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Acórdão
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Ilustre Advogado, Dr. Marco Aurélio Krefeta, impetra ordem de habeas corpus em favor de LUIS VINICIUS DA SILVA, 27 anos de idade – custodiado preventivamente desde 30.06.2020 -, e denunciado pela prática de crimes de corrupção de menores e homicídio qualificado, em coautoria, de que foi vítima Adailson de Paula, mediante ao menos doze (12) golpes de armas brancas contra o rosto, mãos, pescoço, costas, axila, nuca e cabeça do ofendido, entre o dia 18 e a madrugada de 20 de julho de 2016, na estrada rural da Colônia Maria Brava, em Imbituva (AP n.º 0000440-69.2021.8.16.0153, mov. 29.1).Alega a caracterização de constrangimento ilegal decorrente de ato emanado da autoridade apontada como coatora que mantém o paciente preso preventivamente, sem fundamentação concreta e em excesso de prazo na instrução e, também, para sua revisão, no prazo de 90 dias (art. 316, parágrafo único do CPP). Aduz, em síntese, que o acusado é primário e portador de bons antecedentes, e a prova coletada nos autos é vacilante e inconclusiva com relação a autoria delitiva. Pede liminar, com aplicação de medidas cautelares substitutivas.Sem liminar (mov. 11.1), veio aos autos parecer da douta Procuradoria-Geral de Justiça (mov. 18.1), subscrito pelo ilustre Procurador de Justiça, Doutor Ivonei Sfoggia, manifestando-se pelo não conhecimento do writ “ante o parcial descabimento – relativo aos indícios de autoria – e a manifesta deficiência instrutória, enfatizando-se a impossibilidade de se contornar a indigitada regra regimental, aliada à inexistência de manifesto constrangimento ilegal”.É a síntese do essencial.
O advogado impetrante alega estarem os paciente LUIS VINICIUS DA SILVA submetidos a manifesto constrangimento ilegal em razão da manutenção da prisão preventiva – sem fundamentação concreta -, e em evidente excesso de prazo.Consta da denúncia, que entre o dia 18 e a madrugada de 20 de julho de 2016, em horário incerto, na estrada rural da Colônia Maria Brava, em Imbituva, ADEMAR DA SILVA, RODRIGO RIBEIRO e o paciente LUIS VINÍCIUS DA SILVA, “agindo em concurso com os adolescentes J. N. e J. N., com intenção de matar, impelidos por motivo fútil, mediante recurso que dificultou a defesa do ofendido e utilizando de meio cruel, desferiram ao menos 12 (doze) golpes com armas brancas no rosto, mãos, pescoço, costas, axila, nuca e cabeça de Adailson de Paula, acarretando-lhe ‘choque hipovolêmico’ que foi a causa efetiva de sua morte conforme laudo pericial de movimento 1.9 a 1.11 e laudo de exame cadavérico de movimento 1.13.”Conforme se apurou os denunciados decidiram ceifar a vida da vítima em razão de “dívidas de drogas” motivo pelo qual ADEMAR, RODRIGO, LUIS VINÍCIUS e os então adolescentes Joelson N. e Jocélio N. a agrediram com “pauladas” e “pedradas” e a conduziram até o local dos fatos (área rural), golpeando-a novamente inúmeras vezes com diversos instrumentos (armas brancas – faca, facão, canivete e “coronhadas” com arma de fogo além de chutes pelo corpo), arrastando-a no solo por cerca de 10 metros ainda viva, gerando-lhe intenso sofrimento.Com efeito RODRIGO golpeou a vítima utilizando um canivete, ADEMAR desferiu chutes por seu corpo e coronhadas em sua cabeça, sendo que LUIS VINÍCIUS a atacou com uma faca pequena e um facão, o que foi seguido por diversos golpes de faca e esgorjamento (degolamento) praticados por ADEMAR e pelos então adolescentes J.N. e J. N., resultando nas seguintes lesões: 1 – ferida cortante em tórax lado esquerdo; 2 – três feridas cortantes em região dorsal de tórax; 3 – ferida cortante em tórax, lado direito; 4 – escoriação em região lateral direita; 5 – escoriação em nádega direita; 6 – ferida axilar esquerda; 7 – quatro feridas cortantes em couro cabeludo; 8 – escoriação em tórax e abdome lado esquerdo; 9 – equimose periorbital; 10 – ferida cortante em pescoço com profundidade e laceração de traqueia; 11 – equimose em punho esquerdo; 12 – equimose em mão direita; 13 – escoriação em tórax anterior, que foram a causa efetiva de sua morte.O motivo fútil é evidente diante da desproporcionalidade entre o mal praticado (homicídio) e sua motivação (discussão acerca da forma de pagamento/dívida de drogas).O recurso que dificultou a defesa do ofendido está estampado na quantidade de agressores (ao menos cinco) contra apenas uma vítima que não pôde oferecer resistência, bem como no inesperado ataque inicial.O meio cruel extrai-se da forma como praticado o homicídio mediante a repetição de golpes em diversas regiões do corpo e em razão da vítima ter sido arrastada no solo ainda viva por cerca de 10 metros, o que acarretou-lhe intenso e desnecessário sofrimento (conforme laudo cadavérico de mov. 1.13 e laudo de movimentos 1.9 a 1.11).Na madrugada de 20 de julho de 2016, aproximadamente entre 05h30 e 07h30, na estrada rural da Colônia Maria Brava, nesta cidade e Comarca de Imbituva, ADEMAR DA SILVA, RODRIGO RIBEIRO e LUIS VINÍCIUS DA SILVA facilitaram a corrupção de J. N. (nascido em 03/01/2001) e J. N. (nascido em 15/08/1998) – conforme certidões de movimentos 1.11 e 1.12 dos autos nº 0001556-36.2020.8.16.0092 – com eles praticando a infração penal (homicídio) acima descrito” (AP, mov. 15.1).A prisão preventiva do paciente foi decretada, em 27.06.2020, para garantia da ordem pública e conveniência da instrução criminal (autos 0001556-36.2020.8.16.0092, mov. 13.1).Em 27.08.2021 a custódia cautelar foi mantida, ante a subsistência dos requisitos do art. 312 do CPP (art. 316, parágrafo único do CPP) (AP, mov. 432.1).Pois bem.O writ comporta conhecimento.Pois as peças necessárias ao seu julgamento podem ser visualizadas pelo sistema Projudi.Entretanto, não há razão para revogar a prisão cautelar do ora paciente.Ainda não é o momento de se aprofundar o exame da prova – inviável na via restrita do habeas corpus -, para verificar a alegada insuficiência de indícios de autoria.Os indícios de autoria que recaem sobre o paciente foram indicados pelo magistrado singular, e estão consubstanciados em elementos informativos do inquérito policial, notadamente pelas declarações colhidas durante quase quatro (04) anos de investigação.Maiores incursões a respeito do envolvimento do acusado no crime lhe imputado, esbarra na via eleita pela ora impetrante. Tais questões deverão ser analisadas, oportunamente, pelo magistrado singular, ao final da instrução processual.Conforme precedentes do Superior Tribunal de Justiça, “O habeas corpus não é o meio adequado para a análise de tese de negativa de autoria ou participação por exigir, necessariamente, uma avaliação do conteúdo fático-probatório, procedimento incompatível com a via estreita do writ, ação constitucional de rito célere e de cognição sumária” (STJ, HC 412.878/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, j. em 21/09/2017, DJe 27/09/2017).Ademais, “(...) Para a ordenação da prisão preventiva não se exige prova concludente da autoria delitiva, reservada à condenação criminal, mas apenas indícios suficientes dessa, que, pelo cotejo dos elementos que instruem o ‘mandamus’, se fazem presentes. 2. A análise acerca da negativa de participação no ilícito é questão que não pode ser dirimida em ‘habeas corpus’, por demandar o reexame aprofundado das provas colhidas no curso da instrução criminal, vedado na via sumária eleita (...)” (RHC 80.159/RJ, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 18/04/2017, DJe 12/05/2017).No mais, a prisão preventiva do paciente, notadamente para garantia da ordem pública – como forma de evitar a reiteração delitiva -, está adequadamente motivada na gravidade concreta do delito e periculosidade social do agente, revelada pelo modus operandi empregado e demais circunstâncias do evento delituoso.O paciente é acusado da prática de crime de gravidade ímpar, praticado com violência exacerbada contra a pessoa, e motivado por dívida de drogas. Observe-se, a propósito, a brutalidade com que foi cometido o delito de homicídio, com requintes de crueldade, sendo a vítima submetida a esgorjamento. Ademais, conforme anotado pelo magistrado no decreto prisional, a paciente teria sido apontado “como aquele que mais desferiu golpes na vítima”.Cumpre registrar, outrossim, o relato, no decreto de prisão preventiva, que testemunha teria contado “que foi ameaçada pelos investigados Rodrigo e Luís Vinícius logo após os fatos, em virtude de tê-los presenciado matando Adailson”, a justificar a medida extrema para garantia da instrução criminal.Do mesmo modo, não há que se falar em ausência de fundamentação da decisão que manteve a prisão cautelar do paciente para fins do art. 316, parágrafo único do CPP.Conforme já decidiu a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça “(...) 3. A fundamentação da revisão da prisão preventiva não exige a invocação de elementos novos, mas apenas o reconhecimento da manutenção do quadro fático que serviu de embasamento à sua decretação. Precedente. A cada ciclo de revisão, o Poder Judiciário deve avaliar (i) se, mantido o quadro fático intacto, a prisão tornou-se excessivamente longa; ou (ii) se, alterado o quadro fático subjacente, ela se tornou desnecessária, situação em que deve ser revogada, independentemente de sua duração (...)” (AgRg na APn 940/DF, Rel. Ministro OG FERNANDES, CORTE ESPECIAL, julgado em 07/04/2021, DJe 10/05/2021).No mesmo sentido:“(...) III - Segundo entendimento desta eg. Corte Superior, "Mantidas as circunstâncias fáticas, a fundamentação da revisão da prisão preventiva não exige a invocação de elementos novos, razão pela qual, para o cumprimento do disposto no art. 316, parágrafo único, do CPP, é suficiente que as decisões que mantêm as prisões preventivas contenham fundamentação mais simplificada do que aquela empregada nos atos jurisdicionais que as decretaram" (QO no PePrPr 4/DF, Corte Especial, Relª. Minª. Nancy Andrighi, DJe 22/06/2021) (...)” (EDcl no AgRg no RHC 150.457/SP, Rel. Ministro JESUÍNO RISSATO (DES. CONV. DO TJDFT), QUINTA TURMA, julgado em 16/11/2021, DJe 26/11/2021).Desse modo, encontrando-se devidamente motivada a decretação e manutenção da medida extrema, irrelevante a presença de condições pessoais favoráveis, e ineficaz a aplicação de medidas cautelares substitutivas.A propósito do tema, a jurisprudência desta Primeira Câmara Criminal:“HABEAS CORPUS - HOMICÍDIO QUALIFICADO E TRÁFICO DE DROGAS - PRISÃO PREVENTIVA - PEDIDO DE REVOGAÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - DECISÃO DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA - PRESENÇA DOS REQUISITOS DOS ARTS. 312 E 313, CPP - CUSTÓDIA NECESSÁRIA PARA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA - PERICULOSIDADE DO PACIENTE CONCRETAMENTE AFERIDA PELA GRAVIDADE CONCRETA DO CRIME, POSSIBILIDADE REAL DE REITERAÇÃO DELITIVA E ‘MODUS OPERANDI’ DO DELITO - CONDIÇÕES SUBJETIVAS FAVORÁVEIS - IRRELEVÂNCIA - APLICAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO - INVIABILIDADE - ORDEM DENEGADA” (TJPR - 1ª C.Criminal - 0025632-75.2021.8.16.0000 - Clevelândia - Rel.: DESEMBARGADOR ANTONIO LOYOLA VIEIRA - J. 31.05.2021).Oportuno lembrar, outrossim, que a prisão cautelar em absoluto agride o princípio constitucional da presunção de inocência, desde que se trata de medida processual que visa a proteção social, tendo inclusive previsão na própria Carta Magna – art. 5º, inciso LXI.Desse modo, não se vislumbra qualquer ilegalidade na prisão preventiva do paciente a ser coarctada pela via do habeas corpus.Por outro lado, não se contata excesso de prazo na instrução, ou mesmo para a reanálise da custódia preventiva (art. 316, parágrafo único do CPP).A alegação de excesso de prazo não pode ser analisada isoladamente – ou apenas pela soma aritmética dos prazos legais -, mas num contexto mais amplo, onde devem preponderar os critérios de razoabilidade e proporcionalidade.No caso, não obstante o tempo da prisão processual do ora paciente, de cerca de um (01) ano e cinco (05) meses, não se verifica a presença de demora injustificada ou desídia que possa ser atribuída ao magistrado singular na condução do feito.Trata-se de feito complexo, que conta com três réus – com procuradores diferentes -, e mais de um fato delituoso, onde houve necessidade de expedição de cartas precatórias, e que, ademais, já se encontra na fase de alegações finais, atraindo a incidência do entendimento da Súmula n.º 52 do STJ, verbis:“Encerrada a instrução criminal, fica superada a alegação de constrangimento por excesso de prazo”.De igual sorte, a última revisão da prisão para fins do disposto no artigo 316, parágrafo único do CPP, como dito, foi realizada em 27.08.2021 (AP, mov. 432.1), aguardando-se nova deliberação judicial a respeito (cf. certidão de mov. 470).Ademias, como é sabido, eventual inobservância ao prazo preconizado no parágrafo único do artigo 316, do Código de Processo Penal, não importa em qualquer irregularidade. Pois, tal prazo não é peremptório, admitindo dilações conforme as peculiaridades do caso. Nesse sentido:“(...) 3. O entendimento das duas Turmas Criminais que compõem o Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que o prazo de 90 dias para reavaliação dos fundamentos da prisão (conforme disposto no art. 316, parágrafo único, do CPP) não é peremptório, isto é, eventual atraso na execução deste ato não implica automático reconhecimento da ilegalidade da prisão, tampouco a imediata colocação do custodiado cautelar em liberdade. No mesmo sentido, o Supremo Tribunal Federal, em recente decisão (SL 1.395/SP, Ministro Presidente), firmou entendimento no sentido de que a inobservância da reavaliação da prisão no prazo de 90 dias, previsto no art. 316, parágrafo único, do CPP, com a redação dada pela Lei 13.964/2019, não resulta na revogação automática da prisão preventiva (...)” (STJ, HC 621.416/RS, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 13/04/2021, DJe 16/04/2021).Cumpre observar que tão logo sobrevenha a decisão de encerramento da primeira fase do rito do júri, caso eventualmente pronunciado o acusado, a prisão cautelar será novamente revisada.Desse modo, não se verifica a presença de constrangimento ilegal a autorizar a soltura do paciente.À face do exposto, define-se o voto pelo conhecimento parcial e denegação da ordem de habeas corpus.
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