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Acórdão
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1. RELATÓRIO. Trata-se de recurso de apelação cível interposto por Fernando dos Santos Mariano contra a r. sentença (mov. 62.1 e 76.1) proferida nos autos nº 0000674-25.2021.8.16.0194, de ação de indenização, que julgou improcedentes os pedidos iniciais, condenando o autor ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, fixados em 15% sobre o valor atualizado da causa.Nas razões recursais (mov. 83.1), Fernando dos Santos Mariano sustentou a aplicação do CDC, com a inversão do ônus da prova. Alegou que sua conta ficou suspensa por 21 dias, de modo que os apelados agiram de forma negligente e excessiva ao não cumprirem o prazo de 36 horas para solução do problema. Alegou que deixou de auferir lucros com a venda de produtos durante esse período, requerendo a condenação dos réus ao pagamento de indenização por lucros cessantes no valor de R$ 14.757,90 e por danos morais no montante de R$ 10.000,00.Foram apresentadas contrarrazões (mov. 87.1).Os autos foram inicialmente distribuídos como matéria residual para a Quarta Câmara Cível (mov. 3.1-TJ), tendo sido determinada a redistribuição como matéria atinente a responsabilidade civil (mov. 9.1-TJ).Em síntese, é o relatório.
2. Fundamentação. Presentes os pressupostos de admissibilidade intrínsecos e extrínsecos, conheço do recurso. Síntese fática Fernando dos Santos Mariano ajuizou ação indenizatória em face de Ebazar.com.br Ltda. – Mercado Livre e Mercadopago.com Representações Ltda. (mov. 1.1), narrando, em síntese, que possui conta nas plataformas requeridas, utilizando a conta no primeiro demandado para a venda de peças automotivas e a conta no corréu para realizar as transações financeiras referentes às vendas. Afirmou que, no dia 26.08.2020, notou movimentações incomuns em sua conta do Mercado Pago, sendo transferidos valores para a conta do usuário Dionatan Fitz, o qual era seu funcionário à época, no valor total de R$ 1.300,00, além de mais três transferências no importe de R$ 1.000,00 no dia seguinte. Aduziu, ainda, que foi solicitado um empréstimo sem seu consentimento no montante de R$ 3.200,00, de modo que entrou em contato com os requeridos e registrou um boletim de ocorrência. Alegou que ficou impossibilitado de movimentar os valores referentes às vendas no Mercado Livre, tendo a conta bloqueada entre 27.08 e 11.09.2020. Mencionou que somente conseguiu retirar a quantia depositada em 16.09.2020. Ante o exposto, requereu a condenação dos réus ao pagamento de lucros cessantes de R$ 14.757,90, referentes aos dias em que ficou sem acesso a suas contas, e de indenização por danos morais na quantia de R$ 10.000,00. Ainda, pleiteou que os demandados apresentassem as informações da conta para a qual foram transferidos valores entre 26 e 27.08.2020.Ebazar.com.br Ltda. e Mercadopago.com Representações Ltda. apresentaram contestação (mov. 26.1), arguindo, preliminarmente, a incompetência do Juizado Especial, a ilegitimidade passiva e a carência de ação no que tange aos lucros cessantes. No mérito, defenderam a inaplicabilidade do CDC. Alegaram que a conta do autor foi suspensa temporariamente para apuração dos fatos denunciados por ele, bem como que os valores das transferências foram estornados, sendo o empréstimo cancelado. Argumentaram que empregam os padrões mais avançados em matéria de proteção de informações pessoais dos usuários e que não deram causa ao evento ocorrido. Ponderaram que não houve prática de ato ilícito e que não há nexo de causalidade, incidindo as excludentes de responsabilidade previstas no art. 14, § 3º, I e II, do CDC. Rechaçaram os pedidos indenizatórios, postulando a improcedência da pretensão inaugural. Foi apresentada réplica (mov. 32.1).Intimados para especificação de provas (mov. 33.1), os demandados renunciaram ao prazo (mov. 37), ao passo que o autor permaneceu inerte (mov. 39), sendo anunciado o julgamento antecipado (mov. 41.1).Sobreveio a r. sentença de improcedência (mov. 62.1 e 76.1), daí advindo o recurso (mov. 83.1). Aplicação do Código de Defesa do Consumidor Os arts. 2º, caput e 3º, caput e § 2º, do diploma consumerista, assim definem os conceitos de consumidor e fornecedor: Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. (...)§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista. Na espécie, o demandante não se qualifica como destinatário final, porquanto utiliza as plataformas dos réus para comercializar peças automotivas, conforme afirmado na exordial (mov. 1.1).Não obstante, é entendimento firmado pelo Superior Tribunal que “o Código de Defesa do Consumidor não se aplica no caso em que o produto ou serviço é contratado para implementação de atividade econômica, já que não estaria configurado o destinatário final da relação de consumo (teoria finalista ou subjetiva). Contudo, tem admitido o abrandamento da regra quando ficar demonstrada a condição de hipossuficiência técnica, jurídica ou econômica da pessoa jurídica, autorizando, excepcionalmente, a aplicação das normas do CDC (teoria finalista mitigada). Precedentes” (AgInt no AREsp 1973453/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 11/04/2022, DJe 19/04/2022).Ora, o requerente utiliza as plataformas como meio de viabilizar sua atividade econômica. Logo, para fins de incidência, ou não, da legislação consumerista ao caso, é necessária a análise da alegada vulnerabilidade do autor.Examinando os autos, observo que a discussão versa sobre a existência, ou não, de falha na prestação dos serviços pelos demandados, em decorrência da suspensão/bloqueio da conta do apelante pelo prazo de 21 dias.Assim, os fatos estão diretamente ligados aos serviços prestados pelos requeridos, o que é alheio ao conhecimento do demandante, que atua como vendedor de peças automotivas.Neste contexto, conquanto o recorrente utilize as plataformas para implementar sua atividade negocial, diante de sua vulnerabilidade técnica – e também econômica –, resta configurada sua condição de consumidor, com base na mitigação da teoria finalista.Corroborando este entendimento, colaciono o seguinte aresto: Agravo de instrumento. Procedimento de indenização c/c obrigação de fazer. Decisão que acolheu exceção de incompetência territorial com base na inaplicabilidade do CDC ao caso. Irresignação do autor. Alegação de existência de relação de consumo. Procedência. Recorrente vendedor usuário da plataforma Mercado Livre. Aplicação da teoria finalista mitigada. Precedentes do STJ. Relação de consumo verificada pela vulnerabilidade e disparidade econômica do recorrente diante das recorridas. Aplicabilidade do CDC. Competência do domicílio do consumidor. Art. 6º, VIII, do CC e Art. 101, I, do CDC. Exceção de incompetência afastada. Recurso conhecido e provido.1. De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, “a teoria finalista deve ser mitigada nos casos em que a pessoa física ou jurídica, embora não tecnicamente destinatária final do produto ou serviço, apresenta-se em estado de vulnerabilidade ou de submissão da prática abusiva, autorizando a aplicação das normas prevista no CDC”.(TJPR - 12ª C.Cível - 0026116-90.2021.8.16.0000 - Foz do Iguaçu - Rel.: DESEMBARGADOR ROGÉRIO ETZEL - J. 09.09.2021) (grifei) Destarte, considerando que o apelante se enquadra na definição de consumidor, é aplicável a legislação consumerista ao caso, bem como é possível a inversão do ônus da prova quando caracterizada a verossimilhança das alegações ou a hipossuficiência do consumidor, de acordo com o art. 6º, VIII, do CDC: Art. 6º São direitos básicos do consumidor:(...)VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências; A inversão do ônus probatório, todavia, não é medida automática após o reconhecimento da relação de consumo, devendo ocorrer apenas quando presentes os pressupostos que a justificam, “a critério do juiz”, conforme disciplinado no dispositivo transcrito. Nesse sentido: AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ACIDENTE DE CONSUMO. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 489, § 1º, IV, E 1.022, II, DO CPC/2015. NÃO OCORRÊNCIA. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. RELAÇÃO DE CONSUMO. ART. 14, § 3º, DO CDC. ACÓRDÃO RECORRIDO EM SINTONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA 83 DO STJ. DECISÃO MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO.1. Se as questões trazidas à discussão foram dirimidas, pelo Tribunal de origem, de forma suficientemente ampla, fundamentada e sem omissões, deve ser afastada a alegada violação aos arts. 489 e 1.022 do Código de Processo Civil de 2015.2. A inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, não é automática, dependendo da constatação, pelas instâncias ordinárias, da presença ou não da verossimilhança das alegações e da hipossuficiência do consumidor.Precedentes.3. Hipótese dos autos em que o Tribunal de origem concluiu pela prova da vulnerabilidade do consumidor e da verossimilhança de suas alegações. Impossibilidade de reexame do conjunto fático-probatório dos autos. Súmula 7 do STJ.4. Agravo interno a que se nega provimento.(AgInt no AREsp 1893252/RJ, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 25/04/2022, DJe 28/04/2022) (grifei) AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA. RECONSIDERAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA. INTERCORRÊNCIA CIRÚRGICA. ERRO MÉDICO OU NEGLIGÊNCIA NÃO RECONHECIDOS. RESPONSABILIDADE DO HOSPITAL E DO MÉDICO NÃO CONFIGURADA. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA NÃO É AUTOMÁTICA. MULTA. ART. 1.026, § 2º, DO NCPC. SÚMULA 98/STJ. AGRAVO INTERNO PROVIDO. DECISÃO RECONSIDERADA. AGRAVO CONHECIDO PARA CONHECER EM PARTE DO RECURSO ESPECIAL E, NESSA PARTE, DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO.1. Agravo interno contra decisão da Presidência que não conheceu do agravo em recurso especial. Reconsideração.2. Não há cerceamento de defesa quando o julgador, ao constatar nos autos a existência de provas suficientes para o seu convencimento, indefere pedido de produção de prova. Cabe ao juiz decidir, motivadamente, sobre os elementos necessários à formação de seu entendimento, pois, como destinatário da prova, é livre para determinar as provas necessárias ou indeferir as inúteis ou protelatórias.3. Na hipótese, o Tribunal de origem, após o exame acurado dos autos, das provas, dos documentos, da perícia e da natureza da relação jurídica, concluiu pela ausência de qualquer responsabilidade do médico e do hospital, consignando expressamente que "não restou minimamente comprovado que os problemas enfrentados pela autora tenham sido decorrentes de falha na prestação do serviço, seja pelos médicos que lhe atenderam, seja pelo nosocômio onde foi internada e operada".4. A modificação da conclusão do Tribunal de origem demandaria o revolvimento do suporte fático-probatório dos autos, o que é inviável em sede de recurso especial, a teor do que dispõe a Súmula 7/STJ.5. A inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, não é automática, dependendo da constatação, pelas instâncias ordinárias, da presença ou não da verossimilhança das alegações e da hipossuficiência do consumidor.Precedentes.6. Os embargos de declaração foram opostos com o intuito de prequestionamento. Tal o desiderato dos embargos, não há por que inquiná-los de protelatórios; daí que, em conformidade com a Súmula 98/STJ, deve ser afastada a multa aplicada pelo Tribunal local.7. Agravo interno provido, para reconsiderar a decisão agravada, e, em novo julgamento, conhecer do agravo para conhecer em parte do recurso especial e dar-lhe parcial provimento.(AgInt no AREsp 1904219/RJ, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 04/04/2022, DJe 06/05/2022) (grifei) No caso, como mencionado, o apelante exerce o comércio de peças automotivas, o demandado Ebazar (Mercado Livre) é empresa de tecnologia de e-commerce líder na América Latina (mov. 26.1, p. 08) e o corréu Mercado Pago é instituição de pagamento atuante no país inteiro (mov. 26.1, p. 08/09), daí porque o autor é hipossuficiente tecnicamente em relação aos apelados.De fato, o requerente se encontra em posição de vulnerabilidade, embora tal situação não lhe retire o ônus de comprovar o que alega, tendo que trazer elementos mínimos de convencimento sobre os fatos narrados na petição inicial.Portanto, é o caso de provimento do recurso neste ponto. Responsabilidade civil Inicialmente, registre-se que, aplicáveis as regras consumeristas ao caso, incide a responsabilização objetiva, a qual comporta apenas as excludentes do art. 14, § 3º, do CDC: Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.(...)§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. Neste sentido: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS –INTERMEDIAÇÃO DE COMÉRCIO ELETRÔNICO (MERCADO LIVRE) – PROVEDOR DE APLICAÇÕES DE INTERNET – ART. 19 DA LEI Nº 12.965/2014 (MARCO CIVIL DA INTERNET) – CASO QUE, CONTUDO, SE SUBMETE AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO FORNECEDOR DE SERVIÇOS (ART. 14, DO CDC) – INVASÃO DE CONTA EXISTENTE JUNTO À PLATAFORMA – ANÚNCIOS FALSOS DE VENDA DE BICICLETA – FRAUDE DE TERCEIROS – FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO – SISTEMA QUE NÃO IMPEDIU, TAMPOUCO IDENTIFICOU A AÇÃO DO FALSÁRIO – DANO MORAL, TODAVIA, NÃO COMPROVADO – MERO DISSABOR DO COTIDIANO – FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS – SENTENÇA MANTIDA, POR FUNDAMENTO DIVERSO – RECURSO DESPROVIDO.(TJPR - 9ª C.Cível - 0030611-38.2021.8.16.0014 - Londrina - Rel.: DESEMBARGADOR DOMINGOS JOSÉ PERFETTO - J. 31.03.2022) (grifei) Examinando os autos, denota-se que, em 27.08.2020, o requerente entrou em contato com o serviço de atendimento ao consumidor do Mercado Livre, informando ter identificado “operações duvidosas” em sua conta (mov. 1.8, p. 03). Após explicar que ocorreram transferências financeiras para uma conta que desconhecia, em nome de “Dionatan Fitz” (mov. 1.8, p 04), o demandante foi encaminhado para a equipe de segurança, sendo-lhe informado que a conta ficaria bloqueada por 36 horas para apuração do ocorrido (mov. 1.8, p. 06).No mesmo dia (27.08.2020), o autor recebeu uma mensagem do Mercado Livre noticiando que o empréstimo de R$ 3.200,00 havia sido aprovado (mov. 1.7, p. 04), tendo ele respondido que não havia solicitado tal operação (mov. 1.7, p. 05).No dia 09.09.2020, o demandante registrou reclamação a respeito do bloqueio da sua conta, que persistia desde 27.08.2020 (mov. 1.4, p. 03). A movimentação do dinheiro depositado na conta foi liberada em 11.09.2020, conforme consta na petição inicial (mov. 1.1, p. 03).Registre-se que não há controvérsia a respeito do fato de não ter sido o apelante quem realizou as transferências à conta de “Dionatan Fitz” nos dias 26 e 27.08.2020, bem como a solicitação de empréstimo no dia 27.08.2020.Todavia, em que pese o autor tenha afirmado, em algumas oportunidades, que sua conta teria sido hackeada, não é o que se depreende do conjunto probatório.Com efeito, no Boletim de Ocorrência registrado pelo requerente (mov. 1.10), constou o seguinte: RELATA O NOTICIANTE QUE FAZ VENDA PELO MERCADO LIVRE E NOTOU QUE O FUNCIONÁRIO DIONATAN FITZ GERALDO CPF (...) EFETUOU UMA TRANSFERÊNCIA DA CONTA DO MERCADO LIVRE DO NOTICIANTE PARA UMA CONTA DELE DO MERCADO LIVRE NO VALOR DE R$ 4.000,00, O NOTICIANTE CONSEGUIU ESTORNAR O VALOR NO DIA 26/08/2020 E DEMITIU O REFERIDO FUNCIONÁRIO. OCORRE QUE NO DIA SEGUINTE PERCEBEU HAVER TRÊS TRANSFERÊNCIAS NO VALOR DE R$ 1.000,00 CADA DA CONTA DO NOTICIANTE PARA CONTA DO DIONATAN DO MERCADO LIVRE E O NOTICIANTE CONSEGUIU ESTORNAR R$ 2.000,00, E TAMBÉM RELATA QUE HOUVE UM TENTATIVA DE MUDAR A SENHA DA CONTA DO NOTICIANTE PELA INTERNET. (sic) Aliás, na petição inicial, o demandante expôs que “o Sr. Dionatan Fitz Geraldo no período dos fatos era funcionários do Autor e seu contrato de trabalho foi rescindido em 18 de setembro de 2020” (sic – mov. 1.1, p. 10).Ou seja, as movimentações não autorizadas pelo recorrente não decorreram de um ataque hacker, mas foram realizadas por um ex-funcionário, que tinha acesso à conta movimentada e, ao que tudo indica, às respectivas senhas. Em se tratando de eventuais prejuízos decorrentes de invasão de contas por hackers, não haveria, em regra, como deixar de responsabilizar os réus, os quais devem impossibilitar que fraudadores acessem as contas de seus usuários, razão pela qual eventual invasão caracterizaria fortuito interno inerente ao risco da atividade desenvolvida pelos demandados.No entanto, no caso, observa-se que as transferências em questão foram realizadas pelo funcionário do autor à época, o qual é o único responsável pelo ocorrido, não se tratando, portanto, de invasão hacker.Além disso, em que pese o desbloqueio da conta não tenha ocorrido em 36 horas, como havia sido informado pelo funcionário que atendeu o requerente quando do registro da reclamação (mov. 1.8, p. 06), denota-se que os demandados solucionaram a contento o problema, estornando todas as transferências e cancelando o empréstimo em tempo razoável, aproximadamente 21 dias, haja vista a necessidade de apuração dos fatos, infringências de normas internas etc.Ora, a suspensão, temporária ou definitiva, da conta de usuário é expressamente prevista nos “Termos e condições gerais de uso do site” (mov. 26.3, p. 10) e nos “Termos e condições de uso” (mov. 26.4, p. 06).Em consequência, como apontado na r. sentença, “a suspensão da conta do autor era prerrogativa das rés, visto que ocorreram as hipóteses autorizadoras, quais sejam, impossibilidade de verificação da identidade do usuário ou de informações incorretas (alínea d), da cláusula décima), bem como de suspeita de irregularidades, fraudes ou qualquer outro ato contrário às disposições dos termos e condições de uso e de questões relativas à idoneidade do usuário ou informações cadastrais (alíneas ‘ii’ e ‘iii’, da cláusula 1.3.3.2)” (mov. 62.1, p. 08).E, como demonstrado, a fraude partiu de ex-funcionário do apelante, o qual tinha acesso aos dados das contas, daí porque incide, no caso, a excludente de responsabilidade prevista no art. 14, § 3º, II, do CDC.Assim, inexistindo ato ilícito perpetrado pelos apelados, não há que se falar na condenação deles ao pagamento de indenização por lucros cessantes ou danos morais, devendo ser mantida a r. sentença de improcedência, ainda que por fundamentação diversa. Honorários recursais Por fim, nos termos do art. 85, §11, do CPC/2015, majoro os honorários advocatícios arbitrados na origem para 18% sobre o valor atualizado da causa, deixando de fixar honorários recursais em favor do apelante, porquanto a sucumbência recursal dos réus é mínima. 3. CONCLUSÃO. Do exposto, voto pelo conhecimento e parcial provimento da apelação cível aviada pelo autor, somente para determinar a aplicação do CDC e a inversão do ônus da prova, fixando honorários recursais, nos termos da fundamentação.
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