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Acórdão
Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Acórdão. Eventuais imagens serão suprimidas.
1. RELATÓRIO. Tratam os autos de apelações cíveis interpostas por Leonardo Haura e Marcio Geraldo Bernardo em face da r. sentença (mov. 297.1 dos autos nº 0014956-79.2019.8.16.0019 e 183.1 dos autos nº 0015031-21.2019.8.16.0019) proferida nos autos das ações indenizatórias mencionadas, que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para condenar os réus, solidariamente, ao pagamento em favor de cada um dos demandantes de indenização por danos morais no importe de R$ 20.000,00 e por danos estéticos no montante de R$ 10.000,00, com correção monetária pelo INPC desde o arbitramento e juros de mora de 1% ao mês a partir do evento danoso, descontadas as quantias de R$ 1.788,75 (de Luis Miguel) e R$ 2.362,50 (de Wilfrido), recebidas a título de indenização pelo seguro obrigatório DPVAT.Pela sucumbência mínima dos autores, condenou os requeridos, solidariamente, ao pagamento das custas, despesas processuais e dos honorários advocatícios, fixados em 20% sobre o valor da condenação, ressalvada a gratuidade judicial.Nas razões recursais (mov. 301.1 dos autos nº 0014956-79.2019.8.16.0019 e 187.1 dos autos nº 0015031-21.2019.8.16.0019), Leonardo Haura e Marcio Geraldo Bernardo sustentaram que o acidente ocorre por culpa exclusiva do autor Luis Miguel, que trafegava em alta velocidade e com os faróis da motocicleta apagados em horário de baixa visibilidade devido ao crepúsculo. Afirmaram que o corréu condutor do veículo observou as normas de trânsito e que, no local, existe um pico que impossibilita a visualização de automóveis. Subsidiariamente, pleitearam o reconhecimento da culpa concorrente entre as partes. Alegaram a inexistência de danos morais indenizáveis, já que o requerente Luis Miguel afirmou, no depoimento pessoal, que não estava trabalhando na época do sinistro e que o fato de ter apresentado um possível estresse pós-traumático não indica quadro clínico grave. Aduziram que o demandante Wilfrido não comprovou as alegações no sentido de que trabalhava de motoboy, tampouco os respectivos rendimentos. Destacaram não se tratar de dano moral presumido, requerendo o afastamento da condenação. Apontaram, também, a inexistência de danos estéticos, porquanto o laudo pericial fez apenas uma análise genérica, deixando de examinar o caso concreto. Impugnaram a utilização do Código Penal como parâmetro para aferição da gravidade das lesões, asseverando que as cicatrizes não são aparentes. Aduziram que as lesões não são capazes de colocar os autores em situação de constrangimento, razão pela qual pleitearam a reforma da sentença também neste ponto. Requereram, subsidiariamente, a redução do valor das indenizações, à luz dos princípios da proporcionalidade, razoabilidade e dos precedentes desta Corte, assim como a redução da verba honorária sucumbencial.Foram apresentadas contrarrazões (mov. 305.1 dos autos nº 0014956-79.2019.8.16.0019 e 191.1 dos autos nº 0015031-21.2019.8.16.0019).Nesta instância, foi determinado o apensamento aos autos n° 0015031-21.2019.8.16.0019 para julgamento em conjunto (mov. 9.1-TJ dos autos nº 0014956-79.2019.8.16.0019), o que foi cumprido (mov. 10-TJ dos autos nº 0014956-79.2019.8.16.0019).Na sequência, considerando que foi imputado ao Estado do Paraná o pagamento dos honorários periciais, foi determinada a intimação do ente público (mov. 12.1-TJ dos autos nº 0014956-79.2019.8.16.0019 e 15.1-TJ dos autos nº 0015031-21.2019.8.16.0019), o qual manifestou concordância com o valor dos honorários periciais, afirmando não possuir interesse em recorrer (mov. 18.1-TJ dos autos nº 0014956-79.2019.8.16.0019 e 21.1-TJ dos autos nº 0015031-21.2019.8.16.0019).Em síntese, é o relatório.
2. FUNDAMENTAÇÃO. Admissibilidade Presentes os pressupostos de admissibilidade intrínsecos e extrínsecos, conheço ambos os recursos, os quais, em razão das matérias alegadas, serão examinados em conjunto.Ainda, cumpre registrar que as movimentações processuais citadas são referentes aos autos nº 0014956-79.2019.8.16.0019; quando necessário, o processo nº 0015031-21.2019.8.16.0019 será expressamente mencionado. Síntese fática Por brevidade, transcrevo o relatório da r. sentença, a fim de elucidar a matéria discutida nos autos (mov. 297.1, p. 01/05): Autos nº 0014956-79.2019.8.16.0019 Trata-se de ação de reparação de danos materiais, morais e estéticos por acidente de trânsito, ajuizada por LUIS MIGUEL OCAMPO HENKER em face de MARCIO GERALDO BERNARDO e LEONARDO HAURA. Alega o autor, em síntese: i) que no dia 15/06/2018, aproximadamente às 17h45m, quando trafegava no cruzamento entre as ruas Doutor Joaquim Meneleu de Almeida Torres e Dario Veloso, foi abalroado transversalmente pelo veículo Renault Master – cor prata – placas ASF-4067, que transitava em sentido contrário e cruzou a preferencial, sendo, assim, o responsável pelo acidente; ii) que o veículo Renault era de propriedade do segundo réu, sendo que na data do acidente estava sendo conduzido pelo primeiro réu; iii) que ao cruzar as ruas mencionadas, o réu não respeitou a via preferencial, causando grandes ferimentos no autor e na pessoa que estava em sua garupa de carona – Wilfrido Serna Jimenez; iv) que em virtude do acidente, sofreu diversos danos em sua saúde, como fratura diafisária de rádio e ulna, fratura transversa de fêmur, fratua diafisária com asa da tíbia e fíbula, grande dificuldade de caminhar, tremores, dificuldade para dormir e ansiedade; v) que foi necessárias a colação de fixadores – 16o fixador externo transarticular em MIE e tala fixador e MSE e 17o PO de fixação de fratura em MSE e recolocação de fixador externo em fêmur e haste de fêmur. Diante de tais fatos, ajuizou a presente demanda pleiteando a condenação da parte ré ao pagamento de indenização a título de danos morais e estéticos no importe de R$ 60.000,00. Deferidos os benefícios da justiça gratuita ao autor (evento 23.1). Audiência de mediação infrutífera, diante do não comparecimento do réu Leonardo Haura, o qual não fora citado, bem como pela ausência de acordo entre as partes (evento 40.1).Realizada nova audiência de mediação, esta restou infrutífera, tendo em vista a ausência das partes (evento 93.1).Citados (eventos 36.1 e 63.1), os réus apresentaram contestação, suscitando como preliminar a conexão com os autos nº 0015031-21.2019.8.16.0019, que têm pedido e causa de pedir idênticos aos do presente processo, distinguindo apenas no que diz respeito à parte autora. Quanto ao mérito, alegou (sic), em síntese: i) que no dia 15/06/2018, aproximadamente às 17h45min, o réu MARCIO GERALDO BERNARDO dirigia o veículo Renault Master com os faróis acesos e ao se aproximar do cruzamento entre as ruas Doutor Joaquim Meneleu de Almeida Torres e Dario Veloso, reduziu a velocidade e sinalizou que realizaria conversão à esquerda; ii) que ao realizar a conversão, foi surpreendido pela motocicleta do autor, que trafegava em alta velocidade e com os faróis apagados; iii) que no dia do abalroamento, as condições climáticas eram de chuva fraca, estando a superfície da via molhada e com a visibilidade dificultada pelo crepúsculo; iv) que a colisão ocorreu por culpa exclusiva da vítima, que não observou as leis de trânsito; v) que os réus prestaram socorro ao autor no local do fato e estiveram no hospital para obter informações sobre seu estado de saúde. Diante de tais fatos, pugnou pela determinação de reunião do presente processo com os autos nº 0015031-21.2019.8.16.0019, bem como o recebimento da contestação em todos os seus fundamentos, especialmente quanto à excludente de responsabilidade civil por culpa exclusiva da vítima, sendo julgados totalmente improcedentes os pedidos iniciais. Houve réplica (evento 98.1). Facultada a especificação de provas (evento 99.1), a parte autora manifestou-se favorável ao julgamento antecipado da lide e, subsidiariamente, requereu prova oral e documental (evento 106.1). A parte ré, por sua vez, manifestou interesse na produção de prova documental e pericial (evento 107.1). Através da decisão saneadora (evento 110.1), a preliminar de conexão arguida pela parte ré foi acolhida, sendo determinado que os processos sejam apensados a fim de serem instruídos e julgados conjuntamente. Além disso, foram fixados os pontos controvertidos e estabelecida a distribuição do ônus da prova de maneira ordinária. Por fim, restou deferida a produção de prova oral, consistente na tomada dos depoimentos pessoais dos autores e do réu Márcio, e na inquirição de testemunhas. Restou deferida, também, a produção de prova documental, sendo postergada a análise do pedido de produção de prova pericial médica para apuração dos danos estéticos. Apensado ao processo nº 0015031-21.2019.8.16.0019 (evento 132).Aberta audiência de instrução e julgamento, foram colhidos os depoimentos pessoais dos autores e do réu Márcio, bem como inquiridas três testemunhas arroladas pela parte autora, com a dispensa das demais (evento 133.1). Deferida a produção de prova pericial médica, a fim de apurar a existência de danos estéticos aos autores, relacionados ao acidente objeto desta lide e, sobretudo, a extensão destes para fins de fixação de eventual indenização (evento 135.1). As partes indicaram assistente técnico, bem como apresentaram quesitos. Ainda, a parte ré apresentou impugnação aos quesitos 1, 2, 5 e 6, apresentados pela parte autora, alegando se tratarem de eventuais danos morais (eventos 142.1 e 143.1). Rejeitada a impugnação aos quesitos 1, 2, 5 e 6, apresentados pelos autores, e deferidos os benefícios da justiça gratuita aos réus (evento 184.1). Laudo de perícia médica (evento 253.1) e manifestação das partes (eventos 260.1 e 261.1). Apresentação de alegações finais por memoriais (eventos 271.1 e 272.1). Expedição de ofício à Seguradora Líder do Consórcio do Seguro DPVAT, a fim de apurar eventual recebimento de indenização pelos autores em decorrência do acidente de trânsito ocorrido em 15/06/2018 (evento 275.1). Resposta de ofício indicando que houve o pagamento de indenização do seguro DPVAT, por invalidez permanente em razão do acidente de trânsito ocorrido em 15/06/2018, com as vítimas LUIS MIGUEL OCAMPO HENKER e WILFRIDO SERNA JIMENEZ, nos valores de R$ 1.788,75 (mil setecentos e oitenta e oito reais e setenta e cinco centavos) e R$ 2.362,50 (dois mil, trezentos e sessenta e dois reais e cinquenta centavos), respectivamente (eventos 286.1 e 291.1).Autos nº 0015031-21.2019.8.16.0019Trata-se de ação de reparação de danos materiais, morais e estéticos por acidente de trânsito, ajuizada por WILFRIDO SERNA JIMENEZ em face de MARCIO GERALDO BERNARDO e LEONARDO HAURA. Alega o autor, em síntese: i) que no dia 15/06/2018, aproximadamente às 17h45m, trafegava, na qualidade de carona/garupa, na motocicleta que era conduzida por Luis Miguel Ocampo Henker, no cruzamento entre as ruas Doutor Joaquim Meneleu de Almeida Torres e Dario Veloso, momento em que foram abalroados transversalmente pelo veículo Renault Master – cor prata – placas ASF-4067, que transitava em sentido contrário e cruzou a preferencial; ii) que o veículo Renault era de propriedade do segundo réu, sendo que na data do acidente estava sendo conduzido pelo primeiro réu; iii) que ao cruzar as ruas mencionadas, o réu não respeitou a via preferencial, causando grandes ferimentos ao autor e ao condutor da motocicleta, Luis Miguel; iv) que em virtude do acidente, sofreu diversos danos em sua saúde, como trauma com edema na coxa esquerda, fratura de diáfise com fêmur com desvio, fratura exposta grau III – que necessitou de cirurgia com urgência -, sendo necessária a colocação de fixador externo linear e pinos Shantz. Diante de tais fatos, ajuizou a presente demanda pleiteando a condenação da parte ré ao pagamento de indenização a título de danos morais e estéticos no importe de R$ 60.596,51. A parte autora apresentou emenda à inicial (evento 13.2), a qual foi recebida. Ainda, foram deferidos os benefícios da justiça gratuita ao autor (evento 24.1). Audiência de mediação infrutífera diante da ausência de acordo entre as partes (evento 74.1).Citados (eventos 37.1 e 62.1), os réus apresentaram contestação (evento 75.1), suscitando como preliminar a conexão com os autos nº 0014956-79.2019.8.16.0019, que têm pedido e causa de pedir idênticos aos do presente processo, distinguindo apenas no que diz respeito à parte autora. Quanto ao mérito, alegou, em síntese: i) que no dia 15/06/2018, aproximadamente às 17h45min, o réu MARCIO GERALDO BERNARDO dirigia o veículo Renault Master, com os faróis acesos e ao se aproximar do cruzamento entre as ruas Doutor Joaquim Meneleu de Almeida Torres e Dario Veloso, reduziu a velocidade e sinalizou que realizaria conversão à esquerda; ii) que. ao realizar a conversão, foi surpreendido pela motocicleta do autor, que trafegava em alta velocidade e com os faróis apagados; iii) que no dia do abalroamento, as condições climáticas eram de chuva fraca, estando a superfície da via molhada e com a visibilidade dificultada pelo crepúsculo; iv) que a colisão ocorreu por culpa exclusiva da vítima, que não observou as leis de trânsito; v) que os réus prestaram socorro ao autor no local do fato e estiveram no hospital para obter informações sobre seu estado de saúde. Diante de tais fatos, pugnou pela determinação de reunião do presente processo com os autos nº 0014956-79.2019.8.16.0019, bem como o recebimento da contestação em todos os seus fundamentos, especialmente quanto à excludente de responsabilidade civil por culpa exclusiva da vítima, sendo julgados totalmente improcedentes os pedidos iniciais. Houve réplica (evento 79.1). Facultada a especificação de provas (evento 80.1), a parte autora manifestou-se favorável ao julgamento antecipado da lide e, subsidiariamente, requereu prova oral e documental (evento 87.1). A parte ré, por sua vez, manifestou interesse na produção de prova documental e pericial (evento 88.1). Decisão saneadora conjunta nos autos 0014956-79.2019.8.16.0019 (evento 91.1). Apensado ao processo 0014956-79.2019.8.16.0019 (evento 113).Suspensão do processo por depender do julgamento de outra causa (evento 169). A r. sentença julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais (mov. 297.1), daí advindo os recursos (mov. 301.1 dos autos nº 0014956-79.2019.8.16.0019 e 187.1 dos autos nº 0015031-21.2019.8.16.0019).Em síntese, é o relatório. Responsabilidade civil Restou incontroverso que, em 15.06.2018, por volta das 17h45m, no cruzamento entre a Rua Doutor Joaquim Meneleu de Almeida Torres e a Rua Dario Veloso, na cidade de Ponta Grossa, houve um acidente de trânsito envolvendo o veículo Renault Master, placa ASF-5067, conduzido pelo demandado Márcio Geraldo Bernardo e de propriedade do corréu Leonardo Haura, e a motocicleta Honda CG 150, placa ARM-9670, conduzida pelo requerente Luiz Miguel Ocampo Henker, com o autor Wilfrido Serna Jimenez na garupa (mov. 1.5).Discute-se, inicialmente, a responsabilidade pelo acidente de trânsito.As partes não divergem quanto ao fato de que o condutor demandado realizou, no cruzamento, conversão à esquerda. Os autores sustentam que o veículo dos requeridos cruzou a preferencial, gerando o abalroamento transversal. Os réus, por sua vez, afirmam que a motocicleta estava em alta velocidade e com os faróis apagados.Conforme se extrai do boletim de ocorrência, houve um abalroamento transversal entre os veículos (mov. 1.5, p. 01). O croqui elaborado pela autoridade policial demonstrou a dinâmica do acidente, retratada da seguinte forma na r. sentença (mov. 297.1, p. 09 – destaques da douta Magistrada):
Em seu depoimento pessoal (mov. 133.2), o autor Luis Miguel Ocampo Henker relatou que saiu de sua casa, no bairro de Oficinas, e estava indo para Uvaranas, com o outro autor na garupa. Afirmou que fez uma parada obrigatória e depois começou a descer a rua. Disse que estavam na preferencial e que a van dos réus bateu na motocicleta. Confirmou que a van estava na mesma rua, mas em sentido contrário, subindo. Alegou que iriam continuar descendo a rua e que a van virou à esquerda. Questionado se a van “deu sinal”, afirmou que não lembrava. Falou que a batida foi no pneu dianteiro da moto. Sobre os ferimentos, relatou que quebrou o fêmur em duas partes, a tíbia, a fíbula, o rádio, a ulna e tinha pontos embaixo do queixo. Disse que ficou hospitalizado por 21 dias. Afirmou que, na época, não estava trabalhando, porque tinha chego da Colômbia há pouco mais de um mês. Alegou que veio ao Brasil para trabalhar e que, atualmente, trabalha como motoboy. Contou que ainda manca um pouco por causa do acidente e que tem dores nas costas. Negou tomar remédios controlados por conta do acidente e disse que, após sair do hospital, levou cerca de quatro meses para se recuperar, tendo feito fisioterapia. Relatou que ficou com cicatrizes na perna, no joelho e no rosto. Mencionou que as pessoas ficam olhando as cicatrizes.O autor Wilfrido Serna Jimenez, em seu depoimento pessoal (mov. 133.3), relatou que saíram de Oficinas e estavam indo para Uvaranas. Disse que estava na garupa da motocicleta de Luis Miguel e que estavam numa rua preferencial. Alegou que, uma quadra antes do acidente, fizeram a parada e começaram a descer. Afirmou que lembrava vagamente porque ficou inconsciente na hora do impacto. Contou que, enquanto desciam, a van, que estava no mesmo sentido, mas subindo, virou. Alegou que ficou hospitalizado por cerca de um mês e que teve fratura exposta no fêmur. Relatou que pegou uma infecção no hospital e por conta disso não pôde fazer cirurgia de pronto. Explicou que, na época, trabalhava como motoboy e ficou impossibilitado de trabalhar por cerca de três a quatro meses, tendo sido dolorosa a recuperação. Afirmou que, em tal período, a namorada o ajudou e que já retornou ao trabalho. Acrescentou que sua renda mensal como motoboy é de R$ 1.200,00 em média. Relatou que ainda tem sequelas do acidente, pois não consegue correr, pular etc., e que sente dor no joelho. Confirmou que ficou com uma cicatriz na perna.O réu Márcio Geraldo Bernardo, em seu depoimento pessoal (mov. 133.4), contou que, antes do acidente, estava entregando umas crianças e já havia deixado duas em casa. Disse que estava trafegando pela Joaquim Meneleu de Almeida Torres e, ao chegar na metade da quadra, sinalizou à esquerda para fazer a conversão para a rua Dário Veloso. Aduziu que olhou para cima de volta e não vinha ninguém. Afirmou que também olhou os retrovisores e não havia ninguém lhe ultrapassando. Relatou que, quando foi fazer a conversão, já estava “em cima com a moto”. Asseverou que “a hora que viu” já estava de frente com a motocicleta e que sua única reação foi pisar no freio, porque não deu tempo de desviar. Disse que “talvez” tenha invadido a preferencial, mas não intencionalmente. Falou que o tempo estava nublado e que já estava quase escuro, porque era próximo das 18 horas. Questionado se parou na via preferencial, afirmou que “vinha reduzindo”, olhou para cima e não vinha ninguém. Ponderou que, apesar de não ter visto a motocicleta, pelo tempo que calculou, ela estava em alta velocidade. Mencionou que, a princípio, a luz da motocicleta estava apagada, mas foi tudo muito rápido. Alegou que o corréu Leonardo foi ao pronto socorro para oferecer “recurso” às vítimas, tendo deixado um cartão. Contou que uma das vítimas foi procurada, mas o hospital não autorizou o acesso. Falou que não contribuiu com os autores porque, pelo que soube, não houve sucesso na tentativa de contato com eles.A testemunha Lucas Kraeski Krum (mov. 133.5), médico que atendeu o requerente Luis Miguel, disse que ele fraturou vários ossos do braço esquerdo e que apresentou um tremor que não foi inicialmente diagnosticado como nenhuma causa orgânica. Posteriormente, o diagnóstico foi de síndrome pós-traumática. Afirmou que o quadro do paciente foi bem grave. Disse que o acompanhou por mais duas ou três consultas e que, em tais ocasiões, concluíram que ele apresentava essa síndrome. Afirmou que a síndrome, em si, não é grave, mas o quadro do paciente, que decorreu do acidente, sim. Confirmou a autenticidade das fotografias juntadas ao mov. 1.8.A testemunha Sueli de Souza Meira (mov. 133.6), técnica de enfermagem, disse que mora bem em frente ao local em que aconteceu o acidente e que estava em casa no dia. Afirmou que ouviu o barulho e saiu para ver o que havia acontecido. Relatou que a van estava subindo pela rua ao lado de sua casa e que entrou à esquerda, enquanto a motocicleta descia no sentido oposto. Confirmou que a van cruzou na frente da moto e mencionou que fez os primeiros socorros às vítimas. Asseverou que a primeira impressão é que o autor Luis Miguel estava em óbito. Disse que ele tinha muitos espasmos e oscilações de consciência, bem como que estava prensado na moto. Contou que Wilfrido estava em uma “posição bem mais confortável”. Confirmou que a rua do lado de sua casa era preferencial e que, na sua impressão, a van entrou na frente da moto. Negou que tivesse chovido naquele dia e acrescentou que, no momento do acidente, era entardecer, mas ainda não estava escuro. Disse que a rua pela qual trafegavam os veículos tem um “pico” na parte superior.Itamar Ferreira Meira (mov. 133.7) relatou que é marido da testemunha Sueli e que ouviram o barulho do acidente de dentro de casa, tendo prestado atendimento às vítimas. Falou que, quando chegaram no local, os veículos estavam com a traseira numa rua e a frente em outro sentido, “dando sequência” à rua de sua casa. Disse que, pela posição dos veículos, deu para perceber que a van entrou na frente da moto, que estava descendo, à esquerda. Negou que tivesse chovido naquele dia e, questionado sobre a luminosidade no momento, respondeu que estava “meio termo”. Contou que a van estava na metade da manobra de conversão à esquerda.Pois bem.Como é cediço, a configuração da responsabilidade civil depende da comprovação de causas que geraram, diretamente, o acidente de trânsito e da ausência de concausas que, por si sós, originem o dano.Na espécie, as provas acostadas aos autos indicam que o acidente de trânsito ocorreu porque a van conduzida pelo corréu Márcio realizou conversão à esquerda, interceptando a trajetória da motocicleta, que transitava na mesma direção, mas em sentido contrário.Por certo, antes de empreender qualquer tipo de manobra, o condutor deve adotar as cautelas necessárias e, tratando-se de conversão à esquerda, deve ter especial prudência para garantir a segurança dos demais condutores e transeuntes, além de assegurar a preferência de passagem.Dessa forma, conclui-se que o acidente apenas ocorreu porque o motorista da van – o requerido Márcio –, ao fazer a manobra de conversão à esquerda sem adotar as cautelas necessárias, interceptou a motocicleta na qual os autores trafegavam.Registre-se que, mesmo que se admitisse que a motocicleta transitava em velocidade alta – o que não foi satisfatoriamente demonstrado –, o fato é que o acidente ocorreu porque a van interrompeu o fluxo da via preferencial, sendo esta a causa direta e imediata do sinistro.Nem se diga que a visibilidade, no momento da colisão, era precária, tampouco que a motocicleta estava com os faróis apagados. Primeiro, porque as testemunhas ouvidas em juízo afirmaram que, na hora dos fatos, ainda não estava escuro. Segundo, porquanto o próprio corréu Márcio, em seu depoimento pessoal, disse que tudo foi muito rápido e que, quando viu, “já estava em cima”, o que confirma a conclusão no sentido da impossibilidade de ter conseguido verificar se, de fato, a motocicleta estava com as luzes apagadas.O fato de a rua possuir um “pico”, como alegado pelos demandados, também não altera a conclusão adotada, já que as cautelas necessárias devem ser adotadas justamente para evitar que condições como esta causem acidentes.Diante disso e, considerando que, de acordo com o entendimento doutrinário e jurisprudencial, o Código Civil adotou a teoria da causalidade direta e imediata no âmbito da responsabilidade civil, que considera como causas apenas aqueles eventos que possuem ligação direta com o dano (art. 403 do Código Civil), conclui-se que, ao invadir a pista contrária e interceptar a trajetória da motocicleta, o motorista demandado deu causa direta e imediata ao sinistro, não havendo que se cogitar, ainda, a culpa concorrente do autor condutor da motocicleta, que em nada contribuiu para o evento danoso.Sobre o assunto, Gustavo Tepedino, Heloisa Helena Barboza e Maria Celina Bodin de Moraes lecionam: O art. 403 exige que o dano seja resultado ‘direto e imediato’ da inexecução. Trata-se do nexo de causalidade entre o dano e o fato a que se imputa a responsabilidade civil. Só há dever de indenizar se houve dano; todavia, não há responsabilidade se não se consegue estabelecer a vinculação entre determinado ato ou atividade e o resultado danoso. (...) Com base no teor do art. 403 (CC1916, art. 1.060), afirma-se que o legislador civil adota a teoria da causalidade direta e imediata, também chamada de interrupção do nexo causal, consagrada em notório acórdão do STF (STF, 1ª T., RE 130.764, Rel. Min. Moreira Alves, julg. 12.05.1992, publ. DJ 07.08.1992) (Código Civil Interpretado conforme a Constituição da República. v. 1. Rio de janeiro: Renovar, 2007, p. 735-736) Assim, o condutor da van violou os deveres de cuidado e de atenção previstos no art. 28 do Código de Trânsito Brasileiro, bem como desrespeitou as normas de preferência de trânsito dispostas nos art. 34, 38, II e parágrafo único e 44 da mesma legislação: Art. 28.O condutor deverá, a todo momento, ter domínio de seu veículo, dirigindo-o com atenção e cuidados indispensáveis à segurança do trânsito. Art. 34.O condutor que queira executar uma manobra deverá certificar-se de que pode executá-la sem perigo para os demais usuários da via que o seguem, precedem ou vão cruzar com ele, considerando sua posição, sua direção e sua velocidade. Art. 38. Antes de entrar à direita ou à esquerda, em outra via ou em lotes lindeiros, o condutor deverá: (...)II - ao sair da via pelo lado esquerdo, aproximar-se o máximo possível de seu eixo ou da linha divisória da pista, quando houver, caso se trate de uma pista com circulação nos dois sentidos, ou do bordo esquerdo, tratando-se de uma pista de um só sentido.Parágrafo único. Durante a manobra de mudança de direção, o condutor deverá ceder passagem aos pedestres e ciclistas, aos veículos que transitem em sentido contrário pela pista da via da qual vai sair, respeitadas as normas de preferência de passagem. Art. 44. Ao aproximar-se de qualquer tipo de cruzamento, o condutor do veículo deve demonstrar prudência especial, transitando em velocidade moderada, de forma que possa deter seu veículo com segurança para dar passagem a pedestre e a veículos que tenham o direito de preferência. Também importante ressaltar que os veículos de maior porte possuem o dever de zelar pela segurança dos veículos menores, conforme prevê o art. 29, §2º, do Código de Trânsito Brasileiro: Art. 29. O trânsito de veículos nas vias terrestres abertas à circulação obedecerá às seguintes normas: (...)§ 2º Respeitadas as normas de circulação e conduta estabelecidas neste artigo, em ordem decrescente, os veículos de maior porte serão sempre responsáveis pela segurança dos menores, os motorizados pelos não motorizados e, juntos, pela incolumidade dos pedestres. Portanto, estando configurada a culpa exclusiva da parte ré, não há que se falar em reforma da r. sentença, conforme entendimento deste Colegiado em situações assemelhadas: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS DECORRENTES DE ACIDENTE DE TRÂNSITO – SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA – RECURSO DO AUTOR – (1) – AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO AOS FUNDAMENTOS DA SENTENÇA NO TOCANTE AOS DANOS MATERIAIS – OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE – NÃO CONHECIMENTO DESTE TÓPICO DO RECURSO – (2) COLISÃO ENTRE AUTOMÓVEL DO RÉU E MOTOCICLETA DO AUTOR, EM VIA URBANA DE MÃO DUPLA – CULPA EXCLUSIVA DO RÉU QUE, AO FAZER CONVERSÃO À ESQUERDA, INTERCEPTOU A TRAJETÓRIA PREFERENCIAL DO AUTOR QUE CONDUZIA A MOTOCICLETA NA PISTA DE SENTIDO OPOSTO – AUSÊNCIA DE PROVA HÁBIL A DEMONSTRAR A CONDUÇÃO DA MOTOCICLETA EM ALTA VELOCIDADE – CULPA CONCORRENTE DO AUTOR AFASTADA – (...)(TJPR - 10ª C.Cível - 0007167-86.2019.8.16.0194 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADORA ELIZABETH MARIA DE FRANCA ROCHA - J. 04.07.2022) (grifei) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS COM RECONVENÇÃO. ACIDENTE DE TRÂNSITO. COLISÃO ENTRE AUTOMÓVEL E MOTOCICLETA. (I) RESPONSABILIDADE CIVIL PELO SINISTRO. CONVERSÃO À ESQUERDA. MANOBRA DE RISCO QUE REQUER ATENÇÃO. DEVER DO CONDUTOR QUE DESEJA EXECUTAR TAL MOVIMENTO DE AGUARDAR A PASSAGEM DOS VEÍCULOS QUE SEGUEM EM SENTIDO CONTRÁRIO PARA, APÓS SE CERTIFICAR DA AUSÊNCIA DE PERIGO, EFETUAR A MANOBRA. AUTOMÓVEL DO RÉU QUE COLIDIU COM A MOTOCICLETA DO AUTOR, QUE TRANSITAVA EM VIA PRINCIPAL. VEÍCULO QUE INVADIU A PREFERENCIAL SEM TOMAR AS DEVIDAS CAUTELAS. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 28, 34, 38 E 44 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO. BOLETIM DE OCORRÊNCIA. PRESUNÇÃO DE LEGALIDADE E VERACIDADE DO DOCUMENTO PÚBLICO. CULPA DO RÉU DEMONSTRADA. REQUERIDO QUE NÃO COMPROVOU FATO IMPEDITIVO, MODIFICATIVO OU EXTINTIVO DO DIREITO DO REQUERENTE (ART. 373, I, CPC/2015). ENQUADRAMENTO NO CONCEITO DE CULPA CONTRA A LEGALIDADE. PRECEDENTES DESTA CÂMARA. (...)(TJPR - 10ª C.Cível - 0056760-08.2020.8.16.0014 - Londrina - Rel.: JUIZ DE DIREITO SUBSTITUTO EM SEGUNDO GRAU ALEXANDRE KOZECHEN - J. 27.06.2022) (grifei) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZATÓRIA. ACIDENTE DE TRÂNSITO. COLISÃO ENTRE AUTOMÓVEL E MOTOCICLETA. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO INTERPOSTO PELO RÉU.1. ALEGAÇÃO DE QUE O ACIDENTE OCORREU POR CULPA EXCLUSIVA DA DEMANDANTE, CONDUTORA DA MOTOCICLETA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. REQUERIDO QUE OBSTRUIU A PASSAGEM DA MOTOCICLISTA, QUE TRAFEGAVA NA VIA PREFERENCIAL. TEORIA DA CAUSALIDADE DIRETA E IMEDIATA. VIOLAÇÃO AOS DEVERES DE CUIDADO E ATENÇÃO. ARTS. 28, 34 E 44 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO. RESPONSABILIDADE EXCLUSIVA DO RÉU, INDEPENDENTEMENTE DO EXCESSO DE PASSAGEIROS NA MOTOCICLETA, POIS NÃO FOI DEMONSTRADO QUE TAL CIRCUNSTÂNCIA INFLUIU PARA A OCORRÊNCIA DO EVENTO DANOSO. ÔNUS DE COMPETIA AO DEMANDADO. ART. 373, II, DO CPC/2015. EXCESSO DE VELOCIDADE DA AUTORA NÃO COMPROVADO. INEXISTÊNCIA DE CULPA CONCORRENTE. (...)(TJPR - 10ª C.Cível - 0024670-91.2018.8.16.0021 - Cascavel - Rel.: DESEMBARGADOR GUILHERME FREIRE DE BARROS TEIXEIRA - J. 30.05.2022) (grifei) Portanto, a causa determinante do acidente foi a conduta imprudente do demandado Márcio, devendo ser mantido o reconhecimento da responsabilidade solidária dos réus pelo sinistro. Danos morais Como se sabe, dano moral é o sentimento capaz de afetar substancialmente a subjetividade do indivíduo em seu íntimo, causando-lhe transtornos e sentimentos que alteram de forma significativa o seu cotidiano e a normalidade do seu dia a dia.Conforme leciona Sérgio Cavalieri Filho: Só deve ser reputado como dano moral a agressão a um bem ou atributo da personalidade que cause dor, vexame, sofrimento ou humilhação; que fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia a dia, no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos mais triviais aborrecimentos. (Programa de responsabilidade civil. 13ª ed. São Paulo: Atlas, 2019, p. 123) No caso, em razão do acidente, conforme relato da inicial (mov. 1.1, p. 02), documentação médica (mov. 1.6/1.7) e fotografias (mov. 1.8), o demandante Luis Miguel apresentou lesões graves, como fraturas diafisária de rádio e ulna, fratura transversa de fêmur, fratura diafisária com asa da tíbia e fíbula. Além disso, foi necessária a colocação de fixadores externos no fêmur, tendo apresentado tremores, consoante relatado pela testemunha Lucas Kraeski Krum (mov. 133.5), o que restou diagnosticado como transtorno pós-traumático. De acordo com os documentos mencionados, Luis Miguel ficou internado por mais de 15 dias (mov. 1.6, p. 01).O demandante Wilfrido, por sua vez, apresentou trauma com edema na coxa esquerda, fratura de diáfise com fêmur com desvio, fratura exposta grau III – que necessitou de cirurgia com urgência –, sendo também necessária a colocação de fixador externo linear e pinos Shantz, conforme relatado na petição inicial (mov. 13.2, p. 02, dos autos nº 0015031-21.2019.8.16.0019), prontuário médico (mov. 13.10 dos autos nº 0015031-21.2019.8.16.0019) e fotografias (mov. 13.13 dos autos nº 0015031-21.2019.8.16.0019).Nesse sentido, o laudo pericial consignou que “Fraturas expostas são lesões gravíssimas em medicina, dado o risco alto de infectividade e mortalidade da lesão” (mov. 253.1, p. 01, quesito 1 da parte autora), apontando que a dificuldade de Wilfrido para caminhar em razão do acidente possui caráter permanente (mov. 253.1, p. 01, quesito 2 da parte autora).O perito ainda atestou que ambos os autores tiveram “reduções físicas como atrofia dos membros acometidos e diminuição da força local” (mov. 253.1, p. 02, quesito 9 da parte autora).Diante disso, os danos à integridade física dos demandantes e a necessidade de tratamentos médicos/cirúrgicos trouxeram aflição psicológica e angústia, que afetaram a esfera extrapatrimonial deles e, por consequência, caracterizam o dano moral.Nesse sentido: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR ACIDENTE DE TRÂNSITO – SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA – RECURSOS DE AMBAS AS PARTES – (1) NÃO CONHECIMENTO DE TÓPICO DO RECURSO DO AUTOR NO TOCANTE AOS DANOS CORPORAIS E À PENSÃO – OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE – (2) RESPONSABILIDADE CIVIL – VERSÃO FÁTICA APRESENTADA PELO AUTOR QUE NÃO FOI EFETIVAMENTE IMPUGNADA PELA RÉ ENVOLVIDA NO ACIDENTE, PRESUMINDO-SE VERDADEIRA, INCLUSIVE QUANTO AO CONSERTO EXTRAJUDICIAL DA MOTOCICLETA – EXEGESE DO ART. 341 DO CPC – (3) INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – COMPROVAÇÃO DAS LESÕES SOFRIDAS PELO AUTOR EM DECORRÊNCIA DO ACIDENTE – SITUAÇÃO QUE EXTRAPOLOU O MERO ABORRECIMENTO – DANOS CONFIGURADOS – FIXAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO EM CONSONÂNCIA COM OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE – (4) MANUTENÇÃO DA SENTENÇA, COM A MAJORAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA PELA FASE RECURSAL.APELAÇÃO CÍVEL 1 (RÉ) CONHECIDA E DESPROVIDA;APELAÇÃO CÍVEL 2 (AUTOR) PARCIALMENTE CONHECIDA E DESPROVIDA.(TJPR - 10ª C.Cível - 0028095-07.2019.8.16.0017 - Maringá - Rel.: DESEMBARGADORA ELIZABETH MARIA DE FRANCA ROCHA - J. 08.08.2022) (grifei) APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ACIDENTE DE TRÂNSITO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSOS INTERPOSTOS PELA SEGURADORA E PELA RÉ.1. PEDIDO DE MAJORAÇÃO DO VALOR DA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS FORMULADO EM CONTRARRAZÕES QUE NÃO COMPORTA CONHECIMENTO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. LUCROS CESSANTES QUE FORAM ANALISADOS E REJEITADOS NA SENTENÇA. AUSÊNCIA DE OMISSÃO.2. INEXISTÊNCIA DE CONTROVÉRSIA SOBRE A DINÂMICA E A RESPONSABILIDADE DO ACIDENTE. CAMINHÃO DESGOVERNADO DIANTE DE FALHA NOS FREIOS. CONJUNTO FÁTICO E PROBATÓRIO DEMONSTRANDO QUE, EM RAZÃO DO ACIDENTE DE TRÂNSITO, A AUTORA PRECISOU SER INTERNADA UM DIA E MEDICADA PARA ALÍVIO DA DOR. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. SITUAÇÃO QUE ULTRAPASSOU A ESFERA DO MERO DISSABOR. CONDENAÇÃO MANTIDA.3. VALOR DA INDENIZAÇÃO QUE DEVE ATENDER AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE, PROPORCIONALIDADE E AO CARÁTER INIBITÓRIO DA CONDUTA, BEM COMO ÀS PARTICULARIDADES DO CASO CONCRETO. DEMANDANTE QUE NÃO SOFREU DANOS FÍSICOS OU PSICOLÓGICOS GRAVES. BOA-FÉ DA REQUERIDA NA TENTATIVA DE SOLUÇÃO DA SITUAÇÃO EXTRAJUDICIALMENTE.4. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS RECURSAIS. APELAÇÃO CÍVEL (1) CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA.APELAÇÃO CÍVEL (2) CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA.(TJPR - 10ª C.Cível - 0008680-84.2019.8.16.0131 - Pato Branco - Rel.: DESEMBARGADOR GUILHERME FREIRE DE BARROS TEIXEIRA - J. 21.05.2022) (grifei) Por esses motivos, deve ser mantida a condenação dos demandados ao pagamento de indenização por danos morais.No que tange ao quantum indenizatório, o arbitramento deve visar a compensação pelo dano sofrido e, ao mesmo tempo, coibir a reiteração do ilícito. Desse modo, a atividade do julgador deve ser balizada pelos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, sempre levando em conta as peculiaridades do caso concreto e a compensação da ofensa, sem, contudo, ensejar aumento patrimonial indevido ou refletir valores inexpressivos. No caso, como descrito, as consequências foram bastante graves.Em relação às condições econômicas dos litigantes, todos são beneficiários da gratuidade judicial (mov. 23.1 e 184.1), sendo que o demandado Leonardo, que trabalhava como motorista de transporte escolar, precisou colocar a van à venda em razão dos efeitos advindos da pandemia de Covid-19 (mov. 173.10). Além disso, o corréu Márcio percebeu remuneração mensal líquida de R$ 1.479,58 em março de 2021 (mov. 173.11), sendo que, no contra turno, complementava a renda trabalhando com Leonardo.Assim, tendo em vista as circunstâncias mencionadas, o princípio da uniformidade das decisões judiciais, bem como os valores indenizatórios estabelecidos em outros casos nesta Corte, revela-se adequado reduzir o montante indenizatório para R$ 15.000,00 para cada autor, corrigidos monetariamente a partir desta sessão de julgamento (Súmula 362 do STJ), mantidos os juros moratórios desde o evento danoso (ponto em relação ao qual não houve insurgência recursal). Danos estéticos O dano estético é um defeito físico capaz de causar na vítima uma sensação de angústia e inferioridade. Trata-se, portanto, de uma deformidade física aparente, diferentemente do dano moral.Leciona Arnaldo Rizzardo: Dano estético é aquele que atinge o aspecto físico da pessoa. Compreende o aleijão, que é a amputação ou perda de um braço, de uma perna, de dedos, de um órgão que é o canal do sentido. Já a deformidade envolve a cicatriz, a ferida, a marca deixada pelo ferimento. Uma ou outra situação enfeia a pessoa, prejudica a aparência, causa o desequilíbrio na disposição do corpo humano, prejudicando sua integridade, e infunde uma sensação de desagrabilidade. (...) Diríamos que a aparência é de capital importância no sucesso de muitas profissões. Para a própria realização como pessoa, no lado humano, pessoal, psíquico e social, o porte, os traços fisionômicos, a simetria corporal e outras características significam o sucesso ou a frustração em muitos setores da vida. De modo que um indivíduo prejudicado no aspecto estético encontra maior dificuldade na subsistência em um mundo que se apega excessivamente a valores exteriores. (Responsabilidade civil. 8ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 215/216) Na hipótese, as lesões decorrentes do acidente de trânsito provocaram significativas cicatrizes em ambos os autores.O laudo pericial atestou que o demandante Wilfrido apresenta cicatrizes permanentes de pós-operatório, com “cerca de 20 cm em coxa E, uma de 3 cm logo abaixo, uma cicatriz de 1cm em região anterior da coxa e uma de 4 a 5 cm em quadril” (mov. 253.1, p. 01, quesito 4 da parte autora).Quanto às cicatrizes do autor Luis Miguel, constou o seguinte: “2 cicatrizes no antebraço esquerdo, a maior com cerca de 15 cm, a menor com certa de 8 cm (Autor tatuou o braço para disfaçá-las). Ainda há 2 pequenas (cerca de 2cm) no joelho e 1 na região anterior da coxa E (cerca de 7 cm). Há 2 cicatrizes pequenas (cerca de 1cm) em pena E” (sic – mov. 253.1, p. 02, quesito 8 da parte autora).Ainda em resposta aos quesitos, o expert consignou que as cicatrizes ficam plenamente expostas e visíveis (mov. 253.1, p. 03, quesito 3 da parte ré e p. 08, quesito 13 dos requeridos).Neste ponto, cabe destacar que o laudo pericial foi elaborado por profissional técnico qualificado, de confiança do juízo, não tendo sido minimamente desconstituído pelos demandados. Em sentido contrário ao que eles afirmar, a perícia analisou pontualmente as cicatrizes dos autores, não havendo nenhum elemento que indique uma conclusão genérica, como afirmado.Do mesmo modo, o fato de o perito ter feito referências ao Código Penal para explicar a gravidade das lesões não desqualifica a prova, inclusive porque nada impede que, por uma interpretação sistemática do ordenamento jurídico, alguns termos de outras áreas do Direito sejam utilizados para melhor compreensão dos fatos.Diante disso, conclui-se que os demandantes ficaram com várias cicatrizes decorrentes do acidente e das cirurgias que tiveram que realizar, restando também evidenciado que as lesões são definitivas e que a aparência apenas poderá ser melhorada com o tempo, não sendo possível que desapareçam definitivamente.Logo, deve ser mantido o dever de pagamento de indenização pelos danos estéticos, conforme entendimento deste Colegiado: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – ACIDENTE DE TRÂNSITO – SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA – RECURSOS INTERPOSTOS PELOS RÉUS – (1) CAUSA DIRETA DA COLISÃO EM RODOVIA – AUTOMÓVEL CONDUZIDO PELO CORRÉU QUE INVADE A PISTA CONTRÁRIA, NA QUAL TRAFEGAVA A MOTOCICLETA CONDUZIDA PELO AUTOR, INTERCEPTANDO A TRAJETÓRIA DESTE – COMPROVAÇÃO DA CONDUTA CULPOSA DAQUELE QUE DECORRE NA RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA COM O PROPRIETÁRIO DO RESPECTIVO AUTOMÓVEL PELOS DANOS OCASIONADOS AO AUTOR – (2) ALEGAÇÃO DE CULPA CONCORRENTE DO AUTOR, POR FALTA DE HABILITAÇÃO PARA DIRIGIR VEÍCULO – NÃO ACOLHIMENTO – ACIDENTE OCORRIDO POR CONDUTA DIRETA E EXCLUSIVA DO CORRÉU, SEM INTERFERÊNCIA DO ILÍCITO ADMINISTRATIVO PRATICADO PELO AUTOR - (3) INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – AUTOR QUE TEVE FERIMENTOS GRAVES E SE SUBMETEU A VÁRIAS INTERVENÇÕES CIRÚRGICAS, PERMANECENDO POR LONGO PERÍODO AFASTADO DAS ATIVIDADES – DANOS EXTRAPATRIMONIAIS CONFIGURADOS – MANUTENÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO ADEQUADAMENTE À SITUAÇÃO EXAMINADA - (4) INDENIZAÇÃO POR DANOS ESTÉTICOS – COMPENSAÇÃO DEVIDA PELA ALTERAÇÃO NA APARÊNCIA EXTERNA PROVOCADA COM INÚMERAS CICATRIZES, SEM NECESSIDADE DE VINCULAÇÃO COM ATIVIDADE LABORAL ENVOLVENDO A IMAGEM – (5) SENTENÇA MANTIDA, COM MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS PELA FASE RECURSAL. Apelação 1 e Apelação 2 desprovidas.(TJPR - 10ª C.Cível - 0001416-11.2019.8.16.0068 - Chopinzinho - Rel.: DESEMBARGADORA ELIZABETH MARIA DE FRANCA ROCHA - J. 27.06.2022) (grifei) Destaque-se que, como se extrai da ementa do julgado acima, para fins de reconhecimento do dever de indenizar pelos danos estéticos, não se exige que as vítimas trabalhem com a exploração econômica da própria imagem.Em relação ao quantum indenizatório, ambos os autores se qualificaram como solteiros e ainda são jovens, com menos de 30 anos de idade (mov. 1.3 dos autos nº 0014956-79.2019.8.16.0019 e 13.4 dos autos nº 0015031-21.2019.8.16.0019), daí porque certamente há uma maior preocupação com a imagem, inclusive porque, como demonstrado, as cicatrizes ficam em locais expostos e de fácil visualização.Neste contexto, deve ser mantida a indenização em R$ 10.000,00 para cada um dos apelados, cabendo acrescentar que não houve insurgência em relação aos consectários legais. Honorários advocatícios, inclusive recursais Os réus postularam, subsidiariamente, a redução dos honorários advocatícios sucumbenciais.A este respeito, o art. 85, §2º, do CPC/2015 dispõe o seguinte: Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor. (...)§ 2o Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos:I - o grau de zelo do profissional;II - o lugar de prestação do serviço;III - a natureza e a importância da causa;IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço. Deste modo, quando o magistrado aplica a norma mencionada, deve atentar ao grau de zelo profissional, ao lugar da prestação do serviço, à natureza e importância da causa, ao trabalho realizado e ao tempo exigido.E, ao assim proceder, atende para que os honorários não sejam fixados em valores aviltantes para a profissão do advogado ou irrisórios em relação ao valor da causa, mas que também não sejam desmedidamente pesados para a parte que com eles arcará.No caso, os processos tramitaram na origem por cerca de três anos, havendo necessidade de instrução probatória, com a realização de provas pericial e oral. Além disso, cuidando-se de acidente de trânsito, a matéria fática guarda certa complexidade, sendo que o trabalho desenvolvido pelo procurador dos autores foi adequado e zeloso, daí porque o montante arbitrado na origem não se revela desproporcional ou desarrazoado.Assim, mantenho inalterada a r. sentença neste aspecto, deixando, por outro lado, de fixar honorários recursais, por ter sido adotado o percentual máximo na origem, cabendo ressaltar que este Colegiado entende que a Súmula 326 do STJ continua em vigor, de modo que, apesar da redução do valor da indenização por danos morais, os demandados não fazem jus a honorários recursais. 3. CONCLUSÃO. Do exposto, voto pelo conhecimento e parcial provimento das apelações cíveis interpostas pelos demandados, tão somente para reduzir a indenização por danos morais para R$ 15.000,00 para cada requerente, com correção monetária a partir desta sessão de julgamento, nos termos da fundamentação.
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