SELEÇÃO DE DECISÕES

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Processo:
0001153-90.2019.8.16.0031
(Acórdão)
Segredo de Justiça: Sim
Relator(a): Celso Jair Mainardi
Desembargador
Órgão Julgador: 4ª Câmara Criminal
Comarca: Guarapuava
Data do Julgamento: Thu May 05 00:00:00 BRT 2022
Fonte/Data da Publicação:  Thu May 05 00:00:00 BRT 2022

Ementa

APELAÇÃO CRIMINAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. AÇÃO PENAL PÚBLICA. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DO RÉU. PEDIDO DE JUSTIÇA GRATUITA. MATÉRIA AFETA À EXECUÇÃO. VIA IMPRÓPRIA. NÃO CONHECIMENTO. PLEITO DE NULIDADE PROCESSUAL POR CERCEAMENTO DE DEFESA. REJEIÇÃO. INDEFERIMENTO DE PROVA PERICIAL PSICOLÓGICA POR DECISÃO FUNDAMENTADA. PROCEDIMENTO QUE ENSEJARIA REVITIMIZAÇÃO DA INFANTE. PERTINÊNCIA NÃO DEMONSTRADA. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE NO DEPOIMENTO ESPECIAL DA VÍTIMA. CONFORMIDADE COM A LEI 13.431/2017. ATO REALIZADO POR PROFISSIONAIS ESPECIALIZADOS PARA A LIVRE NARRATIVA DA OFENDIDA SOBRE A SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA. INCONFORMISMO COM A PROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL. PLEITOS DE ABSOLVIÇÃO E DESCLASSIFICAÇÃO PARA IMPORTUNAÇÃO SEXUAL OU CONTRAVENÇÃO PENAL. IMPROCEDÊNCIA. PROVAS SUFICIENTES DA CONSUMAÇÃO DO CRIME NARRADO NA DENÚNCIA PELO QUAL FOI CONDENADO. RELEVÂNCIA DAS PALAVRAS DA MENOR. DECLARAÇÕES FIRMES E COERENTES DA VITIMADA CORROBORADAS PELOS DEMAIS ELEMENTOS PROBATÓRIOS. CONDENAÇÃO MANTIDA. DEMANDA DE REDUÇÃO DA PENA. DESACOLHIMENTO. CORRETO ACRÉSCIMO DECORRENTE DA MAJORANTE PELA CONDIÇÃO DE PADRASTO. APLICAÇÃO DA REGRA DE CONTINUIDADE DELITIVA. NÚMERO INCALCULÁVEL DE ABUSOS QUE TORNAM CORRETA A FRAÇÃO MÁXIMA DE AUMENTO. DOSIMETRIA INALTERADA COM MANUTENÇÃO DO REGIME FECHADO. SÚPLICA DE AFASTAMENTO DA FIXAÇÃO DE VALOR MÍNIMO PARA REPARAÇÃO DO DANO MORAL CAUSADO PELA INFRAÇÃO (ARTIGO 387, INCISO IV, DO CPP). INVIABILIDADE. REQUERIMENTO EXPRESSO CONTIDO NA DENÚNCIA. POSSIBILITADO O IRRESTRITO ACESSO A AMPLA DEFESA E AO CONTRADITÓRIO. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E NÃO PROVIDO.1. O requerimento de concessão da justiça gratuita deve ser apreciado pelo juízo da execução, competente para analisar a situação econômica do apenado.2. Não há que se falar em eventual nulidade por cerceamento de defesa quando realizada a oitiva da vítima realizada em produção antecipada de provas em conformidade com a Lei 13.431/2017, na modalidade depoimento sem dano, na presença de psicólogo, magistrado, promotor de justiça e defensor indicado pela OAB/PR.3. O depoimento especial deve ser adotado nos casos de violência sexual, sendo realizado sob o rito cautelar de antecipação de prova para evitar a revitimização, ou seja, evitar que a vítima tenha que reviver diversas vezes, perante diferentes instâncias públicas, os momentos de violência.4. Inexiste a necessidade de intimação prévia do acusado a respeito do ato (depoimento especial), pois não há previsão legal para tanto e porque o procedimento é realizado com profissionais especializados (artigo 12 da mesma lei), servindo o ato para a livre narrativa sobre a situação de violência (artigo 12, inciso II), podendo o profissional especializado intervir quando necessário, utilizando técnicas que permitam a elucidação dos fatos.5. Em crimes sexuais, o laudo psicológico não constitui prova obrigatória nem imprescindível para a comprovação do delito ou de sua materialidade. A questão encontra consonância com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: “O art. 159 do CPP diz respeito ao exame de corpo de delito e a outras perícias, os quais não incluem o laudo psicológico realizado na vítima, normalmente confeccionado para avaliar os danos sofridos com o abuso sexual, não constituindo o aludido diagnóstico prova obrigatória nem imprescindível para a comprovação do delito ou de sua materialidade” (STJ, AgRg no AREsp 531.398/GO).6. É facultada ao magistrado a rejeição, de forma fundamentada, do pleito de produção de provas protelatórias, irrelevantes ou impertinentes. No caso, o indeferimento de produção de prova pericial psicológica está consubstanciado na correta prevenção da revitimização da ofendida e está em conformidade com os pareceres do Psicólogo auxiliar e do representante do Ministério Público.7. Em crimes sexuais, comumente praticado sem testemunhas oculares e com possibilidade de desaparecimento de vestígios, a jurisprudência confere especial relevância à palavra da vítima e, no caso dos autos, as ações criminosas foram confirmadas pela ofendida e informantes, que detalharam o grave ilícito, o qual por sua vez não deixou vestígios.8. O Superior Tribunal de Justiça atesta reiteradamente que “não há qualquer ilegalidade no fato de a acusação referente aos crimes contra a dignidade sexual estar lastreada nas declarações da ofendida, já que tais ilícitos geralmente são cometidos fora da vista de testemunhas, e muitas vezes sem deixar rastros materiais, motivo pelo qual a palavra da vítima possui especial relevância”, e inclusive que “a ausência de constatação de vestígios de violência sexual na perícia realizada na vítima é insuficiente para afastar a comprovação da materialidade delitiva, uma vez que, consoante a narrativa contida na denúncia, o réu não chegou a com ela praticar conjunção carnal, o que, frise-se, sequer é necessário para a consumação do delito pelo qual foi acusado” (STJ, AgRg no RHC 109.966/MT).9. No caso, a partir das palavras da vítima, confirmadas por informantes, é evidente que a conduta do réu não pode ser confundida com uma simples importunação ou contravenção penal, tratando-se de efetivo contato corpóreo e lascivo, com o propósito único de satisfação de seu desejo sexual. Foi praticado comprovadamente ato libidinoso, que está inserido no artigo 217-A do Código Penal. Nesse sentido, “é pacífica a compreensão de que o delito de estupro de vulnerável se consuma com a prática de qualquer ato de libidinagem ofensivo à dignidade sexual da vítima” (STJ, REsp 1795560/RS).10. A aplicação da causa de aumento de pena descrita no artigo 226, inciso II, do Código Penal, refere-se à condição de padrasto ostentada pelo recorrente em relação à ofendida, que foi extensamente comprovada nos autos, inclusive no interrogatório do próprio réu. Portanto, houve subsunção do caso à norma penal, respeitando-se o princípio da correlação entre a denúncia e a sentença.11. Sobre a continuidade delitiva, o entendimento pacificado no Superior Tribunal de Justiça “é firme no sentido de que, "aplica-se a fração de aumento de 1/6 pela prática de 2 infrações; 1/5, para 3 infrações; 1/4 para 4 infrações; 1/3 para 5 infrações; 1/2 para 6 infrações e 2/3 para 7 ou mais infrações” (STJ, REsp 1.699.051/RS).12. Nos crimes sexuais envolvendo vulneráveis, quando é complexa a prova do exato número de crimes cometidos, a “exasperação da pena na fração máxima de 2/3 pela continuidade delitiva é de rigor” (STJ, AgRg no REsp 1880036/PR).13. Para que seja fixado na sentença valor mínimo para a reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido, com base no art. 387, IV, do CPP, basta o pedido expresso do ofendido ou do Ministério Público e a concessão de oportunidade de exercício do contraditório pelo réu.14. “A aferição do dano moral, na maior parte das situações, não ensejará nenhum alargamento da instrução criminal, porquanto tal modalidade de dano, de modo geral, dispensa a produção de prova específica acerca da sua existência, encontrando-se in re ipsa. Isto é, não há necessidade de produção de prova específica para apuração do grau de sofrimento, de dor e de constrangimento suportados pelo ofendido; o que se deve provar é uma situação de fato de que seja possível extrair, a partir de um juízo baseado na experiência comum, a ofensa à esfera anímica do indivíduo” (STJ, AgRg no REsp 1626962/MS).