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Acórdão
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I – Trata-se de recurso de apelação cível interposto pelo Município de Matinhos contra a sentença que reconheceu a ocorrência da prescrição intercorrente e julgou extinta a execução, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, II, e art. 924, V, dos dois do Código de Processo Civil e art. 40, § 4º da Lei nº 6.830/80. Ainda, condenou-se o Município ao pagamento das custas processuais e taxas judiciárias, sem fixação de honorários advocatícios (mov. 21.1).Inicialmente, assevera o apelante que não houve intimação prévia para manifestação acerca de eventual extinção da execução fiscal pela prescrição intercorrente, razão pela qual pleiteia a nulidade da sentença. Sustenta, na sequência, que houve a interrupção do prazo prescricional quinquenal pelo despacho que determinou a citação do devedor, nos termos do art. 174, parágrafo único, I, do Código Tributário Nacional, com redação dada pela Lei Complementar nº 118/2005.Afirma, ainda, que sempre se manifestou quando intimado para tanto e que não houve a suspensão do processo, nos termos do art. 40 da Lei nº 6.830/80. Reforça, desse modo, que o prazo da prescrição intercorrente só tem início após a intimação da Fazenda Pública sobre o arquivamento provisório, o que não ocorreu na espécie.Aduz que, se houve a paralisação do feito, essa se deu por culpa exclusiva do Poder Judiciário, que não promoveu as intimações necessárias, nos termos do art. 25 da Lei nº 6.830/80.Pugna, então, pelo conhecimento e provimento do recurso, com a reforma da sentença recorrida e o prosseguimento da execução fiscal (mov. 24.1). Não houve intimação do apelado para apresentar contrarrazões porque não constituiu procurador (mov. 25.1). Distribuiu-se o feito livremente a este Relator (mov. 3.1 – recurso). Na sequência, ordenou-se a intimação do apelante para se manifestar sobre eventual prescrição material do débito do exercício de 2005 (mov. 8.1 – recurso). Intimado, o Município deixou de se manifestar sobre eventual prescrição material. Contudo, na ocasião, pugnou pela extinção do feito sem ônus para as partes, com fulcro no art. 921, § 5º, do Código de Processo Civil (mov. 12.1 – recurso). É o relatório.
II – De início, registre-se que inviável o aditamento das razões recursais, como pretendido pela agravante.Isso porque “todo recurso deve vir acompanhado das respectivas razões, já no ato de interposição. (...) não se admite que as razões sofram acréscimos, sejam modificadas ou aditadas, posteriormente” (GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito Processual Civil Esquematizado. 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 2018. p. 770).Nessa linha já decidiu o Superior Tribunal de Justiça:“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3/STJ. INTERPOSIÇÃO RECURSAL. MINUTA INCOMPLETA. PRETENSÃO DE COMPLEMENTAÇÃO DAS RAZÕES. IMPOSSIBILIDADE. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. APRESENTAÇÃO DE NOVA MINUTA EXTEMPORÂNEA. 1. A ausência de razões de impugnação impede o conhecimento do recurso de agravo interno, dado o desatendimento do ônus da dialeticidade. 2. O direito de recorrer exaure-se com o seu exercício, do que decorre a impossibilidade de complementar as razões recursais, o que, no caso concreto, é agravado diante de essa complementação almejada ter ocorrido depois de esgotado o prazo legal. 3. Agravo interno não conhecido” (STJ. AgInt no RMS 53.249/PE, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/09/2017, DJe 15/09/2017).Assim, deixo de conhecer do pedido formulado na petição de mov. 12.1 do recurso.No mais, presentes os pressupostos de admissibilidade extrínsecos (tempestividade, preparo, regularidade formal e inexistência de fato impeditivo) e intrínsecos (legitimidade, interesse e cabimento), conheço do recurso com efeito suspensivo por não vislumbrar, na hipótese, nenhuma das exceções previstas no § 1º, do art. 1.012, do Código de Processo Civil.Passo, então, à análise da pretensão recursal.Observo, contudo, que há questão não examinada pelo Juízo “a quo” e que pode ser conhecida nesta instância, qual seja, a prescrição material do crédito tributário, o que faço de ofício. Pois bem. A prescrição material refere-se ao prazo que a Fazenda Pública tem para cobrar em Juízo o crédito tributário devidamente constituído.Dispõe o art. 174 do Código Tributário Nacional que “a ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva”.Portanto, constituído o crédito tributário, inicia-se o prazo de 5 (cinco) anos para a Fazenda Pública realizar a respectiva cobrança, o qual pode ser suspenso ou interrompido, consoante o disposto nos arts. 151[1] e 174, parágrafo único[2], ambos do Código Tributário Nacional. Na hipótese, proferiu-se o despacho ordenador da citação do devedor em 16.12.2010, isto é, após a vigência da Lei Complementar nº 118/2005, que alterou a redação do inciso I do art. 174 do Código Tributário Nacional. Dessa maneira, a interrupção do prazo prescricional ocorre com o “despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal“.Paralelamente, observa-se que o IPTU é tributo sujeito a lançamento de ofício, consoante o art. 149, do Código Tributário Nacional. Significa dizer que o lançamento ocorrerá independentemente de qualquer provocação porquanto a Fazenda Pública já detém todas as informações necessárias.E, como consolidado no Recurso Especial n° 1.641.011, julgado sob a sistemática prevista para os recursos repetitivos, o Superior Tribunal de Justiça já fixou que o termo a quo para a contagem do prazo prescricional do IPTU coincide com o dia seguinte à data do vencimento da exação, quando passa a ser exigível o crédito tributário pela Fazenda Pública:“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. IPTU. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. DIA SEGUINTE AO VENCIMENTO DA EXAÇÃO. PARCELAMENTO DE OFÍCIO DA DÍVIDA TRIBUTÁRIA. NÃO CONFIGURAÇÃO DE CAUSA SUSPENSIVA DA CONTAGEM DA PRESCRIÇÃO. MORATÓRIA OU PARCELAMENTO APTO A SUSPENDER A EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. NECESSÁRIA MANIFESTAÇÃO DE VONTADE DO CONTRIBUINTE. PARCELAMENTO DE OFÍCIO. MERO FAVOR FISCAL. APLICAÇÃO DO RITO DO ART. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015. ART. 256-I DO RISTJ. RECURSO ESPECIAL DO MUNICÍPIO DE BELÉM/PA A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Tratando-se de lançamento de ofício, o prazo prescricional de cinco anos para que a Fazenda Pública realize a cobrança judicial de seu crédito tributário (art. 174, caput do CTN) referente ao IPTU, começa a fluir somente após o transcurso do prazo estabelecido pela lei local para o vencimento da exação (pagamento voluntário pelo contribuinte), não dispondo o Fisco, até o vencimento estipulado, de pretensão executória legítima para ajuizar execução fiscal objetivando a cobrança judicial, embora já constituído o crédito desde o momento no qual houve o envio do carnê para o endereço do contribuinte (Súmula 397/STJ). Hipótese similar ao julgamento por este STJ do REsp. 1.320.825/RJ (Rel. Min. GURGEL DE FARIA, DJe 17.8.2016), submetido ao rito dos recursos repetitivos (Tema 903), no qual restou fixada a tese de que a notificação do contribuinte para o recolhimento do IPVA perfectibiliza a constituição definitiva do crédito tributário, iniciando-se o prazo prescricional para a execução fiscal no dia seguinte à data estipulada para o vencimento da exação. 2. O parcelamento de ofício da dívida tributária não configura causa interruptiva da contagem da prescrição, uma vez que o contribuinte não anuiu. 3. O contribuinte não pode ser despido da autonomia de sua vontade, em decorrência de uma opção unilateral do Estado, que resolve lhe conceder a possibilidade de efetuar o pagamento em cotas parceladas. Se a Fazenda Pública Municipal entende que é mais conveniente oferecer opções parceladas para pagamento do IPTU, o faz dentro de sua política fiscal, por mera liberalidade, o que não induz a conclusão de que houve moratória ou parcelamento do crédito tributário, nos termos do art. 151, I e VI do CTN, apto a suspender o prazo prescricional para a cobrança de referido crédito. Necessária manifestação de vontade do contribuinte a fim de configurar moratória ou parcelamento apto a suspender a exigibilidade do crédito tributário. 4. Acórdão submetido ao regime do art. 1.036 e seguintes do CPC/2015 (art. 256-I do RISTJ, incluído pela Emenda Regimental 24 de 28.9.2016), cadastrados sob o Tema 980/STJ, fixando-se a seguinte tese: (i) o termo inicial do prazo prescricional da cobrança judicial do Imposto Predial e Territorial Urbano - IPTU inicia-se no dia seguinte à data estipulada para o vencimento da exação; (ii) o parcelamento de ofício da dívida tributária não configura causa interruptiva da contagem da prescrição, uma vez que o contribuinte não anuiu.” (REsp 1641011/PA, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/11/2018, DJe 21/11/2018 - Grifei).No caso, a data de vencimento do tributo relativo ao exercício de 2005 se deu em 10.2.2005, como indica a Certidão de Dívida Ativa nº 7254/2010 (mov. 1.1 – p. 2). Dessa forma, o termo inicial da prescrição é 11.2.2005. O termo final, por sua vez, corresponde a 11.2.2010. Destarte, tendo em vista que o exequente ajuizou a execução fiscal em 19.11.2010, isto é, passados mais de 5 (cinco) anos desde a constituição definitiva do débito, forçoso o reconhecimento, de ofício, da prescrição material do crédito tributário do exercício de 2005, nos termos do art. 174, caput, do Código Tributário Nacional c/c art. 487, II, do Código de Processo Civil.Quanto aos demais débitos, passo ao exame das alegações formuladas nas razões recusais.Infere-se dos autos que o Município de Matinhos ajuizou a Execução Fiscal nº 0016193-66.2010.8.16.0116, em 19.11.2010, contra José Eraldo Germano da Silva, a fim de satisfazer débito tributário de IPTU referente aos exercícios de 2005 a 2008, no valor de R$ 644,38 (seiscentos e quarenta e quatro reais e trinta e oito centavos), consoante a Certidão de Dívida Ativa nº 7254/2010 (mov. 1.1, p. 1-2).Em 16.12.2010, proferiu-se despacho citatório e, em 25.2.2011, expediu-se a carta de citação (mov. 1.1, p. 3-4).Em 6.4.2011, o Município efetuou o pagamento da despesa postal (mov. 1.1, p. 7).Assim, em 13.4.2011, a Secretaria certificou a citação do executado (mov. 1.1, p. 8/10). Inseriu-se o processo no sistema PROJUDI em 20.11.2017 (mov. 1 e 2).Em 26.2.2018, a Fazenda Pública tomou ciência da digitalização dos autos (mov. 4). E, em 3.5.2018, requereu “a suspensão do feito pelo prazo de 06 (seis) meses, a fim de que o Município possa analisar cada autos de Execução Fiscal com mais atenção, visto que no momento o exequente conta com amis de quinze mil prazos aberto” (mov. 5.1).Com o término da suspensão dos autos, intimou-se o Município para dar prosseguimento ao feito (mov. 6.1 e 9.1). Todavia, em 13.8.2019, a Fazenda Pública pleiteou a “prorrogação do prazo para que esta Procuradoria possa analisar a situação técnica do imóvel, no intuito de avaliar o prosseguimento do feito” (mov. 12.1). Em 18.9.2020, o Fisco pediu o bloqueio das constas do executado via SISBAJUD ou, alternativamente, pela penhora e bloqueio de veículos em nome do executado por meio dos sistemas RENAJUD e INFOJUD (mov. 19.1).Sobreveio, em 25.8.2021, sentença que reconheceu a ocorrência da prescrição intercorrente e julgou extinta a execução, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, II, e art. 924, V, dos dois do Código de Processo Civil e art. 40, § 4º da Lei nº 6.830/80 (mov. 38.1).Pois bem. Desde logo, assiste razão ao apelante quanto à alegação de nulidade da sentença pela ausência de intimação prévia acerca do reconhecimento, de ofício, da prescrição intercorrente. É que, no julgamento do REsp nº 1.340.553/RS, submetido à sistemática dos recursos repetitivos, o Superior Tribunal de Justiça fixou a seguinte tese acerca da intimação prévia da Fazenda Pública para se manifestar sobre eventual reconhecimento, de ofício, da prescrição intercorrente: “4.4.) A Fazenda Pública, em sua primeira oportunidade de falar nos autos (art. 245 do CPC/73, correspondente ao art. 278 do CPC/2015), ao alegar nulidade pela falta de qualquer intimação dentro do procedimento do art. 40 da LEF, deverá demonstrar o prejuízo que sofreu (exceto a falta da intimação que constitui o termo inicial - 4.1., onde o prejuízo é presumido), por exemplo, deverá demonstrar a ocorrência de qualquer causa interruptiva ou suspensiva da prescrição” (STJ. REsp 1340553/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 12/09/2018, DJe 16/10/2018).A propósito, convém destacar o seguinte trecho do voto proferido pelo Ministro Relator que elucida bem a questão:“Ocorre que esse procedimento prevê a intimação do representante judicial da Fazenda Pública em dois momentos distintos. Na primeira parte, ele deve ser intimado da suspensão do curso da execução com vista dos autos a fim de que providencie a localização do devedor ou dos bens. Com efeito, a citação do devedor implicaria interrupção do prazo prescritivo e a efetiva localização de bens significaria a possibilidade de o feito executivo caminhar, afastando a inércia necessária à caracterização da prescrição intercorrente. Na segunda parte, ele deve ser intimado do decurso do prazo prescricional a fim de apontar a ocorrência, no passado, de qualquer causa interruptiva ou suspensiva da prescrição ou simplesmente tomar ciência do decurso do prazo.Decerto, muito embora a jurisprudência do STJ já tenha entendido que é necessário intimar a Fazenda Pública antes da decisão de decretação da prescrição intercorrente, consoante a literalidade do art. 40, §4º, da LEF (vg. EREsp 699.016/PE, Primeira Seção, Rel. Min. Denise Arruda, DJ 17.3.2008; RMS n. 39241/SP, Segunda Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 11.06.2013), as duas previsões legais de intimação da Fazenda Pública dentro da sistemática do art. 40, da LEF são formas definidas pela lei cuja desobediência não está acompanhada de qualquer cominação de nulidade, ou seja, a teor do art. 244, do CPC: "Quando a lei prescrever determinada forma, sem cominação de nulidade, o juiz considerará válido o ato se, realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade". Dessa maneira, o ato pode ser considerado válido se a finalidade foi alcançada de outro modo.Sendo assim, se ao final do referido prazo de 6 (seis) anos contados da falta de localização de devedores ou bens penhoráveis (art. 40, caput, da LEF) a Fazenda Pública for intimada do decurso do prazo prescricional, sem ter sido intimada nas etapas anteriores, terá nesse momento e dentro do prazo para se manifestar (que pode ser inclusive em sede de apelação, como no caso concreto), a oportunidade de providenciar a localização do devedor ou dos bens e apontar a ocorrência no passado de qualquer causa interruptiva ou suspensiva da prescrição. Esse entendimento é o que está conforme o comando contido no art. 40, §3º, da LEF.Por outro lado, caso a Fazenda Pública não faça uso dessa prerrogativa, é de ser reconhecida a prescrição intercorrente. O mesmo raciocínio é aplicável caso se entenda que a ausência de intimação das etapas anteriores tem enquadramento nos arts. 247 e 248, do CPC ("Art. 247. As citações e as intimações serão nulas, quando feitas sem observância das prescrições legais. Art. 248. Anulado o ato, reputam-se de nenhum efeito todos os subseqüentes, que dele dependam; [...]").Isto porque o princípio da instrumentalidade das formas recomenda que a Fazenda Pública, em sua primeira oportunidade de falar nos autos (art. 245, do CPC), ao alegar a nulidade pela falta de intimação demonstre o prejuízo que sofreu e isso somente é possível se houver efetivamente localizado o devedor ou os bens penhoráveis ou tenha ocorrido qualquer causa interruptiva ou suspensiva da prescrição” (STJ. REsp 1340553/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 12/09/2018, DJe 16/10/2018 – destaquei).Vê-se, então, que o Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento segundo o qual, em que pese a regra contida no art. 40, § 4º, da Lei de Execução Fiscal[3], somente será declarada a nulidade pela ausência de intimação prévia para manifestação sobre o reconhecimento, de ofício, da prescrição intercorrente quando a Fazenda Pública, na primeira oportunidade de falar nos autos, demonstrar o prejuízo que sofreu. E, na hipótese, é certo que o reconhecimento, de ofício, da citada prescrição veio a causar prejuízos ao Município de Matinhos, uma vez que, como será visto adiante, não houve o transcurso do lapso prescricional em relação aos débitos remanescentes (2006 a 2008). Tal cenário permite, de acordo com o supracitado precedente vinculante, o reconhecimento da nulidade da sentença (mov. 21. 1), com a determinação do prosseguimento da execução fiscal.Ocorre que, nos termos do art. 282, § 2º, do Código de Processo Civil, se possível o julgamento do mérito em favor da parte que seria beneficiada com o reconhecimento da nulidade, deve o julgador optar pela resolução do mérito em detrimento da simples declaração da nulidade. Confira-se:“Art. 282. Ao pronunciar a nulidade, o juiz declarará que atos são atingidos e ordenará as providências necessárias a fim de que sejam repetidos ou retificados.§ 1º O ato não será repetido nem sua falta será suprida quando não prejudicar a parte.§ 2º Quando puder decidir o mérito a favor da parte a quem aproveite a decretação da nulidade, o juiz não a pronunciará nem mandará repetir o ato ou suprir-lhe a falta” (destaquei).O dispositivo decorre, entre outros, do princípio da primazia do julgamento de mérito, extraído dos arts. 4º e 6º, ambos do Código de Processo Civil[4].Como explica Daniel Amorim Assumpção Neves, “cabe ao juiz fazer o possível para evitar a necessidade de prolatar uma sentença terminativa no caso concreto, buscando com todo o esforço chegar a um julgamento de mérito. Essa é uma realidade incontestável, e bem representada pelo art. 282, §2º, do Novo CPC, ao prever que o juiz, sempre que puder decidir no mérito a favor da parte a quem aproveite a declaração da nulidade, deve ignorar o vício formal e proferir decisão de mérito. É a prevalência do julgamento de mérito aliada ao princípio da instrumentalidade das formas” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. Vol. Único. 10ª ed. Salvador: JusPodivm, 2018. p. 214).O autor cita, como exemplo da aplicação do art. 282, § 2º, do Código de Processo Civil, hipótese semelhante a que se verifica nos presentes autos:“Assim, por exemplo, a parte que, derrotada em sentença, pede a anulação da sentença arguindo em sua apelação a nulidade do processo em razão de não ter sido lhe dada vista de um documento juntado pela parte contrária e, caso não seja acolhida tal alegação, pede a reforma da sentença. O Tribunal, percebendo ter ocorrido o desrespeito ao contraditório (com a não intimação para manifestação sobre documentos juntados pela parte contrária), não deve decretar a nulidade se entender que, apesar da nulidade relativa, no mérito recursal tem razão o apelante. Nesse caso, eventual decretação de nulidade prejudicaria o próprio apelante, que, no julgamento do mérito, teria a reforma da sentença de mérito que lhe favorece, devendo o Tribunal deixar de reconhecer a nulidade e julgar o recurso no mérito a favor daquele que apontou a existência da nulidade relativa” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. Vol. Único. 10ª. ed. Salvador: JusPodivm, 2018. p. 476 – destaquei).Fredie Didier Junior pondera, ainda, que “a regra é reforçada pelo art. 488 do CPC: ‘Desde que possível, o juiz resolverá o mérito sempre que a decisão for favorável à parte a quem aproveitaria eventual pronunciamento nos termos do art. 485’” – que trata das sentenças sem resolução de mérito (DIDIER JUNIOR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 1. 21ª ed. Salvador: JusPodivm, 2019. p. 483).Registre-se que é perfeitamente possível, na hipótese, a superação da nulidade para a apreciação do mérito porque a prescrição intercorrente é fundamento da sentença, objeto do recurso e, ademais, matéria de ordem pública, passível de conhecimento de ofício.Demais disso, o exame do mérito, com o afastamento da prescrição intercorrente, beneficia o apelante – parte em favor da qual se reconheceria a nulidade.No mesmo sentido já se manifestou esta Corte:“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REGRESSIVA DE RESSARCIMENTO. DANOS CAUSADOS POR SUPOSTA OSCILAÇÃO/QUEDA DE ENERGIA ELÉTRICA. INSURGÊNCIA DA PARTE RÉ. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA. INDEFERIMENTO DE PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL E JULGAMENTO ANTECIPADO DO FEITO. APLICAÇÃO DO DISPOSTO NO §2º, DO ART. 282, DO CPC. DESNECESSIDADE DE DECLARAÇÃO DA NULIDADE DA SENTENÇA. MÉRITO FAVORÁVEL A QUEM APROVEITA A NULIDADE. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA EFICIÊNCIA E DA ECONOMIA PROCESSUAL. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO NEXO DE CAUSALIDADE. ACOLHIMENTO. AUSÊNCIA DE PROVA ACERCA DO ALEGADO SERVIÇO DEFEITUOSO PRESTADO PELA RÉ. INTELECÇÃO DO ART. 373, INCISO I, DO CPC. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO INICIAL. SENTENÇA REFORMADA. INVERSÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO” (TJPR - 8ª C. Cível - 0004467-20.2018.8.16.0115 - Matelândia - Rel.: Desembargador Marco Antonio Antoniassi - J. 11.05.2020 – destaquei).“AGRAVO DE INSTRUMENTO – DECISÃO QUE ACOLHEU A EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE, RECONHECENDO A PRESCRIÇÃO DA NOTA PROMISSÓRIA EXEQUENDA E CONVERTENDO O PROCESSO EXECUTIVO EM AÇÃO MONITÓRIA – RECURSO DA PARTE EXECUTADA – NULIDADE DOS ATOS POSTERIORES À DECISÃO QUE ACOLHEU DA EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE – CONSTATADA – EXECUTADOS QUE NÃO FORAM INTIMADOS, POR MEIO DE SEU PROCURADOR QUANTO AO CONTEÚDO DA DECISÃO. NULIDADE, ENTRETANTO, QUE NÃO SERÁ PRONUNCIADA EM RAZÃO DA DECISÃO DE MÉRITO DO PRESENTE RECURSO SER EM FAVOR DOS EXECUTADOS – APLICAÇÃO DAS NORMAS CONTIDAS NOS ART. 272, §2°, ART. 281 E ART. 282, §2°, TODOS DO NCPC. MÉRITO – DECISÃO QUE RECONHECEU A PRESCRIÇÃO DA NOTA PROMISSÓRIA E CONVERTEU A AÇÃO EXECUTIVA EM AÇÃO MONITÓRIA – IMPOSSIBILIDADE – CORTE SUPERIOR DE JUSTIÇA QUE POSSUÍ O ENTENDIMENTO DE QUE NÃO É POSSÍVEL A MENCIONADA CONVERSÃO APÓS A ESTABILIZAÇÃO DA RELAÇÃO PROCESSUAL (CITAÇÃO DOS EXECUTADOS) – APLICAÇÃO DO RECURSO ESPECIAL N°. 1.129.938/PE SOB O RITO DOS REPETITIVOS. DECISÃO PARCIALMENTE REFORMADA PARA JULGAR EXTINTO O PROCESSO EXECUTIVO E CONDENAR A PARTE EXEQUENTE AO PAGAMENTO DAS CUSTAS E DESPESAS PROCESSUAIS, ALÉM DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO” (TJPR - 14ª C. Cível - 0049860-85.2019.8.16.0000 - Capitão Leônidas Marques - Rel.: Desembargador Fernando Antonio Prazeres - J. 09.03.2020 – destaquei).“AÇÃO DE USUCAPIÃO. SUPOSTA NULIDADE DA SENTENÇA POR VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA NÃO SURPRESA (ART. 10 DO CPC/15) E DESATENDIMENTO AO ART. 489 DO CPC/15. POSSIBILIDADE, NO CASO, DE JULGAMENTO DE MÉRITO FAVORÁVEL À PARTE A QUEM APROVEITARIA O RECONHECIMENTO DE EVENTUAL NULIDADE. HIPÓTESE DE NÃO PRONUNCIAMENTO DAS POSSÍVEIS NULIDADES (§ 2º DO ART. 282 DO CPC/15). USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA (ART. 550 DO CC/16). CONJUNTO PROBATÓRIO A DEMONSTRAR QUE OS AUTORES POSSUEM UMA ÁREA RURAL HÁ MAIS DE 30 (TRINTA) ANOS NELA EXERCENDO AGRICULTURA DE SUBSISTÊNCIA E CULTIVANDO PLANTAS ORNAMENTAIS. AUSÊNCIA, PORÉM, DE PROVA SUFICIENTE DE QUE ESSA POSSE TENHA EXTRAPOLADO O IMÓVEL JÁ DE PROPRIEDADE DOS AUTORES, COM ÁREA DE 24.990,00 M² OU 2,49 HA, PARA ABRANGER O EXTENSO BEM IMÓVEL USUCAPIENDO COM ÁREA DE 1.146.141,81 M² OU APROXIMADAMENTE 114 HA. OCASIONAL USO DA ÁREA USUCAPIENDA QUE NÃO SE CONFUNDE COM POSSE MANSA, PACÍFICA, ININTERRUPTA E COM ÂNIMO DE DONO. USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ NÃO CARACTERIZADA. SENTENÇA REFORMADA. ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA REDISTRIBUÍDO. RECURSO PROVIDO” (TJPR - 17ª C. Cível - 0000496-75.1999.8.16.0088 - Guaratuba - Rel.: Desembargador Fernando Paulino da Silva Wolff Filho - J. 22.08.2019 – destaquei).Assim, não há falar em reconhecimento da nulidade da sentença, mas, sim, em reforma para afastar a prescrição intercorrente.Ora, é cediço que a prescrição intercorrente é disciplinada no art. 40, § 4º, da Lei de Execução Fiscal e consiste na extinção do feito executivo em razão da não localização do devedor ou de bens passíveis de penhora. A respeito dessa espécie de prescrição, o Superior Tribunal de Justiça, no Recurso Especial nº 1.340.553/RS, julgado sob a sistemática dos recursos repetitivos, fixou as seguintes teses:“RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ARTS. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015 (ART. 543-C, DO CPC/1973). PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. SISTEMÁTICA PARA A CONTAGEM DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE (PRESCRIÇÃO APÓS A PROPOSITURA DA AÇÃO) PREVISTA NO ART. 40 E PARÁGRAFOS DA LEI DE EXECUÇÃO FISCAL (LEI N. 6.830/80). 1. O espírito do art. 40, da Lei n. 6.830/80 é o de que nenhuma execução fiscal já ajuizada poderá permanecer eternamente nos escaninhos do Poder Judiciário ou da Procuradoria Fazendária encarregada da execução das respectivas dívidas fiscais. 2. Não havendo a citação de qualquer devedor por qualquer meio válido e/ou não sendo encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora (o que permitiria o fim da inércia processual), inicia-se automaticamente o procedimento previsto no art. 40 da Lei n.6.830/80, e respectivo prazo, ao fim do qual restará prescrito o crédito fiscal. Esse o teor da Súmula n. 314/STJ: "Em execução fiscal, não localizados bens penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o qual se inicia o prazo da prescrição quinquenal intercorrente". 3. Nem o Juiz e nem a Procuradoria da Fazenda Pública são os senhores do termo inicial do prazo de 1 (um) ano de suspensão previsto no caput, do art. 40, da LEF, somente a lei o é (ordena o art. 40: "[...] o juiz suspenderá [...]"). Não cabe ao Juiz ou à Procuradoria a escolha do melhor momento para o seu início. No primeiro momento em que constatada a não localização do devedor e/ou ausência de bens pelo oficial de justiça e intimada a Fazenda Pública, inicia-se automaticamente o prazo de suspensão, na forma do art. 40, caput, da LEF. Indiferente aqui, portanto, o fato de existir petição da Fazenda Pública requerendo a suspensão do feito por 30, 60, 90 ou 120 dias a fim de realizar diligências, sem pedir a suspensão do feito pelo art. 40, da LEF. Esses pedidos não encontram amparo fora do art. 40 da LEF que limita a suspensão a 1 (um) ano. Também indiferente o fato de que o Juiz, ao intimar a Fazenda Pública, não tenha expressamente feito menção à suspensão do art. 40, da LEF. O que importa para a aplicação da lei é que a Fazenda Pública tenha tomado ciência da inexistência de bens penhoráveis no endereço fornecido e/ou da não localização do devedor. Isso é o suficiente para inaugurar o prazo, ex lege. 4. Teses julgadas para efeito dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015 (art. 543-C, do CPC/1973): 4.1.) O prazo de 1 (um) ano de suspensão do processo e do respectivo prazo prescricional previsto no art. 40, §§ 1º e 2º da Lei n. 6.830/80 - LEF tem início automaticamente na data da ciência da Fazenda Pública a respeito da não localização do devedor ou da inexistência de bens penhoráveis no endereço fornecido, havendo, sem prejuízo dessa contagem automática, o dever de o magistrado declarar ter ocorrido a suspensão da execução; 4.1.1.) Sem prejuízo do disposto no item 4.1., nos casos de execução fiscal para cobrança de dívida ativa de natureza tributária (cujo despacho ordenador da citação tenha sido proferido antes da vigência da Lei Complementar n. 118/2005), depois da citação válida, ainda que editalícia, logo após a primeira tentativa infrutífera de localização de bens penhoráveis, o Juiz declarará suspensa a execução. 4.1.2.) Sem prejuízo do disposto no item 4.1., em se tratando de execução fiscal para cobrança de dívida ativa de natureza tributária (cujo despacho ordenador da citação tenha sido proferido na vigência da Lei Complementar n. 118/2005) e de qualquer dívida ativa de natureza não tributária, logo após a primeira tentativa frustrada de citação do devedor ou de localização de bens penhoráveis, o Juiz declarará suspensa a execução. 4.2.) Havendo ou não petição da Fazenda Pública e havendo ou não pronunciamento judicial nesse sentido, findo o prazo de 1 (um) ano de suspensão inicia-se automaticamente o prazo prescricional aplicável (de acordo com a natureza do crédito exequendo) durante o qual o processo deveria estar arquivado sem baixa na distribuição, na forma do art. 40, §§ 2º, 3º e 4º da Lei n. 6.830/80 - LEF, findo o qual o Juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato; 4.3.) A efetiva constrição patrimonial e a efetiva citação (ainda que por edital) são aptas a interromper o curso da prescrição intercorrente, não bastando para tal o mero peticionamento em juízo, requerendo, v.g., a feitura da penhora sobre ativos financeiros ou sobre outros bens. Os requerimentos feitos pelo exequente, dentro da soma do prazo máximo de 1 (um) ano de suspensão mais o prazo de prescrição aplicável (de acordo com a natureza do crédito exequendo) deverão ser processados, ainda que para além da soma desses dois prazos, pois, citados (ainda que por edital) os devedores e penhorados os bens, a qualquer tempo - mesmo depois de escoados os referidos prazos -, considera-se interrompida a prescrição intercorrente, retroativamente, na data do protocolo da petição que requereu a providência frutífera. 4.4.) A Fazenda Pública, em sua primeira oportunidade de falar nos autos (art. 245 do CPC/73, correspondente ao art. 278 do CPC/2015), ao alegar nulidade pela falta de qualquer intimação dentro do procedimento do art. 40 da LEF, deverá demonstrar o prejuízo que sofreu (exceto a falta da intimação que constitui o termo inicial - 4.1., onde o prejuízo é presumido), por exemplo, deverá demonstrar a ocorrência de qualquer causa interruptiva ou suspensiva da prescrição. 4.5.) O magistrado, ao reconhecer a prescrição intercorrente, deverá fundamentar o ato judicial por meio da delimitação dos marcos legais que foram aplicados na contagem do respectivo prazo, inclusive quanto ao período em que a execução ficou suspensa. 5. Recurso especial não provido. Acórdão submetido ao regime dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015 (art. 543-C, do CPC/1973)” (STJ. REsp 1340553/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 12/09/2018, DJe 16/10/2018 – destaquei).Conclui-se que, após o despacho que determina a citação do executado – na vigência da Lei Complementar nº 118/2005 – o prazo prescricional ficará obstado até o momento em que a Fazenda Pública for formalmente cientificada sobre a não localização do devedor ou de bens sujeitos à penhora.Na hipótese, após certificada a citação válida do executado em 13.4.2011, a Fazenda Pública somente foi intimada em 26.2.2018. Portanto, é evidente que, à época da prolação da r. sentença (25.8.2021), ainda não havia transcorrido o prazo para a prescrição intercorrente.Do exposto, é de se dar provimento ao recurso para reformar a sentença e afastar a prescrição intercorrente, determinando-se o prosseguimento da execução fiscal em relação ao IPTU dos exercícios de 2006 a 2008.Destarte, impõe-se o reconhecimento, de ofício, da prescrição material do débito de 2005, motivo pelo qual fica prejudicado om recurso quanto ao referido crédito. E, quanto aos demais débitos, deve ser reformada a sentença, a fim de afastar o reconhecimento da prescrição intercorrente e determinar o retorno dos autos à Vara de origem para o prosseguimento da execução fiscal.III – Voto, então, pelo parcial conhecimento do recurso, com a declaração, de ofício, da prescrição material do crédito tributário de 2015, prejudicada a análise recursal quanto ao referido crédito, e, na parte conhecida, pelo provimento da apelação para afastar a prescrição intercorrente, determinando-se o prosseguimento da execução fiscal quanto aos débitos de IPTU relativos aos exercícios de 2006 a 2008.
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