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Acórdão
Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Acórdão. Eventuais imagens serão suprimidas.
I - RELATÓRIOPor brevidade, adoto o relatório da sentença (evento nº 453.1) proferida nos presentes autos registrados sob nº. 0001865-87.2021.8.16.0103:“O Ilustre Representante do Ministério Público do Estado do Paraná, com atribuições nesta Comarca, ofereceu denúncia em face de JOÃO MARIA RIBEIRO FILHO, MAIKON DOUGLAS SANTOS e MATHEUS HENRIQUE PEREIRA DA SILVA, todos já qualificados nos autos, dando-os como incursos nas sanções do artigo 157, § 2º, incisos II e V e § 2º-A, inciso I do Código Penal (1º fato); artigo 180, caput, do Código Penal (2º fato); artigo 16, §1º, da Lei nº 10.826/03 (3º fato); e artigo 288, parágrafo único, do Código Penal (4º fato), pela prática das seguintes condutas delituosas: 1º Fato: “No dia 17 de maio de 2021, por volta das 00h00min, na BR 476, Rodovia do Xisto, nesta cidade e comarca da Lapa/PR, os denunciados JOÃO MARIA RIBEIRO FILHO, MAIKON DOUGLAS SANTOS, MATHEUS HENRIQUE PEREIRA DA SILVA e EMERSON ANTUNES DOS REIS, agindo com consciência e vontade, em unidade de desígnios, mediante grave ameaça, exercida com o emprego de arma de fogo (revólver calibre 32, com número de série suprimido, apreendido ao mov.1.12), após conduzirem a vítima para um matagal próximo ao km 237 e restringirem sua liberdade, SUBTRAÍRAM para todos, 02 (dois) semirreboques placas ATP 3G79 e ATP 3G83, avaliados em R$ 90.000,00 (noventa mil reais), 01 (um) aparelho celular e mais a quantia de R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais) em espécie, pertencentes à vítima Claudecir Roberto Bosio. Conforme Boletim de Ocorrência nº 2021/502113 (mov. 1.8), Auto de Exibição e Apreensão (mov. 1.11), Auto de Reconhecimento (mov. 1.16; 78.9 e 92.2) Auto de Avaliação (mov. 1.20), termos de depoimento, e demais documentos inclusos no sistema Projudi.” 2º Fato: “No dia 17 de maio de 2021, por volta das 05h00min, em um conjunto de barracões situado as margens da BR 476, na localidade do Passa Dois, nesta cidade e comarca da Lapa/PR, o denunciado JOÃO MARIA RIBEIRO FILHO, consciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, dolosamente, OCULTAVA, EM PROVEITO PRÓPRIO, COISA QUE SABIA SER PRODUTO DE CRIME, sendo 01 (um) semirreboque, vermelho, placa CEK-892, do Paraguai, avaliado em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), veículo que foi roubado no dia 10 de maio de 2021, por volta das 01h07 Rodovia 277. Cf. Boletim de Ocorrência nº 2021/476743 (mov. 1.10), Boletim de Ocorrência nº 2021/503971 (mov. 1.7) Auto de Exibição e Apreensão (mov. 1.11), Auto de Avaliação (mov. 1.20) e demais documentos inclusos no sistema Projudi. ” 3º Fato: “No dia 17 de maio de 2021, por volta das 05h00min, em um conjunto de barracões situado as margens da BR 476, na localidade do Passa Dois, nesta cidade e comarca da Lapa/PR, o denunciado JOÃO MARIA RIBEIRO FILHO, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, dolosamente, POSSUÍA em desacordo com determinação legal e regulamentar, 01 (um) revólver, calibre 32, marca Rossi, com número de série suprimido, municiado com 05 (cinco) munições intactas, calibre 32 e 01 (uma) deflagrada do mesmo calibre. Cf. Boletim de Ocorrência nº 2021 /476743 (mov. 1.10), Boletim de Ocorrência nº 2021/503971 (mov. 1.7) Auto de Exibição e Apreensão (mov. 1.11) e demais documentos inclusos no sistema Projudi. ” 4º Fato: “Em data não precisada nos autos, mas até a data de 17 de maio de 2021, em um conjunto de barracões situado as margens da BR 476, na localidade rural de Passa Dois, neste Município e Comarca da Lapa/PR, os denunciados JOÃO MARIA RIBEIRO FILHO, MAIKON DOUGLAS SANTOS, MATHEUS HENRIQUE PEREIRA DA SILVA e EMERSON ANTUNES DOS REIS, com consciência e vontade e em comunhão de esforços, ASSOCIARAM-SE, estavelmente, com o propósito de praticarem, especialmente, o crime voltado ao patrimônio, em especial, o delito tipificado no artigo 157 do Código Penal, portanto, com interesse de obterem benefício econômico. A associação era armada e se deu mediante organizada divisão funcional de tarefas, na qual os denunciados EMERSON ANTUNES DOS REIS e MAIKON DOUGLAS SANTOS foram os responsáveis por efetuarem a locação do conjunto de barracões onde eram armazenados os veículos e cargas subtraídos, o denunciado EMERSON ANTUNES DOS REIS atuava como motorista do automóvel que utilizavam para abordarem as vítimas, os denunciados JOÃO MARIA RIBEIRO FILHO e MATHEUS HENRIQUE PEREIRA DA SILVA, na posse de um revólver, calibre 32, marca Rossi, com número de sérir suprimido, anunciavam o assalto e restringiam a liberdade das vítimas, enquanto que o denunciado MAIKON DOUGLAS SANTOS conduzia os veículos subtraídos até os barracões alugados. Diante desses dados, verifica-se que todo o grupo criminoso estava imbuído do mesmo elemento subjetivo para prática dos crimes voltados ao patrimônio, em especial, roubo de caminhões e cargas, além do que se dividiram funcionalmente para a realização comum dos fatos, sendo que cada um dos denunciados ofereceu contribuição objetiva para a execução dos crimes. ” Na peça acusatória inicial (mov. 34.1), na qual imputou-se delito somente ao réu João Maria, foram arroladas 03 (três) testemunhas e vieram os documentos constantes do Inquérito Policial de movs. 1.1 a 32.9. A denúncia foi recebida em 19 de maio de 2021 (mov. 34.1). O réu João Maria foi pessoalmente citado (mov. 67.1) e apresentou resposta à acusação no mov. 95.1. Novas peças de inquérito policial acostadas nos movs. 78.1 a 78.13, 79.1 a 79.12 e 88.1 a 94.1. Após manifestação do Ministério Público (mov. 99.1), não sendo caso de absolvição sumária, o juízo ratificou o recebimento da denúncia, designou data para audiência de instrução do processo e decidiu sobre a manutenção da prisão preventiva do réu João Maria (mov. 102.1). Com base nas novas informações obtidas no inquérito policial, o Ministério Público aditou a denúncia no mov. 125.1, para incluir novos denunciados e novas condutas delitivas. Após manifestação da Defesa do acusado João Maria, foi recebido o aditamento da denúncia e deferida a inclusão dos novos denunciados e novos fatos criminosos ao feito (mov. 141.1). Os réus Maikon Douglas Santos e Matheus Henrique Pereira da Silva foram pessoalmente citados nos movs. 174.1, 176.2. No mov. 193.1, decisão mantendo as prisões preventivas de Maikon e Matheus na forma do artigo 316, parágrafo único, do CPP. No mov. 210.1 juntou-se certidão de óbito do acusado Emerson Antunes dos Reis, tendo sido extinta a sua punibilidade no mov. 222.1. Respostas à acusação dos acusados Maikon Douglas e Matheus nos movs. 234.1 e 235.1. Não sendo caso de absolvição sumária, o juízo ratificou o recebimento do aditamento da denúncia, designou data para audiência de instrução do processo e decidiu sobre a manutenção da prisão preventiva dos réus na forma do artigo 316, parágrafo único, do CPP (mov. 244.1). Durante a instrução criminal foram ouvidas 03 (três) testemunhas de acusação, 02 (duas) de defesa, e, por fim, realizados os interrogatórios dos réus (movs. 302, 370 e 436). O Ministério Público apresentou alegações finais na forma de memoriais no mov. 440.1 requerendo seja julgada totalmente procedente a pretensão punitiva constante na denúncia para condenar os acusados em todas os delitos imputados. A Defesa do réu Matheus Henrique Pereira da Silva apresentou derradeiras alegações no mov. 448.1 requerendo absolvição dos crimes de roubo e associação criminosa por ausência de provas e, subsidiariamente, aplicação da pena mínima, detração penal, revogação da prisão preventiva, fixação de regime semiaberto e concessão da gratuidade da justiça. A Defesa do réu João Maria Ribeiro Filho apresentou derradeiras alegações no mov. 449.1 requerendo absolvição de todos os crimes imputados ao réu por ausência de provas e, subsidiariamente, aplicação da atenuante da confissão com relação ao porte ilegal de arma de fogo, detração penal e concessão da gratuidade da justiça. A Defesa do réu Maikon Douglas Santos apresentou derradeiras alegações no mov. 451.1 requerendo a nulidade do reconhecimento pessoal realizado na delegacia de polícia, absolvição dos crimes de roubo e associação criminosa por ausência de provas e concessão da gratuidade da justiça.”A sentença julgou parcialmente procedente a r. denúncia, para o fim de: “a) CONDENAR o réu João Maria Ribeiro Filho às sanções do artigo 157, § 2º, incisos II e V, do Código Penal (1º fato) e artigo 288, parágrafo único, do Código Penal (4º fato); e ABSOLVÊ-LO das sanções dos artigos 180, caput, do Código Penal (2º fato) e artigo 16, §1º, I, da Lei n.º 10.826/003, o que faço com fundamento no artigo 386, incisos III e VI, do Código de Processo Penal; e b) ABSOLVER os réus Maikon Douglas Santos e Matheus Henrique Pereira da Silva das sanções do artigo 157, § 2º, incisos II e V, do Código Penal (1º fato) e artigo 288, parágrafo único, do Código Penal (4º fato), o que faço com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal.”Devidamente intimado, o réu João Maria manifestou o interesse em recorrer (mov. 480.1), sendo o termo recebido pelo magistrado como apelação (mov. 483.1).Nas razões recursais, a Defesa de JOÃO MARIA pugna: i) pela absolvição do acusado pelos crimes a que fora condenado; ii) pela desclassificação do crime de organização criminosa para associação criminosa com a consequente redução da pena; iii) no tocante à dosimetria, pela fixação da pena no mínimo legal, com alteração do regime inicial para o aberto, bem como a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos. Irresignado, o Órgão Ministerial interpôs recurso de apelação (mov. 485.1), que foi recebido pelo Juízo (mov. 491.1).Em suas razões (mov. 494.1), o MINISTÉRIO PÚBLICO requer a condenação dos réus Maikon Douglas Santos e Matheus Henrique Pereira da Silva nas sanções previstas no artigo 157, §2º, incisos II e V, do Código Penal (1º Fato) e artigo 288, parágrafo único, do Código Penal (4º Fato), em concurso material de crimes. Em ato contínuo, foram juntadas as contrarrazões ao recurso Ministerial, tendo a Defesa de Matheus (mov. 516.1), pugnado pelo desprovimento do recurso, com arbitramento de honorários. Por sua vez, a Defesa de Maikon renunciou ao prazo para oferecimento das contrarrazões (mov. 499). Em contrarrazões pelo Órgão Ministerial (mov. 533.1), se almeja o não provimento do apelo defensivo.Instada a se manifestar, a douta Procuradoria Geral de Justiça, em parecer lavrado pelo nobre Procurador de Justiça, Dr. Marcelo Alves de Souza, opinou pelo: “conhecimento do recurso interposto pelo Ministério Público e o parcial conhecimento do recurso de João Maria Ribeiro Filho e, no mérito o desprovimento do apelo do Ministério Público e o parcial provimento do apelo de João Maria Ribeiro Filho, apenas ao efeito de absolvê-lo do delito capitulado no art. 288, parágrafo único, do Código Penal.”Vieram os autos conclusos.É o relatório.
II - VOTO do crime de roubo (1º Fato) Aduz a Defesa de João Maria que não há provas de sua participação no crime em comento, devendo ser absolvido. Afirma que além do réu ter confessado apenas o crime de porte de arma, o barracão onde a carga roubada foi encontrada foi alugada por terceira pessoa. Enfatiza ainda que a vítima não reconheceu o acusado com a certeza necessária como um dos participantes do delito. Já o Órgão de Acusação, em linhas gerais, pretende ver os réus Maikon e Matheus condenados pelo crime de roubo.Pois bem. A materialidade delitiva restou demonstrada pelo Auto de Prisão em Flagrante (mov. 1.3) Boletins de Ocorrência nº 2021/503971 e nº 2021/502113 (movs. 1.7/1.8), Auto de Exibição e Apreensão (movs. 1.11/1.12), Auto de Entrega (mov. 1.17), Auto de Avaliação (movs. 1.20/1.21), além da prova oral produzida nos autos.A autoria também é certa e recai também sobre o apelante João Maria, havendo dúvidas em relação aos demais denunciados.O ora recorrente, quando de seu interrogatório em juízo, negou que tenha participado dos ilícitos a ele imputados, assumindo a utilização do Corsa e a propriedade da arma de fogo: “(…) (são verdadeiras essas acusações que são feitas contra o senhor ou não?) Não doutor, não meritíssimo, no dia dezessete do mês de maio eu estava trabalhando na chácara, eu trabalho na chácara do doutor Demir Xavier na BR 427, ao lado da BR 427, eu trabalho faz doze anos registrado pra ele lá, eu trabalhava até o dia dezessete eu estava trabalhando registrado doze anos trabalho pra ele lá, por volta das onze horas eu me desloquei da chácara porque eu tenho um bar que eu tinha locado ele no quilômetro da BR 476 no quilômetro 213 mais ou menos ali eu tenho um bar que eu tinha locado ali e estava passando por reforma estava fazendo umas pintura lá eu me desloquei da chácara nesse horário que eu estava trabalhando porque era hora do almoço eu fui lá que tinha dois rapaz pintando pra mim lá o bar estava por reforma lá eu me desloquei até o bar, chegando no bar lá era hora do almoço (…) passou uns vinte minutos mais ou menos que a polícia chegou e adentrou no bar (…) revistaram o bar não acharam nada no bar (…) aí o policial Marcos Vinícius pediu pra mim o meu documento eu apresentei pra ele a minha habilitação, inclusive estavam procurando por mais dois indivíduos só que os dois indivíduos que estavam no bar eram os rapazes que estavam pintando e eles viram que os rapaz estavam pintando nesse horário, ele pediu meu documento pra verificar meu documento perguntou se eu tinha passagem eu confirmei que realmente eu tinha passagem né, eu tinha uma passagem em 2006 pelo 155, e tenho um 180 (…) nesse momento o terceiro policial que estava que não era o Tavares era um terceiro policial que eu não conheço não sei o nome dele que deveria ser de outra cidade, é falou pode prender que é ele mesmo (…) foi até o carro revistou o carro ali no momento ele não achou nada no meu carro ali, não achou nada porém o revólver é meu, o revólver 32 é meu só que ele não achou no lá bar, ele achou dentro do carro mas estava dentro de uma caixa de ferramenta (…) mas na caixa de ferramenta estava o revólver é meu, essas outras pessoas que estão no processo comigo eu não conheço, nunca vi essas pessoas, não tenho o conhecimento delas e esses reboques que eles falaram eles falaram na Delegacia pra mim mas eles acharam no barracão do seu Francisco no quilômetro 207, é antes do meu bar (...) quando eu cheguei lá o seu Claudecir estava lá na Delegacia (…) ele se aproximou de mim (…) mas eu não conheço, jamais assaltei o seu Claudecir (…). ” (João Maria Ribeiro Filho – interrogatório – mídia digital inserida no mov. 436.2) (Transcrição constante da sentença) O codenunciado Maikon Douglas Santos negou que tenha participado do roubo, apresentando a seguinte versão: “(…) (são verdadeiras essas acusações que são feitas Maikon?) Não (…) porque na verdade eu não conheço, a única pessoa que eu conheço que tá nesse mesmo processo junto comigo é o Mateus e o restante das pessoas eu não faço ideia eu não sei quem é (…) e eu não sei porque que me colocaram nesse mesmo no caso nesse mesmo processo, nesse mesmo B.O aí, mas eu nem sei onde fica essa rodovia que o senhor falou na verdade (-Você não é da Lapa?) não (….) não, eu estava morando na Lapa junto com a minha mulher mas eu era aqui de São José dos Pinhais mesmo (-Bom, mas então você conhece a Lapa, você conhece a rodovia.) a eu conhecia a BR ali que eu vinha único lugar eu vinha de São José dos Pinhais até a Lapa e voltava (…) nego o fato (…) fui preso num tráfico (…) (-E você disse que só conhecia o Mateus?) isso só o Mateus (…) o Mateus ele mora uma quadra mais ou menos pra baixo da minha casa, então sempre nós estava se criou junto de criança no caso (…) eu fui na casa da minha mãe a tarde sai da Lapa fui pra casa da minha mãe e estava voltando embora já na verdade já daí eu mandei uma mensagem pra Kauane era umas dez horas da noite mais ou menos e falei se ela queria sair com nós né se ela queria ir pra Lapa com nós (…) fui buscar ela mais ou menos cheguei na casa dela ali umas onze e meia meia noite (…) estava eu o Mateus a Kauane a Rafaela e o meu primo (…) nenhum momento foi saído da casa (…). ” (Maikon Douglas Santos - interrogatório – mídia digital inserida no mov. 436.3) (Transcrição constante da sentença) No mesmo sentido foram as declarações do também codenunciado Matheus Henrique Pereira da Silva: “(…) (são verdadeiras essas acusações Mateus?) Não, são falsas (…) eu não tenho nenhum envolvimento, eu não sei o que levou eu estar envolvido nesses roubos porque eu não tenho nenhum envolvimento nunca roubei carga nenhuma, não conheço o, acho que o João Maria, não conheço (…) (-Quem que você conhece daqui?) não conheço ninguém, só conheço o Maikon só (…) conheço ele desde pequeno conheço da vila ali do São Marcos (…) daí eu tava no sobrado né no dia do roubo (…) na Lapa no sobrado do Maikon (…) (-Junto com o Maikon?) sim (-No dia do roubo aqui?) sim (-Que horas era isso?) o dia do roubo eu não sei mas é no dia do roubo a gente estava ali daí foi buscar a Kauane e a Rafaela daí voltamos pra Lapa e permanecemos ali, não saímos dali, saímos só no dia seguinte para levar elas (-Você nunca tinha visto o João Maria?) não, nunca vi (…) (-E o Emerson você conhecia?) não também não, não conheço nenhum deles (…) eu fui em 2020 é tentativa, mas não foi feito roubo nenhum (…) é de 157 (…). ” (Matheus Henrique Pereira da Silva – interrogatório – mídia digital inserida mov. 436.4) (Transcrição constante da sentença) A história contada por Maikon e Matheus foi corroborada pelas pessoas mencionadas por eles quando de seus interrogatórios, tendo Rafaela Rodrigues Diogo confirmado que no dia dos fatos, recebeu uma mensagem de Maikon por meio da rede social Facebook, convidando-a para ir à sua casa na Lapa. Contou que saiu por volta da meia noite e retornou apenas na manhã seguinte. Disse que ficaram em casa a noite toda, estando presente também a pessoa de Matheus e outro amigo dos réus, cujo nome não se recorda. A outra testemunha, Kauany da Silva, confirmou que é amiga de Maikon e que no dia dos fatos ele lhe enviou uma mensagem convidando-a para ir até a residência dele na Lapa. Explicou que ele lhe enviou mensagem por volta das 22h00 do dia 16, mas que só visualizou às 00h00 do dia 17 (dia do roubo). Explicitou que Maikon foi buscá-la e dormiu na residência do réu, retornando apenas no dia seguinte. Sustentou, ainda, que Rafaela e Matheus também estavam na casa. A situação narrada foi confirmada, tendo em vista a juntada de capturas de telas pela Defesa de Maikon em sede de alegações finais (mov. 451.1), sendo possível constatar uma conversa de Maikon e possivelmente Kauany, entre 00h06min e 00h49min do dia 17.05.2021, horário em que o roubo estava sendo executado.Não se olvida o fato de o ofendido ter reconhecido em juízo Maikon e Matheus como coautores do delito, o que se verá adiante. Todavia, em sede policial disse que “não conseguiu visualizar os dois indivíduos que entraram no caminhão, pois ficou deitado de barriga para baixo, sem poder olhar nada do que estava acontecendo”, tendo em dado momento de sua narrativa fornecido características diversas de Maikon e Matheus – “conseguiu ver as características físicas de um dos ocupantes do Corsa, "ele é moreno, gordinho, com barba, aparentando ter entre 30 a 35 anos" – mov. 1.14. Muito embora tenha sido ouvido mais duas vezes em fase inquisitorial (movs. 78.8 e 92.1), quando então passou a sugerir a participação de Maikon e Matheus na empreitada criminosa (o primeiro como sendo o assaltante responsável por dirigir a carreta e o segundo como possível masculino que adentrou na cabine do caminhão), recebeu as fotos de forma antecipada, as quais foram enviadas pela polícia como identificação dos demais integrantes do bando.A questão atinente ao reconhecimento posterior dos demais participantes do roubo foi esclarecida pela vítima Claudecir Roberto Bosio em Juízo, senão vejamos: “(…) eu estava trafegando com o veículo bitrem ali saindo de São Mateus é sentido a Lapa ali era por volta de meia noite, é andando até com bastante velocidade porque é uma região ali bem complicada (…) e mesmo assim os meliantes conseguiram encostar um veículo corsa ali atrás do bitrem e subiram na carreta com ela em movimento cortando a lona até chegar atrás do cavalinho ali e arrancar a mangueira de ar ali fazendo com que travasse a carreta em cima da pista, aí no momento em que eu desci pra verificar a situação o porquê que tinha travado em cima da pista, eu fui abordado pelo João se eu não estou enganado com um 32, que me fez voltar pra dentro do veículo com muita agressividade e coronhadas e nesse momento chegou mais dois indivíduos ali que entraram dentro da cabine comigo, aí já me colocaram deitado em cima da cama, me algemaram as mãos com fita hellermann e andemos por uns quilômetros ali aí eles encostaram o veículo no acostamento no quilômetro 237 que tem uma pedreira acho que da prefeitura ali aonde eu fiquei por cerca de cinco horas é no mato ali com eles me vigiando ali até que certo momento eles me atiraram e graças a Deus não me acertou né, mas daí acho que era umas cinco e pouco eles trouxeram o cavalinho de volta lá no mato onde eu estava lá e saíram sentido a Lapa de volta aí foi aonde eu acionei a polícia militar (…) certo momento eles voltaram lá pra pedir informações o porquê que o caminhão não estava desengatando (…) e se achassem o localizador ou rastreador eles iam me matar ali mesmo, e daí o João ficava abrindo o revólver ali puxando o gatilho e numa dessa ele atirou (…) daí eu passei tudo as características do indivíduo (…) e como o caminhão possuía um localizador eu consegui rastrear tudo onde o caminhão andou certinho e daí foi possível localizar o João ali nas primeiras horas ali já (inaudível) por volta das oito e pouco, nove horas da manhã (...) numa casa noturna que tem uns 10 km pra frente da Lapa ali (…) eles estavam praticamente assim com o rosto limpo, estavam usando só a máscara de covid sabe, em certos momentos eles tiraram (…) eles estavam sem máscara quando voltaram então eu pude ver bem o rosto deles (…) (-Foi por fotografia que você fez o reconhecimento do João Maria?) isso o policial militar fotografou ele lá no local que abordaram ele com o veículo a arma tudo né aí voltaram lá na Delegacia mostraram a foto dele, falei parece que é sim ele eu acho que é sim, daí trouxeram ele pra Delegacia quando eu olhei eu falei é ele sim não tenho dúvida não eu tive de frente com ele na Delegacia lá (…) sim recuperei o bitrem com a carga ainda em cima e o cavalinho também, porém com umas avarias (…) eles apresentaram várias fotos dos indivíduos que estavam lá na casa noturna lá junto com ele, e eu reconheci ele, aí o policial militar falou “é inclusive o corsa estava lá, pegamos a arma com a capsula deflagrada tudo então você tem certeza ”eu falei tenho certeza absoluta porque eu vi o rosto dele com muita clareza quando o outro pessoal voltou lá por volta de sei lá que horas lá da madrugada e acenderam a luz do celular e eu vi corretamente o rosto deles (…) sim realizei o reconhecimento de mais pessoas (…) o assalto foi por volta da meia noite, meia noite e vinte eu acho, não tenho certeza né (…) eram cinco suspeitos (…) eu apontei dois (…) (-Certo, então quando foi esse segundo reconhecimento a polícia civil ela ligou para o senhor falando óh foi preso mais alguns indivíduos o senhor pode vir aqui e reconhecer?) sim foi, eles me ligaram é mandaram foto pra mim daí eu fui pessoalmente na Delegacia lá fazer o reconhecimento deles (…) vendo eles pessoalmente lá na janelinha da Delegacia que eles fazem lá pela janelinha lá a visualização deles (…) se eu não estou enganado foram cinco pessoas que eu observei lá (…) o João Maria era o alto daí tinha o gordinho mais baixinho ali que era o motorista e tinha mais um outro moreno que ele estava junto com eles (…) a identificação foi pessoal lá e não teve erro (…) um era estatura média assim mais baixa que o João ali porque o João mede quase dois metros né então ele é extremamente alto né, o motorista ele era sei lá de um metro e setenta mais ou menos e mais gordinho assim né e o outro também era moreno, cabelo preto, com barba estatura média ali também (…) (- o senhor reconheceu uma pessoa de nome Mateus, o senhor lembra se o senhor reconheceu com certeza, com dúvida?) não, com certeza porque quando eu estava lá no mato amarrado lá e até o João achou que tinha sido muito rápido o assalto que já estava liberado eles voltaram pra me perguntar se o caminhão tinha trava na quinta roda porque eles não conseguia desengatar, aí eles clarearam com o celular o rosto deles e eu consegui ver claramente, então eu não tenho dúvida (-O senhor está vendo os réus aí na tela?) dois eu estou vendo sim, o João e outro ali (-Tá, o senhor reconhece algum deles como a pessoa de Mateus?) o Mateus pelo nome eu não sei dizer quem é, mas esse que está do lado do João ali é o que dirigia o caminhão (…) (- nessa tela que está os dois indivíduos o Mateus é o maior?) isso (-O senhor reconhece ele?) sim (…) ele foi o que entrou no veículo por último e ficou com os meus pertences, com o celular, com a carteira, com a mochila de roupa (…) (- Claudecir, você consegue reconhecer o João Maria como sendo o que abordou você no dia do assalto? está vendo a imagem dele aí?) sim estou vendo (…) (-Você tem alguma dúvida?) não (certeza absoluta?) certeza porque lá na Delegacia eu vi eles pessoalmente lá (-E o Maikon e o Mateus que está na tela de cima aqui?) sim (-Certeza absoluta também?) certeza absoluta (…).” (Claudecir Roberto Bosio – vítima – mídia digital inserida no mov. 302.2)” (Transcrição constante da sentença) Com efeito, infere-se do depoimento do ofendido que a certeza conferida desde o primeiro momento se deu somente com relação ao réu João Maria. Porém, não se percebe a mesma força para sustentar um decreto condenatório em desfavor Maikon e Matheus, ainda mais quando “há dúvidas sobre a neutralidade do procedimento do reconhecimento feito na DEPOL”, como bem ponderado em sentença. Importante ressaltar que somente no que tange ao recorrente João Maria foram produzidas outras provas a confirmar o reconhecimento do ofendido, na medida em que os agentes públicos, ouvidos durante a instrução, minuciaram a operação e confirmaram o seu envolvimento no roubo. Em Juízo, o policial militar Jean Ruanito Cardoso de Jesus, disse que: “(…) a minha equipe deu atendimento a uma ocorrência de a gente assumiu o serviço, tinha ocorrido um roubo a um caminhoneiro e sido levado a sua carga né levado o reboque e a carga (…) ele repassou que ele teria um localizador nessa carreta dele e pelo localizador ela teria parado num barracão as margens da rodovia que vai pra São Mateus e também próximo a uma lanchonete na curva conhecida como volta grande (…) aí diante disso a gente deslocou averiguar as informações logrou êxito em achar um barracão, nesse barracão foi localizado dois semirreboques ambos roubados um era o que havia sido roubado nessa madrugada desse boletim dessa vítima que estava lá na sede do Batalhão e o outro é um semirreboque já estava sem a carga e teria sido roubado anteriormente, aí a gente coletou informações no local ali o proprietário desse barracão ele teria alugado para um pessoal não me recordo o nome deles e segundo ele um dos frequentadores do barracão seria o responsável pela lanchonete da volta grande que seria o outro ponto onde o rastreador do caminhão e é teria parado após o roubo, aí diante disso a gente pediu apoio do serviço reservado e também da equipe de Contenda pra deslocar até essa lanchonete, daí nesse local nessa lanchonete foi logrado êxito em abordar um veículo e três masculinos e uma feminina, e o veículo também era as mesmas características do veículo que havia sido informado pela vítima do roubo aí, era um corsa hatch prata, na busca do veículo foi localizado também um 32 (…) na Delegacia foi confirmado pela vítima ser um dos autores do roubo (…) no dia que a gente fez o encaminhamento foi esse José Maria aí, ele também já era conhecido e já tinha atendido uma outra ocorrência também de roubo de carga e também havia sido efetuado a prisão do indivíduo ele já era conhecido desse meio por roubo a carga, era ele que foi identificado no dia lá, acredito que os outros foi posterior aí a investigação da Polícia Civil (…) é ele informou que teria sido ameaçado é fizeram amarraram acho que ele deixaram na mata lá (…) e daí saíram com a carreta dele daí após algumas horas retornaram e devolveram o cavalinho pra ele e teriam feito pressão psicológica pra ele falar se teria rastreador no veículo no caminhão, na carreta, ele falou que não teria negou e foi isso que deu certo de a gente conseguir localizar o barracão com os objetos de furtos e com os semirreboques (…) o revólver foi localizado dentro do corsa hatch aí do proprietário aí João Maria, José Maria (…) ele teria confirmado que o veículo era dele aí na busca foi localizado a arma de fogo (…) a gente tinha informações que era uma quadrilha que estava agindo na região e eles teriam em tese um barracão sempre um barracão sendo utilizado para armazenar né os caminhões as carretas roubadas e daí posteriormente eles faziam a desova dessa carga aí e no dia foi logrado êxito em localizar esse barracão em contato com o proprietário do barracão que teria locado ele para os autores aí ele informou que teria passado pelo menos umas vinte carretas ali e todas com uma movimentação estranha normalmente a noite, madrugada e eles faziam mais na surdina, batiam a carga e o transporte dessa carga ai (…). ” (Jean Ruanito Cardoso de Jesus - Policial Militar – mídia digital inserida no mov. 302.3) (Transcrição constante da sentença) O policial militar Marcos Vinicius Cadena da Silva, ouvido em Juízo, narrou que: “(…) eu com o soldado Jean estávamos de serviço lá na Lapa e a gente assumiu o serviço oito horas da manhã a vítima já estava no batalhão ele havia chegado cedo também pedindo socorro, é segundo ele na madrugada daquele dia ele foi rendido por alguns indivíduos, foi levado até um matagal e os indivíduos saíram com o caminhão que ele estava e ele ficou ali por algumas horas no meio do mato com um dos indivíduos cuidando dele ali e algumas horas depois entregaram pra ele o cavalinho dele no caso a parte da frente do caminhão (…) através de um aplicativo de rastreamento do caminhão dele foi possível verificar e no momento que ele estava sendo mantido preso digamos assim no meio do mato, o caminhão dele trafegou ali pela rodovia do xisto sendo que fez uma parada em uma lanchonete conhecida como lanchonete da volta grande, é posteriormente o mesmo caminhão fez outra parada em uma outra região ali aonde existem uns barracões, aí depois o caminhão se movimentou novamente e perdeu contato, então foi feito ali buscas sendo que no local aonde existe os barracões foi conversado lá com o proprietário do barracão (…) onde foi verificado lá que dentro do barracão existia uma carreta né um reboque e a mesma possuía alerta já de uma situação em data anterior na cidade de Palmeiras e também ali estava o semirreboque no caso seria um bitrem e pertencia a vítima referente a essa oitiva, conversado lá com o seu Gavlak ele falou que alugou havia alugado aquele barracão e que uma das pessoas que ali frequentavam (…) essa pessoa era a pessoa responsável pela lanchonete na Volta Grande, inclusive aonde foi feita a primeira parada do caminhão segundo o aplicativo de rastreamento (…) foi deslocado até a lanchonete na volta grande, na lanchonete foi abordado o responsável pela lanchonete o seu João e naquele dia eles tinham mais duas pessoas não me recordo o nome, é no local existia um veículo um Ford se não me engano um Ford corsa né um Chevrolet algo do tipo, mas era um veículo de propriedade do João esse veículo batia com o veículo que a vítima anteriormente havia relatado, algumas características a cor do veículo, é foi feita uma busca no veículo foi encontrado ali um revólver calibre 32, esse revólver também batia ali com a característica da vítima que a vítima relatou que seria um revólver ali usado pelos autores (…) a vítima reconheceu ali o João, reconheceu o veículo dele e reconheceu o revólver (…) reconheceu como sendo usado na ação delituosa (…) isso no mínimo uns três, mas eram mais (…) esses dois ali que estão aparecendo na tela eu já tive ocorrências com eles em outras situações, já havia outras denúncias deles também (…) (-Acerca dessa associação criminosa já tinha conhecimento, teve contato com outra investigação, alguma coisa nesse sentido ou não?) informalmente já haviam denúncias dos outros dois que estão aparecendo na tela, já haviam envolvimento aí com roubo de carga (…). ” (Marcos Vinicius Cadena da Silva - Policial Militar – mídia digital inserida no mov. 302.4) (Transcrição constante da sentença) Como se pode perceber, a polícia conseguiu reunir provas e relacionar o apelante João Maria ao roubo em questão, posto que em decorrência do aparelho rastreador instalado no caminhão subtraído, foi possível detectar o trajeto percorrido, constatando-se que antes de rumarem ao barracão onde o bem foi localizado, o qual era frequentado por João Maria, conforme informações obtidas com o proprietário do imóvel, pararam em uma lanchonete de sua propriedade.Acrescenta-se ainda que na operação realizada no barracão, os agentes públicos apreenderam uma arma de fogo compatível com a utilizada pelo acusado João Maria no momento do crime, bem como um automóvel, o qual também é de propriedade do apelante, com as mesmas características do carro usado no roubo, conforme relatado pela vítima. Nesse contexto, a prova carreada aos autos é firme e coerente a apoiar o decreto condenatório que recaiu sobre o réu João Maria, ora apelante, resultando descabidas as alegações defensivas de insuficiência provatória, impondo-se a manutenção de sua condenação.Lado outro, com bem destacado pela d. Procuradoria de Justiça “embora em Juízo Maikon e Matheus tenham sido reconhecidos pela vítima, forçoso reconhecer que os relatos dos policiais não confirmam o reconhecimento feito. Além disso, os apelados apresentaram um álibi para o dia do fatos e se empenharam em sua comprovação”.Logo, não restando satisfatórios os elementos fáticos indispensáveis a sustentar uma decisão desfavorável aos acusados Maikon e Matheus pelo crime de roubo majorado, tal como pretende o il. Representante do Ministério Público, há que se aplicar o princípio “in dubio pro reo”, não podendo uma condenação alicerçar-se em possíveis envolvimentos com outros roubos perpetrados de forma semelhante.Assim, diante das considerações postas, torna-se necessária a manutenção da absolvição de Maikon e Matheus, e a condenação do apelante José Maria. DO CRIME DE ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA (4º FATO) Pretende o Ministério Público a condenação dos acusados Maikon e Matheus também como incursos nas sanções do artigo 288, parágrafo único, do Código Penal, sob o fundamento de ter restado provado nos autos o vínculo “sólido e durável” entre os réus para a prática dos crimes. Já a Defesa de João Maria pugna por sua absolvição por ausência de provas ou a desclassificação do crime de organização criminosa para o delito de associação criminosa. Por óbvio, o pleito desclassificatório não merece ser conhecido, por ausência de interesse recursal, visto que o apelante já fora condenado pelo crime de associação criminosa. Quanto ao pedido absolutório, o parecer ministerial é favorável na forma pretendida pela Defesa. Pois bem. Ao contrário do que pretende fazer crer o órgão acusador, não existem elementos nos autos que demonstrem de forma suficiente a durabilidade e a permanência da associação criminosa, sendo estes requisitos indispensáveis para a caracterização do delito, conforme nos ensina a doutrina: “A legislação brasileira, até muito recentemente, não definia organização criminosa, a despeito da existência da Lei nº 9.034/1995, que teoricamente dispunha sobre medidas de tratamento da investigação de crimes praticados por organizações criminosas. A subscrição da Convenção das Nações Unidas sobre Crime Organizado, (Protocolo de Palermo), introjetada no ordenamento jurídico brasileiro pelo Decreto nº 5.015 /2004, definiu grupo criminosos organizado como: “Grupo estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na presente Convenção, com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material.” Com o advento da Lei nº 12.694, de 24 de julho de 2012, passou-se a definir organização criminosa, em seu art. 2º, nos seguintes termos: “Para os efeitos desta Lei, considera-se organização criminosa a associação, de três ou mais pessoas, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com o objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de crimes cuja pena máxima seja igual ou superior a quatro anos ou que sejam de caráter transnacional”. Apenas um ano depois o legislador pátrio editou nova lei (Lei nº 12.850, de 2 agosto de 2013) redefinindo organização criminosa com outros contornos e outra abrangência, em seu art. 1º, §1º, nos seguintes termos: “Considera-se organização criminosa a associação de quatro ou mais pessoas, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a quatro anos, ou que sejam de caráter transnacional”, e revogando o art. 288 do Código Penal, com seu art. 24, definindo a associação criminosa como: associarem-se três ou mais pessoas, para o fim específico de cometer crimes. A redação dada ao art. 288 vem, portanto, a reboque de uma pretensão de regulamentação de criminalização da organização criminosa e sua distinção diante da associação criminosa. (...) O núcleo da incriminação, segundo o desenho estipulado pela Lei nº 12.850/2012, é o verbo associar-se, que significa agrupar-se, juntar-se, colocar-se em colaboração mútua.Manteve-se, portanto, o conteúdo incriminado do antigo tipo de quadrilha ou bando, o que bem permite deduzir não ter havido propriamente uma extinção da modalidade delitiva anteriormente existente, mas uma simples modificação de nomenclatura, preservada a incriminação, que, no entanto, trouxe efeitos benéficos quanto a delimitação, até então bastante confusa, entre organização criminosa e associação criminosa. Essa associação deve ter no mínimo três pessoas. Tais pessoas devem reunir-se em caráter estável ou permanente, para efetivamente configurar o termo associação. Somente a demonstração de que há estabilidade ou permanência no grupo torna possível falar em associação, delimitando a situação diante do concurso eventual de pessoas.” (BUSATO, Paulo César. Direito Penal: parte especial 2, v.3. São Paulo: Atlas, 2016. p. 292/294) Com efeito, não se vislumbra prova segura e judicializada a despeito do animus associativo duradouro e permanente da suposta associação criminosa entre os referidos agentes para a prática de crimes.De se notar que os policiais militares chegaram até os acusados porque foram acionados para dar atendimento à notícia de roubo de caminhão e respectiva carga, e não porque estavam investigando suposta associação criminosa, pontuando apenas que já teriam ouvido relatos dando conta do envolvimento deles com atividades correlatas.Logo, não há lastro provatório suficiente para comprovar a estabilidade e permanência do vínculo entre os réus para a prática de crimes. Quanto ao tema, esta Corte já decidiu: APELAÇÕES CRIMINAIS. MINISTÉRIO PÚBLICO E RÉUS. CONCUSSÃO ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. ARTIGOS 316, C/C 69, E 288, TODOS DO CÓDIGO PENAL. AUTORIA DELITIVA NÃO COMPROVADA NOS AUTOS. IN DUBIO PRO REO. ABSOLVIÇÃO. SENTENÇA ESCORREITA. ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. FALTA DE ELEMENTOS QUE COMPROVEM A ESTABILIDADE E PERMANÊNCIA DO VÍNCULO ASSOCIATIVO. CONDENAÇÃO QUE NÃO SE JUSTIFICA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DEVIDOS PELA APRESENTAÇÃO DE CONTRARRAZÕES PELO DEFENSOR DATIVO. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DESPROVIDO E PROVIDO O INTERPOSTO PELOS RÉUS. (TJPR - 2ª C.Criminal - 0007950-22.2008.8.16.0014 - Londrina - Rel.: DESEMBARGADOR LAERTES FERREIRA GOMES - J. 11.11.2021) Apelação crime. Associação criminosa, exposição de perigo para a vida ou saúde de outrem e realização de atividades poluentes ao meio ambiente (artigos 132 e 288 do Código Penal e 38 e 60 da Lei nº 9.605/98). Sentença absolutória. Pleito de condenação pelo Ministério Público em relação ao delito de associação criminosa. Não acolhimento. Ausência de comprovação do elemento específico do tipo penal “finalidade especial de cometer crimes”. Acervo probatório insuficiente. Infração penal não configurada. Manutenção da sentença absolutória. Recurso desprovido. O delito de associação criminosa, previsto no art. 288 do Código Penal, com a alteração conferida pela Lei 12.850/13, prevê a associação de três ou mais pessoas para o “fim específico de cometer crimes”. Nesse contexto, para a configuração do delito é necessário estar sobejamente comprovado o ajuste de vontades entre os agentes, dirigidas à prática de condutas ilícitas. (TJPR - 2ª C.Criminal - 0008108-61.2016.8.16.0058 - Campo Mourão - Rel.: DESEMBARGADOR JOSÉ MAURICIO PINTO DE ALMEIDA - J. 27.09.2021) APELAÇÃO CRIMINAL – CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO – FURTO QUALIFICADO [ART. 155, § 4º, I E IV, DO CÓDIGO PENAL] – CRIME CONTRA A PAZ PÚBLICA – ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA [ART. 288, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CP] – CORRUPÇÃO DE MENORES [ART. 244-B DO ECA] – SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA – INCONFORMISMO DA DEFESA – PLEITO DE ABSOLVIÇÃO EM RELAÇÃO A TODOS OS CRIMES – PARCIAL ACOLHIMENTO – ABSOLVIÇÃO EM RELAÇÃO AO CRIME DE ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA – Se não há nos autos provas suficientes do animus associativo estável ou permanente por parte dos agentes, sendo certo que para sua caracterização exige prova inconteste de vínculo associativo permanente com a finalidade de cometer crimes, a absolvição do delito de associação criminosa armada é medida que se impõe – (...) – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO – SENTENÇA PARCIALMENTE MODIFICADA. (TJPR - 5ª C.Criminal - 0004439-80.2019.8.16.0159 - São Miguel do Iguaçu - Rel.: DESEMBARGADOR LUIZ OSORIO MORAES PANZA - J. 30.01.2021) Outrossim, como bem destacado pelo d. Procurador de Justiça “inviável manter a condenação de João Maria pelo crime de associação quando a Denúncia narra expressamente a formação de grupo criminoso com os corréus absolvidos (Maikon e Matheus) e não com terceiros”. Isso porque o princípio da Correlação determina que deve haver adequação entre o fato narrado na denúncia e aquele pelo qual o réu é condenado. Em vista disso, “percebe-se que não houve total correspondência entre o decreto condenatório e a descrição fática contida no Aditamento à Denúncia com relação a João Maria, na medida em que o decreto condenatório não reconheceu a existência de provas suficiente do envolvimento dos corréus e a Exordial narrava uma associação criminosa composta exclusivamente pelos denunciados”.Portanto, acolhe-se o pedido da Defesa de absolvição do recorrente João Maria quanto a prática do crime previsto no artigo 288, parágrafo único, do Código Penal e rejeita-se o requerimento ministerial pela condenação dos acusados Maikon e Matheus pelo delito em questão. DA DOSIMETRIA DA PENA De forma alternativa, a Defesa de João Maria pugna pela redução da pena no mínimo legal. A sentença condenou o réu à pena privativa de liberdade de 09 (nove) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, em regime fechado, além do pagamento de 22 (vinte e dois) dias-multa, pela prática do delito previsto no artigo 157, §2º, incisos II e V, do Código Penal (roubo duplamente majorado).Com relação à dosimetria da pena, explicitou o decisum objurgado: “4.1. Crime de roubo duplamente majorado Partindo dos mínimos legais previstos nos arts. 157 e 49 do Código Penal, quais sejam, 04 (quatro) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, passa-se ao exame das circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal. Pena base (1ª fase) A culpabilidade, ou o grau de reprovabilidade da conduta, embora grave, é ínsita ao tipo penal, não podendo ser considerada em seu desfavor; com relação aos antecedentes, verifica-se a existência de condenações transitadas em julgado em desfavor do sentenciado nos autos: n.º 0000174-63.2006.8.16.0103 - trânsito em julgado em 09/05/2008; e n.º 0004772-06.2019.8.16.0103 - trânsito em julgado em 12/01/2022, devendo ambas serem consideradas para fins de maus antecedentes porquanto uma não compreende o prazo quinquenal para fins de reincidência e a outra consumou trânsito em julgado durante o trâmite da presente ação penal, podendo ser considerada somente nesta fase (mov. 15.1); a conduta social é compreendida como o comportamento do agente no meio familiar, no ambiente de trabalho e nos relacionamentos sociais. Ausentes elementos para valorá-la negativamente, neutralizo-a; quanto à personalidade do agente, tratando-se de quesito técnico, a exigir conhecimento específico para sua avaliação, e não realizada, também deve ser neutralizada; no tocante aos motivos do crime, verifica-se ser ínsito ao tipo penal; as circunstâncias e consequências do crime, igualmente decorrem do próprio tipo penal; no que concerne ao comportamento da vítima, não contribuiu para a conduta criminosa. Considerando que existe uma circunstância judicial desfavorável (antecedentes), elevo a pena-base na fração de 1/6, fixando-a em 04 (quatro) anos e 08 (oito) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa. Pena provisória (2ª fase) Não há circunstâncias atenuantes ou agravantes para serem consideradas. Assim, mantenho a pena provisória em 04 (quatro) anos e 08 (oito) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa. Pena definitiva (3ª fase) Conforme fundamentação supra, incidem sobre causas especiais de aumento relativas ao concurso de agentes (art. 157, § 2º, inciso II, do CP) e restrição da liberdade da vítima (art. 157, § 2º, inciso V, do CP). Assim, considerando a incidência de duas causas de aumento, bem como as frações específicas para o §2º (1/3) e §2º-A (2/3), majoro a pena em 3/3, fixando a pena definitiva em 09 (nove) anos e 04 (quatro) meses de reclusão e 22 (vinte e dois) diasmulta. Diante da inexistência de informações acerca de eventual renda lícita auferida pelo acusado, fixo o valor do dia-multa em 1/30 do salário mínimo vigente na data do fato. O valor da multa deverá ser atualizado pelos índices da correção monetária, conforme artigo 49, § 2º, do CP.” Pois bem. Ao fixar a pena-base, a sentença valorou negativamente apenas a circunstância judicial relativa aos “maus antecedentes” do agente, elevando a pena basilar em 08 meses acima do mínimo legal.A despeito da negativação mencionada, ensina Guilherme de Souza Nucci que “são os aspectos passados da vida criminosa do réu” (in Código Penal Comentado, Ed. Forense, 14ª edição, RJ, 2014, p. 676).Há na certidão de antecedentes criminais (mov. 15.1) diversos registros de ações judiciais em que o apelante figurou como réu. É de se observar que condenações anteriores podem não ser aptas a caracterizar a reincidência do réu, mas suficiente a configurar maus antecedentes. Deste modo, correta a decisão combatida que elevou a pena-base acima do mínimo legal. Na terceira fase, ante a presença de duas causas de aumento de pena (concurso de pessoas e restrição da liberdade das vítimas), elevou-se a reprimenda intermediária em 3/3, conforme previsão legal. Em suma, uma vez que não foi verificado nenhum equívoco na dosimetria, a pena do réu deve ser mantida, tal como lançada.Para mais, muito embora afastada a condenação do recorrente pelo delito de associação criminosa (4º Fato), a pena aplicada ao crime de roubo (1º Fato) permanece superior a 8 (oito) anos de reclusão, o que impede a alteração do regime inicial de cumprimento de pena para um menos gravoso ou a substituição da pena, nos termos do art. 33, §2º e art. 44, ambos do Código Penal. DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Quanto ao pleito de arbitramento de honorários, formulado pela Defesa de Matheus Henrique Pereira da Silva em razão da apresentação de contrarrazões (mov. 516.1), deve ser assegurada a remuneração pelo fiel exercício da advocacia dativa, reconhecida como munus público. Portanto, conforme os valores discriminados na Tabela de Honorários anexa à Resolução Conjunta nº 15/2019 – SEFA/PGE arbitra-se à Drª DEISE DOS SANTOS NASCIMENTO (OAB/PR 83.035), o valor de R$ 400,00 (quatrocentos) reais, a serem pagos pelo Estado do Paraná. CONCLUSÃO Face a todo o exposto, voto no sentido de conhecer parcialmente e, na parte conhecida, dar parcial provimento ao recurso interposto por João Maria Ribeiro Filho (Apelante 1); conhecer e negar provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público do Estado do Paraná (Apelante 2), com fixação de honorários à defensora dativa pela apresentação de contrarrazões.
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