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Acórdão
Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Acórdão. Eventuais imagens serão suprimidas.
RELATÓRIOTrata-se de apelação cível interposta em face da sentença proferida nos autos de curatela (mov. 92.1), a qual dispôs:“(...) 3. DISPOSITIVOAnte o exposto, julgo improcedentes os pedidos iniciais, resolvendo a lide com resolução do mérito, o que faço com fincas no art. 487, I, do CPC, e, por conseguinte, revogo a liminar deferida no seq. 21.1.Em virtude da sucumbência, condeno a autora ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários sucumbenciais em favor do curador especial nomeado para exercer a defesa da ré, os quais fixo em R$ 500,00 (quinhentos reais), o que faço com fincas no art. 85, §2º, I a IV, e §8º, do CPC.A exigibilidade das despesas e honorários sucumbenciais a serem arcados pelo autor ficará suspensa, nos termos do art. 98, §3º, do CPC, haja vista que restou deferido em seu favor as benesses da gratuidade da justiça (item 5 – seq. 21.1).Ainda, tendo em vista a necessidade de nomeação de curador especial para a defesa processual da requerida, haja vista a inexistência de Defensoria Pública nesta Comarca com atribuição para feitos desta natureza, condeno o Estado do Paraná ao pagamento de R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais) a título de honorários ao Dr. Elizeu Cordeiro dos Santos – OAB/PR 86.409, valor este fixado segundo os parâmetros estabelecidos pela Resolução Conjunta 015/2019 – PGE/SEFA (item 2.8). (...)”.Nas razões do recurso (mov. 100.1 - origem), Ângela M. R. alega que sua filha é portadora da diversos transtornos mentais e psicológicos, não sendo capaz de gerir assuntos financeiros e patrimoniais sem ajuda. Indica, ainda, ser o caso, subsidiariamente, de aplicação da tomada de decisões apoiada.Ausente contrarrazões.No mov. 14.1-AP, a d. Procuradoria Geral da Justiça opinou pelo conhecimento em parte do recurso, em razão da inovação recursal, e, na parte conhecida, o não provimento.É o relatório.
VOTO1. Inicialmente, e por questão de ordem, deixo de conhecer do pedido relativo à tomada de decisão apoiada, porquanto trata-se de inovação recursal, não havendo sua devida submissão e apreciação pelo juízo de origem.Ademais, ainda que assim não fosse, há incompatibilidade entre os procedimentos legalmente adotados para cada um dos pedidos, tendo em vista ser a curatela ajuizada pela pretensa curadora em desfavor de seu possível curatelado, enquanto a tomada de decisão apoiada é de titularidade do próprio apoiado.2. No mais, conheço do recurso, ante a presença dos pressupostos de admissibilidade.A apelante ajuizou ação de curatela em face de sua filha, Stephanie, diagnosticada com retardo mental leve (F70), autismo atípico (F84.1), transtornos globais de desenvolvimento – autismo (F84), distúrbios da atividade e da atenção (F90.0), transtornos emocionais com início especificamente na infância (F93), defendendo a ausência de condições mentais e psicológicas dela para gerir os atos da vida civil.Pois bem.A curatela é um instituto com caráter claramente protetivo da pessoa, contudo, caracteriza-se como medida extremamente drástica e excepcional, passível de revisão a qualquer momento, sendo imprescindível que sua apreciação esteja revestida das cautelas necessárias, de forma a justificar a decisão que irá privar o interditando da sua inerente capacidade civil, retirando-lhe a administração e a livre disposição dos seus bens jurídicos.Ademais, o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/15) – instituído com o fim de “... assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania” (art. 1.º) - é expresso ao afirmar que a curatela é “... medida protetiva extraordinária, proporcional às necessidades e às circunstâncias de cada caso, e durará o menor tempo possível” (art. 84, § 3.º) e restrita a atos de conteúdo patrimonial e negocial (art. 85).In casu, Stephanie possui fala limpa, clara e articulada, conseguindo expressar suas vontades e determinar-se de acordo com elas, demonstrou domínio de seus cuidados pessoais e das atividades cotidianas.Outrossim, afirmou ter concluído o ensino fundamental, médio e técnico, além de realizar viagens curtas de ônibus, compras, noticiando, apenas, dificuldades com questões mais complexas relativas a pagamentos em dinheiro.Destarte, na situação dos autos, não há provas robustas da incapacidade absoluta da interditanda de gerir sua vida e exprimir suas vontades de forma a justificar sua curatela.Com efeito, o laudo pericial confeccionado na origem (mov. 52.2), indica a existência de capacidade reduzida de Stephanie tão somente em relação a alguns assuntos financeiros.Nesse contexto, infere-se a adequação do entendimento manifestado no juízo singular, não bastando a mera dificuldade de gestão de determinados assuntos de ordem financeira, para o deferimento de medida tão grave e excepcional.De outra banda, a sujeição da pessoa à curatela ocorre nas hipóteses do art. 1.767 do CC[1] (redação dada pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência), e não se infere o enquadramento de Stephanie nela. Ora, pelas provas dos autos, ela apresentou discernimento suficiente para “exprimir sua vontade”. Portanto, a circunstância dos autos não recomenda o deferimento da curatela, não sendo descartada, no entanto, a possibilidade de ser adotado o procedimento de tomada de decisão apoiada, se necessário (arts. 1.783-A do CC).Em situação próxima a dos autos esta Câmara assim já decidiu:“APELAÇÃO CÍVEL. CURATELA E CURATELA. AÇÃO PROPOSTA PELA MÃE DO INTERDITANDO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA REQUERENTE. PRETENSÃO DE QUE SEU FILHO, PORTADOR DE ESQUIZOFRENIA, SEJA INTERDITADO, PARA QUE POSSA GERIR SEUS INTERESSES, EM ESPECIAL SEU BENEFÍCIO PERANTE O INSS – INTERDITANDO QUE SE ENCONTRA SOB TRATAMENTO, E, EM ENTREVISTA, SE MOSTROU ORIENTADO, CONSCIENTE DE SUA DOENÇA E DO QUE LHE FOI PERGUNTADO – INCAPACIDADE PARA O TRABALHO CONSTATADA NO ÂMBITO PREVIDENCIÁRIO QUE NÃO SE CONFUNDE COM A INCAPACIDADE CIVIL PLENA - AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A CURATELA E IMPOSIÇÃO DE CURATELA. POSSIBILIDADE, NO CASO, DE ADOÇÃO DA TOMADA DE DECISÃO APOIADA. DESNECESSIDADE, ADEMAIS, DA CURATELA PARA REPRESENTAÇÃO PERANTE O INSS OU OUTRAS ENTIDADES, QUE PODE SER FEITA MEDIANTE PROCURAÇÃO. JULGAMENTO DE IMPROCEDÊNCIA DA DEMANDA QUE DEVE SER MANTIDO. RECURSO DESPROVIDO.” (TJPR - 11ª C.Cível - 0000884-55.2016.8.16.0193 - Colombo - Rel.: DESEMBARGADOR MARIO NINI AZZOLINI - J. 23.03.2020).E, de minha relatoria, AP 0001529-27.2020.8.16.0133.Por fim, ficam prequestionados todos os artigos invocados nesta decisão, a fim de viabilizar eventuais recursos às cortes superiores (art. 1.025 do CPC).Posto isso, voto por conhecer em parte e negar provimento ao recurso interposto por Ângela Maria Reginaldo.É como voto.
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