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Acórdão
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I – RELATÓRIO 1. Tratam-se de recursos de apelação interpostos em face da sentença proferida nos autos n° 0012128-18.2016.8.16.0019, oriundos da 3ª Vara Cível da Comarca de Ponta Grossa, em que o juízo a quo julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, a fim de condenar a parte ré: a) ao pagamento de pensionamento mensal à autora, no valor equivalente 2/3 do salário mínimo, a partir da data em que o neonato completaria 14 anos, até o seu 25º aniversário, e de 1/3 do salário, desta data, até aquela em que completaria 65 anos, ou até o falecimento da genitora, o que ocorrer primeiro, devendo, para assegurar o pagamento das parcelas vincendas, em 15 (quinze) dias, constituir capital de garantia ou caução fidejussória; e, b) ao pagamento da quantia de 100.000,00 (cem mil reais) a título de danos morais, a serem corrigidos monetariamente pela média INPC/IGP-DI a partir da sentença e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês a partir da citação, por se tratar de responsabilidade contratual.Ante a sucumbência recíproca, condenou ambas as partes, em 50% cada, ao pagamento das custas processuais e os honorários advocatícios, fixados em 15% sobre o valor da condenação, observados os benefícios da justiça gratuita em relação à autora (Ref. Mov. 295.1 – autos originários 0012128-18.2016.8.16.0019).Opostos embargos de declaração, os quais foram acolhidos em parte, a fim de alterar o dispositivo da sentença, a fim de constar de forma individualizada o resultado e a sucumbência de cada uma das quatro demandas conexas (Ref. Mov. 312.1 – autos originários 0012128-18.2016.8.16.0019).Irresignada, apela a autora, ora apelante 1, alegando, em síntese, que: a) os prontuários indicam que o bebê teve respiração, mesmo mecânica e atividade cerebral, isso significa (juridicamente) que existiu vida, não se tratando de natimorto; b) a parte ré adulterou dolosamente o documento chamado “aviso de óbito”, com a finalidade de ocultar o nascimento com vida do bebê, atrasando o horário da morte para a mesma hora do nascimento; e, c) no processo n°. 0012128-18.2016.8.16.0019 busca o deferimento de danos extrapatrimoniais ao neonato, independentemente do nascimento com vida, em razão da dor e sofrimento que a falha médica causou.Ao final, pugna pelo conhecimento e provimento do recurso, a fim de que seja reformada a sentença, com: a) a declaração de nascimento com vida de Yago Henrique de Camargo, com indenização moral pela negativa de personalidade civil; b) a condenação ao pagamento de indenização pelos danos morais sofridos pelo bebê, em virtude do sofrimento fetal agudo; c) a fixação de honorários recursais (Ref. Mov. 317.1 - autos originários 0012128-18.2016.8.16.0019).A ré, ora apelante 2, por sua vez, aduz, em síntese, que: a) faz jus aos benefícios da gratuidade da justiça; b) há nulidade processual em decorrência da negativa de denunciação da lide ao médico que atendeu a autora; c) trata-se de prestação de serviços médicos por meio do Sistema único de Saúde (SUS), logo, não há falar-se em aplicação das normas do Código de Defesa do Consumidor, e, por conseguinte, da inversão do ônus da prova; d) a benesse da justiça gratuita concedida à apelada deve ser revogada; e) não possui médicos funcionários, sendo referidos profissionais organizados por meio de um corpo clínico, logo, o Dr. Rafael, médico que atendeu a apelada, não é seu funcionário ou mesmo preposto; f) a apelada não demonstrou qualquer queixa acerca dos atendimentos que efetivamente são prestados pela apelante, tendo tido todo o suporte necessário que competia ao nosocômio quando de sua internação; g) a responsabilidade objetiva apenas exclui o ônus da parte apelada em provar a culpa da instituição, não alterando, por si só, o ônus do polo ativo em comprovar o dano, a culpa dos profissionais e, principalmente, o nexo de causalidade; h) o hospital não responde objetivamente, mesmo depois da vigência do Código de Defesa do Consumidor, quando se trata de indenizar dano produzido por médico ou enfermeira integrante de seus quadros, pois é preciso provar a culpa destes, para somente depois se ter como presumida a culpa do hospital; i) não houve qualquer ato ilícito, ou mesmo ação ou omissão, negligência ou imperícia praticada pela apelante, nos moldes do art. 186 e 927, do Código Civil, que sejam passíveis da qualificação desta aos danos morais experimentados pela apelada; j) caso mantida a condenação ao pagamento de indenização por danos morais, o quantum indenizatório merece ser minorado; k) conforme espelho extraído do portal eletrônico da Receita Federal, a apelada abriu uma empresa individual que visa a venda de calçados, demonstrando que já não é mais dependente do Bolsa Família e, consequentemente, não faz jus ao recebimento do pensionamento deferido; l) caso mantida a pensão, devem ser alterados os critérios para seu recebimento, com limite na idade de 18 anos do menor falecido; m) exigir que a apelante institua capital de garantia ou caução fidejussória de um valor hipotético (salário mínimo do ano de 2030) para suspostamente ter sua periodicidade iniciada em 9 (nove) anos da data atual não é razoável; e, n) os honorários de sucumbência devidos à parte autora devem ser minorados, eis que a instrução probatória decorreu propriamente do laudo pericial elaborado pelo expert, sendo os quesitos a atividade mais técnica da presente demanda, sem ter havido a formulação de quesitos complementares.Pugna, ao final, pelo conhecimento e provimento do recurso, a fim de que seja anulada a sentença, com o restabelecimento da instrução probatória, para que seja aceita e ocorra a denunciação da lide do Dr. Rafael Sfeir, ou, pela sua reforma (mov. 321.1 – autos originários 0012128-18.2016.8.16.0019).A autora interpôs recurso de apelação adesivo, pugnando pela majoração do quantum indenizatório fixado a título de danos morais para R$150.000,00 (cento e cinquenta mil reais) (mov. 325.1 – autos originários 0012128-18.2016.8.16.0019).Intimada, a autora apresentou contrarrazões ao recurso da ré, pugnando pelo seu desprovimento (Ref. Mov. 326.1 – autos originários 0012128-18.2016.8.16.0019).Em seguida, a ré apresentou contrarrazões ao recurso da autora, pugnando pelo seu desprovimento, pugnando pela fixação de honorários recursais (Ref. Mov. 329.1 – autos originários 0012128-18.2016.8.16.0019).Em grau recursal, foi determinado o desarquivamento dos autos 0011860-61.2016.8.16.0019, 0012125-63.2016.8.16.0019 e 0012121-26.2016.8.16.0019, com o translado de cópias àqueles feitos dos recursos de apelação e adesivo (Mov. 317.1, 321.1 e 325.1) e das respectivas contrarrazões (Mov. 326.1 e 329.1) já apresentados pelas partes, devendo ser autuados em apenso os recursos ao presente feito (Ref. Mov. 15.1 – autos recursais 0012128-18.2016.8.16.0019).Determinada a redistribuição por prevenção ao Des. Fernando Wolff Bodziak (Ref. Mov. 22.1 – autos recursais 0012128-18.2016.8.16.0019).Houve a declinação da competência por parte do il. Juiz subs. Em 2º Grau Dr. Sergio Luiz Kreuz (Ref. Mov. 40.1 – autos recursais 0012128-18.2016.8.16.0019).O 1º Vice-Presidente declarou a competência da 9ª Câmara Cível para julgamento do feito (Ref. Mov. 42.1 – autos recursais 0012128-18.2016.8.16.0019).Foi determinada a remessa dos autos ao Núcleo de Conciliação deste Tribunal (Ref. Mov. 52.1 – autos recursais 0012128-18.2016.8.16.0019).A audiência foi cancelada por pedido das partes (Ref. Mov. 59.1 – autos recursais 0012128-18.2016.8.16.0019).Os autos foram encaminhados ao Ministério Público (Ref. Mov. 64.1 – autos recursais 0012128-18.2016.8.16.0019), que se manifestou pela desnecessidade de intervenção no feito (Ref. Mov. 67.1 – autos recursais 0012128-18.2016.8.16.0019).Após, vieram os autos conclusos.
II – FUNDAMENTAÇÃO E VOTO 2. Pressupostos de admissibilidade2.1. Da unirrecorribilidadeEm relação ao recurso adesivo interposto pela parte autora ao mov. 325.1, não se pode conhecê-lo, por violar o princípio da unirrecorribilidade em virtude da interposição posterior à primeira apelação (mov. 317.1).Nas palavras de Nelson Nery Junior, “Diz-se consumativa a preclusão, quando a perda da faculdade de praticar o ato processual decorre do fato de já haver ocorrido a oportunidade para tanto, isto é, de o ato já haver sido praticado e, portanto, não pode tornar a sê-lo.”[1]Nesse cenário, considerando que a parte já exerceu o seu direito, ou seja, já exerceu a faculdade que lhe era cabível, não há como conhecer do recurso adesivo, ante a incidência da preclusão consumativa. Nesse sentido:RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. PERÍODO DIURNO (14H:35 MIN). TEMPO BOM. ÁREA URBANA. PISTA EM NÍVEL, ASFALTADA EM BOM ESTADO DE CONSERVAÇÃO. COLISÃO ENTRE AUTOMÓVEL C3 E MOTOCICLETA CG TITAN 150. VEÍCULO QUE PRETENDIA CRUZAR A PREFERENCIAL. ÓBITO DO CONDUTOR DA MOTOCICLETA. SENTENÇA QUE DISTRIBUIU A CULPA. INTERPOSIÇÃO DE DOIS RECURSOS PELA PARTE AUTORA. SEGUNDO RECURSO PROTOCOLADO (ADESIVO). POSTERIOR AO RECURSO DE APELAÇÃO VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA UNIRRECORRIBILIDADE. NÃO CONHECIMENTO. RECURSO DA RÉ. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. VELOCIDADE DESEMPENHADA ACIMA DA PERMITIDA PARA A VIA. DESRESPEITO À SINALIZAÇÃO PRATICADO PELO MOTOCICLISTA. CULPA PELO ACIDENTE. POSSIBILIDADE DE DISCUSSÃO NA ESFERA CÍVEL. SENTENÇA PENAL AINDA NÃO PROFERIDA.CONDUTOR DA MOTOCICLETA QUE TRAFEGAVA EM ALTA VELOCIDADE. AUSÊNCIA DE MARCA DE FRENAGEM DA MOTOCICLETA NA PISTA. VEÍCULO DA RÉ QUE AGUARDAVA O FLUXO DE VEÍCULOS PARA APÓS TRANSPOR A VIA PREFERENCIAL. CARTEIRA DE HABILITAÇÃO SUSPENSA. IRREGULARIDADE ADMINISTRATIVA QUE NÃO TEM O CONDÃO DE IMPUTAR A CULPA. ARCABOUÇO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA CULPA SEVERA DE AMBOS OS CONDUTORES. INOBSERVÂNCIA DAS REGRAS DE TRÂNSITO. CULPA CONCORRENTE EVIDENCIADA. INOBSERVÂNCIA DAS REGRAS DO CÓDIGO NACIONAL DE TRÂNSITO. "QUANTUM" INDENIZATÓRIO FIXADO EM R$15.000,00 PARA CADA AUTOR. MAJORAÇÃO. INVIABILIDADE. SENTENÇA ALTERADA SOMENTE PARA ATRIBUIR A CULPA NA PROPORÇÃO DE 50% PARA CADA PARTE. HONORÁRIOS RECURSAIS DEVIDOS AO PATRONO DA PARTE REQUERIDA.RECURSO DA RÉ PARCIALMENTE PROVIDO.RECURSO DOS AUTORES DESPROVIDO.RECURSO ADESIVO DOS AUTORES NÃO CONHECIDO. (TJPR - 9ª C. Cível - 0028203-60.2014.8.16.0001 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR ARQUELAU ARAUJO RIBAS - J. 01.02.2021. Sem grifo no original) Portanto, deixo de conhecer o recurso de apelação adesivo interposto pela parte autora. 2.2. Da justiça gratuitaPugna a ré, ora apelante 2, pela concessão dos benefícios da justiça gratuita.Ocorre que a ré recolheu o preparo recursal (mov. 321.8 e 321.9) praticando ato incompatível com seu pedido, o que demonstra justamente que não é hipossuficiente financeiramente.Neste sentido:APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO QUE CULMINOU NA MORTE DE UM DOS CONDUTORES. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO. RECURSO INTERPOSTO EM DUPLICIDADE. PRINCÍPIO DA UNIRRECORRIBILIDADE APLICADO. CONHECIMENTO APENAS DE UM DELES. PLEITO DE CONCESSÃO DOS BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA. RECOLHIMENTO DO PREPARO RECURSAL. ATO INCOMPATÍVEL. PRECLUSÃO LÓGICA. NÃO CONHECIMENTO. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE AFASTADA. AUSÊNCIA DE PROVA DA ALIENAÇÃO DO AUTOMÓVEL AO CONDUTOR QUE CAUSOU O ACIDENTE. PROPRIEDADE DO BEM RECONHECIDA CONFORME DADO CONSTANTE NO REGISTRO DO ÓRGÃO COMPETENTE (CRLV). ALEGAÇÃO DE FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO EM RAZÃO DA NÃO INDIVIDUALIZAÇÃO DO VALOR CONDENATÓRIO PARA CADA RÉU. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. DESNECESSIDADE. MINORAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO À TÍTULO DE DANO MORAL. ACOLHIMENTO. APELAÇÃO PARCIALMENTE CONHECIDA E, NA PARTE CONHECIDA, PROVIDA EM PARTE. (TJPR - 9ª C. Cível - 0002555-49.2019.8.16.0148 - Rolândia - Rel.: DESEMBARGADOR ARQUELAU ARAUJO RIBAS - J. 26.06.2022. Sem grifo no original) Deixo, portanto, de conhecer do recurso da parte ré no tocante ao pedido de concessão dos benefícios da justiça gratuita.Ademais, alega que a parte autora não faz mais jus aos benefícios da gratuidade da justiça, os quais devem ser revogados, visto que abriu uma empresa individual que visa a venda de calçados, demonstrando que já não é mais dependente do Bolsa Família.Do documento acostado ao mov. 1.10 dos autos 0012125- 63.2016.8.16.0019, é possível observar que a autora é beneficiária do Programa Bolsa Família, bem como a CTPS acostada ao mov. 1.12 também demonstra que a autora não exerce atividade remunerada formal desde junho de 2014.Ainda, a informante Bruna Lemes Schechtel (mov. 289.3) afirmou que a autora não possui renda fixa e realiza a venda informal de produtos.Assim, a simples insurgência, sem provas específicas para desconstituir a declaração feita pela autora, a qual tem presunção de veracidade e foi acolhida pela magistrada singular, deve ser rejeitada.Veja-se:APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE COBRANÇA DE SEGURO AGRÍCOLA – CONHECIMENTO DO APELO – JUSTIÇA GRATUITA MANTIDA, HAJA VISTA IMPUGNAÇÃO GENÉRICA PELA PARTE CONTRÁRIA – COMPREENSÃO DA PRETENSÃO RECURSAL – PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE – RESPEITADO - PLANTAÇÃO DE SOJA – CHUVAS INTENSAS QUE ATINGIRAM SAFRA 2015/2016 – PEDIDO DE INDENIZAÇÃO – AUSÊNCIA DE PROVA, TODAVIA, DE QUE A PRODUTIVIDADE OBTIDA TENHA SIDO INFERIOR À PRODUTIVIDADE SEGURADA – LAUDOS ELABORADOS PELA SEGURADORA QUE ATESTARAM PRODUTIVIDADE SUPERIOR – SOJA QUE FOI COLHIDA EM TODA A EXTENSÃO DA PLANTAÇÃO, DEMONSTRANDO QUE GRÃOS NÃO ESTAVAM COMPLETAMENTE PERDIDOS – POSTERIOR VENDA PARA COOPERATIVA, QUE ADQUIRIU TAMBÉM GRÃOS ARDIDOS – DECLARAÇÃO FEITA PELA COOPERATIVA ACERCA DE ALTO VALOR DE SACAS ENTREGUES PELO PRODUTOR NA SAFRA 2015/2016 – INDIVIDUALIZAÇÃO INEXISTENTE QUANTO AOS DOIS LOTES SEGURADOS – DOCUMENTO QUE NÃO FOI IMPUGNADO PELO DEMANDANTE AO LONGO DA FASE INSTRUTÓRIA – SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJPR - 9ª C.Cível - 0003443-67.2016.8.16.0101 - Jandaia do Sul - Rel.: DESEMBARGADOR DOMINGOS JOSÉ PERFETTO - J. 14.10.2019. Sem grifo no original) Assim, mantenho os benefícios da gratuidade da justiça concedidos à autora. 2.3. Da preclusãoAduz a ré, ora apelante 2, que há nulidade processual em decorrência da negativa de denunciação da lide ao médico que atendeu a autora.Afirma, ainda, que se trata de prestação de serviços médicos por meio do Sistema único de Saúde (SUS), logo, não há falar-se em aplicação das normas do Código de Defesa do Consumidor, e, por conseguinte, da inversão do ônus da prova.Contudo, referidas alegações se encontram abarcadas pela preclusão.Da detida análise dos autos, verifica-se que a magistrada a quo indeferiu o pedido de denunciação da lide (mov. 46.1), bem como reconheceu a aplicabilidade do CDC ao caso, com a inversão do ônus da prova, em decisão saneadora (mov. 64.1). Frise-se que a parte ré não se insurgiu quando lhe cabia interpor o recurso cabível, a fim de reformar tais decisões.Nas palavras de Fredie Didier Jr. acerca da preclusão[2]:A preclusão é instituto fundamental para o bom desenvolvimento do processo, sendo uma das principais técnicas para a estruturação do procedimento e, pois, para a delimitação das normas que compõem o formalismo processual. A preclusão apresenta-se, então, como um limitador do exercício abusivo dos poderes processuais pelas partes, bem como impede que questões já decididas pelo órgão jurisdicional possam ser reexaminadas, evitando-se, com isso, o retrocesso e a insegurança jurídica. A preclusão consiste na perda da faculdade processual de praticar um ato, extinguindo-se o direito subjetivo das partes de sua prática, pelo fato de se haverem alcançado os limites assinalados ao seu exercício. Sobre o tema, leciona a doutrina de Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery: A preclusão indica perda da faculdade processual, pelo seu não uso dentro do prazo peremptório previsto pela lei (preclusão temporal), ou, pelo fato de já havê-la exercido (preclusão consumativa), ou, ainda, pela prática de ato incompatível com aquele que se pretenda exercitar no processo (preclusão lógica).[3] No mesmo sentido é o entendimento desta Câmara: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO INDENIZATÓRIA – FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS – APLICABILIDADE DO CDC E INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA – PRECLUSÃO DAS MATÉRIAS, QUE FORAM DECIDIDAS NO SANEADOR E NÃO IMPUGNADAS PELAS PARTES – PROVA DA CONTRATAÇÃO DAS PROFISSIONAIS – ÔNUS DO AUTOR, POR SE TRATAR DE FATO CONSTITUTIVO DE SEU DIREITO – AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DAS ALEGAÇÕES – SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. (TJPR - 9ª C.Cível - 0000596-22.2019.8.16.0058 - Campo Mourão - Rel.: DESEMBARGADOR DOMINGOS JOSÉ PERFETTO - J. 21.02.2022. Sem grifo no original) Assim sendo, as alegações não podem ser conhecidas, ante a preclusão temporal. 3. Mérito3.1. Recurso de apelação 1 – interposto pela autoraPugna a autora, ora apelante 1, pelo provimento do seu recurso, a fim de que seja declarado o nascimento com vida de Yago Henrique de Camargo, com indenização moral pela negativa de personalidade civil, bem como para que a ré seja condenada ao pagamento de indenização pelos danos morais sofridos pelo bebê, em virtude do sofrimento fetal agudo.Para tanto, sustenta que os prontuários indicam que o bebê teve respiração, mesmo mecânica e atividade cerebral, isso significa (juridicamente) que existiu vida, não se tratando de natimorto.Afirma que a parte ré adulterou dolosamente o documento chamado “aviso de óbito”, com a finalidade de ocultar o nascimento com vida do bebê, atrasando o horário da morte para a mesma hora do nascimentoAduz que são evidentes os danos extrapatrimoniais devidos ao neonato, independentemente do nascimento com vida, em razão da dor e sofrimento que a falha médica causou.Contudo, sem razão.Dispõem os artigos 1º e 2º, do Código Civil:Art. 1º Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil.Art. 2º A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro. Assim, tem-se que o termo inicial da personalidade humana (e, por consequência, da capacidade de direito) se dá com o nascimento com vida, sendo ressalvados os direitos do nascituro, desde a concepção.Acerca do tema, lecionam Gagliano e Pamplona Filho:1.2. Aquisição da personalidade jurídicaA pessoa natural, para o direito, é, portanto, o ser humano, enquanto sujeito/destinatário de direitos e obrigações. (...) O seu surgimento, segundo a dicção legal, ocorre a partir do nascimento com vida (art. 2.º do CC/2002).No instante em que principia o funcionamento do aparelho cardiorrespiratório, clinicamente aferível pelo exame de docimasia hidrostática de Galeno, o recém-nascido adquire personalidade jurídica, tornando-se sujeito de direito, mesmo que venha a falecer minutos depois[4]. Logo, o Código Civil brasileiro exige o nascimento com vida como requisito para a aquisição da personalidade e a titularidade própria de direitos, ainda que o nascituro mereça ampla proteção pelo ordenamento.Sobre a proteção do nascituro, destaco a seguinte doutrina:Tal proteção da situação jurídica do nascituro justifica a difusa referência aos chamados “direitos do nascituro”, indicando a possibilidade, reconhecida pela jurisprudência, de se cobrar, após o nascimento com vida, indenização por danos morais em face de terceiros e dos próprios pais, por fato ocorrido durante a gestação[5]. Em que pesem as alegações trazidas pela parte autora, da leitura do laudo pericial (mov. 193.1) depreende-se que a perita concluiu que:f) Com a intervenção de procedimentos de reanimação, inclusive respiração mecânica e entubação, pode-se afirmar que o bebê nasceu com vida? Não. De acordo com os dados no prontuário, o recém-nascido já nasceu em parada cardíaca e foram realizadas manobras de ressuscitação as quais não tiveram sucesso. Como bem pontuado pela magistrada a quo, as informantes ouvidas quando da audiência de instrução afirmaram que não presenciaram o parto, logo, inexiste nos autos qualquer elemento capaz de comprovar as alegações da parte autora.Desta forma, a parte autora não se desincumbiu do ônus que lhe competia, nos termos do art. 373, inciso I, do Código de Processo Civil.Assim, inexistindo nascimento com vida, não há falar-se em alteração da declaração causa mortis ou em condenação da ré ao pagamento de danos morais ao filho da autora. 3.2. Recurso de apelação 2 – interposto pela ré3.2.1. Do dever de indenizarTrata-se de demanda proposta pela autora em face da ré, a fim de que seja reconhecida a ocorrência de erro médico, com a condenação desta ao pagamento de indenização por danos morais.In casu, a autora é contratante de serviços médicos, enquadrando-se, pois, no conceito de consumidora (art. 2º do CDC), ao passo que a ré se amolda ao de fornecedor (art. 3º, §2º, do CDC).Desta forma, imperioso destacar o contido no artigo 14, do CDC, que estabelece que o fornecedor de serviços responde de maneira objetiva pela reparação dos danos causados por defeitos relativos à sua prestação, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.Ademais, o artigo 932, III, do Código Civil, prevê que são responsáveis pela reparação civil “o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele”.Sabe-se que o Superior Tribunal de Justiça, no tocante à responsabilidade da instituição hospitalar por erro médico, tem se orientado no seguinte sentido:AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO HOSPITAL. NÃO OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE ERRO MÉDICO E DE FALHA NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS. AGRAVO NÃO PROVIDO.1. "A responsabilidade das sociedades empresárias hospitalares por dano causado ao paciente-consumidor pode ser assim sintetizada: (i) as obrigações assumidas diretamente pelo complexo hospitalar limitam-se ao fornecimento de recursos materiais e humanos auxiliares adequados à prestação dos serviços médicos e à supervisão do paciente, hipótese em que a responsabilidade objetiva da instituição (por ato próprio) exsurge somente em decorrência de defeito no serviço prestado (art. 14, caput, do CDC); (ii) os atos técnicos praticados pelos médicos sem vínculo de emprego ou subordinação com o hospital são imputados ao profissional pessoalmente, eximindo-se a entidade hospitalar de qualquer responsabilidade (art. 14, § 4, do CDC), se não concorreu para a ocorrência do dano; (iii) quanto aos atos técnicos praticados de forma defeituosa pelos profissionais da saúde vinculados de alguma forma ao hospital, respondem solidariamente a instituição hospitalar e o profissional responsável, apurada a sua culpa profissional. Nesse caso, o hospital é responsabilizado indiretamente por ato de terceiro, cuja culpa deve ser comprovada pela vítima de modo a fazer emergir o dever de indenizar da instituição, de natureza absoluta (arts. 932 e 933 do CC), sendo cabível ao juiz, demonstrada a hipossuficiência do paciente, determinar a inversão do ônus da prova (art. 6º, VIII, do CDC)". (REsp 1145728/MG, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Rel. p/ Acórdão Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 28/6/2011, DJe 8/9/2011) 2. Não cabe, em recurso especial, reexaminar matéria fático-probatória (Súmula n. 7/STJ). 3. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp 1761544/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 03/05/2021, DJe 11/05/2021. Sem grifo no original) De acordo com este entendimento não cabe atribuir a responsabilidade ao nosocômio quando a falha técnica for restrita ao profissional sem vínculo com o hospital. Por outro lado, caso o profissional seja de alguma forma vinculado à instituição, esta responde, solidariamente, pelos danos causados, desde que apurada a culpa do médico.No presente caso, em que pese a ré alegue que o Dr. Rafael, médico que atendeu a autora/apelada, não é seu funcionário ou mesmo preposto, nenhuma prova produziu neste sentido, sendo certo que a paciente, ao procurar atendimento no nosocômio, foi atendida pelo profissional, não se tratando de consulta previamente agendada, apenas com uso das dependências do hospital.Ademais, alega a ré que a autora não demonstrou qualquer queixa acerca dos atendimentos que efetivamente são prestados pela apelante, tendo tido todo o suporte necessário que competia ao nosocômio quando de sua internação. Em se tratando de serviços médicos, prestados por profissional liberal, se aplica ao caso a exegese do art. 14, §4º, do Código de Defesa do Consumidor, “a responsabilidade dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa”. Ou seja, a responsabilidade, aqui, é subjetiva e depende da comprovação da culpa do profissional.Via de regra, em se tratando de responsabilidade atribuída ao médico, para averiguar a culpa, é necessário aferir se os serviços executados se qualificam como de meio ou de resultado.É válido citar o entendimento do doutrinador Sergio Cavalieri Filho sobre a responsabilidade do profissional da medicina: Logo, a obrigação assumida pelo médico é de meio, e não de resultado, de sorte que, se o tratamento realizado não produziu o efeito esperado, não se pode falar, só por isso, em inadimplemento contratual. Esta conclusão, além de lógica, tem o apoio de todos os autores, nacionais e estrangeiros (Aguiar Dias, Caio Mário, Silvio Rodrigues, Antonio Montenegro), e é também consagrada pela jurisprudência.Disso resulta que a responsabilidade médica, embora contratual, é subjetiva com culpa provada. Não decorre do mero insucesso no diagnóstico ou no tratamento, seja clínico ou cirúrgico. Caberá ao paciente, ou aos seus herdeiros, demonstrar que o resultado funesto do tratamento teve por causa a negligência, imprudência ou imperícia do médico. O Código do Consumidor manteve neste ponto a mesma disciplina do art. 1545 do Código Civil de 1916, que corresponde ao art. 951 do Código de 2002. Embora seja o médico um prestador de serviços, o Código de Defesa do Consumidor, no §4º do art. 14, abriu uma exceção ao sistema de responsabilidade objetiva nele estabelecido.[6] Como bem destaca Miguel Kfouri Neto: Ao assistir o cliente, o médico assume obrigação de meio, não de resultado. O devedor tem apenas que agir, é a sua própria atividade o objeto do contrato. O médico deve apenas esforçar-se para obter a cura, mesmo que não a consiga.A jurisprudência tem sufragado o entendimento de que, quando o médico atende a um cliente, estabelece-se entre ambos um verdadeiro contrato.A responsabilidade médica é de natureza contratual. Contudo, o fato de considerar como contratual a responsabilidade médica não tem, ao contrário do que poderia parecer, o resultado de presumir a culpa. O médico não se compromete a curar, mas a proceder de acordo com as regras e os métodos da profissão.Já na obrigação de resultado (empreitada, transporte, cirurgia plástica estética propriamente dita), o profissional obriga-se a atingir determinado fim, o que interessa é o resultado de sua atividade – sem o que não terá cumprido a obrigação.Não há, pois, culpa presumida do médico, por estarmos diante de um contrato. Ao autor incumbe a prova de que o médico agiu com culpa.[7] É sabido que a obrigação do médico, em regra, é de meio e não de resultado, ou seja, o médico que atendeu a paciente deveria empregar todos os meios possíveis e adequados ao caso clínico em questão, ficando desvinculado do resultado, uma vez que a própria ciência não oferece esta garantia.Assim, à vítima incumbe demonstrar o dano e provar que este decorreu de culpa por parte do médico. Esse é o firme entendimento do Superior Tribunal de Justiça:RESPONSABILIDADE CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. TEMPESTIVIDADE. DEMONSTRAÇÃO NOS AUTOS. FIBROPLASIA RETROENTICULAR, QUE OCASIONOU PERDA DA VISÃO AO PACIENTE. RESPONSABILIDADE CIVIL DO HOSPITAL E DO MÉDICO POR ALEGADO ERRO CULPÁVEL. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CULPA DO PROFISSIONAL DA MEDICINA E DO NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE O DANO E O ATO COMISSIVO OU OMISSIVO. REEXAME DE PROVAS, EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL. INVIABILIDADE. 1. Não procede a alegação de que o recurso especial foi interposto a destempo, pois o acórdão dos embargos de declaração foi publicado em 2 de março de 2007 e o recurso especial, segundo afirmado, interposto no dia 19 de março de 2007. A certidão de fl. 789 esclarece que o acórdão dos embargos de declaração, de fato, foi publicado na data afirmada - sexta-feira. Todavia, como houve publicação no Diário de Justiça eletrônico, considera-se o primeiro dia útil seguinte como data da efetiva publicação. Com efeito, deve ser considerado como data de publicação o dia 5 de março de 2007 (segunda-feira), considerando-se, portanto, como o termo ad quem do prazo recursal, o dia 20 de março de 2007. 2. A obrigação do médico, em regra, é de meio, isto é, o profissional da saúde assume a obrigação de prestar os seus serviços atuando em conformidade com o estágio de desenvolvimento de sua ciência, com diligência, prudência e técnicas necessárias, utilizando os recursos de que dispõe - elementos que devem ser analisados, para aferição da culpa, à luz do momento da ação ou omissão tida por danosa, e não do presente-, de modo a proporcionar ao paciente todos os cuidados e aconselhamentos essenciais à obtenção do resultado almejado. 3. Portanto, como se trata de obrigação de meio, o resultado final insatisfatório alcançado não configura, por si só, o inadimplemento contratual, pois a finalidade do contrato é a atividade profissional médica, prestada com prudência, técnica e diligência necessárias, devendo, para que exsurja obrigação de indenizar, ser demonstrada a ocorrência de ato, comissivo ou omissivo, caracterizado por erro culpável do médico, assim como do nexo de causalidade entre o dano experimentado pelo paciente e o ato tido por causador do dano. 4. "O reconhecimento da responsabilidade solidária do hospital não transforma a obrigação de meio do médico, em obrigação de resultado, pois a responsabilidade do hospital somente se configura quando comprovada a culpa do médico, conforme a teoria de responsabilidade subjetiva dos profissionais liberais abrigada pelo Código de Defesa do Consumidor". (REsp 1.216.424/MT, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 09/08/2011, DJe 19/08/2011) 5. No caso, a Corte local apurou que a oxigenoterapia era tratamento premente e essencial à preservação da vida do autor e que "não há como estabelecer como único vínculo para a retinopatia de prematuridade a utilização da oxigenoterapia, pois além deste fator, no presente caso, a apelante também nasceu com insuficiência respiratória grave, sendo imprescindível naquele momento afastar o risco de morte" e o acórdão impugnado, com base em laudo pericial, consignou que "o oxigênio somente não é suficiente nem necessário para desencadear retinopatia da prematuridade, e o nível seguro de oxigênio ainda não foi determinado" pela Ciência, de modo que só se concebe a revisão da decisão por meio do reexame provas, obstado pela Súmula 7/STJ. 6. Recurso especial não provido. (REsp 992.821/SC, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 14/08/2012, DJe 27/08/2012. Sem grifo no original) Outrossim, em relação ao hospital, em que pese seja responsável objetiva e solidariamente pelos serviços prestados pelos profissionais da medicina, sua responsabilidade está vinculada à existência de culpa do médico que prestou atendimento à paciente.In casu, tem-se que a autora estava na trigésima oitava semana de gestação e sentiu dores e sangramento vaginal, motivo pelo qual se dirigiu ao hospital réu, sendo atendida pelo obstetra Dr. Rafael, às 10h09min.Foi indicada a realização de exame de ultrassom, o qual foi feito às 10:50h e o laudo identificou centralização e bradicardia fetal.Por conta do quadro da autora, foi determinada a preparação do centro cirúrgico, no entanto, o médico anestesiologista foi contatado apenas às 12h39min.A cesárea teve início às 13:00h, segundo a ficha anestésica, entretanto, o obstetra relata em sua evolução médica no prontuário que o anestesista não estava no hospital e que este haveria chegado às 13:07h, que a cesárea começara às 13:20h daquele dia, com extração do neonato 14 segundos após a incisão da pele. O anestesiologista optou pela realização da raquianestesia e teve uma primeira tentativa frustrada, precisando repetir o procedimento o que também contribuiu para retardar o início da cirurgia de emergência.Segundo consta nos documentos, o bebê nasceu em óbito fetal e não respondeu às manobras de reanimação, sendo constatado o óbito às 13:55h.Argumenta a autora que houve alteração na declaração da causa mortis do neonato, atestando-o como natimorto, o que impede que ele tenha sua personalidade reconhecida.Alega que houve demora injustificada no atendimento, razão pela qual ajuizou as quatro demandas conexas ora em análise, pugnando pela condenação da ré: a) nos autos 0012121-26.2016.8.16.0019, a alterar a declaração causa mortis, bem como ao pagamento de danos morais experimentados em razão da impossibilidade de reconhecimento da personalidade civil do recém-nascido; b) nos autos 0012125-63.2016.8.16.0019, ao pagamento de pensão em virtude do falecimento de seu filho; c) nos autos 0011860-61.2016.8.16.0019, ao pagamento de danos morais em razão do falecimento de seu filho; e, d) nos autos 0012128-18.2016.8.16.0019, ao pagamento de danos morais ao neonato.A magistrada a quo, em julgamento conjunto, acolheu apenas os pedidos formulados nos itens “b” e “c”.Em virtude disso, ambas as partes interpuseram recursos de apelação.Primeiramente, passo à análise da existência ou não de erro médico.Na audiência de instrução e julgamento foram ouvidas duas irmãs da parte autora como informantes.Maisa Lemes de Camargo (mov. 289.2) e Bruna Lemes Schechtel (mov. 289.3) informaram que a autora foi internada às 10h, mas a cesárea somente teria sido realizada às 13h20min. Narram que tomaram conhecimento de que o bebê teria nascido com vida, contudo, não presenciaram o momento do nascimento. Relatam que o Hospital teria fornecido apenas certidão de natimorto. Afirmam que a autora experimentou grande sofrimento em razão da morte do filho.Desta forma, verifica-se que suas declarações pouco contribuíram para a constatação de erro médico e falha no atendimento prestado à autora.Do laudo pericial, por outro lado, extrai-se o seguinte (mov. 193.1 – autos originários):(...) A paciente gestante deu entrada no hospital às 10:09h com sangramento vaginal. Foi avaliada pelo obstetra que fez registro no prontuário eletrônico às 10:42h que não detectou sinais de sofrimento fetal agudo, porque os batimentos do feto no momento eram de 144 batimentos por minuto. Entretanto, como havia sangramento solicitou ecografia e deixou a paciente em jejum.A paciente informou no exame pericial que esperou longamente para realizar a ultrassonografia, e que o fez às 12:00h, entretanto no resultado do exame acostado aos autos, o horário do exame que está registrado é às 10:50h (...)O exame detectou sinais evidentes de sofrimento fetal agudo que indicavam àquele momento a necessidade de realização de cesárea em caráter de urgência. No laudo do ultrassom, o médico ultrassonografista escreve: “entrado em contato imediato com obstetra Dr Rafael e repassado o caso”. Entretanto, não há registro do horário deste contato.Por sua vez, o Dr Rafael registro no prontuário às 12:39h o contato do ecografista e também que fez contato com o anestesista para a cesárea de urgência neste mesmo horário. Entretanto o Dr Rafael escreve em sua evolução médica que o anestesista chegou apenas às 13:07h. Ademais, houve demora adicional em se começar a cirurgia por dificuldade na técnica anestésica escolhida que teve que ser refeita. Por fim, o neonato foi extraído do útero às 13:20h.Constam nas descrições os sinais que já nasceu em parada cardíaca sendo submetido a reanimação neonatal em sala de parto sem sucesso. Foram interrompidas as manobras de ressuscitação e constatado o óbito às 13:55h. Não foram constatados sinais de descolamento placentário durante a cirurgia.O caso se trata de um feto potencialmente viável, que às 10:50h (horário registrado no laudo do ultrassom) estava em sofrimento fetal agudo cujo parto só se deu 13:20h, já em óbito fetal, portanto depois de duas horas e 30 minutos do reconhecimento da emergência.A situação de sofrimento fetal agudo com feto viável é uma verdadeira corrida contra o relógio e cada minuto é valioso no sentido de preservar a integridade do binômio materno-fetal. Nada muda esta assertiva o fato da etiologia do sofrimento causal agudo não ter sido confirmado como descolamento de placenta, como era a suspeita inicial do Dr Rafael. Uma demora de duas horas e trinta minutos é demasiada e contribuiu diretamente para o êxito letal fetal. (sem grifo no original) Concluiu a perita que na chegada ao Hospital o feto da autora estava vivo e com batimentos fetais normais. Já na ecografia realizada às 10:50h constatou-se sofrimento fetal agudo. O parto só se deu às 13:20h, já com o óbito fetal, portanto, após 2 horas e 30 minutos do reconhecimento da emergência. Por fim, apontou que referida demora foi demasiada e contribuiu diretamente para o êxito letal fetal.Conforme disposto no laudo pericial, qualquer que fosse o diagnóstico etiológico do sofrimento agudo fetal, ele era real e uma verdadeira emergência, em que cada minuto até a resolução do parto seria precioso para a sobrevida do feto.Ao responder os quesitos formulados pelas partes, a expert consignou em seu laudo que:(...) 5.1 Quesitos da Autora – mov. 95.1 (...)c) Tendo em vista a gravidade do caso, é correto afirmar que o houve demora no atendimento, porquanto o procedimento cirúrgico foi iniciado mais de três horas após a chegada da Autora ao hospital?Sim.d) O atendimento tardio influenciou o agravamento da situação do nascituro, com sua posterior morte, considerando que na entrada ao hospital sua frequência cardíaca era 144 bpm?Sim.e) Levando-se em conta que o anestesiologista não se encontrava hospital na hora da emergência e o procedimento aplicado na intervenção cirúrgica foi conturbado, conforme descreve o prontuário, é possível afirmar que esses fatos contribuíram para a demora no parto?Sim. (...)5.2 Quesitos do Réu – mov. 98.1 (...)7. Queira o Senhor Perito responder se diante do diagnóstico dopplervelocimétrico de centralização fetal, a conduta obstétrica foi adequada; A cesárea de urgência estava indicada (como o foi), porém a demora em sua realização contribuiu para o desfecho negativo do feto. (...)15. Pode-se inferir, com base na análise dos documentos, que a Autora recebeu tratamento adequado?Não. (...)18. Queira o Senhor Perito descrever em detalhes se o desfecho do caso é um risco do procedimento, ainda que corretamente realizado ou se a situação vivenciada pela Autora ocorre somente em casos de erro, imprudência, negligência ou imperícia;Ao chegar ao Hospital Requerido e ser atendida pelo médico, no dia 24/10/2015, entre 10:09 e 10:42h, o feto da autora estava vivo e com batimentos fetais normais. A ecografia realizada às 10:50h constatou sofrimento fetal agudo, situação na qual cada minuto é valioso no sentido de preservar a integridade do binômio materno-fetal. O parto só se deu às 13:20h, já com o óbito fetal, portanto depois de duas horas e 30 minutos do reconhecimento da emergência. Tal demora foi demasiada e contribuiu diretamente para o êxito letal fetal. (sem grifo no original) Na complementação ao laudo pericial a perita consignou, ainda, que “caso o parto tivesse ocorrido antes, sim, havia uma chance de sobrevida para o feto. É possível afirmar com convicção que a demora para a cesárea foi demasiada e contribuiu diretamente para o êxito letal fetal” (mov. 215.1 – autos nº 0012128-18.2016.8.16.0019).Assim, depreende-se que se tratava de feto potencialmente viável, que às 10:50h estava em sofrimento fetal agudo cujo parto só se deu 13:20h, já em óbito fetal, portanto, depois de duas horas e 30 minutos do reconhecimento da emergência.Logo, do conjunto probatório dos autos, conclui-se pelo dever de indenizar por parte do hospital pelos danos causados pela má prestação do serviço pelos profissionais médicos, que agiram de forma negligente.Consoante ao exposto, já decidiu este Tribunal:APELAÇÃO CÍVEL. RECURSO DE APELAÇÃO JULGADO SEM A INTIMAÇÃO DA PARTE APELADA DOS ATOS EM SEGUNDA INSTÂNCIA. ACÓRDÃO ANULADO. REGULARIZAÇÃO DO PROCESSO NO TRIBUNAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. ERRO MÉDICO. PRESCRIÇÃO RECONHECIDA EM SENTENÇA COM BASE NO ART. 206, § 3º, V, DO CÓDIGO CIVIL. INSTITUTO AFASTADO. APLICAÇÃO, AO CASO, DO PRAZO PRESCRICIONAL QUINQUENAL PREVISTO NO ART. 27 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. FEITO MADURO PARA JULGAMENTO. ART. 1.013, § 4º, DO CPC/2015. MERITUM CAUSAE. ÓBITO DE RECÉM-NASCIDO LOGO APÓS O PARTO. SOFRIMENTO FETAL AGUDO. AUSÊNCIA DE MONITORAMENTO E EXAMES DURANTE A REALIZAÇÃO DO PARTO. REALIZAÇÃO DE CESÁREA SERODIAMENTE. NEGLIGÊNCIA CARACTERIZADA. RÉU QUE NÃO SE DESICUMBIU DO SEU ÔNUS PROBATÓRIO. CULPA DO PROFISSIONAL MÉDICO EVIDENCIADA. RESPONSABILIDADE DO HOSPITAL DECORRENTE DA CONDUTA CULPOSA DO CORPO CLÍNICO. DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO. (...) RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJPR - 10ª C. Cível - AC - 1168773-1 - Foz do Iguaçu - Rel.: DESEMBARGADOR PAULO ROBERTO VASCONCELOS - Unânime - J. 28.03.2019. Sem grifo no original) Assim sendo, imperioso o desprovimento do recurso da parte ré, mantendo a sentença que reconheceu o dever de indenizar. 3.2.2. Dos danos morais e do quantum indenizatórioSustenta a ré que não houve qualquer ato ilícito, ou mesmo ação ou omissão, negligência ou imperícia praticada pela apelante, nos moldes do art. 186 e 927, do Código Civil, que sejam passíveis de condenação por danos morais experimentados pela apelada.Ainda, requer, caso mantida a condenação ao pagamento de indenização por danos morais, que o quantum indenizatório merece ser minorado.In casu, verifica-se que, em decorrência da negligência e demora na realização da cesárea, o feto, que se encontrava em sofrimento fetal agudo, foi a óbito.Não se olvide quanto da realidade da dor sofrida pela autora, pois, das circunstâncias trazidas aos autos, não é necessário grande esforço para verificar os sentimentos de dor, tristeza e angústia ao perder seu ente querido, após longas 38 semanas de gestação. Por isso mesmo, o dano moral nesse caso é evidente, eis que a dor da perda de um ente querido não tem preço, no caso, o falecimento do bebê provocou dores, sofrimentos e traumas à autora.A indenização do dano moral consiste na reparação pecuniária prestada pelo ofensor, em proveito do ofendido, dentro dos limites da razoabilidade e proporcionalidade, como uma satisfação pela dor que lhe foi causada injustamente. Diante disso, é incontestável que a parte autora merece ser indenizada pelos danos morais sofridos.No que tange aos danos morais, inexistem parâmetros legais e precisos para a fixação do quantum indenizatório, cabendo ao julgador diante do grau de culpa do ofensor, gravidade do sofrimento e peculiaridades de cada caso, arbitrar o montante que entender justo para o sofrimento da parte.Sobre os critérios a serem utilizados a doutrina traz o seguinte ensinamento:Para a fixação do valor da indenização, poderia o juiz, aplicando também a analogia, valer-se de algumas outras previsões legais de critérios para a quantificação da reparação do dano moral. (...) A título ilustrativo, alguns desses critérios podem ser utilizados pelo juiz, de forma supletiva, para arbitrar a compensação pecuniária correspondente ao dano moral verificado, de forma a proporcionar uma condenação o mais próxima possível do ideal de Justiça no caso concreto.[8] A respeito dos parâmetros para fixação do dano moral, veja-se o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no REsp 265.133/RJ:III - A indenização por danos morais deve ser fixada em termos razoáveis, não se justificando que a reparação venha a constituir-se em enriquecimento sem causa, com manifestos abusos e exageros, devendo o arbitramento operar-se com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa e ao porte econômico das partes, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso. Ademais, deve ela contribuir para desestimular o ofensor a repetir o ato, inibindo sua conduta antijurídica. (Quarta Turma, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira). O valor da indenização decorrente de danos morais, portanto, deve ser fixado com base na avaliação da extensão do dano sofrido, e arbitrado em quantia capaz de compensá-lo, atendendo, ao mesmo tempo, seu caráter punitivo-pedagógico, de modo a evitar que o causador do dano venha a repeti-lo.Além disso, o valor da condenação não pode ser elevado, a ponto de causar enriquecimento sem causa a quem o recebe, tampouco deve ser ínfimo, a ponto de se tornar inexpressivo.De acordo ao posicionamento do Superior Tribunal de Justiça:RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS. (...) 1. Na fixação do valor da reparação do dano moral por ato doloso, atentando-se para o princípio da razoabilidade e para os critérios da proporcionalidade, deve se levar em consideração o bem jurídico lesado e as condições econômico-financeiras do ofensor e do ofendido, sem se perder de vista o grau de reprovabilidade da conduta e a gravidade do ato ilícito e do dano causado. (STJ. REsp 1300187/MS. T4. Rel. Min. Raul Araújo. Julgado em 17.05.2012) Para se tentar objetivar o máximo possível o arbitramento da indenização por dano moral e com vista, também, à uniformização da jurisprudência, afastando-se, porém, a ideia de tabelamento da indenização, tem-se adotado o denominado critério bifásico. Por esse método, no primeiro momento, define-se uma importância básica de indenização, com análise do interesse jurídico violado e a jurisprudência em casos análogos.Na segunda etapa, ajusta-se o montante em observância às peculiaridades do caso concreto, levando-se em consideração a gravidade do fato em si, culpabilidade do agente, culpa concorrente da vítima, condição econômica das partes e outras circunstâncias relevantes que o julgador entender pertinentes. Conforme entendimento adotado pelo STJ, no julgamento do REsp 1152541/RS[9], de relatoria do Min. Paulo de Tarso Sanseverino, a fixação do dano extrapatrimonial deve observar as seguintes premissas: O método mais adequado para um arbitramento razoável da indenização por dano extrapatrimonial resulta da reunião dos dois últimos critérios analisados (valorização sucessiva tanto das circunstâncias como do interesse jurídico lesado).Na primeira fase, arbitra-se o valor básico ou inicial da indenização, considerando-se o interesse jurídico lesado, em conformidade com os precedentes jurisprudenciais acerca da matéria (grupo de casos). Assegura-se, com isso, uma exigência da justiça comutativa que é uma razoável igualdade de tratamento para casos semelhantes, assim como que situações distintas sejam tratadas desigualmente na medida em que se diferenciam.Na segunda fase, procede-se à fixação definitiva da indenização, ajustando-se o seu montante às peculiaridades do caso com base nas suas circunstâncias. Partindo-se, assim, da indenização básica, eleva-se ou reduz-se esse valor de acordo com as circunstâncias particulares do caso (gravidade do fato em si, culpabilidade do agente, culpa concorrente da vítima, condição econômica das partes) até se alcançar o montante definitivo. Procede-se, assim, a um arbitramento efetivamente equitativo, que respeita as peculiaridades do caso. (...). Em pesquisa jurisprudencial sobre o tema, tem-se que a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Paraná vem arbitrando indenização entre R$ 30.000,00 (trinta mil reais) e R$ 80.000,00 (oitenta mil reais). Citam-se os seguintes acórdãos: (TJPR - 10ª C. Cível - AC - 1168773-1 - Foz do Iguaçu - Rel.: DESEMBARGADOR PAULO ROBERTO VASCONCELOS - Unânime - J. 28.03.2019) – R$ 30.000,00 (trinta mil reais)(TJPR - 3ª C. Cível - 0000839-70.2012.8.16.0135 - Piraí do Sul - Rel.: DESEMBARGADOR MARCOS SERGIO GALLIANO DAROS - J. 08.03.2021) – R$ 50.000,00 para cada genitor(TJPR - 9ª C. Cível - 0008264-41.2007.8.16.0001 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR LUIS SERGIO SWIECH - J. 07.11.2019) – R$ 80.000,00 (oitenta mil reais)(TJPR - 2ª C. Cível - 0025332-65.2012.8.16.0021 - Cascavel - Rel.: DESEMBARGADOR ROGÉRIO LUIS NIELSEN KANAYAMA - J. 12.04.2021) – R$ 80.000,00 (oitenta mil reais)(TJPR - 3ª C. Cível - 0009399-78.2019.8.16.0030 - Foz do Iguaçu - Rel.: DESEMBARGADOR EDUARDO CASAGRANDE SARRAO - J. 08.12.2021) – R$ 80.000,00 (oitenta mil reais)(TJPR - 8ª C. Cível - 0000252-49.2010.8.16.0028 – Segredo de Justiça - Rel.: DESEMBARGADOR HELIO HENRIQUE LOPES FERNANDES LIMA) – R$ 80.000,00 (oitenta mil reais) Em relação à capacidade econômica das partes, a autora é pessoa física, beneficiária da gratuidade da justiça. A ré é instituição beneficente sem fins lucrativos (Ref. Mov. 32.3– autos originários).A culpa do hospital é grave, pois, a negligência médica e demora na realização do parto culminaram no sofrimento fetal e posterior óbito do recém-nascido.Contudo, sopesando as circunstâncias do caso, bem como os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, tem-se que o valor fixado pela magistrada a quo referente aos danos morais merece ser minorado para R$80.000,00 (oitenta mil reais). Desta forma, dou provimento ao recurso da ré neste tópico de insurgência, razão pela qual a correção monetária do valor da indenização deve fluir da data deste acórdão, conforme a súmula 362, do STJ[10]. 3.2.3. Da pensão mensal e da constituição de capitalNo que tange à pensão mensal, a ré alega que a autora abriu uma empresa individual que visa a venda de calçados, demonstrando que já não é mais dependente do Bolsa Família, bem como seu marido pode estar gozando de uma renda maior, consequentemente, não faz jus ao recebimento do pensionamento.Assim, sustenta que a autora alcançou um patamar financeiro que não permite mais o direito de receber pensão desde a data que seu bebê fizesse 14 anos, até os seus 65 anos de vida.Caso mantido o dever de arcar com a pensão, devem ser fixados critérios para o pensionamento, visto que, quando começar a receber o pensionamento a autora terá apenas 39 anos, bem como não se mostra razoável o percentual de 2/3 do salário mínimo durante o período compreendido entre os 14 e 25 anos de idade do menor falecido.Por fim, pugna para que o pensionamento seja limitado aos 18 anos do falecido.A magistrada a quo fixou a pensão mensal em 2/3 do salário mínimo da data em que o menor falecido completaria 14 anos até seus 25 (vinte e cinco) anos de idade, a partir de quando passaria a contribuir com 1/3 do salário mínimo até a data em que completaria 65 (sessenta e cinco) anos ou até a data em que a autora venha a falecer, o que ocorrer primeiro.De acordo com o artigo 948, II, do Código Civil, no caso de ato ilícito com o resultado morte, a indenização deve incluir a “prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável da vida da vítima”.No presente caso, contudo, não houve nascimento com vida, havendo, assim, uma mera expectativa de direito, na qual não se pode indenizar dano hipotético, sob pretexto de aplicação analógica entre à perda de filho menor e o caso em comento que se trata de natimorto.Sabe-se que o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, no caso de óbito de menor de idade, é de que a dependência econômica dos seus genitores é presumida, notadamente em famílias de baixa renda, sendo devido o pensionamento independentemente da comprovação de que a vítima exercia atividade remunerada em vida.Neste sentido:PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. RESPONSABILIDADE. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. INADMISSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7/STJ. MORTE DE FILHO MENOR. PENSÃO. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. SÚMULA N. 83/STJ. DECISÃO MANTIDA. [...] 3. "Nos termos do entendimento consolidado desta Corte, a dependência econômica dos pais em relação ao filho menor falecido é presumida, mormente em se tratando de família de baixa renda" (AgRg no Ag n. 1247155/SP, Relator Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/2/2012, DJe 29/2/2012). 4. Agravo interno a que se nega provimento. ” (AgInt no AREsp 1047018/SC, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 20/06/2017, DJe 29/06/2017. Sem grifo no original) No entanto, para que seja possível a fixação de pensão mensal em caso de filho menor de idade, necessário se faz que o mesmo tenha vivido no âmbito familiar.Isto porque, conforme leciona a doutrina:Chances não equivalem a expectativas subjetivas. Daí que as chances somente se tornam ressarcíveis quando o processo que conduza a elas já se tenha deflagrado. Caso contrário, ficamos no campo dos danos hipotéticos. Portanto, não há como fixar em prol dos genitores pensão mensal baseada em uma perspectiva de vida do nascituro que, lamentavelmente, não se concretizou. (DE FARIAS, Cristiano Chaves; NETTO, Felipe Braga. Novo tratado de responsabilidade civil. 2ª ed. - São Paulo: Saraiva, 2017, p. 268/269). Sobre o tema, já decidiu este Tribunal:ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. SENTENÇA PARCIALMENTE PROCEDENTE. APELAÇÃO CÍVEL (01): INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA. ALEGAÇÃO DE MAJORAÇÃO E INDIVIDUALIZAÇÃO DO DANOS MORAIS. ACOLHIMENTO PARA MELHOR REPARAÇÃO DO DANO. PEDIDO DE FIXAÇÃO DE DANOS MATERIAIS (PENSÃO MENSAL) – NATIMORTO - IMPOSSIBILIDADE – MERA EXPECTATIVA DE DIREITO. PLEITO DE MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. AFASTADO. FIXAÇÃO PROMOVIDA EM PORCENTAGEM RAZOÁVEL E ADEQUADA AOS PARÂMETROS ESTABELECIDOS NO §2º, DO ARTIGO 85 DO CPC. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. APELAÇÃO (02). PRELIMINAR DE OFÍCIO: AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR QUANTO A TESE DE AFASTAMENTO DOS DANOS MATERIAIS (PENSÃO MENSAL) – QUESTÃO DECIDIDA NA SENTENÇA DE MODO FAVORÁVEL À PARTE RÉ – RECURSO NÃO CONHECIDO NESTA PARTE. MÉRITO: INSURGÊNCIA DA PARTE RÉ. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO. ERRO MÉDICO. FALHA NO FUNCIONAMENTO DO SERVIÇO PÚBLICO MUNICIPAL DE SAÚDE. PERÍCIA CONCLUSIVA. DEMONSTRAÇÃO DO NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE A FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE SAÚDE E AO RESULTADO MORTE DO NATIMORTO. DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO. PEDIDO DE REDUÇÃO OU EXTIRPAÇÃO DOS DANOS MORAIS – AFASTADO - VALOR ADEQUADO AOS CRITÉRIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. RECURSO CONHECIDO EM PARTE E, NA PARTE CONHECIDA NEGADO PROVIMENTO. HONORÁRIOS RECURSAIS. MAJORAÇÃO DEVIDA, NOS TERMOS DO ARTIGO 85, § 11º, DO CPC.REEXAME NECESSÁRIO. FIXAÇÃO DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS (CORREÇÃO E JUROS DE MORA) EM ATENÇÃO AO ENTENDIMENTO DOS TRIBUNAIS SUPERIORES. SENTENÇA MANTIDA EM SUA INTEGRALIDADE. ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. SENTENÇA PARCIALMENTE PROCEDENTE. (TJPR - 3ª C. Cível - 0000219-34.2013.8.16.0067 - Cerro Azul - Rel.: RICARDO AUGUSTO REIS DE MACEDO - J. 23.05.2022. Sem grifo no original) Assim, imperioso dar provimento ao recurso da ré neste tocante, a fim de afastar a condenação ao pagamento de pensão mensal. 3.2.4. Dos honorários advocatícios de sucumbênciaAfirma a ré que os honorários de sucumbência devidos à parte autora devem ser minorados, eis que a instrução probatória decorreu propriamente do laudo pericial elaborado pela expert, sendo os quesitos a atividade mais técnica da presente demanda, sem ter havido a formulação de quesitos complementares.Sem razão.A magistrada a quo julgou procedentes os pedidos formulados nos autos nº 0012125-63.2016.8.16.0019 e 0011860-61.2016.8.16.0019, condenando a parte ré ao pagamento de honorários advocatícios no montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) naquela ação e em 15% (quinze por cento) do valor da condenação nesta (mov. 312.1 – autos nº 0012128-18.2016.8.16.0019).Quanto aos autos nº 0012125-63.2016.8.16.0019, se faz necessária a redistribuição da sucumbência, como será feito adiante.Já em relação aos autos nº 0011860-61.2016.8.16.0019, a parte ré requer que os honorários advocatícios sejam reduzidos de 15% para 10% sobre o valor da condenação.Não obstante, considerando o grau de zelo dos profissionais, o lugar de prestação do serviço, a natureza e a importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado, a realização de perícia judicial, e o tempo exigido para o serviço (ação ajuizada em 19.05.2016), a verba honorária arbitrada pelo Juízo de origem não comporta minoração, uma vez que estão de acordo com os critérios estabelecidos pelo art. 85, § 2º, do CPC.Assim, mantenho o valor dos honorários como consignado na sentença. 4. Ônus de sucumbência e Honorários advocatícios recursaisPor fim, ante a reforma da sentença, para o fim de julgar improcedente o pedido pela condenação da ré ao pagamento de pensão mensal formulado nos autos nº 0012125-63.2016.8.16.0019, a redistribuição da sucumbência daquele feito é medida que se impõe. Desse modo, tendo em vista que a parte autora ficou vencida, deverá arcar integralmente com as custas e despesas processuais e honorários advocatícios nos autos nº 0012125-63.2016.8.16.0019, estes fixados em 15% sobre o valor da causa.Quanto aos honorários advocatícios recursais, previstos no artigo 85, § 11, do CPC, conforme decisão do Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do EDcl no AgInt no REsp nº 1.573.573/RJ, somente serão cabíveis quando preenchidos os seguintes requisitos:1. Direito Intertemporal: deve haver incidência imediata, ao processo em curso, da norma do art. 85, § 11, do CPC de 2015, observada a data em que o ato processual de recorrer tem seu nascedouro, ou seja, a publicação da decisão recorrida, nos termos do Enunciado 7 do Plenário do STJ: “Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC”;2. o não conhecimento integral ou o improvimento do recurso pelo Relator, monocraticamente, ou pelo órgão colegiado competente; 3. a verba honorária sucumbencial deve ser devida desde a origem no feito em que interposto o recurso; 4 . não haverá majoração de honorários no julgamento de agravo interno e de embargos de declaração oferecidos pela parte que teve seu recurso não conhecido integralmente ou não provido; 5 . não terem sido atingidos na origem os limites previstos nos §§ 2º e 3º do art. 85 do Código de Processo Civil de 2015, para cada fase do processo; 6 . não é exigível a comprovação de trabalho adicional do advogado do recorrido no grau recursal, tratando-se apenas de critério de quantificação da verba. (Sem grifo no original). In casu, verifica-se que os pedidos iniciais foram julgados parcialmente procedentes pelo juízo a quo (Ref. Mov. 295.1 e 312.1 – autos originários), razão pela qual ambas as partes interpuseram recurso de apelação, sendo o da autora desprovido e o da ré parcialmente conhecido e, na parte conhecida, parcialmente provido.Assim sendo, se mostra cabível o arbitramento de honorários advocatícios recursais, na medida em que dentre os requisitos cumulativos para tanto está o de não conhecimento integral ou desprovimento do recurso, pelo colegiado ou monocraticamente, bem como que a verba sucumbencial seja devida desde a origem no feito em que interposto o recurso.Dito isso, para a fase recursal, fixa-se honorários advocatícios na ordem de 2% sobre o valor atualizado da causa, a serem cumulados com aqueles já arbitrados na sentença, de modo a remunerar o trabalho adicional dos advogados da parte ré e coibir recursos infundados e protelatórios. Mantêm-se os benefícios da gratuidade da justiça anteriormente concedidos à parte autora. 5. ConclusãoDiante do exposto, voto no sentido de: a) conhecer e negar provimento ao recurso de apelação 1, interposto pela autora; b) conhecer parcialmente e, na parte conhecida, dar parcial provimento ao recurso de apelação 2, interposto pela ré, a fim de: b.1) minorar o quantum indenizatório para R$80.000,00 (oitenta mil reais), motivo pelo qual o termo inicial da correção monetária deverá ser a data deste acórdão; e b.2) afastar a condenação da ré ao pagamento de pensão mensal; e, c) não conhecer o recurso de apelação adesivo interposto pela parte autora.Ainda, imperiosa a redistribuição da sucumbência, tendo em vista que a parte autora ficou vencida, deverá arcar integralmente com as custas e despesas processuais e honorários advocatícios nos autos nº 0012125-63.2016.8.16.0019, estes fixados em 15% sobre o valor da causa.
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