SOFT BAIT”, porém somente o produto “NITROCID C/ EXPOSITOR”, no valor de R$ 141,00, sofreu incidência de ICMS, indicando que todos os demais foram remetidos em bonificação.Conforme informado pela Fazenda Estadual, em seu apelo (mov. 43.1, fl. 04):“O Fisco já identificou diversas empresas que por exemplo, circularam 1000 unidades a título de bonificação, para uma operação tributada de apenas 100 unidades. Trata-se de clara operação simulada para evitar o pagamento de imposto. É preciso, portanto, que haja efetiva e categórica comprovação do contribuinte sobre a incondicionalidade do desconto, bem assim vinculação idônea dessa bonificação com uma efetiva circulação de mercadoria devidamente tributada.”No bojo do Mandado de Segurança o direito líquido e certo deve ser comprovado de plano, no momento de sua impetração, sendo que a necessidade de produção de prova pericial desautoriza a via mandamental.Confira-se caso semelhante julgado pelo TJ/RJ, cujo acórdão foi confirmado pelo STJ:[...] 2. O Mandado de Segurança, porque incompatível com a dilação probatória, requer a prévia e cabal demonstração da liquidez e certeza do direito que se tem por violado (AgInt no RMS 33.048/RJ, Rel. Min. Sérgio Kukina, DJe 25.8.2016).3. Hipótese em que o Tribunal de origem expressamente consignou que os documentos anexados ao pedido mandamental não foram suficientes a conferir liquidez e certeza à concessão da segurança. Nesse sentido, transcrevo o seguinte trecho do acórdão: "O presente caso não se trata de simples reconhecimento de homologação tácita da compensação declarada pelo contribuinte, pois é necessária a produção de prova pericial contábil de modo a verificar a suficiência dos créditos do contribuinte em liquidar os créditos tributários, sendo inviável em sede de mandado de segurança" (fl. 386, e-STJ). Rever tal entendimento implica reexame da matéria fático-probatória, o que é vedado em Recurso Especial (Súmula 7/STJ). [...] 5. Agravo Interno não provido. (AgInt no REsp 1804994/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/11/2019, DJe 19/12/2019).Em verdade, a impetrante pretende discutir a exatidão da apuração da base de cálculo do ICMS incidente sobre suas operações, envolvendo bonificação de mercadorias, o que se mostra inviável em sede de Mandado de Segurança, principalmente porque os documentos apresentados não revelam de forma cristalina quais produtos foram vendidos de forma onerosa e quais foram remetidos em bonificação ou descontos incondicionais.Assim, deve ser provido o recurso de apelação do Estado do Paraná, para que seja reformada a sentença e denegada a segurança pleiteada pela impetrante DE SANGOSSE AGROQUIMICA LTDA, cujo recurso de apelação resta prejudicado.Deixo de aplicar o art. 85, § 11º do CPC, visto que não cabem honorários advocatícios no processo de mandado de segurança, nos termos do art. 25 da Lei 12.016/09.Portanto, dou provimento ao apelo do ESTADO DO PARANÁ, para reformar a sentença proferida e denegar a segurança pleiteada, invertendo-se os ônus sucumbenciais, pelo que julgo prejudicado o recurso da impetrante e a remessa necessária, nos termos da fundamentação supra.
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