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Acórdão
Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Acórdão. Eventuais imagens serão suprimidas.
I – Trata-se de recurso de apelação cível interposto em face da r. sentença de mov. 57.1, da lavra do eminente Juiz de Direito Nathan Kirchner Herbst, que em ação declaratória de nulidade de inventário sob nº 0032408-14.2010.8.16.0021, ajuizada por L. G. M., julgou procedente o pedido inicial, para o fim de declarar a nulidade do inventário extrajudicial dos bens de V. T. P. M. .
Inconformada, aduz a parte apelante, em suma, que: a) a partilha do patrimônio deixado pela mãe dos recorrentes foi realizada em 10.09.2010 na via extrajudicial, tendo por objeto o imóvel de matrícula nº 44.709, do 1º Ofício de Registro de Imóveis de Cascavel; b) a meação sobre referido imóvel foi afastada na ação de reconhecimento de união estável; c) o bem foi adquirido com recursos exclusivos da de cujus antes do início da união estável; d) o agravado modificou seu pedido inicial (em que pretendia ver reconhecido seu direito à meação) nas alegações finais da ação de inventário, pretendendo sua qualificação como herdeiro na partilha de bens; e) o entendimento exarado pelo STF no julgamento do RE878694, que comparou o regime de sucessão entre cônjuge e companheiro, somente poderia ser aplicado em relação às partilhas extrajudiciais em que ainda não havia sido confeccionada a escritura pública; f) a sentença recorrida não respeitou os limites da modulação dos efeitos aplicado à tese de repercussão geral; g) a publicação da referida tese ocorreu em 05.02.2018 e a escritura pública foi lavrada em 10.09.2010, de modo que inaplicável o entendimento ao caso em apreço; h) houve inovação processual em sede de alegações finais, uma vez que não havia discussão acerca da condição de herdeiro do apelado, mas sim quanto a sua qualificação de meeiro; i) reconhecer a nulidade do inventário extrajudicial com fundamento na qualidade de herdeiro necessário do apelado configura sentença extra petita; j) requer o provimento do presente recurso, a fim de que seja reformada a r. sentença e declarado válido o inventário extrajudicial dos bens de V. T. P. M. e invertido o ônus da sucumbência. Contrarrazões apresentadas ao mov. 70.1, autos de origem.
II – VOTOPresentes os pressupostos de admissibilidade do recurso, seu conhecimento se impõe.Aduz a parte apelante-requerida que não deve ser acolhida a pretensão do apelado-autor, posto que a escritura pública que formalizou o inventário extrajudicial dos bens de V. T. P. M. foi realizada em 10.09.2010, e a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal, proferida no julgamento do RE878694, que equiparou o regime sucessório do cônjuge ao companheiro, publicada em 05.02.2018, somente seria aplicável aos inventários extrajudiciais cuja escritura pública ainda não houvesse sido lavrada. Cumpre esclarecer que o Juiz é o destinatário da prova, cabendo-lhe decidir sobre os rumos do processo ante a análise dos elementos fático-probatórios juntados aos autos, sendo que o deferimento da pretensão das partes depende do grau de cognição para formação de seu convencimento, nos termos do art. 370 do novo CPC.À luz dos elementos cognitivos existentes nos autos, o MM. Juiz singular concluiu (mov. 57.1, autos de origem): “Cinge-se a controvérsia quanto à validade do inventário extrajudicial de bens de Vânia Theresinha Pereira de Moura, em virtude da exclusão do autor Luciano Giorge Marca, seu companheiro por ocasião do óbito. Primeiramente, importa salientar que a união estável entre o autor e a falecida foi reconhecida pelo Juízo competente, conforme sentença à seq. 17.2: (...)Destaca-se, porém, que restou afastada pelo Tribunal de Justiça a meação do imóvel objeto da matrícula n. 44.709, do 1º Ofício de Registro de Imóveis de Cascavel, consoante excerto do acórdão que cumpre citar (mov. 17.3):(...)O Supremo Tribunal Federal reconheceu a inconstitucionalidade da distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros, e a consequente aplicação do dispositivo alhures também aos casos como o presente. (...)Neste caso o autor sequer participou do inventário extrajudicial, bem como pendia discussão no âmbito do Juízo da Vara de Família quanto à sua condição de meeiro.(...)Não há, na presente hipótese, decisão transitada em julgado que tenha decretado a partilha. Houve inventário extrajudicial que excluiu o companheiro, e a questão é o cerne desta controvérsia. Logo, não há como afastar à espécie a regra do art. 1.829, I, do Código Cível. Consequentemente, tendo sido reconhecido que o bem imóvel deixado pela falecida pertence à categoria dos bens particulares, resta caracterizada nulidade do inventário realizado sem a sua participação, à luz do que dispõe o art. 166, IV, do Código Civil(...)Por todo o exposto, julgo procedente o pedido do autor, para o fim de reconhecer a nulidade do inventário extrajudicial dos bens de Vânia Theresinha Pereira de Moura. Assim resolvo o mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC.”Pois bem. Da análise dos autos, verifica-se que restou devidamente reconhecida a existência de união estável entre o apelado e a de cujus, nos autos sob nº 1.970/2010, cuja ação foi ajuizada em 08.09.2010, durante o período compreendido entre o segundo semestre de 2007 até o óbito de V. T. P. M. em 27.06.2010. Consequência lógica do reconhecimento da união estável entre as partes foi a determinação da partilha do patrimônio deixado pela de cujus entre seus herdeiros, quais sejam, o companheiro supérstite e seus dois filhos, ora apelantes. Não obstante, na data de 10.09.2010 os recorrentes procederam à partilha de bens, por meio de escritura pública de inventário extrajudicial, sem a participação do apelado (mov. 1.4, fl. 74, autos de origem). Verifica-se que a sentença que reconheceu a união estável entre o casal, determinou a partilha dos bens deixados pela de cujus na proporção de 50% para o apelado-companheiro, patrimônio constituído pelo imóvel de matrícula nº 44.709, do 1º Ofício de Registro de Imóveis de Cascavel, bens móveis que guarneciam a residência e saldo bancário de titularidade da falecida na data de seu óbito. Supracitada sentença restou parcialmente reformada por este eg. Tribunal de Justiça (mov. 17.3, autos de origem), excluindo-se o direito de meação do apelado em relação ao bem imóvel, por este ter sido adquirido com recursos exclusivos da falecida, subsistindo, portanto, o direito de meação quanto aos bens móveis e saldo bancário, bem como o direito sucessório quanto ao imóvel. Argumentam os apelantes que não deve ser declarada a nulidade do inventário extrajudicial, posto que a escritura pública foi confeccionada em 10.09.2010 e a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal proferida no julgamento do RE878694, que equiparou o regime sucessório do cônjuge ao companheiro, publicada em 05.02.2018, somente seria aplicável aos inventários extrajudiciais cuja escritura pública ainda não houvesse sido lavrada.Não assiste razão aos apelantes, conforme se demonstra a seguir. O excelso Supremo Tribunal Federal, quando da apreciação do Tema 809 de repercussão geral, no âmbito do Recurso Extraordinário nº 878694, reconheceu de forma incidental a inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil, que fazia distinção entre os regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros sobreviventes, de modo que o disposto no artigo 1.829 do mesmo diploma legal seja aplicado às hipóteses de casamento e união estável.Quanto à sua aplicabilidade, houve a modulação temporal pela Suprema Corte, estabelecendo-se que a tese firmada deve ser observada apenas nos feitos nos quais ainda não tenha havido o trânsito em julgado da sentença de partilha. Sobre o assunto, confira-se trecho da ementa do REsp 1904374/DF, julgado em 15/04/2021, de relatoria da Exma. Ministra Nancy Andrighi:“4- Considerando que a lei incompatível com o texto constitucional padece do vício de nulidade, a declaração de sua inconstitucionalidade, de regra, produz efeito ex tunc, ressalvadasas hipóteses em que, no julgamento pelo Supremo Tribunal Federal, houver a modulação temporal dos efeitos, que é excepcional.5- Da excepcionalidade da modulação decorre a necessidade de que ointérprete seja restritivo, a fim de evitar inadequado acréscimo de conteúdo sobre aquilo que o intérprete autêntico pretendeu proteger e salvaguardar. 6- Ao declarar a inconstitucionalidade do art. 1.790 do CC/2002(tema 809), o Supremo Tribunal Federal modulou temporalmente a aplicação da tese para apenas "os processos judiciais em que ainda não tenha havido trânsito em julgado da sentença de partilha, assim como às partilhas extrajudiciais em que ainda não tenha sido lavrada escritura pública”, de modo a tutelar a confiança e a conferir previsibilidade às relações finalizadas sob as regras antigas (ou seja, às ações de inventário concluídas nas quais foi aplicado o art. 1.790 do CC/2002).” Nada obstante, o caso dos autos guarda importante peculiaridade, uma vez que o companheiro não participou do inventário extrajudicial. Registre-se que, embora na época em que lavrada a escritura pública (2010) ainda não houvesse declaração de inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil pela Suprema Corte de Justiça, o companheiro detinha direito à meação em relação aos bens amealhados na constância do casamento, vez que a Constituição Federal de 1988 já reconhecia a união estável como entidade familiar (art. 226, §3º, CF/88, regulado pela Lei nº 9.278/1996), à qual se aplica o regime da comunhão parcial de bens (art. 5º da Lei nº 9.278/1996, e art. 1.725, CC). Por esta razão, tem-se que o companheiro é herdeiro necessário, de modo que a ausência de sua participação no inventário extrajudicial torna a escritura pública ineficaz em relação a ele. Caso semelhante ao dos autos foi apreciado pelo eg. Superior Tribunal de Justiça, em recurso também de relatoria da Exma. Ministra Nancy Andrighi, cuja ementa se transcreve a seguir:“CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DAS SUCESSÕES. PROLAÇÃO DE SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DE PARTILHA IRRECORRIDA. AUSÊNCIA DE EXPEDIÇÃO DO FORMAL DE PARTILHA. OBSERVAÇÃO DE VÍCIO GRAVE, CONSISTENTE NA AUSÊNCIA DE CITAÇÃO DE LITISCONSORTE NECESSÁRIO. DECLARAÇÃO NO BOJO DO PRÓPRIO INVENTÁRIO. POSSIBILIDADE. SENTENÇA JURIDICAMENTE INEXISTENTE. INEXISTÊNCIA DE TRÂNSITO EM JULGADO E DE COISA JULGADA MATERIAL. QUERELA NULLITATIS INSANABILIS. PRESCINDIBILIDADE. RECONHECIMENTO DO VÍCIO NA FASE DE CUMPRIMENTO DA SENTENÇA POR DISPOSIÇÃO LEGAL. MATÉRIA SUBMETIDA AO CONTRADITÓRIO E QUE DISPENSAVA A DILAÇÃO PROBATÓRIA. LIMITES SUBJETIVOS DA COISA JULGADA NO INVENTÁRIO E PARTILHA. INEFICÁCIA EM RELAÇÃO A TERCEIROS, COMO O LITISCONSORTE NECESSÁRIO NÃO CITADO. DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA JURÍDICA DA SENTENÇA QUE ATRAI A INCIDÊNCIA DA TESE FIRMADA PELO STJ NO JULGAMENTO DO TEMA 809. AGRAVO JULGADO POR FUNDAMENTO DISTINTO DOS ALEGADOS PELA PARTE. RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE INTERESSE. ARGUMENTOS SUSCITADOS PELA PARTE DESCONSIDERADOS NO ACÓRDÃO E REITERADOS NAS CONTRARRAZÕES DO RECURSO ESPECIAL. COGNOSCIBILIDADE. MODIFICAÇÃO DA ORDEM LEGAL DE VOCAÇÃO HEREDITÁRIA. IMPOSSIBILIDADE.1- Ação proposta em 21/05/2010. Recursos especiais interpostos em 01/10/2019 e 02/10/2019 e atribuídos à Relatora em 30/01/2020.2- O propósito do recurso especial de MARIA BARBARA DE OLIVEIRA é definir se a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal por ocasião do julgamento do tema 809, segundo a qual "é inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros prevista no art. 1.790 do CC/2002, devendo ser aplicado, tanto nas hipóteses de casamento quanto nas de união estável, o regime do art. 1.829 do CC/2002", é aplicável na hipótese em que, a despeito da existência de sentença de partilha irrecorrida que homologou acordo celebrado pelos colaterais, únicos herdeiros conhecidos ao tempo de sua prolação, houve o superveniente reconhecimento de herdeira apta a exclui-los da linha sucessória.3- Os propósitos do recurso especial de EMÍLIO XAVIER DE OLIVEIRA, por sua vez, consistem em definir: (i) se há omissão relevante no acórdão recorrido; e (ii) se poderia o Tribunal de Justiça de São Paulo, a despeito da existência de sentença de partilha irrecorrida, nulificar os atos processuais que lhe são subsequentes sem que tenha havido pedido nesse sentido no agravo de instrumento por ele interposto.4- O juízo do inventário, após a prolação de sentença homologatória de acordo de partilha irrecorrida e antes da expedição do respectivo formal, reconhecer a existência de vício grave consistente na ausência de citação de litisconsorte necessário e, assim, a inexistência jurídica da sentença por ele proferida, que não transita em julgado e tampouco forma coisa julgada material.5- A inexistência jurídica da sentença pode ser declarada em ação autônoma (querela nullitatis insanabilis) e também no próprio processo em que proferida, na fase de cumprimento de sentença ou até antes dela, se possível, especialmente na hipótese em que a matéria foi previamente submetida ao crivo do contraditório e não havia a necessidade de dilação probatória.6- Em virtude dos limites subjetivos da coisa julgada, o formal de partilha será título executivo judicial apenas em relação ao inventariante, aos herdeiros e aos sucessores a título singular ou universal, não alcançando, contudo, terceiros, como o litisconsorte necessário não citado para o inventário.7- Declarada a inexistência jurídica da sentença na própria ação de inventário, deve ser aplicada a tese firmada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do tema 809, por meio da qual foi declarada a inconstitucionalidade do art. 1.790 do CC/2002.8- A parte que teve fundamento desprezado por ocasião do julgamento de recurso por ela interposto, mas que foi vencedora por fundamentação distinta e declinada de ofício pelo órgão julgador, não tem interesse para interpor recurso especial, devendo a questão ser reavivada nas contrarrazões do recurso porventura interposto pelo vencido. Precedente.9- Hipótese em que a parte, ao fundamento de que dedicou tempo, esforços e valores na inventariança e no zelo dos bens deixados por seu irmão, pretende a parte modificar a ordem legal de vocação hereditária, o que é absolutamente inadmissível, devendo a questão ser oportunamente apreciada pelo juízo do inventário ou em eventual ação autônoma.10- Recurso especial de MARIA BARBARA DE OLIVEIRA conhecido e provido; recurso especial de EMÍLIO XAVIER DE OLIVEIRA não conhecido.” (REsp 1857852/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/03/2021, DJe 22/03/2021, sem grifos no original.)Para melhor compreensão, oportuna a transcrição de trechos do voto condutor:“09) De início, é preciso examinar o acórdão do Supremo Tribunal que deu origem à tese fixada no tema 809, especificamente no que tange à modulação de efeitos: ‘Por fim, não se pode esquecer que o tema possui enorme repercussão na sociedade, em virtude da multiplicidade de sucessões de companheiros ocorridas desde o advento do CC/2002. Levando-se em consideração o fato de que as partilhas judiciais e extrajudiciais que versam sobre as referidas sucessões encontram-se em diferentes estágios de desenvolvimento (muitas já finalizadas sob as regras antigas), entendo ser recomendável modular os efeitos da aplicação do entendimento ora afirmado. Assim, com o intuito de reduzir a insegurança jurídica, a solução ora alcançada deve ser aplicada apenas aos processos judiciais em que ainda não tenha havido trânsito em julgado da sentença de partilha, assim como às partilhas extrajudiciais em que ainda não tenha sido lavrada escritura pública.’ 10) Na hipótese, o acórdão recorrido merece ser reformado, restabelecendo-se integralmente a decisão agravada proferida em 1º grau de jurisdição, na medida em que, diferentemente da compreensão do TJ/SP, não há sentença de partilha transitada em julgado que justifique a não incidência da tese firmada pelo Supremo Tribunal Federal. 11) Com efeito, examinando-se a decisão de fl. 169 (e-STJ), é correto concluir que o juízo do inventário, ao declarar a insubsistência da sentença homologatória de acordo de partilha entre os colaterais, nada mais fez do que, em verdade, declarar a sua inexistência jurídica em virtude da ausência de citação daquela que, à época, seria litisconsorte necessária, a saber, a recorrente MARIA BARBARA, convivente do autor da herança. (...)13) Com efeito, conforme já se posicionou esta Corte, “não há que se falar em coisa julgada na sentença proferida em processo em que não se formou a relação jurídica apta ao seu desenvolvimento”. Isso porque: ‘É que nessa hipótese estamos diante de uma sentença juridicamente inexistente, que nunca adquire a autoridade da coisa julgada. Falta-lhe, portanto, elemento essencial ao cabimento da rescisória, qual seja, a decisão de mérito acobertada pelo manto da coisa julgada. Dessa forma, as sentenças tidas como nulas de pleno direito e ainda as consideradas inexistentes, a exemplo do que ocorre quando proferidas sem assinatura ou sem dispositivo, ou ainda quando prolatadas em processo em que ausente citação válida ou quando o litisconsorte necessário não integrou o polo passivo, não se enquadram nas hipóteses de admissão da ação rescisória, face a inexistência jurídica da própria sentença porque inquinada de vício insanável (REsp 1.105.944/SC, 2ª Turma, DJe 08/02/2011).(...)17) Anote-se, por oportuno, que ainda que se pudesse cogitar da formação de coisa julgada material a partir de sentença homologatória de acordo de partilha e consequente possibilidade de execução do formal de partilha que, na hipótese, sequer foi expedido, não se pode olvidar que a execução seria ineficaz em relação à recorrente, que, relembre-se, apenas ingressou na ação de inventário após a prolação da sentença homologatória de acordo entre os colaterais.8) A esse respeito, sublinhe-se que há regra específica quanto à ação de inventário e partilha, como bem pontua Rodrigo Frantz Becker: ‘De início, é importante observar que o formal e a certidão de partilha serão títulos executivos judiciais tão somente em relação ao inventariante, aos herdeiros e aos sucessores a título singular ou universal, não alcançando terceiros. Trata-se de limitação subjetiva estabelecida pelo código, evidenciando que, assim como toda sentença, a sentença que julga a partilha fará coisa julgada apenas entre as partes, ou seja, a eficácia será executiva perante os que forem partes na ação de inventário – o inventariante, os herdeiros e sucessores do de cujus. (BECKER, Rodrigo Frantz. Manual do processo de execução dos títulos judiciais e extrajudiciais. Salvador: JusPodivm, 2021. p. 205).19) Diante desse cenário, inexistindo sentença de partilha com trânsito em julgado, é imperiosa a aplicação da tese firmada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do tema 809, de modo a reconhecer a recorrente MARIA BARBARA como única herdeira dos bens deixados por PAULO XAVIER, na forma do art. 1.829, III, do CC/2002.” [1]Disso se conclui, por conseguinte, que não tendo o convivente da de cujus integrado o procedimento de inventário extrajudicial, como se pode claramente observar da cópia dos autos acostada ao mov. 1.4, fl. 74, deve ser observada a regra geral acerca dos efeitos da decisão que reconhece a inconstitucionalidade de dispositivo legal (efeitos ex tunc), de modo que a modulação temporal estabelecida pelo Supremo Tribunal Federal, que trata de exceção à regra, não pode ser aplicada ao caso dos presentes autos.Por consequência, tem aplicabilidade o artigo 1.829 do Código Civil, que estabelece:“Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;III - ao cônjuge sobrevivente;IV - aos colaterais.”Como se pode observar, o cônjuge ou companheiro sobrevivente somente concorre com os descendentes quando o autor da herança tiver deixado bens particulares, o que se verifica no caso dos autos, posto que o bem imóvel integrante do acervo hereditário foi adquirido com recursos exclusivos da de cujus.Sobre o tema, confira-se:“4. "Nos termos do art. 1.829, I, do Código Civil de 2002, o cônjuge sobrevivente,
casado no regime de comunhão parcial de bens, concorrerá com os descendentes do cônjuge falecido somente quando este tiver deixado bens particulares. A referida concorrência dar-se-á exclusivamente quanto aos bens particulares constantes do acervo hereditário do de cujus." (REsp 1368123/SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, Rel. p/ Acórdão Ministro RAUL ARAÚJO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/04/2015, DJe 08/06/2015.)Destarte, considerando que o inventário extrajudicial dos bens deixados pela de cujus V. T. P. M. foi realizado em manifesta afronta ao art. 610 do Código de Processo Civil, visto que não houve a participação, tampouco concordância de todos os herdeiros necessários da falecida, deve ser mantida a r. sentença que declarou a nulidade do procedimento.Cumpre ressaltar, ainda, que também não prospera a pretensão dos apelantes de que a r. sentença seja declarada extra petita, sob o argumento de que houve inovação processual em sede de alegações finais pelo apelado, posto que na exordial o autor pugna expressamente pelo reconhecimento de seu direito à sucessão da companheira, conforme se pode observar da fl. 06, do documento colacionado ao mov. 1.2.
Diante dessas razões, voto pelo conhecimento e pelo não provimento do recurso, mantendo-se a r. sentença em seus fundamentos. Aos honorários advocatícios devidos pela parte apelante devem ser acrescidos os recursais, de 2% (dois por cento) sobre o valor atualizado da causa, na forma do art. 85, § 11, do CPC.
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