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Acórdão
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I – RELATÓRIOO Ministério Público manejou a presente correição parcial contra as decisões de movs. 279.1 e 293.1 dos autos da ação penal nº 0002451-56.2014.8.16.0011, proferidas pelo Juízo de Direito da 1ª Vara Privativa do Tribunal do Júri do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba, por intermédio das quais a Defensoria Pública foi automaticamente habilitada, com base nos arts. 27 e 28 da Lei Maria da Penha, como “assistente qualificada” em prol de mulher vítima de violência doméstica.Sustentou que essa habilitação automática acarretou error in procedendo pela inversão tumultuária de atos e fórmulas legais, pois a atuação da Defensoria Pública é regida pelo princípio dispositivo; que, por esse princípio, a atuação da Defensoria Pública, mesmo em casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, não pode ocorrer de modo automático e indiscriminado, devendo guardar pertinência com o seu mister constitucional de defesa dos necessitados, somente se legitimando quando a vítima procura seus serviços e demonstra a hipossuficiência (carência de recursos econômicos); que hipossuficiência não se confunde com vulnerabilidade; que também ocorreu afronta ao princípio da legalidade com a criação de figura processual não prevista em lei, alargando o polo acusatório; e que isso gerou tumulto processual ao colocar a Defensoria Pública, instituição una e indivisível (CF, art. 134, §4º), em polos opostos da mesma relação processual, pois atuará em prol dos interesses da mulher vítima de violência doméstica e, ao mesmo tempo e no mesmo processo, na defesa de seu algoz, o acusado. Pediu, por isso, a procedência desta correição parcial para, corrigindo-se o alegado erro de procedimento, ser desabilitada a defensora pública que está atuando nos autos de origem em prol da vítima (mov. 1.1 destes autos).O Juízo de origem prestou informações no sentido de que a Defensoria Pública, em casos como o presente, apenas acompanha a vítima em todos os momentos em que sua presença em juízo se fizer necessária, orientando-a acerca de seus direitos, devendo, por isso, ser julgada improcedente a presente correição parcial (mov. 21.1 destes autos).A Defensoria Pública, reportando-se à Nota Técnica nº 04/2022/NUDEM/DPE-PR (encartada no mov. 23.2 destes autos), também pugnou pela improcedência desta correição parcial porque devem ser superados os questionamentos acerca dos limites da sua atuação em casos como o presente; que, de acordo com a vigente ordem constitucional, a Defensoria Pública em nosso Estado Democrático de Direito foi colocada em situação de paralelismo com o Ministério Público, enquanto também instituição de defesa da sociedade na linha do acesso à jurisdição; que a “assistência qualificada” à vítima pode coincidir com a “assistência de acusação”, a depender do interesse da vítima; e que, nesse sentido, o Conselho Nacional dos Defensores Públicos Gerais (CONDEGE) emitiu o Enunciado VI, com o seguinte teor: “Considerando o art. 4º, incisos XI e XVIII, da Lei Complementar 80/1994, a atuação da Defensoria Pública na defesa da mulher em situação de violência doméstica e familiar, conforme prelecionam os artigos 27 e 28 da Lei Maria da Penha, é plena e não se confunde com a assistência de acusação dos artigos 268 e seguintes do CPP” (mov. 32.1 destes autos).A Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Dr. Carlos Alberto Baptista, manifestou-se pela improcedência da presente correição parcial (mov. 39.1 destes autos).É o relatório.
II – VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO(a) Da contextualização do caso em exameNos autos da ação penal nº 0002451-56.2014.8.16.0011, M.S. foi denunciado pelo cometimento, em tese, do crime de tentativa de homicídio praticado no âmbito da violência doméstica contra a vítima P.J.M.A denúncia foi recebida e, posteriormente, transcorrido o prazo do edital de citação, determinou-se a suspensão do processo e do prazo prescricional, nos termos do art. 366 do Código de Processo Penal, decretando-se, ainda, a prisão preventiva do réu.O mandado de prisão foi cumprido em 05.01.2022 e, no dia 11 de janeiro do mesmo ano, revogou-se a suspensão do processo e do prazo prescricional. No dia 13.01.2022, a prisão preventiva também foi revogada.Na sequência, pessoalmente citado, o réu respondeu à acusação por intermédio de defensor dativo. Em seguida, o Ministério Público apresentou manifestação impugnando os argumentos deduzidos pela Defesa.No dia 30.05.2022, foi revogada a nomeação dativa, com remessa dos autos à Defensoria Pública para atuação em prol do réu, consoante decisão de mov. 214.1, com o seguinte teor:“1. Primeiramente, observa-se que há defensor dativo nomeado nos presentes autos desde 10.02.2022, conforme certidão retro. Considerando que, atualmente, desde março de 2022, o Defensor Público Vitor Eduardo Tavares de Oliveira, Defensor Titular da 2ª Vara Privativa do Tribunal do Júri atua nesta 1ª Vara Sumariante do Tribunal do Júri de Curitiba ainda que ‘em acumulação’, conforme Deliberação CSDP 022/2021 e art. 1º da Resolução DPG nº 40/20211, revogo a nomeação da defesa dativa e determino a remessa dos autos à Defensoria Pública. 2. Desabilite-se. Os honorários serão fixados em sentença ao final ao menos desta fase do procedimento. 3. Intime-se a Defensoria Pública. 4. Cientifique-se o Ministério Público. 5. Providências necessárias”.Seguindo-se o trâmite processual, em 02.08.2022 sobreveio a decisão de mov. 279.1, por meio da qual habilitou-se, de ofício, a Defensoria Pública para também atuar na “assistência qualificada” da vítima, verbis:“1. Vista ao Ministério Público para que confeccione o Formulário Nacional de Avaliação de Risco (FNAR). 2. Habilite-se a Defensora Pública Dra. Yara Flores, nos moldes do artigo 28 da Lei nº 11.340/2006. 3. Providências necessárias”.Contra essa decisão, foram interpostos embargos de declaração, sobrevindo a seguinte deliberação, que se vê no mov. 293.1:“1. O Ministério Público opôs embargos de declaração contra decisão que determinou a habilitação da Defensoria Pública em defesa da mulher vítima de violência doméstica, a fim de suprir omissão com a especificação de qual será a função desempenhada pela Defensora Pública em prol da vítima, mas sem habilitação para assistência à acusação. A defesa opinou pela rejeição dos embargos de declaração (mov. 291.2), afirmou que a Defensoria Pública fornece assistência jurídica à vítima de violência doméstica, não se confundindo com a figura do assistente de acusação, nos termos da Lei Maria da Penha.É o breve relato. Decido.Primeiramente, conheço dos embargos, posto que tempestivos, porém os rejeito, eis que não há qualquer omissão a ser suprida.O papel da Defensoria Pública em prol da vítima de violência doméstica decorre de lei na medida em que é de conhecimento de todos que a Lei nº 11340/2006 prevê a necessidade de que a vítima venha a ser acompanhada por advogado e o acesso aos serviços da Defensoria Pública:‘Art. 27. Em todos os atos processuais, cíveis e criminais, a mulher em situação de violência doméstica e familiar deverá estar acompanhada de advogado, ressalvado o previsto no art. 19 desta Lei.Art. 28. É garantido a toda mulher em situação de violência doméstica e familiar o acesso aos serviços de Defensoria Pública ou de Assistência Judiciária Gratuita, nos termos da lei, em sede policial e judicial, mediante atendimento específico e humanizado’.No caso em questão, a vítima não contratou advogado particular e, aparentemente, não buscou os serviços da Defensoria Pública.A despeito disso, considerando as disposições mencionadas acima, entendo que se mostra necessária a atuação da Defensoria Pública na defesa dos direitos da mulher vítima de violência.Há que se considerar a hipossuficiência da mulher vítima de violência, razão pela qual imprescindível que em audiência esteja presente acompanhada de defensor quando da sua oitiva, que poderá orientá-la, informando-lhe de todos os seus direitos e ferramentas a sua disposição para proteção de tais direitos.Ainda, afora a audiência, deve a Defensoria Pública, bem como o Ministério Público, promover a proteção da vítima de violência doméstica.De qualquer forma, é certo que não atua a Defensoria Pública como assistente de acusação, figura evidentemente particular, referente a constituição de advogado pela vítima, mas como garantidor dos direitos da mulher vítima de violência doméstica, assistindo-a, repita-se, principalmente quando da sua oitiva em audiência.Destaco ainda que a atuação de tal Defensoria não se confunde com a atuação da Defensoria Pública em favor dos acusados nos processos que tramitam perante este juízo, posto que, a despeito de se tratar de assistência prestada pela mesma instituição, a lei prevê expressamente a assistência pela Defensoria Pública; ademais, a atuação de cada Defensor é distinta e não se confunde.Ante o exposto, rejeito os embargos de declaração de mov. 283.1.2. Intime-se o Ministério Público para alegações finais, após, à defesa para os mesmos fins.3. Providências necessárias”.É contra essas decisões judiciais, de movs. 279.1 e 293.1, que se volta a presente correição parcial.(b) Da alegada ofensa ao princípio dispositivo pela habilitação da Defensoria Pública, de ofício pelo juízo, para atuar como “assistente qualificada” da vítimaSustentou a Promotora de Justiça que subscreveu a inicial desta correição parcial, que ocorreu error in procedendo porque a Defensoria Pública foi automaticamente habilitada, com base nos arts. 27 e 28 da Lei Maria da Penha, como “assistente qualificada” da vítima.Segundo seu entendimento, a Defensoria Pública é regida pelo princípio dispositivo, ou seja, sua atuação, mesmo em casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, não pode ocorrer de modo automático e indiscriminado, devendo guardar pertinência com o seu mister constitucional de defesa dos necessitados, somente se legitimando quando a vítima procura seus serviços e demonstra a hipossuficiência (carência de recursos econômicos), o que não se confunde com vulnerabilidade.Para ser solucionada essa questão, convém iniciar transcrevendo os arts. 27 e 28 da Lei Maria da Penha, que tratam da chamada “assistência qualificada” à mulher vítima de violência doméstica:“Art. 27. Em todos os atos processuais, cíveis e criminais, a mulher em situação de violência doméstica e familiar deverá estar acompanhada de advogado, ressalvado o previsto no art. 19 desta Lei.Art. 28. É garantido a toda mulher em situação de violência doméstica e familiar o acesso aos serviços de Defensoria Pública ou de Assistência Judiciária Gratuita, nos termos da lei, em sede policial e judicial, mediante atendimento específico e humanizado” (destacou-se).Como se vê, o art. 27 da Lei Maria da Penha estabelece que a mulher, vítima de violência doméstica, deverá estar acompanhada de advogado (constituído, nomeado ou defensor público) em todos os atos processuais em que sua presença em juízo se fizer necessária. A única hipótese em que o legislador estabeleceu ser prescindível a atuação de advogado ou defensor público é para o requerimento de medidas protetivas de urgência, possuindo a própria vítima capacidade postulatória (LMP, art. 19).Se a “assistência qualificada” é obrigatória, pois decorre da própria lei, torna-se dispensável a prévia concordância do Ministério Público e o juízo de sua admissibilidade pelo magistrado condutor do processo, como, aliás, assim já decidiu a 1ª Turma Criminal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal no julgamento da Apelação Criminal nº 0022018-93.2007.8.07.0003, de relatoria do Des. Mário Machado, ocorrido em 12.08.2010.Tem se entendido, porém, apesar de o legislador ter utilizado o vocábulo “deverá”, que o descumprimento da referida disposição legal não ensejará o adiamento nem a nulidade do respectivo ato processual, tratando-se, pois, de mera irregularidade.Em artigo publicado no Consultor Jurídico (conjur.com.br), intitulado “A Lei Maria da Penha e a assistência qualificada no Tribunal do Juri”, o Juiz de Direito Daniel Ribeiro Surdi de Avelar, titular do 2º Tribunal do Júri de Curitiba, escreveu que “Uma primeira questão que pode surgir, especialmente nas comarcas de pequeno porte, é o que fazer quando verificada a inexistência – ou não comparecimento – de um profissional para a audiência.Nesse caso, entendemos que a ausência do profissional (advogado constituído, dativo ou defensor público) para acompanhar o depoimento da vítima não implicará no adiamento ou nulidade do ato processual. Primeiro, porque que a lei (LMP ou CPP) não disciplina qualquer regra a respeito do tema. Segundo, porque preservar e garantir os direitos da mulher é função articulada (LMP, artigo 9º, caput) de todos os sujeitos processuais, em especial, do magistrado e do membro do Ministério Público, os quais, inclusive, podem ser penalizados caso descumpram tal mister. Para tanto, basta voltarmos os olhos para o disposto nos artigos 201, §6º, 400-A, 474-A, do CPP e artigo 37 da LMP” (https://www.conjur.com.br/2023-fev-04/tribunal-juri-lei-maria-penha-assistencia-qualificada-tribunal-juri#author, acesso em 13.03.2023).Nulidade haverá se, e somente se, ficar demonstrado o efetivo prejuízo à situação jurídica da vítima, segundo já decidiu esta Câmara Criminal, chamada a se manifestar acerca dessa questão, no julgamento da Apelação Criminal nº 1.544.789-5, de relatoria do Juiz de Direito Substituto em Segundo Grau Benjamim Acácio de Moura e Costa, realizado em 22.06.2017.Segue daí então a seguinte pergunta, necessária à resolução da primeira questão posta a julgamento deste colegiado: diante do exposto, há alguma mácula na habilitação da Defensoria Pública, de ofício pelo juízo, para atuar como “assistente qualificada” da mulher vítima de violência doméstica?A resposta é negativa.É totalmente contrário ao espírito norteador da Lei Maria da Penha, que trouxe consideráveis avanços no combate à discriminação e violência de gênero com vistas à prevenção e assistência à mulher, dela exigir que, para ter “assistência qualificada” em juízo, tenha de se deslocar, fragilizada e ainda mais vulnerável pela violência doméstica de que foi vítima, até a sede da Defensoria Pública e provar ser carente de recursos econômicos para contratar advogado.Não quis o legislador impor à mulher, vítima de violência doméstica, esse ônus. Quis o legislador, isto sim, protegê-la, tornando a “assistência qualificada” uma ferramenta de garantia indispensável à informação e orientação dos seus direitos.A “assistência qualificada”, assim não se entendendo, tende a se transformar em verdadeiro obstáculo ao acesso ao sistema de tutela de direitos da mulher vítima de violência doméstica, previsto na Lei Maria da Penha. A “assistência qualificada” em todos os processos cíveis e criminais é garantia de que não se dará diminuta importância aos direitos da mulher vítima de violência doméstica nos atos processuais de que foi e poderá ser instada judicialmente a participar, sendo informada do seu conteúdo e finalidade. Garantia de que seu atendimento, nos moldes do art. 28 da Lei Maria da Penha, será específico e humanizado para proteção da sua integridade psíquica e emocional, evitando-se uma execrável revitimização pela avaliação indesejada do seu comportamento nos fatos levados à apreciação do Estado-juiz. Garantia, também, de que será adequadamente informada das consequências jurídicas das suas escolhas, seja em relação ao agressor, seja em relação a ela própria, seja em relação à sua família, tendo em vista a possibilidade da irradiação de efeitos em outras searas (v.g. família, cível ou empresarial).Justamente por isso, a “assistência qualificada” à mulher vítima de violência doméstica deve ser prestada pela Defensoria Pública independentemente da comprovação de hipossuficiência (carência de recursos econômicos), nos exatos termos do trabalho muito bem elaborado por Juliana Garcia Belloque em comentários aos arts. 27 e 28 da Lei Maria da Penha, verbis:“De forma inovadora, o constituinte de 1988 previu a Defensoria Pública como ‘instituição essencial à função jurisdicional do Estado’, de forma a impor a sua criação e organização na União e em todos os estados da federação, devendo incumbir a esta instituição pública a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, consoante preceitua o artigo 134 da Constituição. A grande maioria dos estados atualmente cumpre com este dever constitucional (...).Regulamentando a norma constitucional, a Lei Orgânica Nacional da Defensoria Pública (Lei Complementar n. 80/1994, com significativa alteração promovida pela LC 132/2009) definiu de modo mais preciso em seu artigo 1º: ‘A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, assim considerados na forma do inciso LXXIV do art. 5º da Constituição Federal’.O artigo 4º da aludida lei, o qual trata das atribuições funcionais da Defensoria Pública, prevê, ainda, que incumbe à instituição promover a mais ampla defesa dos direitos fundamentais dos necessitados (inc. X); exercer a defesa dos interesses individuais e coletivos da criança e do adolescente, do idoso, da pessoa portadora de necessidades especiais, da mulher vítima de violência doméstica e familiar e de outros grupos sociais vulneráveis que mereçam proteção especial do Estado (inc. XI); atuar na preservação e reparação dos direitos de pessoas vítimas de tortura, abusos sexuais, discriminação ou qualquer outra forma de opressão ou violência, propiciando o acompanhamento e o atendimento interdisciplinar das vítimas (inc. XVIII); além de representar aos sistemas internacionais de proteção dos direitos humanos, postulando perante seus órgãos (inc. VI).Percebe-se, portanto, que a opção legislativa expressa na reforma da lei nacional que organiza a Defensoria Pública no Brasil abraçou a atribuição conferida à instituição pelo artigo 28 da Lei Maria da Penha. Se já se podia depreender do cenário constitucional e legislativo que a Defensoria também é responsável pelo atendimento às vítimas de violações aos direitos humanos, atualmente as normas pertinentes também são cristalinas ao afirmar que as mulheres vítimas de violência doméstica e familiar integram este conceito e merecem o atendimento jurídico gratuito. Vê-se acima que o artigo 4º, inciso XI, da Lei Complementar nacional 80/1994 (com a alteração havida em 2009) expressa e especificamente elenca as mulheres abrangidas pela Lei Maria da Penha dentre os ‘grupos sociais vulneráveis que merecem proteção especial do Estado’, devendo-se incluir aqui o sistema de justiça.De forma complementar, cumpre salientar que o artigo 6º da Lei Maria da Penha – acompanhando as Convenções internacionais sobre direitos das mulheres ratificadas pelo Brasil – define a violência contra a mulher como uma das formas de violação dos direitos humanos. Essa definição, necessária na lei como forma de sublinhar uma mudança de paradigma na visão social, cultural e jurídica do tema (a qual infelizmente não datava de longa data), de forma bastante clara, igualmente traz a responsabilidade da Defensoria Pública, dentre outros órgãos e instituições públicas, de atuar contra a violação aos direitos das mulheres nesta situação de violência. Basta lembrar o artigo inaugural da lei nacional que organiza as Defensorias Públicas em todo o Brasil e incumbe à instituição a promoção dos direitos humanos.Destarte, o arcabouço normativo é bastante sólido nesta matéria, o que não impediu o surgimento de dúvidas quando da edição da lei – que perduram com menos força no presente momento, mais que ainda remanescem – quanto à assistência gratuita prestada pela Defensoria Pública a mulheres vítimas de violência que disponham de algum recurso financeiro.Para introduzir a análise do tema, é de suma relevância invocar as reflexões desenvolvidas em parecer jurídico da lavra da professora Ada Pellegrini Grinover, encartado na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3943, que tramita no Supremo Tribunal Federal sob a relatoria da Ministra Cármen Lúcia e versa sobre a legitimidade da Defensoria Pública para o ajuizamento de ações coletivas. Neste estudo, a autora se debruçou sobre a exegese das disposições constitucionais relativas à abrangência e aos destinatários da prestação de assistência jurídica gratuita pela instituição pública, invocando o conceito de necessitados organizacionais para a exata inteligência do disposto no artigo 134 da Constituição Federal.Segundo o parecer, o termo ‘necessitados’, utilizado pelo constituinte no aludido dispositivo – que incumbe à Defensoria Pública a sua defesa, em todos os graus – remete precipuamente à idéia de necessidade econômica, mas a ela não se limita. Isso porque, explica a autora, ‘existem os que são necessitados no plano econômico, mas também existem os necessitados do ponto de vista organizacional. Ou seja, todos aqueles que são socialmente vulneráveis’.Acrescenta, ainda, que ‘da mesma maneira deve ser interpretado o inc. LXXIV do art. 5º da CF: ‘O Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos’. A exegese do termo constitucional não deve limitar-se aos recursos econômicos, abrangendo recursos organizacionais, culturais, sociais’.Mesmo não sendo o atendimento jurídico às mulheres vítimas de violência o foco do parecer, os conceitos nele lançados trazem à baila uma reflexão sobre quais os efeitos produzidos pela escolha do legislador, estampada na Lei Complementar nacional n. 132/2009, de elencar as mulheres vitimadas pela violência doméstica e familiar dentre os ‘grupos sociais vulneráveis que mereçam proteção especial do Estado’. Não residiria aí um direcionamento no sentido de que a Defensoria Pública deve atuar na defesa destas mulheres independentemente de sua realidade econômica? Não se olvida que a assistência jurídica gratuita deve estar voltada muito especialmente à mulher vítima e carente de recursos financeiros, pois duplamente vulnerável e necessitada de amparo estatal, mas a peculiar situação de vulnerabilidade gerada pela violência doméstica e familiar autoriza a atuação da instituição pública que visa garantir o pleno acesso à justiça em todos os casos.A Constituição da República, ao tratar da assistência que deve ser prestada gratuitamente pelo Estado visando a garantir a democratização do acesso à justiça, refere-se à ‘assistência jurídica integral’ (art. 5º, inc. LXXIV, CR).É um construído já bastante consolidado a compreensão de que a expressão ‘assistência jurídica’ em muito se difere do termo ‘assistência judiciária’. Esta se limita à defesa jurídica desenvolvida em juízo, no curso de processo judicial ou procedimento preparatório. Aquela abrange a orientação jurídica em toda a sua amplitude, não só a que deve ser prestada aos atores processuais, como também, e principalmente, à população em geral, abarcando a educação em direitos, a mediação de conflitos e o desenvolvimento de diversas atividades que visam prevenir a violação de direitos.A educação em direitos, atividade de disseminação do conhecimento sobre o exercício de direitos, é sobremaneira importante na prevenção da violência doméstica e familiar contra a mulher, que exige, acima de tudo, uma profunda alteração cultural da sociedade ainda patriarcal. Desta forma, quando a Lei Maria da Penha garante às mulheres em situação de violência o ‘acesso aos serviços da Defensoria Pública’ exige que a assistência jurídica integral e gratuita seja prestada pelo Estado em toda a sua completude” (BELLOQUE, Juliana Garcia. Da Assistência Judiciária – artigos 27 e 28. In: CAMPOS, Carmen Hein de. Lei Maria da Penha comentada em uma perspectiva jurídico-feminista. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, pp. 337-346, grifos constantes do texto original).No ponto, portanto, não tem procedência a presente correição parcial.De se observar que se a mulher, vítima de violência doméstica, comparecer em juízo acompanhada de advogado constituído, é lógico que ficará sem efeito a habilitação da Defensoria Pública ou, por hipótese, a nomeação de defensor dativo.Não se há entender, nessas condições, em inversão tumultuária de atos ou fórmulas legais.(c) Da alegada incompatibilidade de a Defensoria Pública atuar como “assistente qualificada” da vítima e, ao mesmo tempo e no mesmo processo, na defesa do acusadoTambém sustentou a representante do Ministério Público, subscritora da inicial desta correição parcial, que as decisões impugnadas geraram tumulto processual ao colocar a Defensoria Pública, instituição una e indivisível (CF, art. 134, §4º), em polos opostos da mesma relação processual, pois atuará em prol dos interesses da mulher vítima de violência doméstica e, ao mesmo tempo e no mesmo processo, na defesa de seu algoz, o acusado.Sem razão.O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso em Mandado de Segurança nº 45.793/SC, decidiu que “Não existe empecilho a que a Defensoria Pública represente, concomitantemente, através de Defensores distintos, vítimas de um delito, habilitadas no feito como assistentes de acusação, e réus no mesmo processo, pois tal atuação não configura conflito de interesses, assim como não configura conflito de interesses a atuação do Ministério Público no mesmo feito como parte e custos legis, podendo oferecer opiniões divergentes sobre a mesma causa. Se assim não fosse, a alternativa restante implicaria reconhecer que caberia à Defensoria Pública escolher entre vítimas e réus num mesmo processo os que por ela seriam representados excluindo uns em detrimento de outros. Em tal situação, o resultado seria sempre o de vedação do acesso à Justiça a alguns, resultado que jamais se coadunaria com os princípios basilares de igualdade e isonomia entre cidadãos que norteiam a Constituição, inclusive na forma de direitos e garantias fundamentais (art. 5º, caput, CF) que constituem cláusula pétrea (art. 60, §4º, IV da CF)” (5ª Turma, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. em 07.06.2018).Ora, se não há empecilho de a Defensoria Pública atuar, concomitantemente no mesmo processo, por intermédio de defensores distintos, como “assistente de acusação” e na “defesa do réu”, também não há, em tais condições, como “assistente qualificada”, cuja atuação, como adiante se verá, é muito menos abrangente, pois a maiori, ad minus, ou seja, quem pode o mais, pode o menos.Também não procede, no ponto, a presente correição parcial, pois não houve inversão tumultuária de atos ou fórmulas legais.(d) Da alegada afronta ao princípio da legalidade porque se criou uma figura processual não prevista em lei. Necessidade de se estabelecer limites da “assistência qualificada”Ainda sustentou a representante do Ministério Público, subscritora da inicial desta correição parcial, ter ocorrido afronta ao princípio da legalidade com a criação de figura processual não prevista em lei, alargando o polo acusatório.Aqui assiste-lhe razão, sendo conveniente deixar assentado, por meio desta via jurisdicional, os limites da “assistência qualificada” da mulher vítima de violência doméstica, visando afastar eventuais e futuras arguições de nulidade processual.Isso porque, conforme se infere da manifestação de mov. 32.1 destes autos, a Defensoria Pública, reportando-se à Nota Técnica nº 04/2022/NUDEM/DPE-PR (mov. 23.2), enfatizou que devem ser superados os questionamentos acerca dos limites da sua atuação em casos como o presente; que, de acordo com a vigente ordem constitucional, a Defensoria Pública em nosso Estado Democrático de Direito foi colocada em situação de paralelismo com o Ministério Público, enquanto também instituição de defesa da sociedade na linha do acesso à jurisdição; que a “assistência qualificada” à vítima pode coincidir com a “assistência de acusação”, a depender do interesse da vítima; e que, nesse sentido, o Conselho Nacional dos Defensores Públicos Gerais (CONDEGE) emitiu o Enunciado VI, com o seguinte teor: “Considerando o art. 4º, inciso XI e XVIII, da Lei Complementar 80/1994, a atuação da Defensoria Pública na defesa da mulher em situação de violência doméstica e familiar, conforme prelecionam os artigos 27 e 28 da Lei Maria da Penha, é plena e não se confunde com a assistência de acusação dos artigos 268 e seguintes do CPP” (mov. 32.1 destes autos).Na referida Nota Técnica, para além disso, também consta que “uma leitura conjunta da Constituição Federal, da Lei Orgânica da Defensoria Pública e da Lei Maria da Penha nos permite concluir que à defesa da mulher são concedidas as mesmas prerrogativas, direitos e garantias concedidas à defesa do réu, como o direito à ampla defesa, de peticionamentos nos autos, requerimentos, juntada de documentos, arrolamento de testemunhas no prazo legal, participação em Plenária de Júri e demais atos necessários e legais que visem a garantir os direitos das mulheres, quando elas, em conjunto com sua Defesa, entendem necessários e eficazes”. A “assistência qualificada”, assim batizada pelo intérprete dos arts. 27 e 28 da Lei Maria da Penha, tem por finalidade, como se disse linhas atrás, em síntese, garantir à mulher, vítima de violência doméstica, atendimento específico e humanizado para proteção da sua integridade psíquica e emocional, evitando-se uma execrável revitimização pela avaliação indesejada do seu comportamento nos fatos levados à apreciação do Estado-juiz. Garantia, também, de que será adequadamente informada das consequências jurídicas das suas escolhas, seja em relação ao agressor, seja em relação a ela própria, seja em relação à sua família, tendo em vista a possibilidade da irradiação de efeitos em outras searas (v.g. família, cível ou empresarial).Assim, os mencionados arts. 27 e 28 da Lei Maria da Penha, antes transcritos em sua integralidade, não criaram uma nova modalidade de intervenção de terceiros no âmbito do processo penal. A “assistência qualificada” destina-se apenas à orientação e proteção da vítima. Não se trata, portanto, de uma atuação ampla, vale dizer, sem balizas, com poderes postulatórios ilimitados.A atuação ampla, nos moldes preconizados pela Nota Técnica trazida aos autos pela Defensoria Pública, só poderá ser exercida de acordo com os ditames da “assistência de acusação”, nos termos dos arts. 268 e seguintes do Código de Processo Penal.Nesse sentido, o Enunciado nº 51 da Comissão Permanente de Combate à Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher (COPEVID), aprovado na II Reunião Ordinária do GNDH de 06.09.2018, estabelecendo que “O direito à assistência judiciária da mulher em situação de violência doméstica e familiar, previsto no artigo 27 da Lei Maria da Penha, não confere ao advogado ou ao defensor público os direitos de assistente de acusação, se não houver habilitação segundo o CPP”.Nessa linha de compreensão, esta Câmara Criminal, em julgado de relatoria do Desembargador Miguel Kfouri Neto, assim decidiu:“VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER. LESÃO CORPORAL (ART. 129, § 9º, CP). CONDENAÇÃO À PENA DE TRÊS (3) MESES DE DETENÇÃO, EM REGIME ABERTO. RECURSO DA DEFESA. 1) PRELIMINAR SUSCITADA PELA PROCURADORIA-GERAL DE JUSTIÇA DE INAPTIDÃO DE JULGAMENTO DO APELO, POR AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DA VÍTIMA COMO ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO, PARA SE MANIFESTAR SOBRE O RECURSO INTERPOSTO. REJEIÇÃO. OFENDIDA APENAS ACOMPANHADA DA DEFENSORIA PÚBLICA. 2) PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. NÃO ACOLHIMENTO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. PALAVRA DA VÍTIMA COERENTE E HARMÔNICA, EM CONSONÂNCIA COM AS DEMAIS PROVAS CONSTANTES DOS AUTOS. EXISTÊNCIA DE LAUDO PERICIAL ATESTANDO A OCORRÊNCIA DE LESÃO CORPORAL. LEGÍTIMA DEFESA NÃO COMPROVADA NOS AUTOS. REQUISITOS DA EXCLUDENTE DA ILICITUDE NÃO EVIDENCIADOS NO CASO CONCRETO. PRETENSÃO DE REDUÇÃO DA PENA E APLICAÇÃO DA FIGURA DO PRIVILÉGIO (ART. 129, §4º, CP). INVIABILIDADE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE QUE O ACUSADO AGIU SOB DOMÍNIO DE VIOLENTA EMOÇÃO, LOGO APÓS INJUSTA PROVOCAÇÃO DA VÍTIMA. RECURSO DESPROVIDO” (Apelação Criminal nº 0006558-46.2014.8.16.0011, j. em 14.03.2022, destacou-se).Do voto do Relator colhe-se, no ponto em destaque, que “Inicialmente, em que pesem as considerações da douta Procuradoria-Geral de Justiça em seu parecer (mov. 26.1), não vislumbro a necessidade de incluir a vítima como assistente de acusação ou fazê-la figurar como parte apelada.Não se pode confundir a figura do assistente de acusação com a denominada ‘assistência qualificada’ prevista na Lei Maria da Penha (art. 27, da Lei nº 11.340/06), que impõe que a mulher em situação de violência doméstica e familiar deverá estar acompanhada de advogado em todos os atos processuais.Observe-se que em momento algum foi admitido nos autos a inclusão da vítima M.R.S.R. como assistente de acusação.O que se verifica é que a ora ofendida foi acompanhada pela Defensoria Pública durante a marcha processual e, quando de sua ausência, como na audiência de instrução, foi-lhe nomeado defensor dativo para representá-la, cumprindo-se assim a exigência legal.Desnecessária, portanto, a intimação da vítima para apresentação de contrarrazões recursais”. Diante, portanto, de tudo que se expôs, é de se ver que integral razão assiste ao Juiz Daniel Ribeiro Surdi de Avelar ao concluir, em seu artigo antes mencionado, que a “assistência qualificada” “tampouco autoriza uma participação diversa da prévia orientação e acompanhamento do depoimento. Ou seja, resta vedado que tal profissional passe a inquirir a vítima (ou testemunhas/informantes), interrogar o acusado, juntar documentos, oferecer alegações finais, etc. Para tanto, faz-se necessária a formalização da atuação como assistente de acusação, a qual, sem prejuízo de posterior adequação, pode ser autorizada no mesmo ato, fazendo-se constar da ata da audiência. Agir de modo contrário é subverter as regras de regência do rito do júri, ou seja, o CPP. Se a intenção da LMP fosse a de criar uma nova figura processual para além da assistência de acusação, ou, quando menos, equiparar a assistência qualificada às prerrogativas de tal figura processual, teria assim previsto expressamente na própria lei, ou acrescentado regra própria no corpo do CPP.Uma interpretação ampliativa de tal figura (’assistência qualificada’) coloca em risco outras regras e princípios, em especial, o devido processo legal, a paridade de armas e a plenitude de defesa. A atuação no rito do júri, em especial, no plenário, é regida por regras específicas que estipulam prazo para a habilitação (CPP, artigo 430), juntada de documentos (CPP, artigo 479), nulidades de plenário (CPP, artigo 478), dentre outras, que visam equilibrar o julgamento e precisam ser respeitadas.Tal entendimento em nenhum momento contribuiria para que a vítima restasse desamparada ou deixasse de ter a visibilidade que a lei lhe conferiu, pois, mesmo não possuindo recursos para contratar um advogado, nada impediria que a própria Defensoria Pública atuasse na qualidade de assistente da acusação:(...)Cientes somos da existência de forte e embasado entendimento em sentido diverso, porém, compreendemos que não é admissível a atuação no plenário do Tribunal do Júri — espaço iluminado pela plenitude de defesa — sem a adequação à vestimenta adequada, ou seja, desuniformizada de uma das figuradas delimitadas pelo Código de Processo Penal, pois, tal agir, seria forjar um novo corpo sem prévia fixação de seus direitos e obrigações. Ademais, a inarredável proteção das vítimas não pode solapar, em desmedida proporção, os direitos do acusado e o fair trial. Voltemos os olhos para o que reza o Estatuto de Roma (artigo 68, 1 e 3) quando trata da bilateralidade de direitos:‘1. O Tribunal adotará as medidas adequadas para garantir a segurança, o bem-estar físico e psicológico, a dignidade e a vida privada das vítimas e testemunhas. Para tal, o Tribunal levará em conta todos os fatores pertinentes, incluindo a idade, o gênero tal como definido no parágrafo 3º do artigo 7º, e o estado de saúde, assim como a natureza do crime, em particular, mas não apenas quando este envolva elementos de agressão sexual, de violência relacionada com a pertença a um determinado gênero ou de violência contra crianças. O Procurador adotará estas medidas, nomeadamente durante o inquérito e o procedimento criminal. Tais medidas não poderão prejudicar nem ser incompatíveis com os direitos do acusado ou com a realização de um julgamento equitativo e imparcial.3. Se os interesses pessoais das vítimas forem afetados, o Tribunal permitir-lhes-á que expressem as suas opiniões e preocupações em fase processual que entenda apropriada e por forma a não prejudicar os direitos do acusado nem a ser incompatível com estes ou com a realização de um julgamento equitativo e imparcial. Os representantes legais das vítimas poderão apresentar as referidas opiniões e preocupações quando o Tribunal o considerar oportuno e em conformidade com o Regulamento Processual’.Assim, tal entendimento não possui qualquer função limitativa dos direitos da mulher, e sim o oposto. Ter a compreensão de que a mulher pode se fazer ouvir em plenário pelo meio e modo adequado, qual seja, mediante a figura de assistente de acusação é garantir que sua participação seja ampliada, possibilitando-se, por exemplo, a juntada de documentos aos autos, a inquirição das testemunhas, a sustentação em plenário em voz até mesmo dissonante do membro do Ministério Público, o retorno em réplica, a interposição de recurso, etc. Por outro lado, a presença pelo meio e modo inadequado pode acarretar dois grandes problemas: (1) a vedação da sua atuação em plenário pelo magistrado; e, (2) a possível anulação do julgamento pelas vias recursais, momento em que a grande prejudicada será a própria vítima diante do atraso na prestação jurisdicional e na possibilidade de que o acusado, estando preso, seja colocado em liberdade.A luta contra a violência estrutural é uma bandeira de todos, mas qualquer batalha, para ser legítima, deve ser feita dentro do campo de batalha e com o necessário respeito às regras” (fonte citada, grifos constantes do texto original).Mais não é preciso dizer, de modo que a atuação do “assistente qualificado” fora dos limites aqui estabelecidos acarretará, sim, erro in procedendo pela inversão tumultuária de atos e fórmulas legais.Impõe-se, pois, a parcial da procedência da presente correição parcial para que a “assistência qualificada” desempenhada nos autos de origem pela Defensoria Pública siga os limites aqui estabelecidos.Determina-se, outrossim, que se expeça ofício ao Senhor Corregedor-Geral da Justiça para ser anotado elogio na ficha funcional do Juiz de Direito Daniel Ribeiro Surdi de Avelar em razão da excelente atuação à frente da 2ª Vara Privativa do Tribunal do Júri de Curitiba e do seu trabalho doutrinário, antes citado, que muito contribuiu para o julgamento desta correição parcial. É como voto.
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