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Acórdão
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1.
Relatório: Trata-se de agravo de instrumento interposto por PEDRO CARNEIRO LOBO JUNIOR contra a decisão proferida em fase de Cumprimento de Sentença, na qual o MM. Juiz a quo indeferiu o pedido de impenhorabilidade da conta bloqueada do executado, sob o fundamento de que a parte não trouxe qualquer indicativo da verba bloqueada ser essencial ao custeio do devedor, uma vez que o mero fato do bloqueio ser inferior a 40 salários-mínimos não induz em automática impenhorabilidade, mormente considerando inexistir informações de outras rendas ou atividades remuneradas exercidas pelos demandados. Ademais, indeferiu o pedido de diligenciar junto ao Banco onde ocorreu o bloqueio, por envolver quebra de sigilo bancário (mov. 292.1). Como razões de irresignação, sustenta o agravante, em síntese, a impenhorabilidade dos valores bloqueados em quantia inferior a quarenta salários mínimos, seja qual for a natureza da conta onde esteja mantida. Caso não seja reconhecida a impenhorabilidade pela verba ser inferior a 40 salários mínimos, requer a expedição de ofício à instituição financeira para informar a natureza da conta e a movimentação nos últimos 12 (doze) meses, para verificar sua impenhorabilidade. Determinei o processamento do recurso e deferi o pedido de efeito suspensivo (mov. 19.1). O Juízo singular prestou informações (mov. 24.2) e a parte agravada deixou de apresentar contrarrazões (mov. 26). É o relatório, em síntese.
2.
Voto: Presentes os pressupostos recursais de admissibilidade intrínsecos (legitimidade, interesse, cabimento e inexistência de fato impeditivo e extintivo) e extrínsecos (tempestividade e regularidade formal), conheço do recurso. Conforme relatado, trata-se de irresignação contra a decisão que indeferiu o pedido de declaração de impenhorabilidade apresentado pelo executado. Em que pesem os fundamentos indicados pelo juízo de primeiro grau, verifica-se ser necessário dar provimento ao agravo. Isto porque, conforme entendimento da jurisprudência, a previsão do artigo 833, inciso X, do CPC, é extensível à conta corrente, quando não ultrapasse 40 (quarenta) salários mínimos, especialmente valor aproximado de um salário mínimo. “Art. 833. São impenhoráveis: (...). IV - Os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, ressalvado o § 2º; (...). X - a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos”.
Sobre o tema, o próprio Superior Tribunal de Justiça possuía entendimento divergente a respeito do tema aqui tratado, o que foi superado por ocasião do julgamento proferido no REsp nº 1.230.060/PR – Relª. Minª. Maria Isabel Gallotti – 2ª Seção – DJe 29-8- 2014, bem como EREsp nº 1.330.567/RS – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – 2ª Seção – DJe 19-12-2014. A partir desse movimento, pacificou-se a jurisprudência na Corte Superior. O julgamento proferido pela 2ª Seção do STJ no REsp nº 1.230.060/PR foi assim ementado: “Recurso Especial. Processual Civil. Impenhorabilidade. Artigo 649, IV e X, do CPC. Fundo de investimento. Poupança. Limitação. Quarenta salários mínimos. Parcial provimento. 1. A remuneração a que se refere o inciso IV do art. 649 do CPC é a última percebida, no limite do teto constitucional de remuneração (CF, art. 37, XI e XII), perdendo esta natureza a sobra respectiva, após o recebimento do salário ou vencimento seguinte. Precedente. 2. O valor obtido a título de indenização trabalhista, após longo período depositado em fundo de investimento, perde a característica de verba salaria impenhorável (inciso IV do art. 649). Reveste-se, todavia, de impenhorabilidade a quantia de até quarenta salários mínimos poupada, seja ela mantida em papel-moeda; em conta-corrente; aplicada em caderneta de poupança propriamente dita ou em fundo de investimentos, e ressalvado eventual abuso, má-fé, ou fraude, a ser verificado caso a caso, de acordo com as circunstâncias da situação concreta em julgamento (inciso X do art. 649). 3. Recurso especial parcialmente provido. ” Observa-se, portanto, que o Superior Tribunal de Justiça fixou entendimento no sentido de que o escopo da impenhorabilidade prevista no artigo 649, inciso X, do Código de Processo Civil de 1973 (correspondente ao art. 833, inc. X, do CPC/2015) é o de proteção do mínimo existencial do devedor, estabelecido pela lei a fim de garantir a dignidade da pessoa humana. Nesse esteio, a terminologia “poupança” empregada pelo legislador cuida, em verdade, da reserva monetária feita pela pessoa, independente da origem desse capital ou da qualidade que o depósito assuma (conta poupança, conta corrente, aplicação financeira, etc.). A lei processual presume, deste modo, que os valores até 40 (quarenta) salários mínimos objetivam assegurar a subsistência do seu titular e sua família, cobrir eventuais despesas extraordinárias ou até mesmo proporcionar o bem-estar. Assim, a interpretação da lei deve ser extensiva, até mesmo porque o artigo 833, inciso X, do CPC, não faz qualquer ressalva sobre o modo de movimentação da conta poupança. No mesmo sentido o posicionamento jurisprudencial em casos semelhantes: DIREITO CIVIL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. BLOQUEIO E PENHORA DE VALORES QUE ESTÃO EM CONTA BANCÁRIA. MONTANTE INFERIOR A 40 (QUARENTA) SALÁRIOS MÍNIMOS. APLICAÇÃO DO INC. X DO ART. 833 DA LEI N. 13.105/2015 (CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL). INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. IMPENHORABILIDADE. EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO AO BANCO. MEDIDA INÓCUA COM A LIBERAÇÃO DA CONSTRIÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS, EM SEDE RECURSAL. MAJORAÇÃO QUANTITATIVA. INAPLICABILIDADE DO § 11 DO ART. 85 DA LEI N. 13.105/2015.1. Inicialmente, sabe-se que valores inferiores a 40 (quarenta) salários mínimos depositados em caderneta de poupança são tidos como impenhoráveis, conforme dispõe o inc. X do art. 833 da Lei n. 13.105/2015 (Código de Processo Civil). 2. Todavia, o egrégio Superior Tribunal de Justiça já exarou entendimento jurisprudencial no sentido de que são impenhoráveis valores inferiores à 40 (quarenta) salários mínimos depositados em quaisquer aplicações financeiras, precedente aplicável ao vertente caso legal (concreto).3. Ademais, entende-se que, uma vez provido o pleito para liberação dos valores constritos, a expedição de ofício, tal como exposto nas razões recursais, tornou-se inócua, isto é, perdeu a utilidade, haja vista que não há necessidade, nesse momento processual, em identificar a origem dos valores e a natureza da conta bancária.4. Recurso de agravo de instrumento conhecido, e, no mérito, parcialmente provido.(TJPR - 17ª C.Cível - 0037197-02.2022.8.16.0000 - Curitiba - Rel.: ROTOLI DE MACEDO - J. 03.10.2022) AGRAVO DE INSTRUMENTO. HABILITAÇÃO DE CRÉDITO. AGRAVANTE AUTORA NA HABILITAÇÃO CONDENADA AO PAGAMENTO DE CUSTAS. BLOQUEIO DE VALORES PARA QUITAÇÃO DAS CUSTAS. DECISÃO AGRAVADA QUE RECONHECEU A IMPENHORABILIDADE DOS VALORES DEPOSITADOS EM CONTA POUPANÇA E REJEITOU O PEDIDO DE IMPENHORABILIDADE DOS VALORES DEPOSITADOS EM CONTA CORRENTE (APENAS R$ 12,55). INSURGÊNCIA DA EXECUTADA. ACOLHIMENTO NO CASO CONCRETO. INCIDÊNCIA DO ART. 833, X, DO CPC. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. DECLARAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE DOS VALORES INFERIORES A 40 SALÁRIOS MÍNIMOS, AINDA QUE DEPOSITADOS EM CONTA CORRENTE.PRECEDENTES DO STJ E DESTE TRIBUNAL. ADEMAIS, PARTE EXECUTADA BENEFICIÁRIA DA JUSTIÇA GRATUITA. OBSERVÂNCIA DO ARTIGO 98, §1º, INCISO II. DECISÃO REFORMADA. RECURSO PROVIDO. (TJPR - 17ª C.CÍVEL - 0006437-70.2022.8.16.0000 - CASCAVEL - REL.: DESEMBARGADOR TITO CAMPOS DE PAULA - J. 02.05.2022) AGRAVO DE INSTRUMENTO – CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – DECISÃO DE ORIGEM QUE REJEITOU A IMPUGNAÇÃO À PENHORA APRESENTADA PELA EXECUTADA – ALEGAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE – ART. 833, X, DO CPC – PROTEÇÃO A VALORES ABAIXO DO MONTANTE ESTIPULADO APLICADOS EM CONTA POUPANÇA OU CONTA CORRENTE – IMPENHORABILIDADE RECONHECIDA – VALOR BLOQUEADO INFERIOR A 40 (QUARENTA) SALÁRIOS-MÍNIMOS – IMPENHORABILIDADE DOS VALORES – PROTEÇÃO À DIGNIDADE DA AGRAVANTE -ENTENDIMENTO CONSOLIDADO DO STJ E DESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA – DECISÃO REFORMADA – AGRAVO CONHECIDO E PROVIDO.(TJPR - 18ª C.Cível - 0041517-95.2022.8.16.0000 - Curitiba - Rel.: JUÍZA DE DIREITO SUBSTITUTO EM SEGUNDO GRAU ANA PAULA KALED ACCIOLY RODRIGUES DA COSTA - J. 03.10.2022) No mais, quanto ao requerimento formulado pelo agravante para expedição de ofício à instituição financeira em que ocorreram os bloqueios, entendo que o pedido fica prejudicado, diante do reconhecimento da impenhorabilidade do valor bloqueado na conta bancária do executado/agravante. Diante de todo o exposto, impõe-se a reforma da decisão agravada, reconhecendo-se a impenhorabilidade dos valores bloqueados, dando-se provimento ao recurso, portanto.
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