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Acórdão
Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Acórdão. Eventuais imagens serão suprimidas.
I._______________Relatório Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de antecipação de tutela, interposto por ALDO MARCHINI JUNIOR, em face à decisão de mov. 130.1, proferida nos autos da Ação de Cobrança pelo Procedimento Comum nº 0001318-65.2021.8.16.0194, que julgou parcialmente procedente a impugnação ao cumprimento de sentença, in verbis: (...) Inicialmente, reforço que inexiste nulidade perante a citação, na medida que apesar da parte executada discorrer acerca do não recebimento da citação, a certidão do oficial de justiça goza de presunção de veracidade decorrente do agente público, de modo que, tendo o mesmo certificado que o executado exarou ciência acerca do mandado, deve-se presumir o conteúdo como verdadeiro, estando a certidão, por certo, de eventual prova em contrário. Não tendo sido demonstrada referida prova, deve-se afastar a tese de nulidade.(...)Nessa condição, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a impugnação, condenando o exequente ao pagamento de honorários sucumbenciais na quantia de 10% sobre o valor tido como em excesso, valor este que deve ser corrigido monetariamente pelo INPC, com incidência de juros de mora de 1% ao mês, ambos contados desde a presente decisão até o efetivo pagamento. Irresignado, sustenta o agravante, em síntese, que: a) o processo tramitou à revelia do agravante, o que culminou com a procedência da ação de cobrança, com a sua condenação e o trânsito em julgado da r. sentença do mov. 43.1, dando início à fase de cumprimento de sentença;b) o agravante só teve conhecimento da existência da referida ação de cobrança quando foi, surpreendido, em sua residência com um mandado de intimação para proceder com o pagamento do montante de R$ 328.970,26 (trezentos e vinte e oito mil, novecentos e setenta reais e vinte e seis centavos);c) o Douto Juízo a quo, ao afirmar da inexistência de nulidade no ato citatório, se baseou, unicamente, na certidão do oficial de justiça (mov. 30.1/30.2), que certificou que o executado exarou ciência acerca do mandado de citação, esta ocorrendo pelo aplicativo Whatsapp.;d) ao contrário da certidão do Oficial de Justiça, não houve ciência expressa do agravante acerca do mandado de citação recebido pelo aplicativo Whatsapp;e) o agravante não recebeu ligação e nem conversou com a Ilma. Oficial de Justiça, muito menos, teve conhecimento do conteúdo do mandado de citação, pois o número 041-9-8805-6600 não é o do seu telefone, de modo que não recebeu qualquer cópia do mandado; f) não foram adotadas as cautelas recomendadas pela jurisprudência na citação do agravante, pelo aplicativo de Whatsapp, para identificação e autenticidade da titularidade e uso do aparelho telefônico (número do telefone, a confirmação escrita, a foto do citando e a exibição de documento pessoal, com foto, do citando);g) a citação do réu, além de não ter tomado conhecimento da existência da presente ação, foi realizada em desobediência às normas legais, uma vez que o artigo 246 do CPC, aplicável à época da citação, antes da Lei 14.195/21;h) não se esgotaram as diligências possíveis (p. ex. correio), para citar, pessoalmente, o ora réu antes da utilização do aplicativo de mensagens Whatsapp. Por fim, pleiteia a concessão de antecipação da tutela recursal e que, ao final, seja dado provimento integral ao presente recurso, a fim de que seja declarada a nulidade da citação do agravante, assim como de todos os atos decisórios subsequentes ao r. despacho do mov. 15.1 dos autos de origem.Por meio da decisão de mov. 11.1, esta relatoria indeferiu a concessão da antecipação dos efeitos da tutela, bem como determinou o processamento do recurso, que o Juízo singular fosse comunicado da decisão e que a parte agravada fosse intimada para apresentar contrarrazões.A parte agravada apresentou contraminuta ao presente recurso (mov. 16.1).É, em síntese, o relatório.
II.
FUNDAMENTOO recurso merece conhecimento, na medida em que estão presentes os pressupostos de admissibilidade recursal.Sustenta a parte agravante, em síntese, que a citação ocorrida é nula, tendo em vista o fato de não ter exarado ciência acerca do mandado de citação (mov. 30.1 dos autos de origem), fazendo com que a declaração de revel por parte do Magistrado singular tenha sido equivocada.Alega que a citação é um ato processual solene em que se informa ao réu da propositura de demanda contra si, dando-lhe a oportunidade para apresentar seus contra-argumentos, sendo que somente a partir deste momento há a formação da relação jurídica processual completa. Discorre que sem a ocorrência da citação válida ficou impossibilitado de exercer o seu direito de defesa, estando eivada de nulidade.Indica que a certidão de citação a ele direcionada relata a existência de contato telefônico via Oficial de Justiça, dando ciência do conteúdo do presente feito, e, posteriormente, haveria confirmado a citação via cópia do mandado enviada ao réu/agravante por meio do aplicativo Whatsapp, nestes termos a certidão: Certifico que em cumprimento ao respeitável mandado, expedido por ordem de Vossa Excelência, ref. Autos nº 131865/2021, 21ª Vara Cível. Certifico e dou fé em atendimento ao presente mandado (remoto), que dia de hoje às 14:50 horas, entrei em contato telefônico( 041988056600) com o executado Sr. ALDO MARCHINI JUNIOR onde dei-lhe conhecimento do conteúdo do presente. Posteriormente o noticiado confirmou a CITAÇÃO pois recebeu cópia do mandado via WHATSAPP. O referido é verdade e dou fé. Curitiba, 30 de abril de 2021. Aduz que do conteúdo da captura de tela acostada aos autos pelo Oficial de Justiça, denota-se a ausência de reconhecimento ou confirmação de recebimento do mandado citatório, que, inclusive, pugnou pelo envio de fotocópia do RG ou CNH do agravante, de modo que não houve qualquer manifestação do réu apta a dar ciência do conteúdo da inicial. Ainda, alega a inexistência de qualquer contato telefônico, na ocasião, acerca dos termos da presente ação, tampouco que o número telefônico ao qual fora direcionada a tentativa citatória (041-9-8805-6600), não lhe pertence. Elenca que no caso em apreço não há como se aceitar válida a citação ocorrida, pois não foram adotadas as cautelas exigidas pela jurisprudência pátria para conferir validade à citação via Whatsapp.Merece razão ao apelante. O ato processual da citação, o qual é previsto a partir do art. 238 do Código de Processo Civil, “pelo qual são convocados o réu, o executado ou o interessado para integrar a relação processual.”.De acordo com o art. 246 do CPC, a citação será feita preferencialmente por meio eletrônico, no prazo de até 2 (dois) dias úteis, contado da decisão que a determinar, por meio dos endereços eletrônicos indicados pelo citando no banco de dados do Poder Judiciário, conforme regulamento do Conselho Nacional de Justiça, entendimento alterado com o advento da Lei n° 14.195/21.Em que pese a alteração legislativa supracitada em momento posterior a citação nos autos, ressalta-se, ainda, a existência de legislação específica referente ao processo eletrônico e a informatização do processo judicial (Lei nº 11.419/2006). O art. 9º, §1º da referida lei prevê a citação realizada pela modalidade eletrônica, sendo indispensável que viabilizem o acesso à integra do processo correspondente. Art. 9º No processo eletrônico, todas as citações, intimações e notificações, inclusive da Fazenda Pública, serão feitas por meio eletrônico, na forma desta Lei. § 1º As citações, intimações, notificações e remessas que viabilizem o acesso à íntegra do processo correspondente serão consideradas vista pessoal do interessado para todos os efeitos legais. Neste compasso, cumpre citar que esta Corte de Justiça estabeleceu regras para cumprimento de mandados nos períodos de vigência dos Decretos Judiciários nº 400 e 401/2020, através da Instrução Normativa (IN) nº 21/2020 da Corregedoria-Geral de Justiça deste Tribunal.No que concerne a possibilidade da citação via Whastapp, a tratativa restou recentemente validade pelo Superior Tribunal de Justiça, confira-se: PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EM HABEAS CORPUS. CITAÇÃO VIA WHATSAPP. NULIDADE. PRINCÍPIO DA NECESSIDADE. INADEQUAÇÃO FORMAL E MATERIAL. PAS DE NULlITÉ SANS GRIEF. AFERIÇÃO DA AUTENTICIDADE. CAUTELAS NECESSÁRIAS. OBSERVAÇÃO. AGRAVO DESPROVIDO. 1. A citação do acusado revela-se um dos atos mais importantes do processo. É por meio dela que o indivíduo toma conhecimento dos fatos que o Estado, por meio do jus puniendi lhe direciona e, assim, passa a poder demonstrar os seus contra-argumentos à versão acusatória (contraditório, ampla defesa e devido processo legal). 2. No Processo Penal, diversamente do que ocorre na seara Processual Civil, não se pode prescindir do processo para se concretizar o direito substantivo. É o processo que legitima a pena. 3. Assim, em um primeiro momento, vários óbices impediriam a citação via Whatsapp, seja de ordem formal, haja vista a competência privativa da União para legislar sobre processo (art. 22, I, da CF), ou de ordem material, em razão da ausência de previsão legal e possível malferimento de princípios caros como o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa. 4. De todo modo, imperioso lembrar que "sem ofensa ao sentido teleológico da norma não haverá prejuízo e, por isso, o reconhecimento da nulidade nessa hipótese constituiria consagração de um formalismo exagerado e inútil" (GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; FERNANDES, Antonio Scarance. As nulidades no processo penal. 11. ed. São Paulo: RT, 2011, p. 27). Aqui se verifica, portanto, a ausência de nulidade sem demonstração de prejuízo ou, em outros termos, princípio pas nullité sans grief. 5. Abstratamente, é possível imaginar-se a utilização do Whatsapp para fins de citação na esfera penal, com base no princípio pas nullité sans grief. De todo modo, para tanto, imperiosa a adoção de todos os cuidados possíveis para se comprovar a autenticidade não apenas do número telefônico com que o oficial de justiça realiza a conversa, mas também a identidade do destinatário das mensagens. 6. Como cediço, a tecnologia em questão permite a troca de arquivos de texto e de imagens, o que possibilita ao oficial de justiça, com quase igual precisão da verificação pessoal, aferir a autenticidade da conversa. É possível imaginar, por exemplo, a exigência pelo agente público do envio de foto do documento de identificação do acusado, de um termo de ciência do ato citatório assinado de próprio punho, quando o oficial possuir algum documento do citando para poder comparar as assinaturas, ou qualquer outra medida que torne inconteste tratar-se de conversa travada com o verdadeiro denunciado. De outro lado, a mera confirmação escrita da identidade pelo citando não nos parece suficiente. 7. Necessário distinguir, porém, essa situação daquela em que, além da escrita pelo citando, há no aplicativo foto individual dele. Nesse caso, ante a mitigação dos riscos, diante da concorrência de três elementos indutivos da autenticidade do destinatário, número de telefone, confirmação escrita e foto individual, entendo possível presumir-se que a citação se deu de maneira válida, ressalvado o direito do citando de, posteriormente, comprovar eventual nulidade, seja com registro de ocorrência de furto, roubo ou perda do celular na época da citação, com contrato de permuta, com testemunhas ou qualquer outro meio válido que autorize concluir de forma assertiva não ter havido citação válida. 8. No caso concreto, ao menos três elementos permitem concluir pela autenticidade do receptor das mensagens: (a) o número telefônico disponível para contato com o acusado; (b) a confirmação de sua identidade por telefone; e (c) a foto individual do denunciado, no aplicativo, que, inclusive, coincide com a foto de identificação civil também constante dos autos. 9. Agravo desprovido. (AgRg no RHC 141.245/DF, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 13/04/2021, DJe 16/04/2021) (Destaque meu) Logo, é cediça a validade da realização da citação por Whatsapp, inicialmente inerente ao processo penal, sendo aplicada por analogia aqui no âmbito do direito privado. A propósito: AGRAVO DE INSTRUMENTO EM AÇÃO DE ALIMENTOS. DECISÃO CITAÇÃO VIA WHATSAPP INDEFERIDA POR AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. INSURGÊNCIA DA ALIMENTADA RECURSO ACOLHIDO PARCIALMENTE PECULIARIDADE ESPECIFICA DA HIPOTESE DOS AUTOS. EMISSÃO DE OFÍCIOS DE BUSCA DO ENDEREÇO DO ALIMENTANTE QUE RETORNARAM INFRUTÍFEROS. ENTENDIMENTO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA ADMITINDO A UTILIZAÇÃO DE APLICATIVO DE MENSAGENS PARA O ATO DE CITAÇÃO, DESDE QUE SEJAM ADOTADOS TODOS OS CUIDADOS PARA COMPROVAR A IDENTIDADE DO DESTINATÁRIO. AUTENTICAÇÃO POR NÚMERO DO TELEFONE, A CONFIRMAÇÃO ESCRITA E A FOTO DO CITANDO. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA DO ARTIGO 243 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL COM INSTRUÇÃO NORMATIVA N. 30/2020 DA CORREGEDORIA-GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ E ARTIGOS 3º E 5º DO DECRETO N. 400/2020 DESTA CORTE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO PARA DETERMINAR O CHAMAMENTO DO ALIMENTANTE VIA WHATSAPP, OBSERVADOS OS REQUISITOS DE IDENTIFICAÇÃO E AUTENTICIDADE DA TITULARIDADE E USO (NÚMERO DO TELEFONE, A CONFIRMAÇÃO ESCRITA E A FOTO DO CITANDO). Permite-se compreender, em tempos de isolamento social, o aparelho celular e a internet como lugares em que o Requerido Alimentante pode ser encontrado pessoalmente, tornando pessoal e válida a citação eletrônica realizada por Whatsapp, sem necessidade de modificação legislativa. (TJPR - 11ª C.Cível - 0027968-52.2021.8.16.0000 - Pinhais - Rel.: DESEMBARGADORA LENICE BODSTEIN - J. 25.07.2021) – grifo nosso. No caso em apreço, se faz necessária a análise das cautelas hábeis a comprovar a identidade do destinatário do ato citatório, essas sendo: o número do telefone, a confirmação escrita e a foto do citando.Da reprodução de tela colacionado aos autos (mov. 30.2), vislumbra-se que nenhum dos pressupostos de autenticação foram suficientemente comprovados, de modo a prosperar a alegação do agravante de que esse não teria exarado ciência quanto ao ato, gerando então a nulidade da citação.Cumpre ressaltar o comparecimento espontâneo do agravante para oferecimento de impugnação ao cumprimento de sentença supre a deficiência na tentativa citatória, porém não saneia o vício derivado da mácula procedimental na fase de conhecimento, que julgou procedente o pedido autoral e condenou o pagamento a quantia apontada, evidenciando prejuízo à parte recorrente Conclui-se, portanto, que no presente caso, há de se reconhecer a nulidade da citação implementada na fase de conhecimento da ação de cobrança, bem como dos atos decisórios posteriores, com o retorno dos autos para regularização do trâmite processual, oportunizando-se ao agravante o oferecimento de contestação. III.
Dispositivo Ante ao exposto, voto no sentido de dar provimento ao recurso de agravo de instrumento, para reconhecer a nulidade da citação, a fim de determinar o retorno dos atos para a regularização do trâmite processual, abrindo prazo para o agravante apresentar contestação, nos termos da fundamentação supra.
PREQUESTIONAMENTO Tem-se por prequestionadas todas as disposições legais expressas e implicitamente tratadas neste recurso.
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