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Acórdão
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Trata-se de recurso de apelação cível interposto por C. Daher Empreendimentos e Participações Ltda. contra a sentença de mov. 55.1 – prolatada nos autos do mandado de segurança nº 0042098-05.2021.8.16.0014 que impetrou contra ato praticado pelo Secretário da Fazenda do Município de Londrina –, mediante a qual o Dr. Juiz a quo denegou a segurança postulada, e condenou a parte impetrante ao pagamento da totalidade das custas processuais. C. Daher Empreendimentos e Participações Ltda., em suas razões recursais (mov. 59.1), postula a reforma da sentença, a fim de que seja concedida integralmente a segurança postulada, reconhecendo a imunidade total e incondicionada do ITBI em relação aos bens imóveis incorporados ao patrimônio, em realização do capital, a fim de ser observada a orientação jurisprudencial firmada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE nº 796.376/SC – TEMA 796, nos termos do art. 927, inc. III, do Código de Processo Civil.Afirma, inicialmente, que o art. 156, § 2º, inc. I, da Constituição Federal prevê duas hipóteses de imunidade do ITBI, quais sejam: a) a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital social; e b) transmissão de bens ou direitos decorrentes de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil. Registra que “da leitura do dispositivo constitucional citado fica evidente que na sua primeira parte ele trata da imunidade do ITBI relativa à transmissão de bens incorporados ao patrimônio da pessoa jurídica em realização de capital, sem impor qualquer condição, do que se depreende que nestes casos a imunidade se aplica de forma automática, independentemente de qualquer circunstância relativa à atividade desenvolvida pela pessoa jurídica adquirente dos bens” (pág. 256-pdf, mov. 59.1). Salienta que o constituinte, ao fixar a ressalva por meio da expressão “salvo se, nesses casos”, quis se referir às hipóteses imediatamente antes dela, quais sejam, transmissão de bens por fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoas jurídica. Assim, entende que essa ressalva é inaplicável à imunidade prevista na primeira parte do dispositivo constitucional – transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital. Sustenta, assim, que a decisão ora recorrida contraria a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Tema nº 796, qual seja a de que “A imunidade em relação ao ITBI, prevista no inciso I do § 2º do art. 156 da Constituição Federal, não alcança o valor dos bens que exceder o limite do capital social a ser integralizado”. A Suprema Corte, a seu sentir, decidiu que a imunidade do ITBI, em relação a transferência de bens para pessoas jurídicas com o intuito de integralização do capital, prevista no art. 156, §2º, da Constituição Federal, independe da atividade desenvolvida pela empresa que receberá os imóveis, ou seja, ainda que a sua atividade preponderante seja a compra e venda dos imóveis utilizados na integralização, a locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil, a imunidade faz-se presente, já que é incondicionada. A única ressalva feita pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 796.376/SC diz respeito ao valor do imóvel que exceder o capital integralizado, sobre o qual deverá incidir ITBI, já que, em verdade, o valor excedente não foi utilizado para a integralização do capital social da empresa, única hipótese de imunidade – se parcela do imóvel, ou seja, se parte do seu valor, não foi utilizada para integralização o capital, sobre essa parte deve incidir o ITBI, já que a imunidade somente atinge a parcela utilizada na integralização do capital.Alega, portanto, que, ao contrário do que decidiu o ilustre magistrado de primeiro grau de jurisdição, faz jus à imunidade tributária, uma vez que, “conforme relatado e comprovado na inicial, a operação realizada pela impetrante apelante se amolda perfeitamente à primeira hipótese decidida pelo STF acima transcrita, pois o valor total dos imóveis incorporados ao seu patrimônio foi utilizado para a integralização do aumento do capital social subscrito pelos sócios, havendo exata coincidência dos valores, conforme se vê das cláusulas primeira e segunda da sua sétima alteração do contrato social juntado com a inicial, não tendo havido qualquer excedente destes imóveis destinado à reserva de capital, razão pela qual se trata de transmissão imune ao ITBI, independentemente da atividade desenvolvida pela impetrante” (pág. 261-pdf, mov. 59.1). Destaca, por fim, que no recurso extraordinário em que a questão da imunidade do ITBI foi apreciada e decidida, houve o reconhecimento de repercussão geral, circunstância que impõe a sua observância pelos demais tribunais pátrios.O Município de Londrina apresentou contrarrazões e postulou o desprovimento do recurso, bem como a fixação de honorários recursais, nos termos do art. 85, § 11, do Código de Processo Civil (mov. 62.1).Os autos, então, foram encaminhados a este Tribunal de Justiça.A douta Procuradoria Geral de Justiça, por meio do parecer do eminente Procurador de Justiça Dr. Arion Rolim Pereira, manifestou-se pelo desprovimento do recurso de apelação (mov. 12.1-TJ). É o relatório.
Voto.1. O presente recurso, como adiante será demonstrado, deve ser desprovido.2. A controvérsia posta em discussão no mandado de segurança, diz respeito à imunidade tributária prevista no art. 156, § 2º, inc. I, da Constituição Federal.Enquanto a empresa impetrante, que alterou o seu contrato social para aumentar o capital social, o qual foi integralizado pela transferência de diversos bens imóveis, sustenta fazer jus à imunidade do ITBI prevista na referida norma constitucional, o Município de Londrina defende o oposto, sob o argumento de que a impetrante tem como principal atividade a incorporação de empreendimentos imobiliários, compra e venda de imóveis, conforme consta no contrato social, circunstância que, por constituir exceção à imunidade, impede o seu reconhecimento.A apelante sustenta que, diversamente do que constou na sentença, a decisão ora recorrida contraria a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 796.376 (Tema 796). Isso porque, segundo afirma, o Supremo Tribunal Federal nesse julgamento decidiu que a transferência de bem imóvel para empresa, a fim de que o sócio integralize o capital social, é incondicionada, ou seja, sempre incide, independentemente da atividade preponderante da empresa. Dessa forma, prossegue, quando for usado bem imóvel para integralizar o capital social da empresa, ainda que a sociedade tenha como atividade a compra e venda de imóveis bem como a locação deles, a transferência da propriedade será imune ao ITBI. Chega a essa conclusão porque a ressalva à imunidade, nos termos da norma constitucional, refere-se apenas às transferências de bens ou direitos “decorrentes de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica”.Alega, ainda, que essa conclusão foi a mesma a que chegou o Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 796.376 (Tema 796).Não lhe assiste razão. A norma contida no art. 156, §2º, inc. I, da Constitição Federal tem o seguinte teor:Art. 156.§2º O imposto previsto no inciso II:I – não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 796.376/SC (Tema nº 796), em relação ao qual foi reconhecida a repercussão geral, fixou a tese de que “A imunidade em relação ao ITBI, prevista no inciso I do § 2º do art. 156 da Constituição Federal, não alcança o valor dos bens que exceder o limite do capital social ser integralizado”.Em outras palavras, não examinou nem decidiu se a ressalva à imunidade tributária prevista na parte final do inc. I do §2º do art. 156 da Constituição Federal – a parte final da mencionada norma constitucional ressalva da imunidade do ITBI as transferência de bens imóveis ou direitos quando “a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil” – diz respeito apenas às hipóteses de transmissão de bens ou direitos decorrentes de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica (2ª. parte da norma) ou se também engloba as transferências de bens e direitos a empresas em operação de integralização do capital social (1ª. parte da norma). Para que não haja dúvida quanto a isso, transcreve-se a ementa do mencionado julgamento e a tese que nele foi fixada:CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE TRANSMISSÃO DE BENS IMÓVEIS - ITBI. IMUNIDADE PREVISTA NO ART. 156, § 2º, I DA CONSTITUIÇÃO. APLICABILIDADE ATÉ O LIMITE DO CAPITAL SOCIAL A SER INTEGRALIZADO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO IMPROVIDO. 1. A Constituição de 1988 imunizou a integralização do capital por meio de bens imóveis, não incidindo o ITBI sobre o valor do bem dado em pagamento do capital subscrito pelo sócio ou acionista da pessoa jurídica (art. 156, § 2º,). 2. A norma não imuniza qualquer incorporação de bens ou direitos ao patrimônio da pessoa jurídica, mas exclusivamente o pagamento, em bens ou direitos, que o sócio faz para integralização do capital social subscrito. Portanto, sobre a diferença do valor dos bens imóveis que superar o capital subscrito a ser integralizado, incidirá a tributação pelo ITBI. 3. Recurso Extraordinário a que se nega provimento. Tema 796, fixada a seguinte tese de repercussão geral: “A imunidade em relação ao ITBI, prevista no inciso I do § 2º do art. 156 da Constituição Federal, não alcança o valor dos bens que exceder o limite do capital social a ser integralizado". (RE 796376, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 05/08/2020, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-210 DIVULG 24-08-2020 PUBLIC 25-08-2020). TESE: “A imunidade em relação ao ITBI, prevista no inciso I do § 2º do art. 156 da Constituição Federal, não alcança o valor dos bens que exceder o limite do capital social a ser integralizado”. Assim, ao contrário do que alega a apelante, a situação examinada pelo Supremo Tribunal Federal é diversa da que se apresente nestes autos. Não se nega que o eminente Ministro Alexandre de Morais, que foi designado relator do mencionado recurso, sem seu voto, defendeu a tese de que a ressalva à imunidade se restringe às hipóteses de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica.Ocorre, entretanto, que, além de essa fundamentação constar apenas do voto de Sua Excelência, o tema do alcance da ressalva não foi objeto de debate entre os integrantes do colegiado, já que a questão posta em discussão se restringia a saber se no caso de o valor do imóvel ser superior ao do capital integralizado a imunidade se restringiria ao valor do capital integralizado. E a decisão foi no sentido de que a imunidade se restringe ao valor do capital integralizado, incidindo o ITBI no valor do imóvel que ultrapassar o valor do capital integralizado. Tanto é assim que a tese fixada no mencionado julgamento, insista-se, foi a de que “a imunidade em relação ao ITBI, prevista no incido I do §2º do art. 156 da Constituição Federal, não alcança o valor dos bens que exceder o limite do capital social a ser integralizado”Este Tribunal de Justiça, ao examinar hipótese como a dos autos, adotou o mesmo entendimento, ou seja, de que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 796.376/SC, não tratou da ressalva à imunidade. Nesse sentido, pode ser transcrita a seguinte ementa de julgamento: AGRAVO DE INSTRUMENTO – MANDADO DE SEGURANÇA – INSURGÊNCIA CONTRA DECISÃO QUE INDEFERIU A CONCESSÃO DE LIMINAR – IMUNIDADE TRIBUTÁRIA – ITBI – INTEGRALIZAÇÃO DE CAPITAL SOCIAL – IMPETRANTE QUE POSSUI COMPRA, VENDA E LOCAÇÃO DE IMÓVEIS PRÓPRIOS COMO ATIVIDADE PREPONDERANTE – INAPLICABILIDADE DO TEMA 796 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – AUSÊNCIA DE RELEVÂNCIA DOS FUNDAMENTOS DO PEDIDO – RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (TJPR - 3ª C.Cível - 0008206-16.2022.8.16.0000 - Londrina - Rel.: DESEMBARGADOR MARCOS SERGIO GALLIANO DAROS - J. 18.07.2022) Do voto do eminente relator, Des. Marcos Daros, faz-se oportuna a transcrição da seguinte passagem: Diversamente do que pretende fazer crer a recorrente, não se verifica que o precedente por ela invocado também teria firmado tese acerca da inaplicabilidade da ressalva quanto à atividade preponderante da adquirente no caso de integralização de capital social.A tese firmada em sede de repercussão geral estabeleceu tão somente o alcance da imunidade tributária do ITBI quando o valor dos imóveis incorporados ao patrimônio da pessoa jurídica excederem o limite do capital social integralizado.Ora, a despeito de alguns apontamentos relativos a que situações a ressalva prevista na parte final do dispositivo constitucional se aplica, constantes do voto da lavra do Senhor Ministro Alexandre de Moraes, relator do acórdão no recurso extraordinário nº 796.376/SC, julgado na Sessão Virtual de 26/06/2020 a 4/08/2020, não se verifica que a questão tenha sido posta como ratio decidendi. Vê-se que a controvérsia acerca da imunidade do ITBI em caso de incorporação de imóveis a título de realização de capital quando o adquirente exercem como atividade preponderante, compra e venda de imóveis próprios, não foi levada à Corte Suprema. É que o fisco municipal de São João Batista/SC exigiu o tributo sobre a diferença entre o valor do capital social e dos bens transferidos.A respeito do limite quanto a questão de mérito do referido precedente, confira-se o que observou o ilustre Procurador-geral da República: (...)Quanto ao mérito, o presente recurso, aviado com base no permissivo do art. 102, III, a, veicula debate sobre suposta ofensa à imunidade contida no art. 156, §2º, I, da Constituição Federal. A divergência sobre o dispositivo em testilha se dá com relação ao alcance da previsão de que o ITBI “não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital”.No caso, o acórdão impugnado delimitou a matéria de fato na origem de modo a expressamente registrar que o objetivo social da empresa não se encaixa na regra da exceção contida no mesmo dispositivo, que prevê a incidência do tributo quando a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda dos bens e direitos imunizados.Eis a exceção: “não incide [o ITBI] sobre a transmissão de bens ou direito incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil;” (grifos nossos). Vê-se, ademais disso, que ao negar seguimento ao recurso extraordinário nº 1.353.731/SP, em 16/11/2021, interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que deixou de exercer juízo de retratação em relação ao já referido Tema 796, o Senho Ministro Alexander de Moraes assim versou:(...)O Tribunal de origem decidiu com acerto, no sentido de que não cabe a aplicação ao caso do Tema 796 da repercussão geral, no qual se fixou tese no sentido de que ‘a imunidade em relação ao ITBI, prevista no inciso I do §2º do art. 156 da Constituição Federal, não alcança o valor dos bens que exceder o limite do capital social a ser integralizado”Isso porque, como bem explicitado pela Relatora do acórdão recorrido, quando da reapreciação de matéria em sede de juízo negativo de retratação, na hipótese, não foi reconhecida a imunidade tributária do ITBI em favor da empresa ora recorrente; assim, por óbvio, não há que se falar na análise do valor dos imóveis transferidos para integralização de capital social da empresa a fim de verificar se o montante excede ou não o limite abarcados pela benesse fiscal (Vol. 10, fl. 5).Vejamos os trechos a seguir do acórdão recorrido, no qual o Tribunal de origem confirmou a sentença que julgara improcedente o pedido de declaração de inexistência de relação tributária em relação ao ITBI (Vol. 6, fls. 31-34):“Delineados estes contornos legislativos, cumpre ressaltar que o contrato social, constitutivo da empresa, dispõe que o capital social foi integralizado inicialmente em moeda corrente, nos termos da cláusula 4ª do aludido contrato, no ano de 2010. Consignou-se que a sociedade apresentava o seguinte objeto: “atividade social de gestão e administração de bens próprios” (fl. 261).No respectivo registro na Junta Comercial do Estado de São Paulo, a pessoa jurídica apresentou como objeto o “aluguel de imóveis próprios, corretagem na compra e venda e avaliação de imóveis e compra e venda de imóveis próprios.”(...)Como se vê, o Tribunal a quo, com base nas normas do CTN e do Código Civil, bem como no contexto fático probatório dos autos, concluiu que a empresa não faz jus à imunidade do ITBI, uma vez que atividade preponderante era a compra e venda de imóveis no momento do fato gerador do imposto.(...) – destaquei.. Vê-se, portanto, que, diversamente do que sustenta a apelante, o Supremo Tribunal Federal nada decidiu a respeito do alcance da ressalva quanto à imunidade do ITBI, prevista no art. 156, §2º, inc. I, da Constituição Federal.Não há, portanto, que se falar em aplicação da Tese firmada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE nº 796.376/SC (Tema nº 796) para justificar eventual reconhecimento da imunidade do ITBI à impetrante, ora apelante.Vencida essa questão, passa-se ao exame da imunidade do ITBI em relação a integralização do capital da impetrante mediante a transferência de imóveis.O imposto incidente sobre a transmissão de bens entre vivos (ITBI), cuja instituição é de competência dos municípios, está previsto no art. 156, inciso II, da Constituição Federal, verbis: Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:(...)II - transmissão "inter vivos", a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição; O inc. I do §2º do referido comando constitucional, por sua vez, prevê hipótese de imunidade tributária do ITBI: “não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil”.Em que pese ao argumento da impetrante, a ressalva prevista no inc. I do §2º do art. 156 da Constituição Federal, refere-se tanto às hipóteses de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, como a hipótese de realização de capital.A norma constitucional, na parte em que trata da ressalva, não faz qualquer restrição às hipóteses em que se aplica. Se a intenção fosse limitar a ressalva às hipóteses de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, a norma tê-lo-ia feito de forma expressa.Além disso, na norma consta a expressão “nesses casos”, referindo-se a todas as hipóteses anteriormente descritas, dentre elas a de integralização de capital social de empresas. Fixada essa premissa, passa-se ao exame da atividade preponderante da apelante.O art. 37 do Código Tributário Nacional estabelece os requisitos para a caracterização da atividade preponderante da pessoa jurídica. Eis o teor do mencionado dispositivo legal:Art. 37. O disposto no artigo anterior não se aplica quando a pessoa jurídica adquirente tenha como atividade preponderante a venda ou locação de propriedade imobiliária ou a cessão de direitos relativos à sua aquisição.§ 1º Considera-se caracterizada a atividade preponderante referida neste artigo quando mais de 50% (cinqüenta por cento) da receita operacional da pessoa jurídica adquirente, nos 2 (dois) anos anteriores e nos 2 (dois) anos subseqüentes à aquisição, decorrer de transações mencionadas neste artigo.§ 2º Se a pessoa jurídica adquirente iniciar suas atividades após a aquisição, ou menos de 2 (dois) anos antes dela, apurar-se-á a preponderância referida no parágrafo anterior levando em conta os 3 (três) primeiros anos seguintes à data da aquisição.§ 3º Verificada a preponderância referida neste artigo, tornar-se-á devido o imposto, nos termos da lei vigente à data da aquisição, sobre o valor do bem ou direito nessa data.§ 4º O disposto neste artigo não se aplica à transmissão de bens ou direitos, quando realizada em conjunto com a da totalidade do patrimônio da pessoa jurídica alienante. (grifou-se). Assim sendo, vê-se que a regra da imunidade tributária prevista no art. 156, §2º, inc. I, da Constituição Federal, prevê a não incidência do ITBI sobre a transmissão de imóveis e direitos a eles relativos incorporados ao patrimônio da pessoa jurídica para fins de integralização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrentes de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica. No entanto, o próprio constituinte estabeleceu que esta imunidade tributária não se aplicará na hipótese de a atividade preponderante do adquirente, vale dizer da pessoa jurídica cujo capital foi integralizado mediante a transferência de imóveis, for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil. E para a apuração da atividade preponderante, deve ser verificado, nos termos do art. 37, §§1º e 2º do Código Tributário Nacional, se mais de cinquenta por cento (50%) da receita operacional da pessoa jurídica adquirente é proveniente de venda ou locação de propriedade imobiliária ou cessão de direitos relativos à sua aquisição. Esta receita deve ser apurada nos dois anos subsequentes à aquisição, ou, nos três primeiros anos seguintes à data da aquisição, na hipótese de a pessoa jurídica adquirente iniciar suas atividades após a aquisição, ou menos de 2 anos antes dela. A Lei 7.303/97 do Município de Londrina (Código Tributário Municipal), de igual modo, dispõe acerca do ITBI e as hipóteses em que ele não incidirá (mov. 50.1):Art. 179. O imposto de competência do Município, sobre a transmissão por ato oneroso "inter vivos", de bens imóveis (I.T.B.I.), bem como cessão de direitos a eles relativos, tem como fato gerador:I – a transmissão “inter vivos” a qualquer título, por ato oneroso, da propriedade ou do domínio útil de bens imóveis, por natureza ou por acessão física, conforme definido no Código Civil;II – a transmissão “inter vivos” por ato oneroso, a qualquer título, de direitos reais sobre imóveis, exceto os direitos reais de garantia;III – a cessão de direitos relativos às transmissões referidas nos incisos anteriores.Parágrafo único. Para efeitos desta lei é adotado o conceito de imóvel e de cessão constantes da Lei Civil. Art. 180. A incidência do Imposto Sobre a Transmissão de Bens Imóveis alcança as seguintes mutações patrimoniais:(...)XX – incorporação de imóvel ou de direitos reais sobre imóveis ao patrimônio de pessoa jurídica, em realização de capital, quando a atividade preponderante da adquirente for a compra e venda, locação ou arrendamento mercantil de imóveis, ou a cessão de direitos relativos à sua aquisição;XXI – transmissão desses bens ou direitos, decorrentes de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, quando a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil;(...)§ 2º Considera-se caracterizada a atividade preponderante referida no inciso XXI quando mais de 50 % (cinqüenta por cento) da receita operacional da pessoa jurídica adquirente, nos dois anos anteriores e nos dois anos subsequentes à aquisição, decorrer de transações mencionadas naquele dispositivo.§ 3º Se a pessoa jurídica adquirente iniciar suas atividades após a aquisição, ou menos de 2 (dois) anos antes dela, apurar-se-á a preponderância referida no parágrafo anterior, levando em conta os 3 (três) primeiros anos seguintes à data da aquisição.§ 4º Verificada a preponderância referida neste artigo, tornar-se-á devido o imposto, nos termos da lei vigente à data da aquisição, sobre o valor do bem ou direito nessa data.(...) Art. 181. O imposto não incide sobre a transmissão dos bens ou direitos referidos nos artigos anteriores, desde que não caracterizadas as situações dos incisos XX e XXI do artigo 180: (Redação alterada pelo art. 1º da Lei nº 12.576, de 29 de setembro de 2017).I – quando efetuada para sua incorporação ao patrimônio de pessoa jurídica em pagamento de capital nela subscrito;II – quando decorrente da incorporação ou da fusão de uma pessoa jurídica por outra ou com outra.§ 1º O imposto não incide sobre a transmissão aos mesmos alienantes, dos bens e direitos adquiridos na forma do inciso “I” deste artigo, em decorrência da sua desincorporação do patrimônio da pessoa jurídica a que foram conferidos, nos casos de cisão ou extinção da pessoa jurídica. (Redação alterada pelo art. 1º da Lei nº 12.576, de 29 de setembro de 2017).§ 2º Para efeito da emissão do documento a que se refere §3º do artigo 184 desta Lei, deverá o interessado prestar declaração junto à Administração Tributária, para fins de comprovação do atendimento das condições para não incidência do imposto. (Redação acrescida pelo art. 1º da Lei nº 12.576, de 29 de setembro de 2017).§ 3º Nos casos em que a verificação da preponderância da atividade do adquirente tiver que ser realizada em momento futuro, o interessado deverá, no prazo legal, apresentar declaração complementar com a comprovação necessária, sob pena de aplicação de penalidade por descumprimento da obrigação, sem prejuízo do lançamento do imposto. (Redação acrescida pelo art. 1º da Lei nº 12.576, de 29 de setembro de 2017).§ 4º O regulamento disporá sobre a forma e prazos para apresentação das declarações a que se referem os §§2º e 3º deste artigo. (Redação acrescida pelo art. 1º da Lei nº 12.576, de 29 de setembro de 2017). Hugo de Brito Machado, a respeito da hipótese em que a imunidade tributária prevista no art. 156, § 2º, inc. I, da Constituição Federal não é aplicada, registra:(...)Ao referir-se a atividade preponderante, a norma que exclui a imunidade ao Imposto de Transmissão de Bens Imóveis e direitos a eles relativos utiliza um conceito, como acontece com as normas jurídicas em geral. Atividade preponderante é aquela que supera as demais. É a que se caracteriza como de maior expressão. Mesmo assim, faz necessária uma definição desse conceito, pois a norma que o alberga há de ter o alcance definido o mais exatamente possível. (...)Cumprindo o papel reservado à lei complementar pelo art. 146, inciso III, alínea a, da vigente Constituição, o art. 37 do Código Tributário Nacional, em seus parágrafos 1º, 2º e 3º, definiu a atividade preponderante, para fins de exclusão da imunidade. E o fez da forma mais adequada possível para evitar fraudes. Considera-se preponderante a atividade imobiliária quando mais de 50% da receita operacional da pessoa jurídica adquirente, nos dois anos anteriores e nos dois anos subsequentes à aquisição decorrer de transações imobiliárias. É o que está dito no § 1º do art. 37 do Código Tributário Nacional. Pode ocorrer, porém, que na data da aquisição a cujo respeito se questiona a configuração da imunidade, a pessoa jurídica não esteja operando há dois anos. Nesse caso, a preponderância será apurada levando em conta os três anos seguintes à data da aquisição questionada. Como se vê, pode ocorrer que na data da aquisição dos bens imóveis ou direitos a eles relativos já seja possível verificar-se a configuração ou não da exceção, vale dizer, da circunstância excludente da imunidade. Nesse caso, o imposto será devido normalmente. Pode ocorrer, porém, que só posteriormente se venha a verificar a configuração do suporte fático da norma excepcional excludente da imunidade. Nesse caso, uma vez verificado este fato, o imposto será devido nos termos da lei vigente da data da transmissão tributada. É o caso de fato gerador que fica a depender de condição. (MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao Código Tributário Nacional, 2 ed., vol. I, São Paulo: Atlas S.A., 2007, p. 418/419 – grifou-se). Ademais, acerca da mencionada imunidade tributária, bem como das hipóteses em que ela não incidirá, faz-se oportuna a transcrição da lição do professor Ricardo Alexandre:(...) optou o legislador constituinte originário por imunizar as operações listadas no inciso I do § 2º do art. 156 da CF/1988. Trata-se de uma imunidade tributária objetiva, que visa a estimular a capitalização e o crescimento das empresas e a evitar que o ITBI se transformasse num estimulo contrário à formalização dos respectivos negócios.A principal característica de uma pessoa jurídica é possuir direitos e obrigações diferentes dos relativos às pessoas físicas que integram seu quadro societário. A título de exemplo, na criação de uma sociedade por quotas de responsabilidade limitada, o sócio incorpora ao patrimônio da pessoa jurídica um valor a título de realização de capital. Suponha-se que um dos sócios integralizou sua quota por meio da entrega de um imóvel. A transferência não se deu a título gratuito, pois o sócio passa a ter uma quota do capital da empresa e, se não existisse regra imunizante objeto de estudo, haveria incidência do ITBI. Na situação proposta, a incidência tributária serviria como um estímulo para que a criação da empresa não fosse formalizada, o que levou o legislador constituinte a estatuir a regra imunizante. Se, mais à frente, a sociedade criada vier a ser extinta, a entrega de imóvel a um sócio, como parcela que lhe cabe do capital social, também não estará sujeita a incidência tributária. (...). (ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário. Editora JusPodivm, 14 ed., ver., atual., e ampl. Salvador, 2020, p. 782/783). Feitas essas considerações, da análise dos autos do mandado de segurança – autos nº 0042098-05.2021.8.16.0014 – é possível verificar que, por meio da 6ª alteração contratual, o ramo de atividade da sociedade passou a ser “participação em outras sociedades (6463-8/00) e, incorporação de imóveis próprios e de terceiros e empreendimentos imobiliários (7010-6/00)”, e, por meio da 7ª alteração contratual, além de ter fixado o seu capital social no valor de R$ 4.470.558,00 – sócios Cheplitanus Daher Filho (2.235.279 cotas, tendo como parte no capital social R$ 2.235.279,00) e Jandyra Daher (2.235.279, tendo como parte no capital social R$ 2.235.278,00) –, foram incorporados ao patrimônio, em realização de capital, os bens imóveis de matrículas nos 31.476, 5.183, 30.840, 32.787, 30.939, 42.979, 30.976, 57.009, 14.174, 14.749, 14.783, 26.228, 11.513, 33.392, 33.416, 33.417, 33.454, 33.459, 8.611, 3.337, 19.730, 3.638, 3.641, 15.350 e 15.351 (documentos de movs. 1.3/1.4).Poder-se-ia defender que a empresa impetrante, por ter incorporado ao patrimônio os bens imóveis em realização de capital social, faria jus à imunidade tributária prevista no art. 156, § 2º, inciso I, da Constituição federal. Ocorre que, segundo o seu contrato social, com as alterações posteriores, estabelece o seu objeto social como sendo a administração de bens imóveis, fato que é incontroverso nos autos. Eis o teor da cláusula quarta do contrato social: CLAÚSULA QUARTA: O ramo de atividade da sociedade passa ser: participação em outras sociedades (6463-8/00) e, incorporação de imóveis próprios e de terceiros e empreendimentos imobiliários (7010-6/00); (mov. 1.3, pág. 21-pdf, Sexta alteração do Contrato Social).CLÁUSULA SEGUNDA – A Sociedade tem por objeto participar de outras sociedades como sócia, ou participar no capital de outras sociedades como acionista, a exploração da atividade de compra e venda de imóveis, desmembramento ou loteamento de terrenos, incorporação imobiliária e construção de imóveis destinados à venda, locação; e, administração e locação de bens urbanos e rurais próprios, bem como atividades de exploração rural. (mov. 1.5, pág. 63-pdf, 7ª alteração do Contrato Social). Não se ignora que, nos termos do art 37, §1º, do Código Tributário Nacional, para que a atividade empresarial seja considerada preponderante, é preciso que mais de cinquenta por cento (50%) da receita operacional da pessoa jurídica adquirente, nos dois anos anteriores e nos dois anos subsequentes à aquisição, se origine da administração de bens – compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil. No entanto, embora este dispositivo legal estabeleça um critério objetivo de verificação da atividade preponderante da incorporação, não impede que a constatação se dê por outros elementos de prova, como se deu na hipótese em apreço.No caso em exame, o contrato social da impetrante aliado ao fato de que ela não nega que a sua atividade preponderante é a administração dos bens imóveis – compra e venda de bens imóveis, desmembramento ou loteamento de terrenos, incorporação imobiliária e construção de imóveis destinados à venda, locação e, administração e locação de bens urbanos e rurais próprios, bem como atividades de exploração rural – é suficiente para demonstrar que a atividade da impetrante enquadra-se nas atividades ressalvadas da imunidade tributária.Conclui-se, assim, a partir da prova pré-constituída existente nos autos, que a sociedade empresária apelante não faz jus à imunidade tributária prevista no art. 156, § 2º, inciso I, da Constituição social, uma vez que o seu objeto social, na atual redação que lhe foi dada pela alteração contratual, impossível concluir que a atividade preponderante dela não seja outra que não a de compra e venda desses bens ou direito, bem como locação desses imóveis.A própria quantidade de imóveis utilizados na integralização do capital social da empresa (foram utilizados 25 imóveis) já serve de sério indicativo da atividade preponderante da impetrante. E nem ela nega que essa seja a sua atividade, tanto que defende a imunidade sob a alegação de que a ressalva à imunidade tributária prevista no art. 156, §2º, inc. I, da Constituição Federal refere-se apenas às hipóteses de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica. Em outras palavras que a transferência de imóvel para integralização de capital estaria excluída da ressalva, independentemente da atividade preponderante da empresa.Não há dúvida, portanto, de que o presente recurso de apelação deve ser desprovido. 3. O pleito formulado pelo apelado, para que sejam fixados honorários sucumbenciais na fase recursal, não pode ser colhido. Diz-se isso porque, nas ações de mandado de segurança não é possível a fixação de honorários advocatícios, nos termos do art. 25 da Lei nº 12.016/2009 e da Súmula 512 do STF e da Súmula 105 do STJ.Além disso, pressuposto lógico para que haja a majoração de honorários advocatícios em segundo grau de jurisdição, é que tenham eles sido arbitrados na sentença, até porque somente pode ser majorado valor anteriormente fixado, hipótese diversa à dos autos, em que o magistrado sentenciante, corretamente, não condenou a impetrante ao pagamento de honorários advocatícios. A regra contida no art. 85, §11, do Código de Processo Civil espanca qualquer dúvida sobre isso, pois estabelece que o tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação dos honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento” (grifou-se). 4. Não há dúvida, portanto, de que o presente recurso de apelação interposto por C. Daher Empreendimentos e Participações Ltda. deve ser desprovido.
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