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Acórdão
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Relatório1. Decidindo (mov. 134.1) ação declaratória de inexistência de débito c/c dano moral ajuizada por Gerson Carlos Maciel da Silva em face de Omni S.A. Crédito, Financiamento e Investimento, a juíza de direito da 3ª Vara Cível de São José dos Pinhais julgou procedentes os pedidos iniciais, declarando extinto o processo com resolução do mérito, com base no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para: “a) declarar a inexistência do débito declinado na inicial e determinar o cancelamento definitivo da inscrição objeto dos autos; b) condenar a parte ré ao pagamento de indenização a título de danos morais, em favor da parte autora, a qual fixo em R$ 9.000,00 (nove mil reais), corrigido monetariamente pela média do INPC e IGP-DI a partir da data da sentença e acrescido de juros de mora de 1% ao mês, a contar do evento danoso.” Ainda, condenou a parte ré ao pagamento das custas e despesas processuais e honorários advocatícios, os quais fixou em 10% do valor da condenação, conforme art. 85, §2º, do Código de Processo Civil. Vem daí o recurso de apelação interposto pelo banco requerido (mov. 167.1), em que alega, resumidamente, que não há nos autos qualquer prova de que a Instituição Financeira Recorrente teria causado danos à personalidade da parte recorrida. Alega que a parte recorrida se resume a tecer conjecturas sobre o suposto abalo sofrido, sem, contudo, indicar um único evento material capaz de comprovar os danos supostamente sofridos. Ainda, pelo princípio da eventualidade, aduz que o valor deferido em primeira instância (R$ 9.000,00) supera muito a média deferida em casos análogos, sendo necessária sua minoração. Também sustenta, caso não seja esse o entendimento, que o valor arbitrado a título de danos morais deve ser módico. Ainda, menciona que a correção monetária e os juros de mora devem incidir a partir da publicação da sentença que os fixou. Com as contrarrazões (mov. 172.1), subiram os autos a esta egrégia Corte de Justiça. É o relatório do que interessa.
Voto 2. O recurso merece conhecimento, na medida em que estão presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, tanto os intrínsecos (cabimento, legitimação e interesse em recorrer), como os extrínsecos (tempestividade – mov. 165 e 167.1, regularidade formal, inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer e preparo – mov. 167.2/167.3). 3. Volta-se a controvérsia recursal quanto ao acerto da sentença recorrida que julgou procedente a pretensão inicial para condenar a casa bancária ao pagamento de indenização por danos morais, sob o fundamento de que a inscrição indevida enseja o dever de indenizar. E veja que nas razões recursais a instituição financeira apelante não discute mais a situação fática dos autos, mas tão somente alega que não restou demonstrado que teria causado danos à personalidade do recorrido, pelo que seria indevida a fixação de indenização a título de danos morais. Inclusive porque o apelante não rebate ou se insurge quanto aos fatos consignados na sentença recorrida, tidos por geradores do dever de indenizar. Partindo de tal premissa tem-se por incontroversos os fatos consignados na sentença, restando a análise recursal se há ou não o dever de indenizar por danos extrapatrimoniais. Pois bem. Consta na sentença recorrida que: “Pela leitura dos autos, verifica-se que a parte autora foi inscrita em cadastro de inadimplentes por suposto débito no valor de R$ 974,49 (novecentos setenta quatro reais e quarenta nove centavos), na data de 05/10/2018. É incontroverso entre as partes a existência de contrato devidamente assinado (evento 43.2), que originou a inscrição no órgão de inadimplentes. A relação jurídica já foi objeto de litígio nos autos n° 0002314-28.2016.8.16.0036, no qual debateu-se a inscrição negativa de valores provocada pela requerida no ano de 2016. No presente caso, discute-se outra inscrição, oriunda do mesmo contrato, porém promovida em outubro de 2016. Extrai-se dos autos, notadamente no evento 51.2, que a autora apresentou comprovantes de pagamento dos valores alegados como inadimplidos. E ainda que se considere que foram pagos quatros dias após o vencimento, a ré inscreveu o nome do autor mais de dois anos depois, de modo que já deveria ter o pagamento devidamente processado. Portanto, considerando os documentos comprobatórios carreados pela parte autora e presente prova da existência da relação jurídica e adimplemento das obrigações, impõe-se a procedência do pedido inicial para reconhecer a inexigibilidade dos valores cobrados. Isto porque, no momento de inscrição do nome do autor junto aos órgãos de proteção ao crédito, já haviam sido pagas as parcelas em data e valores previstos, e o contrato já não se encontrava mais ativo.” Ou seja, restou incontroverso que, “no momento de inscrição do nome do autor junto aos órgãos de proteção ao crédito, já havia sido pagas as parcelas em data e valores previstos, e o contrato já não se encontrava mais ativo.” E tal situação ensejou a inscrição indevida do nome do autor no SCPC (mov. 1.2). E não tendo sido demonstrada a legitimidade da inscrição, forçoso é a manutenção da sentença recorrida, que reconheceu ser indevida a inscrição e condenou a casa bancária ao pagamento de indenização por danos morais. E a respeito dos danos morais, leciona Rui STOCO: "Portanto, em sede de necessária simplificação, o que se convencionou chamar de "danos morais" é a violação da personalidade da pessoa como direito fundamental protegido, em seus vários aspectos ou categorias, como a intimidade e privacidade, a honra, a imagem, o nome e outros, causando dor, tristeza, aflição, angústia, sofrimento, humilhação e outros sentimentos internos ou anímicos" (Tratado de Responsabilidade Civil: doutrina e jurisprudência. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 7. ed. 2007. p. 1683) Convém ressaltar, por oportuno, que a indenização por danos morais, ao contrário do que ocorre em relação ao dano patrimonial, não tem por objetivo precípuo repor aquilo que se perdeu ou que se deixou de ganhar. A indenização por danos morais tem por finalidade compensar os prejuízos extrapatrimoniais, porquanto ainda que se considere impossível repor ao ofendido o status quo anterior, pode a pecúnia proporcionar à parte certo conforto material a fim de lhe minorar o sofrimento. Sendo um fenômeno psíquico, a dificuldade maior daqueles que o pleiteiam consiste justamente em provar a ocorrência desse dano, desse abalo interno sofrido pelo ofendido, pois, ao contrário do que se dá quando se trata de reparação de danos materiais, em que se dispõe de contratos, perícias, demonstrativos ou outros documentos que, per si, comprovam a extensão efetiva do dano sofrido, a aferição do dano moral somente pode ser feita por meios indiretos, muitas vezes insuficientes. Por tais razões, o Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que "a própria inclusão ou manutenção equivocada configura o dano moral ‘in re ipsa’, ou seja, dano vinculado à própria existência do fato ilícito, cujos resultados são presumidos" (Ag 1.379.761). Pois bem, os prejuízos decorrentes da inscrição indevida de pessoa física ou jurídica em cadastro de restrição ao crédito é causa de abalo moral presumido, que independe de comprovação, por se tratar de dano moral puro, conforme entendimento do egrégio Superior Tribunal de Justiça e os demais Tribunais Pátrios.Sendo assim, não há que se falar em ausência de prova do dano moral suportado, pois a própria publicidade dos dados pessoais no rol de maus pagadores já é considerada causa capaz de dar margem ao abalo moral passível de indenização.Inclusive o próprio apelante reconhece que se trata de dano presumido (mov. 167.1):
Desse modo, não sendo legítima a inscrição efetuada pelo requerido, impõe-se o dever de indenizar, o que justifica a condenação da casa bancária ao pagamento de indenização por danos morais. Em relação ao quantum indenizatório, a título de indenização por danos morais, é cediço que a fixação do valor deve ser feita pelo Julgador, segundo seu prudente arbítrio, sopesadas as circunstâncias do caso concreto. Dentre tais circunstâncias, é certo que devem ser levadas em consideração: (i) a gravidade da falta; (ii) a intensidade do sofrimento do ofendido; (iii) a existência de dolo; (iv) o grau da culpa ou do dolo observados; (v) o fim almejado pelo ofensor; (vi) o comportamento anterior do ofendido; (vii) o comportamento posterior do ofensor; e (vii) a finalidade tanto compensatória como punitiva. Ainda, é de se anotar que o valor arbitrado a título de indenização deve possuir tanto caráter compensatório como punitivo. Compensatório porque embora não seja capaz de estabelecer o “status quo ante”, pode proporcionar à parte certa recomposição do abalo a que fora acometida. Punitivo ou educativo porque a condenação objetiva coibir condutas semelhantes, desestimulando a sua repetição. Convém anotar, por fim, não obstante se considere o ilícito de extrema gravidade, a indenização não pode se constituir nem em causa de enriquecimento para um, nem de ruína para outro. Bem sopesadas todas essas circunstâncias, em atenção aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, conclui-se que o valor de R$ 9.000,00 (nove mil reais), arbitrado na sentença recorrida, atende bem às peculiaridades do caso concreto, além de não se não se mostrar exorbitante a ponto de gerar enriquecimento indevido. Assim, é de rigor o desprovimento do presente recurso neste aspecto, devendo ser mantida a sentença, conforme prolatada. No que tange aos juros e à correção monetária alega o recorrente que deve incidir a partir da publicação da sentença. E, conforme determinado na sentença recorrida, foi estabelecido que a correção monetária deve incidir a partir da data da sentença e os juros de mora a contar do evento danoso. Contudo, a sentença merece ser mantida também no que se refere ao termo inicial dos juros moratórios. Isto porque, ainda que a inscrição indevida tenha origem no contrato firmado entre as partes, certo é que, justamente por ser indevida, é tida extracontratual, porque em descumprimento ao contrato, aplicando-se, portanto, a Súmula 54 do STJ, com a incidência dos juros da data do evento danoso. Nesse sentido: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INSCRIÇÃO INDEVIDA NO CADASTRO DE INADIMPLENTES. DANOS MORAIS. RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. DATA DO EVENTO DANOSO. SÚMULA N. 54/STJ. SÚMULA N. 83/STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o dano extrapatrimonial decorrente da inscrição indevida em cadastro de inadimplentes é extracontratual, ainda que a dívida objeto da inscrição seja contratual (EDcl no REsp 1375530/SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 6/10/2015, DJe 9/10/2015).O termo inicial para a incidência dos juros moratórios, em caso de responsabilidade extracontratual por danos morais, é a data do evento danoso, nos termos da Súmula 54 do Superior Tribunal de Justiça.Agravo interno a que se nega provimento.” (AgInt no AREsp n. 1.390.641/PR, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, DJe de 26/8/2019.): Assim, resta mantida a sucumbência, conforme fixada na sentença, com majoração dos honorários fixados na sentença para 12% sobre o valor da condenação, tendo em vista os critérios albergados pelo C. Superior Tribunal de Justiça[1], na interpretação do artigo 85 §11, do Código de Processo Civil de 2015. 4. Passando-se as coisas desta maneira, meu voto é no sentido de conhecer e negar provimento, mantida a sentença em seus termos.
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